Acórdão nº 6295-16.0T8LSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 02 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelIL
Data da Resolução02 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

I - RELATÓRIO: M... e mulher, I..., intentaram acção com processo comum, contra, Banco ..., pedindo a condenação do réu a pagar aos autores a quantia de € 313.646,09, acrescida de juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento.

Alegaram, em síntese, que o B..., à data dos factos, era detido totalmente pela S..., SA e tinham ambos o mesmo presidente de conselho de administração. Os autores são clientes do banco há mais de 12 anos. Desde pelo menos 1993 que o B... estava registado como intermediário financeiro. Tinha o dever de categorizar os autores como investidores não qualificados. O B..., em 2004 engendrou um plano de empossamento das quantias depositadas pelos seus clientes e lançou uma operação de emissão de obrigações subordinadas S... Rendimento Mais 2004, a 10 anos, cujos valores captados serviram para reforçar os rácios de capital do B.... Foram dadas instruções aos funcionários para não ser entregue aos clientes a nota informativa do produto e para ser vendido como um sucedâneo de um depósito a prazo. Em Outubro de 2004 um funcionário do réu telefonou ao autor marido dizendo que tinha subscrito por ele três obrigações S... Rendimento Mais 2004, tendo o réu procedido para o efeito ao resgate de 150 000€ que o autor tinha depositado a prazo. Não foi dado qualquer documento a assinar ao autor marido. Não foi dada aos autores nota informativa da operação, mas os funcionários do banco informaram que se tratava de produto sem qualquer risco, que o banco garantia o retorno dos valores em causa e que os podiam resgatar em qualquer altura, o que convenceu os autores. Repetindo a operação, em 2006 o B... voltou a lançar Obrigações S... 2006, igualmente a 10 anos, no valor de 50 000€ cada, igualmente vendidas como sucedâneo de depósito a prazo; mais uma vez foram dadas instruções aos funcionários do réu para não facultarem a nota informativa do produto. Os valores captados serviram para reforçar os capitais do banco. Igualmente, o autor marido recebeu um telefonema de um funcionário do réu, em 08/05/2006, a dizer-lhe que tinha subscrito por ele uma Obrigação S... 2006 no valor de 50 000€. Tudo se passou à revelia dos autores que nada assinaram. Do mesmo modo, em 05/12/2008, o empregado do réu telefonou ao autor marido a dizer-lhe que tinha adquirido por ele duas obrigações S... Rendimento Mais 2006. Mais uma vez, tudo se passou à revelia dos autores que nada assinaram. Aos autores não foi dito nem sabiam que o empréstimo só poderia ser reembolsado a partir de Outubro de 2014 e de Abril de 2016; se o soubessem, não teriam aceitado subscrever o produto, o que era do conhecimento dos funcionários do banco. Os valores mobiliários em causa não estavam à data depositados em qualquer conta de valores mobiliários escriturais do B... ou da S.... O B... não forneceu informação sobre a relação que tinha com a S.... O B... violou os deveres de protecção e de informação, induzindo os autores a contratar em erro nos termos em que o fizeram.

Contestou o réu, alegando, em síntese, que ocorre a excepção de prescrição do direito dos autores, ao abrigo do artº 324º do CVM, dizendo que eles tiveram conhecimento da alegada subscrição abusiva desde início de 2009. Impugna no essencial a factualidade invocada pelos autores. Confirma que o autor marido subscreveu uma Obrigação Rendimento Mais 2006, tendo perfeito conhecimento do produto em causa, tendo-lhe sido explicada a sua natureza, condições de remuneração, reembolso e liquidez; sabia que não estava a contratar um depósito a prazo ou sequer um produto equivalente. Foi informado ao autor que a única forma de obter liquidez antes do prazo de 10 anos seria através de cedência das obrigações a um terceiro. O autor recebeu sempre o extracto mensal no qual figuram as obrigações na sua carteira de títulos e recebeu os cupões de juros e nunca efectuou qualquer reclamação.

Nega que o banco réu tenha garantido o pagamento da emissão das obrigações.

Os autores responderam às excepções.

Foi proferida SENTENÇA que julgou improcedente a acção e absolveu o réu do pedido.

Não se conformando com tal decisão, dela recorreram os autores, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: A.

– Não é aceitável e nem sequer é defensável que se considere que um banco presta informação verdadeira, actual, clara e objectiva quando vende a investidores não qualificados uma obrigação subordinada dizendo aos clientes que se trata de um produto semelhante a um depósito a prazo.

B.

– Reputa-se, quase como um facto público e notório, o modus operandi do Banco réu nas relações que mantinha com os seus clientes.

C.

– Tal modus operandi, em ordem ao seu financiamento consistiu, como é do conhecimento comum, em seduzir meros aforradores com produtos financeiros com remuneração superior à comummente praticada por outros operadores financeiros.

D.

– E, em ordem a esse desiderato, convencerem tais aforradores que os produtos vendidos eram meros sucedâneos de depósito a prazo, mobilizáveis a qualquer tempo, com eventual perda de juros, o que na realidade não era verdade.

E.

– Sendo certo que a douta sentença assim também o considerou.

F.

– Foram carreadas para os autos provas inequívocas e irrefutáveis que impunham resposta diversa (a de “provados”) aos factos vertidos nas alíneas c); d) i,) l) a o), q) e r) dos factos não provados.

G.

– Quanto à matéria da al. c) dos factos não provados, o plano de empossamento das quantias depositadas pelos clientes do Banco em depósitos a prazo ficou bem demonstrado no depoimento da testemunha T..., cotejado com o teor das notas internas dos produtos S... 2004 e S... 2006, com o mail do Dr. J... e com o facto de os produtos financeiros em causa serem vendidos como sendo semelhantes a um deposito a prazo e com o capital garantido pelo banco réu, pelo que, deveria ter merecido a mesma ter merecido a resposta de “provado”.

H.

– Também a matéria de facto referida na al. d) dos factos não provados deveria ter recebido a resposta de “provado”, por via dos depoimentos das testemunhas H... e T..., cotejados com o teor da nota interna do produto S... 2004.

I.

– A redacção “a todos os clientes que o solicitem”, por si só, inculca desde logo a ideia de que a ficha técnica só deveria ser mostrada em casos extremos, uma vez que o cliente comum, confiante, inexperiente e incauto, nunca a solicitaria J.

– Também a matéria de facto vertida nas alíneas i) e l) dos factos não provados deveria ter merecido a resposta de “provado” e “provado, quanto á subscrição de 2006”, respectivamente, uma vez que, a terem sido assinados pelos autores quaisquer documentos ou boletins de subscrição, no que toca ás subscrições efectuadas em 2004 e 2006, caberia ao banco réu provar que, pelo contrário, tais documentos existiam e que foram assinados pelos autores.

K.

– Se é certo que o banco réu juntou, uma “comunicação de cliente” relativa á subscrição de 2008, assinada pelo autor marido, não juntou qualquer documento relativo á subscrição de 2004 e, quanto á subscrição de 2006, juntou um boletim de subscrição, assinado pelos funcionários do banco, mas sem qualquer assinatura dos autores.

L.

– Também a matéria de facto vertida na alínea m) dos factos não provados deveria ter merecido a resposta de “provado”, com base nos depoimentos das testemunhas H... e T..., cotejados com aqueloutros das testemunhas A..., e J....

M.

– Os depoimentos das testemunhas supra descritos não deixam dúvidas: o cliente visado era aquele cliente tradicional, de depósito a prazo, que queria produtos sem risco de capital, como os autores e que nunca compraria as obrigações dos autos, devidamente informado. Ficou demonstrado que o autor marido disse ao funcionário do banco que queria produtos sem risco.

N.

– Também a resposta dada à al. n) dos factos não provados, deveria ter tido a resposta de “provada”. Assim o impunham os depoimentos de T..., H..., A... e J...

O.

– A testemunha T..., quando refere que: “nunca venderia o produto dolosamente, e alem disso eu estava de boa-fé na altura (…) foi com base nessa mensagem de boa-fé que o presidente me transmitiu que eu transmiti á rede comercial” deixa transparecer muito claramente que tinha sido enganada pelas chefias.

P.

– Também no que toca aos factos vertidos na al. o) dos factos não provados, se impunha que o tribunal tivesse dado os mesmos por provados, uma vez que a prova de que tais factos ocorreram competia ao Banco réu. Competia ao réu Banco demonstrar que os autores haviam anteriormente comprado ou vendido obrigações.

Q.

– Não tendo o Banco réu carreado para os autos qualquer prova de que os autores haviam comprado ou vendido obrigações, no B... ou em outros bancos, não poderia a matéria de facto vertida na al. o) dos factos não provados ter deixado de merecer a resposta de “provado”.

R.

– Perpassa por toda a sentença uma sensação de aplicação de dois pesos e duas medidas na valoração da prova. De cada vez que um facto desfavorável ao banco réu é abordado, o mesmo é ignorado ou desvalorizado; pelo contrário, tratando-se de um facto desfavorável aos autores, o mesmo é sempre levado em alta conta, mesmo que tenha sido apreciado fora do contexto.

S.

– Também a matéria de facto vertida nas alíneas q) e r) dos factos não provados deveriam ter merecido a resposta de “provado”.

T.

– Novamente vislumbramos dois pesos e duas medidas: a característica da subordinação não foi referida pelo funcionário que vendeu as obrigações, mas o tribunal a quo não leva isso em conta. Já o facto de os funcionários acreditarem (porque o banco os tinha enganado, como já vimos) que o produto era seguro e que não se colocavam riscos de investimento era levado em muita conta.

U.

– A este respeito, é demolidor o depoimento de T..., quando refere “Chegava o cliente e dizia “olhe, aqui está o produto que é da dona do banco, mas o banco não tem nada a haver com isto!” Você acha que alguém comprava o produto? (…) nós confiávamos num projecto...

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