Acórdão nº 20213/16.2T8LSB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução13 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I.-RELATÓRIO: JOSÉ ......

, residente na ….. intentou, em 03.08.2016, acção declarativa de condenação com processo comum contra: 1º Banco Espírito Santo, S.A.

, com sede na Rua Barata Salgueiro, 28, 6.º piso, em Lisboa, 2º Novo Banco, S.A.

, com sede na Avenida da Liberdade, 195, em Lisboa, através da qual pedem a condenação solidária dos réus a indemnizarem o autor: a)-dos danos patrimoniais a apurar em execução de sentença; b)-dos danos morais, que se computam simbolicamente em 5.000,00 €.

Fundamentou o autor, no essencial, esta sua pretensão da forma seguinte: 1.O autor detém papel comercial emitido pela “Rio Forte Inv, S.A.”; 2.O autor aplicou € 100.000,00 nesse papel comercial, em 16.01.2014, no Balcão de Centro BES 360º - Saldanha, na convicção de estar a adquirir um produto com garantia de capital e taxa de juro fixa, com as mesmas características de um depósito a prazo, como lhe havia sido garantido pela gestora de conta, não tendo sido fornecido ao autor a ficha técnica nem foi informado sobre os riscos inerentes ao papel comercial; 3.O capital ficou por restituir, bem como juros remuneratórios por pagar; 4.O autor não é um investidor qualificado, tem um perfil conservador e as suas aplicações eram em depósitos, como o BES sabia perfeitamente.

  1. Nos termos da deliberação do Banco de Portugal e do regime jurídico da cisão o R. “Novo Banco” é também ele responsável pelo pagamento.

  2. A transferência de activos para o Novo Banco, sem a transferência de responsabilidades constituiria uma violação do art. 62.º, n.º 1 da CRP, sendo certo que a Directiva 2014/59/EU, e os art. 63.º, n.º 1, als. c) ou d), e no art. 145º-G, n.º 1 do RGIF apenas conferem ao BdP poderes para transferir para o Banco de transição determinadas acções ou instrumentos, mas não poderes para determinar quais as responsabilidades do Banco de transição.

    Fundou, assim, o autor a acção em responsabilidade do BES, por violação dos seus deveres enquanto banqueiro e de intermediação financeira, tendo-se transferido esta responsabilidade para o Novo Banco, por força da medida de resolução aplicada ao BES e criação do banco de transição.

    Citados, os réus apresentaram contestação.

    O 1º réu, BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A. (“BES”), contestou, em 23.08.2016, por excepção, invocando a deliberação do BCE que revogou a autorização para o exercício do BES, com efeitos a partir das 19,00 do dia 13 de Julho de 2016 e que, a declaração de insolvência associada ao prosseguimento do processo de Liquidação Judicial implica a inutilidade da lide, no que toca ao BES.

    Mais invocou que, mesmo que se entenda não haver fundamento para a imediata extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, da decisão de revogação da autorização para o exercício da actividade emanada do BCE, deverá ser declarada a suspensão da instância até que se torne definitiva tal decisão.

    Impugnou ainda o 1º réu, grande parte dos factos alegados pelo autor e terminou pedindo que seja: (i)Declarada a extinção da instância, nos termos e para os efetios do artigo 277º, alínea e) do Código de Processo Civil, absolvendo-se, consequentemente, o Banco Espírito Santo, S.A. – Em Liquidação, da instância; (ii)Ordenada a suspensão da instância nos termos do disposto no artigo 272º, nº 1 do Código de Processo Civil, até que se torne definitiva a decisão do Banco Central Europeu que revogou a autorização para o exercício da atividade do BES, sendo, logo que se verifique tal definitividade, declarada extinta a instância, nos termos e para os efeitos do artigo 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil, absolvendo-se o Réu Banco Espírito Santo, S.A. – Em Liquidação, da instância.

    (iii)Julgar improcedente, por não provada, a presente ação absolvendo-se o Réu BES dos pedidos contra si formulados.

    O 2º réu, NOVO BANCO, S.A. contestou, em 12.102016, por excepção, invocando a respectiva ilegitimidade passiva, e por impugnação. Alegou, para tanto, e em síntese, que: 1.

    Por deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014, foi aplicada uma medida de resolução ao Banco Espírito Santo, S.A. (“BES”) 2.

    A lei atribui ao Banco de Portugal uma competência discricionária, no respeito dos pressupostos de aplicação de cada uma delas, bem como dos princípios gerais da adequação e da proporcionalidade (artigo 139.º/24 do RGICSF).

  3. Através da deliberação de 3 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal determinou: O Ponto Um: constituir o NOVO BANCO, e aprovar os respectivos Estatutos (Anexo 1 da deliberação); O Ponto Dois: transferir para o NOVO BANCO, determinados activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do Banco Espírito Santo, S.A. (Anexos 2 e 2A da deliberação); O Ponto Três: designar uma entidade independente para avaliação dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão, transferidos para o NOVO BANCO; O Ponto Quatro: designar os membros dos órgãos sociais do Banco Espírito Santo, S.A.

  4. Foi o que o Banco de Portugal fez no caso do BES: aplicou uma medida de resolução ao Banco Espírito Santo, S.A.: a transferência parcial da actividade e constituiu uma instituição de transição (NOVO BANCO, S.A.), 5.

    No Anexo 2 à deliberação de 3 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal integrou na categoria de «Passivos Excluídos» responsabilidades do BES perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais do BES que se mantiveram na sua esfera jurídica, não tendo sido transferidos para o NOVO BANCO “quaisquer responsabilidades ou contingências decorrentes de dolo, fraude, violações de disposições regulatórias, penais ou contraordenacionais” (alínea b), subalínea (v)).

  5. Por deliberação de 11 de Agosto de 2014, o Banco de Portugal decidiu clarificar e ajustar o perímetro dos activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão do BES trsnsferidos para o Novo Banco.

  6. Se dúvidas pudessem existir sobre se em rigor o BES teria algum tipo de responsabilidades perante os subscritores de papel comercial de entidades do Grupo Espírito Santo, é indubitável que tais responsabilidades sempre estariam excluídas do universo de activos e passivos transferidos para o Novo Banco.

  7. Face à deliberação do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014 e considerando as respectivas aclarações, de acordo com a nova redacção da subalínea (vii), é indiscutível que o Banco de Portugal, enquanto autoridade pública de resolução, e no uso das suas competências legais, não transferiu para o NOVO BANCO a responsabilidade ou as contingências perante os subscritores de papel comercial de entidades do Grupo Espírito Santo.

  8. Tal significa que, em termos processuais, a legitimidade passiva nos presentes autos pertence exclusivamente ao BES.

  9. A resolução bancária tem cobertura constitucional, porquanto, através, designadamente, da constituição de uma instituição de transição, permite, em especial, preservar a estabilidade do sistema financeiro no seu todo, salvaguardar as funções bancárias desempenhadas pela instituição de crédito em crise e proteger os depositantes, como, outrossim, com a resolução da instituição de crédito, tutela os contribuintes e ressalva o erário público.

  10. A verdade é que a resolução não agravou a posição jurídica que o Autor teria se o BES tivesse entrado em liquidação.

  11. Face ao exposto, impõe-se concluir que o NOVO BANCO é parte ilegítima nos presentes autos, na medida em que a responsabilidade perante o Autor, a existir, não foi transferida para o NOVO BANCO, tendo permanecido na esfera jurídica do BES.

    Impugnou ainda, o 2º réu, os factos alegados pelo autor e terminou, pedindo que seja julgada procedente a excepção de ilegitimidade passiva do réu, absolvendo-se o mesmo do pedido ou, pelo menos, da instância. Subsidiariamente, ser a acção julgada improcedente, por não provada, com as legais consequências.

    Por despacho de 03.11.2016, o autor foi convidado a responder às excepções invocadas, convite, o que este acatou, em 22.11.2016, tendo concluído nos seguintes termos: § O Autor reclamou o seu crédito, subjacente à presente acção declarativa, no processo de insolvência do R. BES, Banco Espírito Santo, S.A. - em Liquidação (doc. 8).

    § Reclamação essa que é do conhecimento do R. BES, Banco Espírito Santo, S.A. - em Liquidação, tanto mais que os seus actuais Administradores integram a Comissão Liquidatária.

    § Pelo que a presente acção declarativa não perdeu o seu interesse e fundamento para reconhecimento definitivo do crédito do A.

    § O qual, se não for reconhecido definitivamente no processo de insolvência, deverá ser graduado como crédito sob condição suspensiva.

    § Prosseguindo a presente acção a sua tramitação normal.

    § Não ocorrendo qualquer violação do princípio da igualdade de credores.

    § De qualquer forma, à cautela, sem admitir, sempre se diga que, caso o tribunal decretasse a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, essa extinção só operaria relativamente ao BES, Banco Espírito Santo, S.A. - em Liquidação, mantendo-se a instância contra o outro R., Novo Banco, S.A., à semelhança, aliás, do que ocorre nas acções executivas, nos termos do art.º 88.º, n.º 1 in fine e 2.

    § Assim, caso a responsabilidade do BES fosse apreciada no processo de insolvência do BES, fora desta acção declarativa, haveria sempre o risco de contradição de julgados.

    § O que não acontece se o crédito do A. for reclamado e acautelado no processo de insolvência do BES, como crédito sujeito a condição suspensiva, até ao trânsito em julgado da presente acção.

    Termina o autor, requerendo que as excepções dos R.R. sejam julgadas improcedentes, com as legais consequências, concluindo-se como na p.i.

    Foi dispensada a audiência prévia.

    Em 27.02.3017, foi fixado o valor da causa, proferido despacho saneador e, invocando o Tribunal que havia fundamento para conhecer do pedido, proferiu Decisão.

    Relativamente à imputação de responsabilidade ao réu Novo Banco, consta do seu...

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