Acórdão nº 1802/15.9T8CSC-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelCARLA C
Data da Resolução27 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: João ... de ... ...

intentou a presente acção declarativa com forma comum, pedindo a condenação do R.

Pedro ... ... ... ...

no pagamento da quantia de € 45.000,00 a título de capital, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento e perfazendo os vencidos até à data da propositura da acção a quantia de € 9.000,00.

Para sustentar a sua pretensão alega, em síntese, que era arrendatário relativamente a um imóvel que foi vendido sem que lhe tivesse sido dada preferência na venda, tendo o R. manifestado interesse na aquisição desse imóvel livre e devoluto de pessoas e bens, e tendo então sido acordado entre as partes e a compradora do imóvel que o mesmo seria transmitido ao R. e que este pagaria ao A. a quantia de € 98.000,00 como contrapartida da cessação do contrato de arrendamento, em duas prestações de € 53.000,00 e de € 45.000,00, mas tendo apenas liquidado a primeira, ficando por satisfazer a segunda na data do vencimento respectivo, apesar do A. ter cumprido a sua parte no acordo, entregando as chaves do imóvel ao R.

Regularmente citado o R., apresentou contestação por excepção e impugnação.

* * Foi proferida sentença final que julgou a acção procedente por provada e, em consequência, condenou o R. a pagar ao A. a quantia de € 45.000,00 (quarenta e cinco mil euros), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento, e perfazendo os vencidos até à data da propositura da acção a quantia de € 9.000,00 (nove mil euros).

* Não se conformando com a decisão, dela apelou o R., formulando as seguintes conclusões: A.

–Foi errada a resposta de provado do facto número 3 dos factos provados constantes da sentença, atenta a inexistência de prova que o permitisse, o qual tem assim de passar a ser dado como não provado.

B.

–Para dar como provado o facto número 3 baseou-se o Tribunal no Documento n.º 8 junto com a petição inicial, e no depoimento das testemunhas arroladas pelo recorrido, Armindo Agostinho, Armando ... e Manuel Sousa.

C.

–O Documento n.º 8 junto com a petição inicial só está assinado pelo recorrido, pelo que é absolutamente inaproveitável para a prova do facto em questão, bem como o são os depoimentos das testemunhas, os quais nunca poderiam valer isoladamente uma vez que constituem depoimento indireto, apenas sustentado em conversas com o recorrido.

D.

–Foi errada a resposta de provado do facto número 5 dos factos provados constantes da sentença, atenta a inexistência de prova que o permitisse, o qual tem assim de passar a ser dado como não provado.

E.

–Para dar o facto número 5 como provado, o Tribunal a quo recorreu ao depoimento das testemunhas arroladas pelo recorrido, Armindo Agostinho, Armando ... e Manuel Sousa, conjugado com o teor dos Documentos n.º s 8 e 9 juntos com a petição inicial.

F.

–O Documento n.º 8 é inaproveitável para prova do facto, do Documento n.º 9 nada resulta que permita afirmar a prova do facto em questão, e do depoimento prestado pelas testemunhas identificadas também não é possível afirmar de todo as circunstâncias relativas à assinatura do alegado acordo identificado em 4. dos factos provados.

G.

–As testemunhas em causa deixaram explícito que não conhecem o recorrente, nunca presenciaram qualquer conversação entre o recorrente e recorrido, e que o que sabem lhes foi transmitido pelo seu amigo e primo, o ora recorrido – consta da sentença que as testemunhas apenas têm um conhecimento indireto dos factos.

H.

–O contrato outorgado entre recorrente e recorrido com data de 20.11.2009, denominado “Contrato Promessa de pagamento de indemnização, da cedência do direito de usufruto, uso e habitação” é nulo por impossibilidade legal do objeto e por impossibilidade originária da prestação, nos termos do artigo 280.º, n.º 1 do Código Civil (CC), o que se requer ao Tribunal que declare nos termos do artigo 286.º do CC.

I.

–O Tribunal a quo entendeu que a liberdade contratual e a autonomia privada das partes lhes permitiria celebrar o contrato em causa, e que desse contrato acordo decorreria a obrigação do recorrente pagar ao recorrido a quantia de 45.000,00 €, tendo condenado o recorrente em conformidade.

J.

–Ficou provado nos autos que no dia 06.11.2009, antes do escrito outorgado por recorrente e por recorrido, datado de 20.11.2009, foi registada a favor do recorrente a aquisição provisória do prédio sub judice por compra.

K.

–Nos termos do artigo 6.º, n.º 2 do Código do Registo Predial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224/84, de 6 de julho, o registo convertido em definitivo conserva a prioridade que tinha como provisório.

L.

–Ficou provado nos autos que o recorrido era arrendatário do prédio sub judice, ao abrigo de um contrato de locação, contrato esse que não se confunde com o direito de usufruto, definido no artigo 1439.º do CC, nem com o direito de uso e habitação, definido no artigo 1484.º do CC, sendo os direitos e deveres a cada um inerentes, bem como as formas de constituição e de extinção, diferentes.

M.

–O recorrido era titular do direito ao arrendamento, e não era assim titular de qualquer direito de usufruto, uso e habitação, sendo que tais direitos apenas são validamente constituídos por contrato, testamento, usucapião ou disposição da lei, nos termos dos artigos 1440.º e 1485.º do CC, não tendo sido constituídos a favor do recorrido nenhum destes direitos.

N.

–O recorrido só podia transmitir o direito ao arrendamento, maxime, mediante a cessão da posição contratual prevista no artigo 1059.º, n.º 2 do CC, a qual teria de seguir as regras constantes do artigo 424.º e seguintes do CC, desde logo, o consentimento do outro contraente, neste caso, o locador, o que não foi sequer alegado nos autos.

O.

–Ainda que se entendesse que do acordo decorreria que “o A. transmite ao R. o seu direito ao arrendamento sobre determinado imóvel”, como fez erradamente a decisão recorrida, nenhum cabimento legal teria o proprietário ou futuro proprietário adquirir o direito ao arrendamento que se iria extinguir por confusão, nos termos do artigo 868.º do CC.

P.

–Mediante a aquisição do direito de propriedade na sua plenitude, o recorrente obteve por inerência os direitos que estão contemplados na propriedade plena, desde, logo, o usufruto, uso e habitação, pelo que não os podia comprar ou prometer comprar, igualmente, por impossibilidade legal do objeto negocial.

Q.

–Existe uma impossibilidade legal do objeto imediato, porquanto o negócio não é válido ou apto a produzir os efeitos jurídicos que as partes quiseram convencionar – não se pode produzir o efeito de ceder direitos de que se não é titular; nem se pode produzir o efeito de adquirir direitos que já se titulam.

R.

–A impossibilidade legal verifica-se quer se entenda estar-se perante um contrato definitivo, como perante um contrato-promessa, pois as estipulações negociais gizadas pelas partes não só eram legalmente impossíveis na data da outorga do contrato, como não se iriam tornar possíveis no futuro, pelo menos em momento em que a prestação ainda oferecesse interesse ao credor, recorrente, nos termos do artigo 792.º, n.º 2 do CC.

S.

–Ao não ter declarado a nulidade do acordo entre recorrente e recorrido, e daí retirado as legais consequências, o Tribunal a quo violou os artigos 280.º, n.º 1, 286.º, 289.º, n.º 1 e 401.º, n.º 1 do CC, que devia ter aplicado e não aplicou, o artigo 405.º, n.º 1, que aplicou erradamente ao caso dos autos e que não devia ter aplicado, os artigos 1022.º, 1439.º e 1484.º do CC, que devia ter ponderado e convocado para a solução do litígio e que não aplicou, e o 607.º, n.º 4 do CPC, já que omitiu o dever de exame crítico da prova, em concreto, do Documento n.º 9 junto aos autos.

T.

–O contrato celebrado entre recorrente e recorrido é igualmente nulo por contrário à lei, nos termos dos artigos 294.º e 280.º, n.º 1 pois nele o recorrido prometeu ceder direitos de uso e habitação, os quais são intransmissíveis nos termos do artigo 1488.º do CC, quer se esteja perante um contrato-promessa ou um contrato definitivo e ao assim não decidir a sentença violou os artigos 294.º e 1488.º do CC, que devia ter aplicado e não aplicou.

U.

–A preterição do direito de preferência do arrendatário constante do artigo 1091.º, n.º 1, alínea a) do CC implica que este se possa substituir ao terceiro adquirente, mediante a propositura da ação de preferência prevista no artigo 1410.º do CC.

V.

–O recorrido não propôs ação de preferência para fazer valer o direito que entendeu preterido, o que tem necessariamente por consequência que tal direito caducou por ultrapassagem do prazo de seis meses legalmente previsto, pelo que errou a sentença ao decidir que o direito de preferência do recorrido se teria extinto mediante as negociações alegadas pelo recorrido quando tal direito já se extinguira por caducidade.

W.

–O recorrido não provou sequer que tenha alguma vez manifestado intenção de exercer o direito de preferência, uma vez que o Documento n.º 8 que junto aos autos não está assinado por qualquer entidade além do próprio recorrido.

X.

–O direito de preferência do arrendatário apenas deve ser reconhecido se e na medida em que proporcione ao respetivo titular...

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