Acórdão nº 461/14.0TJLSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução06 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: * I– A «Companhia de Seguros ......., SA» intentou a presente acção declarativa com processo comum contra a «Companhia de Seguros ......., SA» e contra Paula ........

Alegou a A., em resumo: Tendo a A. celebrado um contrato de seguro de acidentes de trabalho com a sociedade «Graça ......., Lda.», ocorreu um sinistro que vitimou mortalmente um trabalhador desta, sinistro esse que configura simultaneamente acidente de viação e de trabalho.

No processo de acidente de trabalho que correu termos, tendo o acidente sido caracterizado como acidente de trabalho, a A. assumiu o pagamento ao Fundo de Acidentes de Trabalho da quantia de 20.370,00 €, quantia que efectivamente pagou.

Nos termos do nº 4 do art. 17 da lei 98/2009, de 4-9, a A. pode sub-rogar-se no direito do lesado contra os responsáveis pelo acidente.

A R. Paula .......foi a única responsável pelo acidente de viação que vitimou o dito trabalhador.

A R. Paula .......celebrara com a «Companhia de Seguros .......» seguro de responsabilidade civil automóvel, transferindo para esta a responsabilidade civil decorrente do referido acidente Formulou a A. o seguinte pedido: «A.)-Deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, a Primeira Ré, “Companhia de Seguros ......., SA”, ser condenada a pagar à Autora o montante de 20.370,00€ (vinte mil, trezentos e setenta euros), à qual acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, que ascendem, nesta data, a 2.656,05€ (dois mil, seiscentos e cinquenta e seis euros e cinco cêntimos), bem como os juros vincendos, igualmente à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; Subsidiariamente, desconhecendo a Autora a validade do contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel, celebrado entre a Primeira e a Segunda Rés, à data em que se verificou o sinistro em causa nos presentes autos, que vitimou mortalmente José ......., de harmonia com o disposto nos art.º 554.º, n.º 1, e 39.º do Novo Código de Processo Civil, B.)-Deve a presente acção ser julgada procedente por provada e, em consequência, a Segunda Ré, Paula ......., ser condenada a pagar à Autora o montante de 20.370,00€ (vinte mil, trezentos e setenta euros), à qual acrescem os juros de mora vencidos, à taxa legal, que ascendem, nesta data, a 2.656,05€ (dois mil, seiscentos e cinquenta e seis euros e cinco cêntimos), bem como os juros vincendos, igualmente à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento».

Contestou a R. Paula ........ Alegou ser parte ilegítima uma vez que à data do acidente existia seguro válido, devendo ser absolvida da instância e pediu a condenação da A. como litigante de má fé em multa e indemnização a seu favor, não inferiores a 5.000,00 € e 10.000,00 €, respectivamente.

Também a R. «.......» contestou. Invocou a nulidade do processo, tendo em conta a nulidade da petição, com a consequente absolvição da instância. Invocou, também, a prescrição da pretensão deduzida pela A., considerando o prazo do nº 4 do art. 17 da lei 98/2009. Por fim, invocou a excepção da preterição do Tribunal Arbitral, face à regulamentação emitida no âmbito da Convenção Regularizadora de Sinistros. Impugnou, ainda, a R. factualidade alegada pela A..

Em audiência prévia que fora designada a A., a cujo mandatário fora concedida a palavra para se pronunciar sobre as excepções invocadas, declarou, nomeadamente: «(…) Relativamente à exceção de preterição do tribunal arbitral, é posição da autora de que tal convénio celebrado ao abrigo da Associação Portuguesa de Seguradoras, não significa que as acções entre as congéneres não possam ser apreciadas no âmbito dos tribunais judiciais (…)».

A A. foi convidada a juntar petição inicial aperfeiçoada (da qual constassem factos demonstrativos do alegado sinistro, a ocorrência de danos e a data da sua verificação, bem como o nexo de causalidade) convite a que acedeu.

As RR. exerceram o contraditório.

Foi proferido despacho saneador. Neste, o Tribunal de 1ª instância absolveu da instância a R. Paula .......

, por esta ser parte ilegítima na acção, bem como absolveu da instância a R. «.......» por preterição do Tribunal Arbitral.

Apelou a A., concluindo nos seguintes termos a respectiva alegação de recurso: a)-Da sentença recorrida resulta demonstrado que, para o Tribunal a quo, a Autora, por força do instituto da sub-rogação, tem direito ao reembolso da indemnização que satisfez do responsável civil pelo acidente de viação, em virtude da ocorrência do acidente simultaneamente de viação e de trabalho.

b)-Entende o Tribunal a quo que “[a] Seguradora da entidade patronal que houver pago a indemnização de acidente de viação e, simultaneamente, de trabalho tem direito, por força da sub-rogação, ao reembolso da indemnização que satisfez do responsável civil pelo acidente de viação, nos termos do disposto no art. 17º, nº 1 e 4 da Lei nº 98/2009”, pois que, “[n]ão obstante o sinistrado não ter deixado sucessores, tal circunstância não impede de a A. ter direito a, por força da sub-rogação, ao reembolso da indemnização que satisfez do responsável civil pelo acidente de viação”.

c)-Todavia, e transcrevendo o alegado pela Recorrida, julgou o Tribunal a quo que, “[n]o âmbito da Convenção Regularizadora de Sinistros de que tanto a Ré como a A. são aderentes, a Comissão Permanente Técnica Auto e Acidentes com o objectivo de harmonizar procedimentos considera que as seguradoras de Acidentes de Trabalho não devem reclamar às seguradoras de Automóvel o reembolso dos montantes por elas pagos ao Fundo de Acidentes de Trabalho por força do disposto no artigo 63.º da referida Lei”, daí, concluindo, sem mais, que se trata “de uma entidade que consubstancia uma forma de arbitragem à qual as seguradoras aderem voluntariamente com vista a descongestionar os Tribunais e a obter decisões de uma forma mais célere e expedita, nomeadamente através de prazos mais curtos”, julgando, assim, procedente a excepção dilatória invocada.

d)-Não pode, num determinado momento, o Tribunal a quo admitir o direito da Recorrente, por força da sub-rogação, para, posteriormente, fundamentar a sua decisão na interpretação dada pela mencionada Comissão Permanente Técnica Auto e Acidentes ao disposto no art.º 63.º da Lei n.º 98/2009, no sentido em que as “… seguradoras de acidentes de trabalho não devem reclamar às seguradoras de Automóvel o aludido reembolso, por força do disposto no artigo 63.º da Lei n.º 98/2009.” e)-O que aliás resulta da jurisprudência mencionada pelo Tribunal a quo, nomeadamente, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.03.2010, onde se decidiu o seguinte: “[a] autora não pagou ao FAT por lhe querer fazer uma liberalidade. Pagou por tal lhe ser imposto por lei, em virtude de a sinistrada não ter deixado titulares com direito à pensão por morte. A circunstância da vítima ter deixado ou não sucessores com direito à pensão não pode influenciar o direito ao reembolso do que foi pago, em consequência da morte, por causa do acidente de trabalho. Como se decidiu no Acórdão do S.T.J. de 12-9-06 (disponível em www.dgsi.pt.): “I - Da conjugação do preceituado no nº1, do art. 18 do DL nº 522/95, de 31-12, com os nºs 1 e 4 do art. 31 e o art. 20, nº6 da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, resulta que se confere à seguradora do trabalho o direito de ser reembolsada do que legitimamente pagou por causa de acidente de trabalho. II – O reembolso é devido quer o pagamento tenha sido feito ao sinistrado, aos seus sucessores com direito a receber pensão por morte, quer se trate de pagamento ao Fundo de Garantia de Actualização de Pensões, efectuado por morte de lesado sem parentes ou afins com direito a tal pensão” (Cfr. AC STJ, processo n.º 270/04.6TBVNG.P1.S1 (Relator:Azevedo Ramos), disponível em www.dgsi.pt).

f)-Por outro lado, não pode o Tribunal a quo apresentar tal conclusão com base no art. 63.º da Lei n.º 98/2009, uma vez que, não resulta, do disposto do referido artigo, a conclusão vertida na douta sentença, designadamente, que as seguradoras de Acidentes de Trabalho não devem reclamar às seguradoras de Automóvel o reembolso de quantia por elas pagas ao Fundo de Acidentes de Trabalho.

g)-Não resulta, ainda, da mencionada norma legal que o direito de reembolso da Recorrente deve ser reclamado no Tribunal Arbitral.

h)-Da fundamentação apresentada pelo Tribunal a quo não resulta demonstrada a obrigatoriedade de deduzir a presente acção no Tribunal Arbitral.

i)-Os fundamentos invocados pelo referido Tribunal não conduzem à decisão expressa na sentença.

j)-Ao abrigo do disposto no art. 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, [é] nula a sentença quando “[o]s fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.

k)-De acordo com a jurisprudência dominante, a oposição ou contradição entre os fundamentos e a decisão ocorre quando a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente – Cfr., nesse sentido, acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.02.2005, processo n.º 04B4466...

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