Acórdão nº 19657/13.6YYLSB-A.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelHIGINA CASTELO
Data da Resolução14 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

–Relatório: ...–SOCIEDADE DE CONSULTADORIA EM GESTÃO E ..., LDA.

, embargante nos autos de embargos de executado indicados à margem, em que é exequente e embargado o CONDOMÍNIO DO PRÉDIO SITO NA RUA LADISLAU ..., LOTE 2, EM ...

, notificada do saneador-sentença de 27 de fevereiro de 2017 e com ele não se conformando, interpôs o presente recurso.

A embargante é condómina do embargado, que lhe tinha interposto execução para pagamento de prestações devidas ao condomínio. A embargante deduziu embargos alegando, em síntese, que não esteve presente nas assembleias de condóminos a que respeitam as atas dadas à execução, desconhecendo se as mesmas foram regularmente convocadas, e que a de 29.02.2012 foi realizada sem quórum; admitiu que não paga as quotas relativas à fração de que é locatária financeira desde 2009, mas alegou que deixou de pagar por o apuramento do valor das quotas ter ficado condicionado ao esclarecimento jurídico do que efetivamente é devido pela sua fração, uma vez que não tem acesso à parte habitacional do prédio, não tendo por isso obrigação de comparticipar nas despesas relativas aos lanços de escadas, aos ascensores, à limpeza das escadas, à eletricidade da parte habitacional, aos telefones ou à recolha do lixo, não sendo também devidos juros.

Recebida a oposição, contestou o exequente pugnando pela respetiva improcedência.

A recorrente conclui as suas alegações de recurso do seguinte modo: «A)– A norma especial - v. g. o artigo 1433.º do Código Civil - consagra um regime que, não se encontrando em oposição ao regime geral da nulidade e da anulabilidade (artigos 286.º e 287.º do Código Civil), tem, em relação a este, certas particularidades, no caso vertente adequado ao regime jurídico da propriedade horizontal.

B)– No âmbito deste artigo 1433.º do Código Civil, não estão compreendidas, nem as deliberações que violam preceitos de natureza imperativa, nem as que tenham por objecto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia de condóminos.

C)– A regra do número 1. Artigo 1424º Encargos de conservação e fruição contém a expressão “salvo disposição em contrário” e desde logo especifica regras que têm de ser observadas em que o princípio de pagamento na proporção do valor da sua quota não é observado; D)– O disposto nos n.ºs 3 e 4 do Art.º 1424.º dispõem de normas sobre encargos e fruição, que devem ser consideradas com carácter imperativo: 3.- As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que dela se servem.

  1. - Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas frações por eles possam ser servidas.

    E)– Existem condicionantes específicos da deliberação da Assembleia do Condomínio, quando delibera nos termos do art.º 6.º n.º 1 Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10, designadamente, “Para constituir título executivo, a ata da assembleia de condóminos tem de permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação do valor exato da dívida de cada condómino… Cfr acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.10.2014 (cfrhttp://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/6ec9d73621e54a7).

    F)– Portanto, impõe-se à ata permitir de forma clara e por simples aritmética a determinação do valor exato da dívida, não basta dizer-se o valor da dívida, tem de ficar explícita a forma de apuramento.

    G)– Donde, não pode um erro no apuramento da dívida ficar validado por a deliberação da Assembleia não ter sido impugnada nos termos do art.º 1433 do Código Civil.

    H)– Decorre do Acórdão da Relação de ... nº 54/09.4TJSB.L1-6, de 06.12.2012: “Estando em causa partes comuns do edifício de que só alguns condóminos possam usufruir, a regra geral da comparticipação nas despesas necessárias á conservação e fruição das partes comuns de acordo com o valor de cada uma das frações, é alterada através da consagração legal de isenção de participação nesses encargos ou despesas daqueles condóminos que não as possam utilizar no âmbito da normal utilização da sua fração”.

    I)– Na Ata da Assembleia de Condomínio que é apresentada como Título Executivo, atenta a forma global como são apresentadas as despesas, necessariamente foi violado o critério que as despesas com partes comuns do edifício de que só alguns condóminos possam usufruir, são pagas exclusivamente por esses condóminos.

    J)– A Ata da Assembleia de Condomínio ao não permitir descriminar as despesas com partes comuns do edifício que só alguns dos condóminos possam usufruir das demais que são responsabilidade de todos os condóminos, deixa de servir de título executivo, pois viola um critério imposto pela lei: aquele que isenta da participação nesses encargos ou despesas os condóminos que não os possam utilizar no âmbito da normal utilização da sua fração.

    K)– As despesas com elevadores estão excluídas para os condóminos que não são servidos pelos elevadores.

    L)– Deste modo, tem de decidir-se pela inexequibilidade das atas apresentadas como título executivo atendendo a que não cumprem os requisitos previstos, no art.º 6º do DL 268/94, de 25 de Outubro.

    M)– A decisão recorrida viola o disposto nos art.º 1424.º, 1433.º e no art.º 6º do DL 268/94, de 25 de Outubro; N)– Deste modo, devem os embargos ser julgados inteiramente procedentes e provados e as atas do condomínio apresentadas não serem consideradas como título executivo».

    Não houve contra-alegações.

    Foram colhidos os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito.

    Objeto do recurso Sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as conclusões das alegações de recurso que delimitam o âmbito da apelação (arts. 635, 637, n.º 2, e 639, n.ºs 1 e 2, do CPC).

    Tendo em conta o teor daquelas, coloca-se a questão de saber se as deliberações constantes das atas das assembleias de condóminos dadas como títulos executivos são suscetíveis de (validamente) afastar o regime das normas contidas nos n.ºs 3 e 4 do art. 1424 do Código Civil; e, na negativa, qual o regime da invalidade.

    II.

    –Fundamentação de facto A 1.ª instância considerou na sua decisão os factos 1 a 9, que a recorrente não discute. Sobre os factos 10 a 12 há consenso entre as partes, constando o primeiro das atas juntas pela exequente como títulos executivos, pelo que se consignam ao abrigo do disposto no art. 662, n.º 1, do CPC.

    Estão assim provados os seguintes factos: 1- A fração autónoma designada pela letra “C”, correspondente à loja ou armazém loja 5, para comércio, do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua Ladislau ..., Lote 2, em ..., mostra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 2394/20041222-C, da freguesia do Lumiar; 2- O direito de propriedade sobre a referida fração foi inscrito a favor do Banco Comercial Português, S.A. em 24.03.2006, por compra; 3- O Banco Comercial Português, S.A. deu a referida fração em locação financeira à executada ... – Sociedade Consultoria em Gestão e ..., Lda., pelo prazo de 15 anos, com início em 10.02.2006, tendo este encargo sido inscrito no registo em 24.03.2006; 4- Na assembleia geral extraordinária de condóminos do prédio, realizada em 26.02.2008 (ata n.º 4), foi deliberado, por maioria, com a abstenção da Loja 5, o orçamento para 2008, ficando a constar dessa ata a seguinte declaração de voto: “é entendimento do proprietário da Loja 5 que não deve comparticipar em todas as despesas correntes do condomínio por não ter acesso à zona habitacional do edifício”, mais ficando ainda a constar da mesma ata que “a distribuição do orçamento aprovado pelas frações ficou condicionada ao esclarecimento jurídico deste ponto”; 5- Na assembleia geral de condóminos, reunida em 12.03.2009 (ata n.º 5), foi deliberado, por unanimidade dos presentes, aprovar o valor do orçamento anual para o ano de 2009, sendo o valor a pagar pela Loja 5, de acordo com a sua permilagem, de € 112,28 mensais; 6- Na assembleia geral de condóminos, realizada em 14.04.2010 (ata n.º 6), foi deliberado, por unanimidade dos presentes, aprovar o valor do orçamento anual para o ano de 2010, sendo o valor a pagar pela Loja 5, de acordo com a sua permilagem, de € 118,47 mensais; 7- Na assembleia geral de condóminos, reunida em 23.02.2011 (ata n.º 7), foi deliberado, por unanimidade dos presentes, aprovar o valor do orçamento anual para o ano de 2011, sendo o valor a pagar pela Loja 5, de acordo com a sua permilagem, de € 116,53 mensais; 8- Na assembleia geral de condóminos, realizada em 29.02.2012 (ata n.º 8), foi deliberado, por unanimidade dos presentes, aprovar o valor do orçamento anual para o ano de 2012, sendo o valor a pagar pela Loja 5, de acordo com a sua permilagem, de € 121,85 mensais; 9- Na assembleia geral de condóminos, reunida em 27.02.2013 (ata n.º 10), foi deliberado, por unanimidade dos presentes, aprovar o valor do orçamento anual para o ano de 2013, sendo o valor a pagar pela Loja 5, de acordo com a sua permilagem, de € 119,87 mensais.

    10- Foram juntas aos autos como títulos executivos as atas n.ºs 5 a 8 e 10, nas quais foram aprovados os orçamentos para os anos 2009 a 2013, por unanimidade dos presentes nas assembleias respetivas, com quóruns de 36,1% (ata 5), 50,7% (ata 6), 28,1% (ata 7), 22,8% (ata 8) e 35,7% (ata 10) do capital investido no prédio.

    11- A recorrente é locatária financeira de uma loja com entrada independente, não usando escadas e elevadores da parte habitacional do prédio.

    12- Os valores encontrados nas atas acima mencionadas como sendo devidos pela Loja 5 tiveram em consideração apenas a permilagem da loja, mas não o facto 11.

    III.

    – Apreciação do mérito do recurso A.

    – Enquadramento jurídico do litígio e do recurso - generalidades A ora recorrente é executada enquanto devedora das prestações de condomínio que, na qualidade de locatária financeira de dada fração autónoma, lhe cabem (cfr. art. 10.º, n.º 1, al. b), do...

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