Acórdão nº 2650/16.4T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelONDINA ALVES
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.–RELATÓRIO: ILÍDIO …., residente em ….., intentou, em 31.01.2016, acção declarativa de condenação com processo comum contra: 1º–Banco Espírito Santo, S.A., com sede na Rua Barata Salgueiro, 28, 6.º piso, em Lisboa, 2º–Novo Banco, S.A., com sede na Avenida da Liberdade, 195, em Lisboa, 3º–José …., Presidente do Conselho de Administração do Novo Banco, S.A., com domicílio profissional na Avenida da Liberdade, 195, em Lisboa, através da qual pede a condenação solidária dos réus a indemnizarem o autor: a)-dos danos patrimoniais a apurar em execução de sentença; b)-dos danos morais, que se computam simbolicamente em 5.000,00 €.

Fundamentou o autor, no essencial, esta sua pretensão na circunstância de, por influência do 1° Réu, através do gestor de conta, Hugo ….., ter aplicado € 189.000,00, em 18.900 acções preferenciais da sociedade Top Renda Investments Jersey Limited, com o ISIN: SCBES0AE0338, não tendo o autor recebido a ficha técnica ou qualquer outra informação escrita relativamente à aplicação feita, nem tão pouco lhe foi dada, verbalmente, qualquer informação técnica sobre a referida aplicação, pensando o autor ao aceitar a proposta que lhe foi feita pelo aludido gestor de conta que era um depósito a prazo, semelhante aos que já tinha efectuado anteriormente, nunca imaginando que o Top Renda 7 eram acções de uma sociedade veículo (SPV) com sede nas Ilhas Jersey.

Mais alegou que o autor que é um investidor não qualificado, não tem qualquer conhecimento em matéria de investimento, sendo avesso aos principais riscos, nomeadamente, capital, rendimento e liquidez. Tem perfil conservador, não fazendo aplicações de risco, procurando produtos com a garantia do capital investido e rendibilidades compatíveis com as taxas de juro de curto prazo. Trata-se de uma pessoa que tinha como projecto, um fim de vida “descansado”, entre a Suíça e Portugal, usufruindo das poupanças que tinha feito ao longo de uma vida de trabalho e sacrifícios na Suíça, necessitando de liquidez e sem qualquer apetência para o risco de perder o capital investido, e estas informações foram prestadas de forma clara, rigorosa e actual, ao seu gestor Hugo …..

Fundou, assim, a sua acção em responsabilidade do BES por violação dos seus deveres enquanto banqueiro e de intermediação financeira, tendo-se transferido esta responsabilidade para o Novo Banco, por força da medida de resolução aplicada ao BES e criação do banco de transição. Por outro lado, o 3º R. sabia e não podia ignorar que o BES tinha garantido ao autor, assim como aos demais adquirentes de acções preferenciais das SPV’s, o pagamento do capital investido e dos juros convencionados. O 3º R. sabia e não podia ignorar que se tratava de uma responsabilidade efectiva, que se transferia necessariamente para o Novo Banco, por força da operação de resolução.

Citados, os réus apresentaram contestação.

Os 2º e 3º réus, NOVO BANCO, S.A., e JOSÉ …., contestaram, em 23.03.2016, por excepção, invocando a respectiva ilegitimidade passiva, e por impugnação. Para além de terem suscitado o incidente de verificação do valor da causa. Alegaram, para tanto, e em síntese que: 1.–Por deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014, foi aplicada uma medida de resolução ao Banco Espírito Santo, S.A. (“BES”) 2.–A lei atribui ao Banco de Portugal uma competência discricionária para, no respeito dos pressupostos de aplicação de cada uma delas, bem como dos princípios gerais da adequação e da proporcionalidade (artigo 139.º/24 do RGICSF).

  1. –Através da deliberação de 3 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal determinou: O Ponto Um: constituir o NOVO BANCO, e aprovar os respectivos Estatutos (Anexo 1 da deliberação); O Ponto Dois: transferir para o NOVO BANCO, determinados activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A. (Anexos 2 e 2A da deliberação); O Ponto Três: designar uma entidade independente para avaliação dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão, transferidos para o NOVO BANCO; O Ponto Quatro: designar os membros dos órgãos sociais do Banco Espírito Santo, S.A.

  2. –Foi o que o Banco de Portugal fez no caso do BES: aplicou uma medida de resolução ao Banco Espírito Santo, S.A. : a transferência parcial da actividade e constituiu uma instituição de transição (NOVO BANCO, S.A.), 5.–No Anexo 2 à deliberação de 3 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal integrou na categoria de «Passivos Excluídos» responsabilidades do BES perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que se mantiveram na sua esfera jurídica, não tendo sido transferidos para o NOVO BANCO “quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais” (alínea b), subalínea (v)).

  3. –Na relação material controvertida, na forma como é apresentada, o Autor imputa ao BES, um conjunto de factos que, se provados, o que não se concede, mas se alvitra por mera hipótese o constituiriam, pelo menos, uma violação de disposições regulatórias que o A. imputa a título de dolo eventual ou negligência grosseira.

  4. –Estando tais situações claramente abrangidas nos “passivos excluídos” designadamente na referida alínea b), subalínea v) do Anexo 2 da deliberação do Banco de Portugal.

  5. –Por via, e de acordo com a nova redacção da subalínea (vii), se conclui que não houve transferência para o NOVO BANCO das eventuais responsabilidades do BES assumidas na comercialização, intermediação financeira de acções preferenciais.

  6. –Face à deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 e considerando as respectivas aclarações e a expressa inclusão do presente processo na deliberação do Banco de Portugal, é indiscutível que o Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, e no uso das suas competências legais, não transferiu para o NOVO BANCO a responsabilidade ou as contingências decorrentes dos créditos relativos a acções preferenciais vendidas pelo BES.

  7. –Tal significa que, em termos processuais, a legitimidade passiva nos presentes autos pertence exclusivamente ao BES.

  8. –A resolução bancária tem cobertura constitucional, porquanto, através, designadamente, da constituição de uma instituição de transição, permite, em especial, preservar a estabilidade do sistema financeiro no seu todo, salvaguardar as funções bancárias desempenhadas pela instituição de crédito em crise e proteger os depositantes, como, outrossim, com a resolução da instituição de crédito, tutela os contribuintes e ressalva o erário público.

  9. –A verdade é que a resolução não agravou a posição jurídica que o Autor teria se o BES tivesse entrado em liquidação.

  10. –Face ao exposto, impõe-se, concluir que o NOVO BANCO é parte ilegítima nos presentes autos, na medida em que a responsabilidade perante o Autor, a existir, não foi transferida para o NOVO BANCO, enquanto instituição de transição, tendo permanecido na esfera jurídica do BES.

    Sustentam, todavia, os réus, “Ad cautelam” a suspensão da instância, invocando, para tanto, que: – a medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal reveste a natureza de acto administrativo, beneficiando da presunção de legalidade do exercício do poder de autoridade nos actos administrativos praticados pelo Banco de Portugal no uso das suas competências legais – a lei imputa expressamente aos tribunais administrativos a competência para conhecer dos litígios emergentes das decisões do Banco de Portugal que apliquem medidas de resolução (artigo 145.º-AR/134 do RGICSF), estabelecendo regras especiais para o processo (artigo 145.º-AR/2/435 do RGICSF) e atribui ao Banco de Portugal inclusive a prerrogativa de invocar causa legítima de inexecução no caso de sentenças anulatórias (artigo 145.º-AR/336 do RGICSF).

    – cabe, assim, ao autor, querendo, impugnar nos tribunais administrativos a medida de resolução, estando-lhe vedado recorrer aos tribunais cíveis para discutir contenciosamente, ainda que prejudicialmente, aquele acto administrativo.

    – Pelo que não deverá o Tribunal julgar improcedente a excepção de ilegitimidade arguida, com base na invalidade da medida de resolução, sem primeiro suspender a instância, remetendo essa competência anulatória para os tribunais administrativos (artigo 92.º/1 do CPC).

    Terminam os réus pedindo que o seja determinado o valor da causa em 194.000 Euros, julgada procedente a excepção de ilegitimidade passiva dos 2º e 3º réus, absolvendo-se os mesmos do pedido ou, pelo menos, da instância. Em qualquer caso, ser a acção julgada improcedente, por não provada, absolvendo-se, em consequência os réus dos pedidos.

    A 1ª ré, BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A. (“BES”), contestou, em 01.04.2016, por excepção, invocando a inexigibilidade do cumprimento das obrigações que não tenham sido transferidas em resultado da medida de resolução aplicada ao BES, por Deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal, visto que apesar do BdP ter determinado a transferência parcial da sua atividade para o Réu Novo Banco, não foi determinada a revogação da autorização do Réu BES “simultaneamente ou em momento imediatamente posterior à aplicação” da medida de resolução.

    Mais invocou que mesmo que se entenda - o que não se admite - que o Réu BES teria uma eventual obrigação de restituição e de indemnização com base nos factos alegados pelo Autor, o cumprimento destas obrigações não é legalmente exigível ao BES, razão pela qual, deverá o Réu BES ser absolvido dos pedidos.

    Contestou a 1ª ré, também por impugnação, alegando que o Autor conhecia o produto que subscreveu e optou por adquiri-lo, sabendo os riscos associados, tendo solicitado desde a data de subscrição da aplicação TOP RENDA 7, as sucessivas renovações, que eram realizadas de acordo com os procedimentos em vigor. O Autor conhecia o tipo e as características das aplicações financeiras que subscreveu...

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