Acórdão nº 4386-07.8TVLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução29 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA 1.- Relatório.

A ( CARLA …) , intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra B ( PAULO…) e C ( … LDA ) , pedindo a condenação solidária dos RR., a : a) a quantia total de 39.412.32€, a título de despesas médicas e medicamentosas, incluindo intervenções cirúrgicas, viagens e estadias ; b) a quantia de 2.972,44€ , a título de remunerações que deixou de auferir em consequência das incapacidades temporárias sofridas ; c) a quantia de 143.000€ , a título de danos futuros ; d) a quantia de 37.500€ ,a título de danos morais ; e) as quantias que se vierem a apurar e que advirão das intervenções cirúrgicas e tratamentos a que terá ainda a autora de se submeter, tudo acrescido de juros a contar da data da citação; e f) subsidiariamente, a condenação da nos mesmos montantes, a título de responsabilidade contratual.

1.1.

- Para tanto, alegou a demandante, em síntese, que: - na sequencia de tratamento dentário anterior, de extracção, e dada a sensação de mal estar na zona da extracção ,consultou, o 1ºréu, que a informou que a mesma sofria de uma osteomielite e que precisava e fazer uma biópsia, tendo para o efeito sido internada no HCVP; - Depois, concluiu o 1º réu que se verificava existir um extenso osteoma, informando então a Autora que teria de ser operada o mais rapidamente possível, o que veio a suceder, tendo a intervenção tido lugar em Janeiro de 2004; - Sucede que, após a referida e primeira operação, foi a Autora sujeita a novas intervenções cirúrgicas e infecções contínuas, dado a extensão da ressecção realizada pelo réu , e que se revelou desnecessária face ao osteoma que a autora apresentava; - O 1º Réu, ao actuar da forma referida em sede de tratamento médico à Autora, violou manifestamente as legis artis, provocando-lhe danos, quer patrimoniais, quer morais, razão porque está obrigado a ressarci-los; - Já a segunda ré, porque os serviços prestados pelo 1º réu o foram através da mesma, é outrossim solidariamente responsável.

1.2.- Após citação de ambas as RR, vieram ambos contestar a acção, tendo ambos deduzido oposição por impugnação motivada, e , a Ré/pessoa colectiva, alegando nada ter que ver com os actos médicos praticados pelo 1º réu, porque possui este último total autonomia na qualidade de médico, invocou ser assim parte ilegítima, padecendo a petição inicial do vício de ineptidão.

Já o 1º Réu/pessoa singular, alegando ser titular de seguro de responsabilidade transferida para a Seguradora "Axa Portugal,SA", e em sede de impugnação motivada, alegou ter actuado com total observância das melhores práticas, tendo sempre agido com zelo e preocupação pela saúde da Autora, razão porque, devendo a acção improceder, impõe-se ainda a condenação da autora como litigante de má fé, por deduzir pretensão cuja falta de fundamento não ignora.

1.3.- Seguindo-se a Réplica da Autora [ em cujo articulado peticiona a condenação do réu como litigante de má fé , um multa não inferior a 200 UCs e indemnização à A. pelos prejuízos e despesas com a acção a liquidar a final ] e a tréplica dos RR, foi proferido despacho que admitiu a intervenção nos autos da Seguradora "Axa Portugal,SA", tendo esta última apresentado articulado próprio, mas dando por reproduzidas as contestações apresentadas pelos réus.

1.4.- De seguida, dispensada que foi a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador [ no âmbito do qual foi desatendida a invocada excepção da ineptidão da petição inicial ] , organizando-se ainda a factualidade assente e fixando-se a base instrutória da causa, peças últimas estas que foram objecto de reclamações, tendo a do réu Paulo Jorge Coelho sido parcialmente atendida.

1.5.- Já a Ré C, inconformada com a decisão proferida no saneador e que desatendeu a invocada excepção da ineptidão da petição inicial , veio da referida parte deduzir AGRAVO , tendo sido apresentadas alegações e contra-alegações .

1.6.

- Após a realização de diversas diligências instrutórias , teve lugar a realização da audiência de discussão e julgamento - que se prolongou por diversas sessões e que apenas se concluiu em 6/4/2016 - , e conclusos os autos para o efeito ( a 11/4/2016 ) , foi finalmente sentenciada a acção, e sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor : “(…) IV. DECISÃO: Pelo exposto, julgo improcedente a acção e consequentemente, decido absolver os réus e interveniente dos pedidos formulados.

Custas da acção pela Autora.

Registe e notifique.

Lisboa, 18 de Maio de 2016”.

1.7.- Inconformada com a sentença identificada em 1.5., da mesma apelou então a Autora A, alegando e deduzindo a mesma em sede recursória as seguintes conclusões :

  1. Existiu neste processo uma incorrecta apreciação da prova documental, uma vez que o Tribunal "a quo" fez tábua rasa de todos os exames imagiológicos bem como dos relatórios técnicos dos médicos que os efectuaram e ainda e ainda das explicações que os médicos presentes nomeadamente o Dr. …. fez dos mesmos. Tudo isto sem qualquer justificação ou sem que tal tenha sido devidamente fundamentado na Sentença, de que, ora se recorre.

  2. Toda a prova que competia à A. de um cumprimento defeituoso ou mesmo incumprimento, por parte do R. a A. fez ,já o R. não conseguiu infirmar ou contrariar essa prova da A.

  3. Toda a prova documental e testemunhal carreada para os autos pela A.; nomeadamente os exames imagiológicos, realizados antes da cirurgia, bem como o depoimento dos médicos Dra. … ; Dr. … ; Dr. …; Dr. ….; … e …a bem como em alguns pontos até as restantes testemunhas indicadas pelo R. foram determinantes para demonstrar que o problema que a A. padecia era um foco inflamatório e não qualquer osteoma ou osteomielite.

  4. Os peritos, ao contrário do que seria de esperar não contribuíram para qualquer esclarecimento, ou apuramento dos factos ; muito pelo contrário limitaram-se à retórica genérica e não satisfizeram as dúvidas pertinentes da A., explicando com rigor técnico e cientifico tanto as dúvidas suscitadas por escrito e que se encontram documentadas nos autos, como aquelas que supostamente deveriam ter esclarecido em sede de Audiência de julgamento. Sendo certo que nesta última sede, inclusivamente a mandatária da A. foi impedida, pelo Tribunal "a quo " de fazer o seu interrogatório mediante os exames médicos que A. tinha confrontado os peritos e inquirindo em conformidade. O tribunal ad quo entendeu por bem limitar a A. e impedir que os peritos respondessem à questão: acerca de nas imagens onde identificavam o osteoma ou a infecção grave, que não obstante a Sentença, de que se recorre, vem concluir, a nosso ver sem qualquer fundamento, ser uma osteomielite.

  5. Apesar de toda a prova produzida pelo R. pretender ir no sentido de que a decisão de operar foi devido à existência de um, suposto, osteoma. Como, não obstante, esta prova não se fez o Tribunal, a quo, decide concluir que o que levou o R. a operar foi a existência de uma osteomielite, quando igualmente tal também não resultou provado . Pelo que, em nosso entender também aqui o Tribunal andou mal e infundamentadamente face à prova produzida.

  6. Esqueceu-se o Tribunal a quo que nem a existência do osteoma, nem da osteomielite ficaram provados antes da cirurgia de Janeiro de 2004 que desencadeia todo este processo na A. pelo contrário, o que ficou provado tanto pelos exames, quanto pelos relatórios dos médicos presentes como testemunhas, como seus próprios testemunhos em Sede de Julgamento, foi que o que a A. tinha à data de Janeiro de 2004 antes da operação do R. era apenas uma inflação que deveria ter sido debelada com tratamento antibiótico e nunca com uma intervenção cirúrgica tão extensa e devastadora como a que o R, realizou.

  7. Igualmente ficou demonstrado que essa inflamação era tratável com terapia antibiótica prolongada. Porventura em casos mais graves através de internamento para tratamento antibiótico intravenoso. Sendo a cirurgia, nestes casos só admitida quando esta última opção de internamento não resulta. De qualquer modo a situação da A. à data era compatível com um tratamento de antibióticos orais porventura com uma mistura de mais do que um antibiótico; o chamado cocktail de antibióticos. O que ficou provado o R. não fez.

  8. Inclusivamente, embora a existência de um osteoma não tivesse resultado provada a testemunha do R. diz que o que justiçaria ou justificou a operação neste caso foi o osteoma e não a infecção. Ora, não tendo o osteoma ficado provado e se a infecção não seria razão para operar então como pode o Tribunal a quo dar como provado que foi a infecção que originou a operação e considerar que esta decisão do R. foi correcta. Esta decisão do tribunal a quo não só não é compreensível como revela uma contradição insanável que urge corrigir.

  9. Por outro lado, igualmente do depoimento das testemunhas acima referidas, e ainda Dr. …. e …. resultou provado que o tratamento de eventuais infecções só não é compatível com tratamento antibiótico quando o doente tem a seguinte sintomatologia: - Não consegue abrir a boca, - Não consegue mastigar, - Não consegue engolir. Todas as outras são tratáveis com antibióticos. Ora. o R. não provou, nem sequer alegou que fosse esta a situação clinica da A. antes da sua decisão, manifestamente errada, de operar. » J) Efectivamente, dos autos não resultou prova do que a A. tivesse essa sintomatologia, daí que, em conjunto com os depoimentos de todos os médicos que depuseram como testemunhas e não intervieram na operação, e disseram que se devia ter recorrido a terapia antibiótica mais prolongada, tenha resultado provado e demonstrado que a decisão de operar do R. não foi tomada de acordo com a "Legis artis," mas sim e antes pelo contrário, ao arrepio das mesmas. De resto, de acordo não só com a prova testemunhal, mas sim também documental junta aos autos pela A. inclusivamente a literatura médica a este propósito que o Tribunal a quo admite...

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