Acórdão nº 3192-12.2YXLSB-D.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução24 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

I-RELATÓRIO: A... e M... vieram, por apenso, aos autos principais de insolvência em que foi decretada a insolvência de P..., nos termos e ao abrigo do preceituado no artigo 129°, nº 1 do CIRE, reclamar um crédito, no montante global de €1.114.500,00, nos termos e com os fundamentos de fls. 32 e seguintes.

A Exma. Sra. Administradora de insolvência não reconheceu o crédito reclamado por A... e M..., nos termos e com os fundamentos de fls. 14 (relação de créditos não reconhecidos) e 17 (correspondência).

A Exma. Sra. Administradora de Insolvência mencionou como motivo de não reconhecimento: "Os factos invocados e os documentos juntos são insusceptíveis de desencadear os mecanismos do art. 442º do Código Civil, que pressupõem o incumprimento definitivo do contrato promessa por parte do insolvente e sua mulher (que não está insolvente). Daí que, não gozem do direito de retenção que invocam.

Contrariamente ao que invocam na reclamação, o direito dos reclamantes não está reconhecido no acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa. Esta decisão foi proferida após o decretamento da insolvência, no âmbito de um processo executivo que foi suspenso e não pode prosseguir, por virtude do decretamento da insolvência de um dos co-obrigados naquele contrato.

Os documentos juntos com a reclamação de créditos não são suficientes para demonstrar que há incumprimento por parte do insolvente ( ... ). O facto de as partes terem fixado dia e hora para a realização da escritura e de o insolvente não ter comparecido no Cartório Notarial não tem o significado que os reclamantes dali pretendem retirar. Até porque, os próprios reclamantes não cumpriram aquilo a que se obrigaram no contrato promessa. E, por isso, à data em que compareceram no Cartório bem sabiam que não podiam exigir a celebração da escritura do contrato prometido naquela data, porque ainda não tinham cumprido a sua parte. Na realidade consta do contrato promessa que os reclamantes são titulares de um direito num contrato promessa de compra e venda de quotas da sociedade comercial "A... Lda." Mas não está demonstrada nem a titularidade desse direito, nem que a posição dos reclamantes tenha o valor de € 350.000,00. Nem resulta dos documentos juntos que os reclamantes tenham efectivamente cedido ao insolvente a sua posição, sendo que este era um elemento essencial do negócio para o insolvente.

Por outro lado, os reclamantes só gozam do direito de retenção se demonstrarem que houve tradição das fracções prometidas vender, se o contrato estiver definitivamente incumprido pelo insolvente e se demonstrarem que têm um crédito contra o insolvente, por virtude do incumprimento.

Não está provado que houve interpelação admonitória do insolvente e seu cônjuge, nem que houve uma perda objectiva de interesse na conclusão do negócio da venda das fracções.

A... e M... vieram deduzir impugnação das listas de créditos não reconhecidos e reconhecidos, nos termos e com os fundamentos de fls. 23 e seguintes.

Sustentam os reclamantes que por contrato promessa de compra e venda, celebrado em 11/11/2008, o insolvente e sua mulher M..., prometeram vender, livre de quaisquer ónus ou encargos as fracções autónomas designadas pelas letras "AC", correspondente ao décimo primeiro andar letra A e 47/1000 avos da fracção autónoma designada pela letra "C", correspondente à quarta cave, do prédio urbano sito na Av. João XXI, n° 72, freguesia de Arroios, concelho de Lisboa, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n° 51 e inscrito na matriz predial urbana daquela freguesia sob o artigo 906°, conforme cópia do contrato que se encontra junto aos autos. O preço acordado da prometida compra e venda foi de €750.000,00.

Por conta do preço estabelecido no contrato os reclamantes ora impugnantes pagaram ao insolvente e sua mulher, a título de sinal e reforços de sinal, a quantia global de €557.250,00.

Ficou acordado na cláusula quarta do aludido contrato promessa de compra e venda, que o remanescente do preço, ou seja, €192.750,00, seria pago na data da celebração da escritura.

Aquando da outorga do dito contrato promessa o insolvente e sua mulher entregaram aos reclamantes ora requerentes as chaves das ditas fracções autónomas, conferindo-lhes plena posse das mesmas, passando estes a ocupá-las desde então até ao momento presente, onde passaram a habitar com os seus filhos, a dormir, comer e a ter as suas coisas, e a pagar as respectivas despesas.

Os promitentes vendedores (insolvente e mulher) não honraram o compromisso assumido no referido contrato promessa.

O Tribunal da Relação de Lisboa, em 12 de Fevereiro de 2013, no âmbito dos autos de reclamação de créditos que correram por apenso aos autos de acção executiva, pela 1ª Secção do 2° Juízo de Execução de Lisboa sob o nº 20318/08.3YYLSB, que se encontram apensados ao processo principal de insolvência, proferiu acórdão onde se encontra definitivamente decidido: a) O incumprimento definitivo do aludido contrato promessa de compra e venda (acórdão referido, páginas 21 e 22, parágrafos 4° e 2°); b) Que esse incumprimento foi imputável aos promitentes vendedores, ora insolvente e sua mulher; c) Reconhecido que os ora requerentes têm o direito a exigir do insolvente e sua mulher o dobro do sinal que pagaram (pág. 22, parágrafo 2); d) Que os autos de reclamação de créditos devem seguir os termos do processo sumário de declaração para se apurar se os ora reclamantes obtiveram, ou não, a tradição dos bens imóveis objecto do contrato prometido (parte decisória do acórdão, pág. 23).

O referido aresto não foi objecto de recurso, reclamação ou impugnação por parte de nenhum interessado, nomeadamente do insolvente e mulher e dos credores reclamantes (que reclamaram os seus créditos no identificado processo executivo e que o vieram a fazer de novo nos presentes autos de insolvência).

Pelo que a referida decisão transitou em julgado.

A Sra. Administradora de Insolvência tomou conhecimento da existência do referido acórdão que foi invocado pelos ora impugnantes no requerimento da sua reclamação de créditos, e dos direitos que na dita decisão foram reconhecidos aos impugnantes e, como tal, tinha que considerar como reconhecido o crédito dos ora impugnantes, por imposição e força do caso julgado. A credora I.... veio, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 131º do CIRE, apresentar a resposta de fls. 129 e seguintes, a pugnar pela inexistência de decisão transitada em julgado, pela inexistência do crédito reclamado (a documentação junta é insusceptível de fazer prova do efectivo pagamento e não existe documentação demonstrativa da existência do direito e da cessão da posição contratual dos impugnantes e que esta, a existir, tenha o valor de €350.000,00), pela inexistência de incumprimento definitivo (não foi alegada e provada a interpelação admonitória legalmente exigível e a perda do interesse no cumprimento) e pela inexistência de tradição e de direito de retenção (cfr. fls. 129 e seguintes).

Por seu turno, a Exma. Sra. Administradora de Insolvência veio tomar posição no sentido vertido no articulado de fls. 153 e seguintes, mantendo o não reconhecimento do crédito reclamado pelos impugnantes.

Foi realizada tentativa de conciliação que não conduziu à obtenção de acordo quanto aos termos do litígio (cfr. fls. 182 a 184).

Realizou-se audiência de discussão e julgamento, vindo a ser proferida sentença que reconheceu os créditos reclamados graduam-se os mesmos do seguinte modo: 1 ° As dívidas da massa insolvente saem precípuas (artigo 172° do CIRE).

  1. O crédito privilegiado da Fazenda Nacional, pelo respectivo valor.

  2. O crédito garantido (direito de retenção) dos credores A... e M..., pelo respectivo valor.

  3. Os créditos garantidos (por hipoteca) da credora H..., pelos respectivos valores.

  4. Os demais créditos (comuns e privilegiado, sendo este último o crédito de € 51.000,00 do Banco ..., e considerando que beneficia de privilégio creditório geral, a graduar em último lugar, sobre os bens móveis integrantes da massa insolvente que no caso inexistem) verificados (com excepção dos abaixo indicados).

  5. Os créditos subordinados. Foram dados como provados os seguintes factos: 1. Por sentença proferida nos autos principais a que os presentes estão apensos, datada de 1 de Fevereiro de 2013, transitada em julgado, foi declarada a insolvência...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT