Acórdão nº 1389-14.0T8CSC-M.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução19 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.-Relatório: Por apenso à acção de divórcio, veio M..., nos autos m.id., propor a presente acção de atribuição da casa de morada de família contra o seu ex-cônjuge N..., também nos autos m.id., pedindo que lhe seja atribuída definitivamente a casa de morada de família, sendo considerado como renda o pagamento pela requerente da quota-parte do requerido nos encargos que oneram o respectivo imóvel.

Em síntese, alegou que no âmbito da acção de divórcio, requerente e requerido acordaram atribuir provisoriamente a casa de morada de família à requerente e que esta suportaria integralmente os encargos com o imóvel, como contrapartida por aquela utilização exclusiva; No âmbito do apenso A onde foram reguladas as responsabilidades parentais dos filhos das partes, os menores foram confiados à guarda da mãe; Os dois menores residem com a requerente naquela que era a casa de morada de família; Desde a atribuição provisória da casa de morada de família que a requerente suportou sem qualquer excepção todos os encargos com esta habitação, nomeadamente: -empréstimo bancário cuja prestação mensal perfaz um total de € 245,78; -seguros multi-risco cujo prémio importa o custo médio mensal de € 13,36; -IMI cujo montante médio mensal importa € 26,94; -tarifas de conservação de esgotos na média mensal de € 13,34; -condomínio numa média mensal de € 94,33; - tudo num valor médio mensal total de € 393,75; O requerido arrendou uma casa onde reside; As necessidades habitacionais dos ex-cônjuges e filhos comuns encontram-se equilibradamente satisfeitas.

Frustrada a tentativa de conciliação a que alude o artº 1413º nº 2 do CPC, ao tempo aplicável aos autos, o requerido apresentou oposição, alegando, em síntese, que desde a separação do casal tem residido em apartamentos arrendados, sendo que, actualmente, e desde 01.11.2009, reside num apartamento pelo qual paga €750,00 de renda. Ficou involuntariamente desempregado e embora receba subsídio de desemprego, vive com a ajuda dos pais. Não pode prescindir da renda da casa de morada da família, cuja metade do valor de mercado é de €475,00. Não há fundamento legal nem razões de justiça que justifiquem que a requerente apenas pague uma renda correspondente a metade dos encargos, ou seja, €196,87.

Concluiu que, caso seja atribuída à requerente a casa de morada da família até à partilha dos bens comuns do casal, deve a requerente pagar uma renda de €475,00, correspondente a metade do valor de mercado.

Respondeu a requerente aos documentos juntos pelo requerido, e alegando ainda que o mesmo não informa qual o valor de subsídio de desemprego que aufere.

Ordenada a avaliação do imóvel a fim de se determinar o seu valor locativo, concluiu-se no respectivo relatório pericial a fls. 109 e seguintes dos autos, por um valor de rendimento bruto mensal provável de €967,00.

Instruídos os autos, e notificadas as partes de que o tribunal entendia possuir os elementos necessários para decidir, foi pela requerente prescindida a realização da audiência de discussão e julgamento.

Pronunciando-se o requerido e não ficando o tribunal esclarecido, proferiu despacho do qual, além do mais, consta: “Devendo ter-se presente que os presentes autos se inserem na jurisdição voluntária onde o tribunal é livre de investigar os factos, coligir as provas e recolher as informações convenientes (artº 986º CPC), podendo ainda adoptar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna (artº 987º CPC), e com vista a clarificar a nossa dúvida, determino se notifique o requerido para esclarecer se se opõe a que se profira decisão sem recurso a audiência de discussão e julgamento”.

O requerido veio aos autos, em resposta, declarar que não se opunha.

Foi então proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “Em face de todo o acima exposto julgo a presente acção totalmente procedente e, em consequência, atribui-se à requerente e filhos T... e S..., até à respectiva partilha, o uso da casa de morada de família sita na Rua P...deA..., nº..., ...º esquerdo, 1...-1... A..., fixando-se como contrapartida por esse uso, até à partilha do dito imóvel, o pagamento pela requerente, não só da sua quota-parte, como da quota-parte do requerido das mensalidades do empréstimo bancário, do seguro multi-riscos, das tarifas de conservação dos esgotos, do IMI e das quotas de condomínio, que oneram a casa de morada de família, não havendo lugar ao pagamento ao requerido de qualquer renda.

Custas a cargo do requerido”.

Inconformado, interpôs o requerido N...R... o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões: 1.-O presente recurso tem por objecto a douta sentença proferida em 03 de Junho de 2016, que julgou a presente acção totalmente procedente e atribuiu à requerente e ora Recorrida e aos filhos T... e S..., até à respectiva partilha, o uso da casa de morada de família sita na Rua P...deA..., nº..., ...º esquerdo, 1...-1... A..., fixando-se como contrapartida por esse uso, até à partilha do dito imóvel, o pagamento pela requerente e ora Recorrida, não só da sua quota-parte, como da quota-parte do requerido e ora Recorrente das mensalidades do empréstimo bancário, do seguro multi-riscos, das tarifas de conservação dos esgotos, do IMI e das quotas de condomínio, que oneram a casa de morada de família, não havendo lugar ao pagamento ao requerido e ora Recorrente de qualquer renda, apesar de se considerar que o valor locativo do imóvel é de 950,00€, sendo portanto a metade devida ao ora Recorrente de 475,00€, e de a sua metade das mensalidades e responsabilidades referidos ascenderem a 215,00€.

  1. -É da parte em que o Mmº Juiz a quo decidiu que o remanescente no montante de 260,00€ não será pago ao Recorrente, ficando antes para a Recorrida como penalização para o Recorrente e como pensão de alimentos do Recorrente para os filhos maiores, que se recorre.

  2. -Com efeito, para justificar que a Recorrida nada pague ao Recorrido pelo uso da casa que a ambos pertence até à partilha, afirma o Mmº Juiz a quo o seguinte: “Mas, se tivermos presente que a habitação em causa se destina também aos filhos comuns e que o requerido é tão responsável pelo sustento dos filhos como a requerente então aquele valor residual de renda que a requerente deveria suportar ficaria absorvida pela obrigação que também incumbe ao requerido de assegurar a habitação condigna dos filhos.” 4.-Ou seja, o Mmº Juiz a quo, com esta sentença, fixou e condenou o Recorrido a pagar uma pensão de alimentos que ninguém que lhe pediu, no âmbito de um processo que a lei processual não prevê nem permite que sirva para fixar pensões de alimentos.

  3. -Com efeito, fosse esta uma acção de alimentos – que não é, por não ter sido esse o pedido feito pela Recorrida nem algum pedido de alimentos foi apresentado pelos próprios filhos – e haveria que dar lugar ao apuramento de todos os factos e condições que poderiam justificar uma atribuição ou alteração da pensão de alimentos.

  4. -Ora, a presente acção é estritamente de atribuição do uso da casa de morada de família, e segue termos processuais totalmente distintos dos termos de uma acção de alimentos.

  5. -Não foi feita a prova da necessidade concreta de alimentos nem do valor das necessidades dos filhos, não foi feita a prova dos gastos que os progenitores fazem em concreto com os filhos, não foram ouvidos os filhos maiores, não foi feito um relatório social, nem foram ouvidas testemunhas que, nesse caso, as partes seguramente teriam indicado.

  6. -Trata-se pois, manifestamente, de um caso de excesso de pronúncia ou de pronúncia indevida, a qual consiste em o juiz conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento (al. e) do n.º1 do art. 615.º do CPC), pelo que o seu excesso configura nulidade relacionada com a 2.ª parte do n.º 2 do art. 608.º do CPC, que proíbe ao juiz ocupar-se de questões que as partes não tenham suscitado, 9.-Por...

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