Acórdão nº 6797-12.8TBALM.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA ALEXANDRINA BRANQUINHO
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: A…veio interpor recurso da sentença proferida na acção de impugnação de paternidade presumida que intentou contra B…e C….

Na p.i., o autor, ora apelante, pede para ser afastado da paternidade da 2.ª ré constante do assento de nascimento desta, bem como a respectiva avoenga paterna ordenando-se que a sentença produza efeitos naquele assento.

Para o efeito, o autor alega que se encontra separado de facto da 1.ª ré desde 1994 não tendo, desde então, quaisquer notícias da mesma e que o divórcio foi decretado em 2006.

O autor diz, ainda, que não teve conhecimento do nascimento da 2.ª ré, que foi registada como sendo sua filha, e que correu termos junto dos serviços do Ministério Público da… um processo administrativo de impugnação da paternidade/perfilhação com o n.º…, aí tendo sido ouvido em declarações em 20.03.2002 e, afirmado desconhecer quem era o pai da menor mas, logo se disponibilizando a realizar exames.

O autor acrescenta que foi ordenado o arquivamento do processo administrativo e que tal decisão lhe foi notificada em Julho de 2011.

As rés foram citadas editalmente. A Magistrada do Ministério Público contestou em representação das rés ausentes, desde logo invocando a excepção peremptória de caducidade do prazo para intentar a presente acção pugnando, consequentemente, pela absolvição do pedido.

O autor respondeu à matéria da excepção pugnando pela sua improcedência e invocou inconstitucionalidade do art.º 1842.º, n.º 1, al. a), do CCivil.

Foi designada data para realização de audiência prévia que não se concretizou por impedimento da mandatária do autor.

A fls. 232 dos autos foi ordenada a notificação das partes para, no prazo de 10 dias, declararem nos autos se se opunham a que o Tribunal conhecesse, por despacho, da matéria da excepção, notificação que foi feita com a cominação expressa de nada dizendo no prazo concedido se interpretar o seu silêncio como não oposição.

As partes nada disseram.

No despacho saneador considerou-se possível o conhecimento da excepção de caducidade, o que foi feito após registo dos seguintes factos julgados provados: 1.

–A…e B… casaram civilmente, um com o outro, em…1998 (cf. certidão junta a fls. 63 v). 2.

–O referido casamento foi dissolvido por sentença proferida em… 2016, transitada em julgado na mesma data (cf. certidão junta a fls. 63 v).

  1. –No dia… de 1999 nasceu C…, a qual tem a paternidade registada em nome do aqui autor e a maternidade registada em nome da aqui 1.ª a ré (fls. 61).

  2. –No dia…de 2002, nos autos do processo administrativo n.º…, que correu termos nos Serviços do Ministério Público da…(extinto), em que é menor C…, mãe a 1.ª ré e requerido o autor, foi este ouvido em declarações, tendo declarado não ser pai da menor C…, nos precisos termos constantes de fls. 185-189, cujo teor aqui se dá integralmente por reproduzido.

  3. –A presente acção foi instaurada em 22 de Novembro de 2012.

    No final do despacho saneador, a 1.ª instância decidiu conforme segue: «Pelo exposto, e atendendo ainda ao disposto no art. 576.º, do CPCivil, julgo procedente por provada a invocada excepção peremptória de caducidade do direito à acção e, consequentemente, absolvo as rés dos pedidos contra si deduzidos».

    O apelante produziu as suas alegações de recurso, rematando-as com as seguintes conclusões: 1.

    –Dos elementos carreados aos autos resulta que o averbamento referente à paternidade da menor C… nem sequer foi comunicado ao Autor, conforme declaração emitida pela Conservadora, a fls.154 dos autos.

  4. –Falece assim o argumento de que o Autor deveria ter instaurado a acção a partir de… 2002.

  5. –Não há qualquer base documental nos Autos que prove que o A. teve conhecimento em…2002 de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade, pois o A. não só nunca pensou ser o pai da 2ª Ré, como também tal nunca lhe foi comunicado.

  6. –A Douta sentença de que se recorre não efectuou uma análise crítica das provas, mormente dos documentos juntos aos autos pelo A. e designadamente pelo facto de nem se ter tido em conta que em 2006 – aquando do divórcio entre o A. e a 1ª Ré – a existência de uma menor para a regulação das responsabilidades parentais, o que evidencia que nessa data a 2ª Ré não era “filha” do A.

  7. –O Tribunal desinteressou-se pelo facto de não se ter dado cumprimento ao exercício do contraditório, mormente em relação ao Auto de declarações através do qual concluiu pelo inicio de contagem de um prazo de caducidade.

  8. –Não se mostra provado que o A. tinha conhecimento de circunstâncias que poderiam pôr em causa a sua paternidade, desde 2002, pois o A. sabia que não era pai daquela menor ou de qualquer outro, e nunca lhe imputaram a paternidade de qualquer dos filhos de A…, nascidos após a separação pois sempre lhe era comunicada pela Conservatória a existência dos outros menores, com excepção para a 2ª Ré.

  9. –Para se apurar a caducidade do direito do A. teria de se contar o prazo de caducidade a partir da data de conhecimento, notificação da paternidade presumida, o que nunca ocorreu, como o atesta o documento junto aos autos a fls. 154, pela Conservatória.

  10. –O A. apenas tomou consciência de que lhe estavam a impor uma paternidade presumida em data posterior a 2011.

  11. –Em… de 2010, foi o A. notificado pelo Tribunal Judicial de…no âmbito do Processo: …Regulação do Poder Paternal, que havia sido instaurado processo administrativo com vista à investigação da paternidade (o processo administrativo …) e que essa instância se encontrava suspensa até que fosse definida a paternidade da menor, conforme doc. 5 junto aos Autos.

  12. –O A. esteve sempre de boa fé e sente-se revoltado e defraudado com o desfecho dos Autos pois nunca lhe foi comunicado que era pai presumido de uma menor.

  13. –O A. criou, sozinho dois filhos e vê-se agora confrontado com a existência de uma terceira “filha”, apenas filha da sua ex-mulher à semelhança de outros filhos que esta teve com outros parceiros, ao longo dos anos em que estiveram separados, e em que o A. não sabia do seu paradeiro, o que apenas veio a ocorrer mercê da detenção da 1ª Ré no EP de...

  14. –A presunção legal de paternidade presumida foi ilidida pela verdade científica e pelos testes de ADN.

  15. –Deve, nestes termos, ser revogada a sentença de que se recorre, sob pena de imposição de uma decisão claramente violadora da lei substantiva, na interpretação que resulta, para o caso concreto, na imposição de uma paternidade presumida, pelo decurso de um prazo de caducidade.

    Por todo o exposto, deverá ao presente recurso ser concedido provimento e, consequentemente, ser revogada a sentença de que se recorre e substituída por outra que considerando improcedente a excepção peremptória de caducidade julgue a acção procedente por provada com o afastamento da paternidade presumida do A. em relação à 2ª R., constante do assento de nascimento desta, bem como a respectiva avoenga paterna ordenando-se ainda que a decisão produza efeitos no assento de nascimento da 2ª Ré, deixando de figurar o A. como pai.

    Respondeu o M.º P.º, pugnado pela manutenção do decidido.

    Questão prévia: Existem dois lapsos nos factos dados como assentes na decisão recorrida. O primeiro deles no ponto 1. e, o segundo, no ponto 2.

    Com efeito, a 1.ª instância registou no ponto 1: «A…e B…casaram civilmente, um com o outro, em 02 de Dezembro de 1998 (cf. certidão junta a fls. 63 v)». Todavia, da referenciada certidão resulta que o casamento ocorreu em 02 de Dezembro de 1988.

    No ponto 2., a 1.ª instância registou: «O referido casamento foi dissolvido por sentença proferida em 19.04.2016, transitada em julgado na mesma data (cf. certidão junta a fls. 63 v)». Todavia, da referenciada certidão resulta que o casamento foi dissolvido por sentença proferida em 19 de Abril de 2006, transitada em julgado na mesma data.

    Corrigidos aqueles dois lapsos, importa dar conta de um segmento da sentença apelada que mostra uma parte relevante da fundamentação de facto e de direito que conduziu ao conhecido desfecho da acção.

    Assim: Referindo-se à acção de impugnação de paternidade, a 1.ª instância esclarece: «pode ser desencadeada pelo marido da mãe, pela mãe, pelo Ministério Público e pelo filho - art. 1839º n.º 1 do CCivil, nos termos constantes do disposto no art. 1841.º, do CCivil.

    (…) Acontece é que a predita acção está sujeita a prazos, prazos esses de caducidade, e todos eles de conhecimento oficioso, por versarem sobre direitos indisponíveis - art. 333º n.º 1 do CCivil.

    Tais prazos são, contudo, distintos, consoante a acção seja intentada pelo pai presumido, pela mãe ou pelo filho.

    Vejamos o que, a este propósito, preceitua o art. 1842º do CCivil: 1.

    –A acção de impugnação da paternidade pode ser intentada: a)-Pelo marido no prazo de três anos contados desde que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade; b)-Pela mãe dentro de dois anos posteriores ao nascimento; c)-Pelo filho, até 10 anos depois de haver atingido a maioridade ou ter sido emancipado, ou posteriormente dentro de três anos a contar da data em que teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se não ser filho do marido da mãe.

  16. –Se o registo for omisso quanto à maternidade, os prazos a que se referem as alíneas a) e c) do número anterior, contam-se a partir do estabelecimento da maternidade.” Ora, da letra e conjugação dos diversos números deste preceito, ressalta com evidência o seguinte: que o prazo de três anos, conferido ao marido, se conta necessariamente a partir da data em que ele teve conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade.

    Se o autor alegar factos ocorridos há mais de três anos, quando propõe a acção, deve logo alegar e provar a data em que deles teve conhecimento, sob pena de a petição ter de ser corrigida e, não o sendo, naufragar a acção.

    Ora, resultou provado que o autor soube da existência de C…pelo menos no dia 20 de Março de...

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