Acórdão nº 97/12.TBVPV.L2-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução06 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 17.02.2012 Sociedade de Construções, Lda, intentou no Tribunal Judicial de Praia da Vitória ação declarativa de condenação, com processo ordinário, contra S e J.

A A. alegou, em síntese, que no âmbito de um contrato de empreitada que celebrara com a R. S, a A. emitiu faturas, no total de € 135 000,00, simulando ter recebido da 1.ª R. pagamentos por conta dessa empreitada, com o intuito de que a R. obtivesse fundos comunitários, sem que a A. efetivamente tivesse ficado com o dinheiro alegadamente pago pela R., uma vez que a A., após ter levantado os cheques emitidos a seu favor pela R., transferira as quantias recebidas para uma conta bancária do 2.º R., que para esse efeito fora indicada pela 1.ª R.. Ora, a R. desistiu da empreitada, não tendo pago à A. o valor dos trabalhos que esta executou, no valor de € 112 283,36, sendo certo que a A. auferiria, se a empreitada fosse totalmente executada, um proveito de € 45 896,00.

A A. terminou formulando o seguinte petitório: “-Ser reconhecido que, o acordo celebrado entre a A. e a R. S, pelo qual foram emitidas 8 facturas pela A. e entregues à R., no valor de €:135.000,00 e em que a R. emitiu cheques de igual valor a favor da A., mas do qual, através do R. José, lhe foi integralmente devolvido, sem que a A. tenha beneficiado de qualquer pagamento efectivo do preço de parte da empreitada, constituiu um negócio simulado entre as partes, com o intuito da R. S poder pedir o pagamento antecipado de fundos comunitários à Grater-Associação de Desenvolvimento Regional dos Açores. Reconhecida a simulação deverá o negócio simulado ser declarado nulo e de nenhum efeito, quanto à emissão das facturas e pagamento do seu valor.

- Ser a R. S condenada a pagar à A. o montante de €:112.283,36 pelos trabalhos efectuados no âmbito da execução do contrato de empreitada celebrado entre as partes e os trabalhos a mais solicitados pela R. S.

- Ser reconhecido que a R. S desistiu da empreitada - Em consequência dessa desistência deverá a R. S ser condenada a pagar à A. o montante de €: 45.896,00 a titulo de indemnização a titulo de proveito que a A. deixou de ter pelo facto da R. ter desistido de concluir a obra.

Mais deverá a A. ser condenada no pagamento de juros legais sobre os montantes reclamados calculados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Deverão os R.R.s. ser condenados no pagamento das custas e demais encargos, nomeadamente custas de parte.” Citados ambos os RR., apenas a R. contestou, impugnando a quase totalidade dos factos alegados pela A. e imputando defeitos aos trabalhos realizados por esta, concluindo pela improcedência da ação e sua consequente absolvição do pedido.

Realizou-se audiência prévia, em que foi proferido saneador tabelar, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

Realizou-se audiência final e em 19.10.2016 foi proferida sentença em que se julgou a ação totalmente procedente e em consequência se condenou a 1.ª R. como peticionado e, ambos os RR., nas custas da ação.

A 1.ª R.

apelou da sentença, tendo apresentado alegações em que formulou as seguintes conclusões: 1.ª Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário, que correu seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Açores - Angra do Heroísmo - Inst. Central - 2ª Secção Cível e Criminal - J3, sob o n.º 97/12.0TBVPV e que consequentemente: a) declarou nulos, por simulação acordada entre a Autora e os Réus S e J, os pagamentos das 8 facturas emitidas pela Autora e entregues à Ré S, no valor de 135.000,00 €, mediante a emissão de cheques de igual valor pela Ré a favor da Autora.

  1. condenou a Ré S a pagar à Autora a quantia de 112.283,36 € (cento e doze mil, duzentos e oitenta e três euros e trinta e seis cêntimos); c) condenou a Ré S a pagar à Autora a indemnização no valor de 45.896,00 € (quarenta e cinco mil, oitocentos e noventa e seis euros); d) condenou a Ré S a pagar à Autora os juros de mora, à taxa supletiva legal, em cada momento em vigor, vencidos sobre os montantes reclamados e calculados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

2.ª Salvo o devido respeito, a recorrente não se pôde conformar com a douta decisão recorrida, porquanto o Tribunal a quo procedeu a uma inadequada apreciação da prova produzida em julgamento e errando no julgamento da matéria de facto. Para além de tudo isso, o tribunal errou na interpretação e aplicação do direito.

3.ª Os pontos concretos da matéria de facto que a recorrente considera erroneamente julgados são os que se encontram enumerados na sentença com os n.ºs 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º., 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14., º15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 28.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º,33.º,34.º,35.º, 36.º e 37.º 4.ª As concretas provas que fundamentam uma decisão sobre a matéria de facto diversa da defendida pela decisão recorrida e que se considera erroneamente julgada no tocante aos pontos da matéria de facto como assentes e numerados pela sentença recorrida com os n.ºs 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 8.º,18.º.,19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 34.º, 35.º. são as que resultam do depoimento das únicas testemunhas ouvidas neste julgamento: António e Carla, e que se encontram registados da seguinte forma: III) O da testemunha António, encontra-se registado no ficheiro 20160706095857_371012_2896502.wma no sistema áudio citius do tribunal ad quo em: 00:00:01 Testemunha António 06-07-2016 09:59:00 00:00:00 Início Gravação 06-07-2016 09:58:58 00:17:54 Fim Gravação 06-07-2016 10:16:54 IV) O da testemunha Carla, encontra-se registado no ficheiro 20160706101655_371017_2896502.wma através do sistema áudio citius do tribunal ad quo em: 00:00:00 Testemunha Carla 06-07 00:00:01 Início Gravação 06-07-2016 10:16:57 00:27:08 Fim Gravação 06-07-2016 10:44:05 5.ª Estas duas testemunhas foram unânimes em referir que não participaram em quaisquer negociações relativamente à formação do contrato, tendo sido tudo entregue e feito pelo “homem no terreno” da A., Diretor Comercial da A., Engenheiro Paulo, que foi arrolado pela A. como sua testemunha, mas que foi prescindida pela A.

6.ª Dos depoimentos transcritos fala-se num contrato assinado, mas a verdade é que ele nunca apareceu, nunca foi junto pela autora nem poderia ser junto porque ele nunca existiu, nunca a R. assinou contrato algum, tanto que em 17 de Agosto de 2011 a R. ora recorrente ainda pedia o contrato de empreitada que nunca tinha sido realizado entre as partes.

7.ª Assim sendo, não tendo os como pode o tribunal ter dado como provado os factos 3.º, 4.º, 5.º, 6.º, 7.º, 24.º e 25.º, relativos à formação do contrato se, como vimos, não existe contrato escrito e nenhuma das testemunhas inquiridas negociou ou esteve presente negociações com a R. que aliás manifestam expressamente não conhecerem, pois tudo foi tratado por uma testemunha que não foi ouvida por ter sido prescindida pela A. ora recorridas (Eng. Paulo).

8.ª Não poderia nem deveria ter dado como provados estes factos que por não serem do conhecimento direto ou pessoal das testemunhas, suscitam elevadas dúvidas a sua existência, pelo que deveriam ter sido dado como não provados, dando-se cumprimento ao disposto no artigo 414.º do Código de Processo Civil.

9.ª Neste caso concreto, o apuramento do facto se encontra tão desgarrado da realidade, porquanto, no caso da testemunha António resulta apenas da consulta de autos de medição que vimos terem sido elaborados totalmente afastados da vontade da Ré ora recorrente, a qual não os produziu, não os aceitou e nem os assinou. Que a testemunha não sabe quem os fez, como os fez e se representavam a realidade. Importa referir que a testemunha nem sequer sabe onde a obra se situava, nunca a visitou, não sabe o que se encontrava construído ou não.

10.ª O depoimento indireto da testemunha Carla não pode ser valorizado, porque resultou daquilo que lhes disse um dos seus funcionários relativamente a um contrato em que este alegadamente terá simulado um conjunto de elementos do mesmo e em que há fundadas suspeitas sobre este mesmo funcionário.

11.ª Ora, não pode o tribunal valorar um depoimento indireto nessas circunstâncias, prestada pela própria sócia gerente da A. ora recorrida, após a própria recorrida ter afastado, ter prescindido, da testemunha arrolada que era a única que tinha conhecimento do que se passava.

12.ª Então, temos o seguinte quadro: Na petição inicial narra-se um conjunto de elementos de facto sobre a existência de um contrato que foi negociado e celebrado por uma testemunha que se arrola, sobre pagamentos simulados, sobre obras a mais, tudo isso factos que são favoráveis à Recorrida. A recorrente, então Ré, impugna esses factos todos e designa-os como falsos. A parte a quem esses factos são favoráveis prescinde do depoimento da testemunha e apresenta como testemunha a sua própria sócia gerente e os factos que são extremamente duvidosos e postos em causa pela outra parte são dados como provados. Ora isto não faz sentido nenhum e nessas circunstâncias o depoimento indireto não pode ser valorado.

13.ª Os próprios factos dados como provados chocam entre si e com os depoimentos das testemunhas. No n.º 4.º dos factos dados como assentes na sentença recorrida dá-se como provado que “ O preço da empreitada de €.526.682,38, foi acordado entre as partes no dia 4 de Março de 2011 e corresponde ao somatório de valores das empreitadas parcelares”. No n.º 5.º dos factos dados como provados, o tribunal deu como assente que “ O prazo para a realização da empreitada foi de 240 dias a contar do início dos trabalhos.” 14.ª Do depoimento das testemunhas, verifica-se que a recorrida levou 180 dias para fazer um quinto da empreitada atento o alegado valor medido da obra construída (112000,00 €). Como é que poderia concluir os restantes 4/5...

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