Acórdão nº 1757-16.2YRLSB-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS MARINHO
Data da Resolução27 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.–RELATÓRIO: 1.–M... CORP, com os sinais identificativos constantes dos autos, instaurou acção «arbitral necessária» contra M... SAS, X... APS e S... LIMITED, neles também melhor identificadas.

Formulou, em tal âmbito, o seguinte pedido: Deverão as Demandadas ser condenadas a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos genéricos que contenham como princípio ativo a Caspofungina. incluindo os que se encontram melhor identificados no artigo 71.° da presente petição, enquanto o CCP 115 se encontrar em vigor.

Mais devem as Demandadas ser condenadas, com vista a garantir o exercício dos direitos das Demandantes, a não transmitir a terceiros as AIMs identificadas no artigo 71.° desta petição, até à referida data de caducidade dos direitos ora exercidos.

Requer-se, ainda, que, nos termos do artigo 829.°-A do Código Civil, sejam as Demandadas condenadas a pagar uma sanção pecuniária compulsória de valor não inferior a 5.000,00 (cinco mil euros) por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que vier a ser proferida nos termos do acima requerido.

  1. –Alegou, para o efeito, que: é titular da patente europeia com o n.º EP 0620 232, válida em Portugal, relativa a Caspofungina; a Caspofungina é normalmente utilizada sob a forma de Acetato, como substância ativa em medicamentos; o Acetato de Caspofungina é indicado no tratamento da candidíase invasiva em doentes adultos ou pediátricos, no tratamento da aspergilose invasiva em doentes adultos ou pediátricos refratários ou intolerantes à anfotericina B, formulações lipídicas de anfotericina B e/ou itraconazol e na terapêutica empírica de presumíveis infeções fúngicas (tais como Candida ou Aspergillus) em doentes adultos ou pediátricos neutropénicos e febris; a Caspofungina é uma invenção do corpo de investigação da M..., que a investigou e desenvolveu, não apenas como composto, mas também como composição farmacêutica, composto para utilização em terapêutica e composto utilizado na preparação de um medicamento; no mercado português os medicamentos que contêm Caspofungina estão disponíveis na forma farmacêutica de pó para concentrado para solução para perfusão, em frasco para injetáveis (vidro), nas dosagens de 50 mg e de 70 mg, e são comercializados com a marca comercial Cancidas®; a sociedade M... Ltd., do Grupo M..., é a titular das autorizações de introdução no mercado dos medicamentos comercializados em Portugal com o nome comercial Cancidas®; a Demandante é a titular da EP 620 232 com a epígrafe «COMPOSTOS AZA CICLOHEXAPEPTÍDEOS»; a EP 620 232 foi pedida ao Instituto Europeu de Patentes em 9 de Março de 1994 e foi concedida em 17 de Novembro de 1999, tendo sido publicada a menção dessa concessão no Boletim da Patente Europeia n.° 1999/46; a EP 620 232 reivindica a prioridade da patente US 328467 de 16 de março de 1993; em Portugal, foi apresentada no INPI a tradução em português do fascículo da Patente, em 3 de janeiro de 2000, conforme publicação no Boletim da Propriedade Industrial n.º 12/1999, 31 de março de 2000, assegurando-se assim a produção de efeitos da mesma em Portugal; a EP 620 232 vigorou até 9 de março de 2014, nos termos do disposto no artigo 63.°, n.° 1 da Convenção da Patente Europeia; as reivindicações da EP 620 232 são as que constam de documento junto; a EP 620 232 apresenta 10 (dez) revindicações, referentes a composto (1 a 6), composição farmacêutica (7 e 8), e utilização de composto para a preparação de um medicamento (9 e 10); é manifesta a proteção da Caspofungina na EP 620 232; a Demandante é ainda titular do Certificado Complementar de Proteção n.º 115; tal certificado indica a Patente EP 620 232 como a «patente base»; foi concedida à Demandante uma extensão pediátrica; o Certificado Complementar de Proteção indicado, que prolonga o período de vigência da EP 620 232 relativamente a qualquer medicamento contendo Caspofungina, vigorará até 24 de Abril de 2017; os medicamentos genéricos cujas AIMs as Demandadas requereram e, em consequência, pretendem lançar no mercado, contêm Caspofungina como substância ativa, tendo as referidas AIMs sido pedidas com a indicação do medicamento Cancidas® como medicamento de referência; na medida em que os referidos medicamentos genéricos de Caspofungina compreendem também composições farmacêuticas, utilizando a Caspofungina para o tratamento das mesmas patologias do medicamento de referência Cancidas®, tais medicamentos invadirão igualmente o escopo de proteção das reivindicações 7 e 8 e 9 e 10; nenhuma das Demandadas solicitou ou obteve autorização da M... para, por qualquer forma, explorar a invenção constante da Patente; quer os pedidos de AIM formulados pelas Demandadas, quer as respetivas AIMs, após concessão, poderão ser transferidas pelas mesmas para terceiros.

  2. –X... APS, na sua contestação, impugnou factos e alinhou os seguintes argumentos: existe falta de interesse em agir por se estar perante pedido de condenação in futurum e os efeitos de uma eventual sentença se limitarem à simples apreciação e reconhecimento dos direitos de propriedade industrial da Demandante, emergentes da patente invocada nos autos; não existindo qualquer violação ou ameaça de violação de direitos, não existia a obrigação de intentar acção arbitral, podendo sempre a Demandante recorrer aos Tribunais estaduais caso ocorra um qualquer litígio; as autorizações legislativas destinadas aos medicamentos genéricos não constituem violação de direitos de propriedade industrial; é de natureza não condicionada a possibilidade de transmissão das autorizações de introdução no mercado; o que está em causa, para o efeito de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória é o incumprimento, já manifestado, de uma obrigação. Terminou pedindo que fosse declarada a falta de interesse em agir da Demandante e, consequentemente, fosse a Demandada absolvida da instância e que a ação arbitral fosse julgada improcedente, por não provada, absolvendo-se a ora Demandada de todos os pedidos nela formulados pela Demandante.

  3. –As Demandadas, M... SAS e S... LIMITED não contestaram.

  4. –A Autora apresentou articulado em cujo introito anunciou a vontade de responder às excepções deduzidas. Nessa sede, considerando que a falta de interesse processual da Demandante configurava um excepção dilatória de ilegitimidade activa, pronunciou-se sobe a mesma apontando a instauração da acção como tendo ocorrido com respeito pelo Direito constituído e referindo a existência de interesse processual, a irrelevância da ausência de actos de infracção e a existência de litígio a dirimir. Concluiu pela improcedência da matéria de excepção.

  5. –A Demandante e a aludida Demandada apresentaram alegações de facto e de Direito.

  6. –O Tribunal arbitral proferiu acórdão final que patenteou, na sua parte decisória, o que se transcreve: a)-Considerar improcedente a arguição da DEMANDADA X... APS de falta do pressuposto processual de interesse em agir por parte da DEMANDANTE; b)-Condenar a DEMANDADA, X... APS, a abster-se de, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer quaisquer medicamentos genéricos que contenham como princípio ativo a Caspofungina, incluindo os que constam dos publicitados pedidos de AI Ms, de 22 de janeiro e 12 de fevereiro, de 2015, pelo INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos da Saúde I.P., enquanto o GCP 115, emitido na sequência da vigência da Patente Europeia n.° 620232, da DEMANDANTE, se encontrar em vigor; c)-Condenar as DEMANDADAS M... SAS e S... LIMITED, a não iniciarem a exploração industrial ou comercial dos medicamentos genéricos a que se referem as AIMS solicitadas na vigência dos direitos de propriedade industrial nvocados pela DEMANDANTE - n.9s 1 e 2 do artigo 3o da Lei n.°62/2011, de 12 de Dezembro; d)-Absolver as DEMANDADAS dos pedidos relativos à proibição de transmissão de AIMs; e)-Absolver as DEMANDADAS quanto ao pedido de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória; f)-Ordenar que se efetuem as comunicações a que se referem os nºs 2 e 6 do artigo 3º da Lei n.º 62/2011, de 12 de Dezembro.

  7. –É desta decisão que vem o presente recurso interposto por M... CORP. que alegou e apresentou as seguintes conclusões: 1.ª-Não pode a Recorrente concordar, na íntegra, com a decisão final proferida pelo Tribunal Arbitral, por entender que, em alguns dos seus pontos, violou as normas jurídicas ao caso aplicáveis, tendo interpretado e aplicado incorretamente as mesmas, padecendo nesses pontos de graves incoerências e vícios que a tornam inválida e que reclamam a sua revogação.

    1. -Em primeiro lugar, não pode a Recorrente conformar-se a decisão do Tribunal a quo de apenas condenar as Recorridas M... e S... a não iniciarem a exploração industrial e comercial dos medicamentos genéricos de Caspofungina para os quais requereram as AIMs dos autos, mas não relativamente a quaisquer outros medicamentos genéricos que contenham como princípio ativo a Caspofungina, ao contrário do que fez em relação à Recorrida X....

    2. -Tal decisão é nula por falta de fundamentação, sendo que as escassas considerações do Tribunal Arbitral a este propósito conduziriam a uma decisão diversa que abrangesse na condenação das Recorridas M... e S... todos os medicamentos que contenham Caspofungina como substância ativa.

    3. -Não há qualquer razão de facto ou de direito que o justifique que as Recorridas M... e S... obtenham uma condenação menos abrangente do que a Recorrida X..., sendo que a única diferença entre elas é o mero facto de as primeiras terem decidido não apresentar contestação neste processo arbitral.

    4. -Resultou amplamente provado nos presentes autos que a EP 620 232 protege o composto Caspofungina e que os medicamentos...

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