Acórdão nº 3377/10.6T2SNT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelONDINA CARMO ALVES
Data da Resolução19 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I.

RELATÓRIO: BANCO, S.A., com sede na …….. intentou, em 10.02.2010, contra CARLOS ……., com domicílio profissional …… SANTOS ….., com domicílio na ……… e MARTINS …., com domicílio em ….., acção declarativa de impugnação pauliana, com processo ordinário, através da qual pede que as doações que identifica sejam declaradas ineficazes em relação a si, na medida do que se mostrar necessário para integral satisfação do crédito que detém sobre o 1º réu.

Fundamentou a autora, no essencial, esta sua pretensão da forma seguinte: 1.

-O 1º R. nos dias 20/12/2007, 04/04/2008 e 05/05/2008, doou aos 2º e 3º RR., seus filhos e por conta da quota disponível dos seus bens, o direito de 8/24 avos que possuía em cada um dos nos imóveis que identifica e que integravam o património daquele.

  1. -Acontece que, no exercício da sua actividade bancária, concedeu, na qualidade de mutuante, a pedido da firma Comércio de Automóvel, Sociedade Unipessoal, Lda., na qualidade de mutuária, diversos financiamentos empréstimos, os quais se destinavam a apoio de tesouraria da mutuária.

  2. -A mutuária obrigou-se perante o mutuante a reembolsar os referidos financiamentos por débito em conta, comprometendo-se a manter a mesma devidamente aprovisionada para aquele efeito; 4.-A mutuária subscreveu e entregou três livranças caução, avalizadas pelo 1º R., que o mutuante poderia accionar ou descontar em caso de incumprimento.

  3. -Em finais de 2007, meados de 2008, a mutuária começou a revelar sinais de risco, tendo dificuldades em cumprir os encargos dos financiamentos; 6.-A partir de 03/10/2008, 16/09/2008 e 16/08/2008 a mutuária entrou em incumprimento, ficando por cobrar o valor global de € 472.678,46 referente a capital e juros.

  4. -Quer à mutuária, subscritora das livranças, quer ao sócio/avalista das referidas livranças não são conhecidos quaisquer bens móveis ou imóveis, que possam garantir aquele crédito.

  5. -Os únicos bens capazes de garantir o crédito do A. são aqueles que o 1º R. doou aos 2º e 3º RR., seus filhos, bem sabendo o 1º R. que ao desfazer-se de todo o seu património se colocava numa situação de impossibilidade de pagar/honrar as suas dívidas que garantiu quanto prestou o aval nas três livranças subscritas pela firma Comércio de Automóvel, Sociedade Unipessoal, Lda..

    Citados os réus, sendo o 3º réu, editalmente, tendo sido igualmente citado o Ministério Público em sua representação, apenas o 1º réu apresentou contestação.

    Na contestação apresentada, em 14.03.2011, invocou o 1º réu: 1.

    -A prescrição da garantia prestada em duas das livranças identificadas pelo A.; 2.-No que respeita à livrança restante, o crédito garantido por esse aval está também garantido por penhor de seguros em valor suficiente para garantir o pagamento do mesmo.

  6. -O contrato de mútuo garantido por via de uma das livranças prescrita deixou de existir por virtude do contrato de leasing a que o financiamento estava indissoluvelmente ligado ter terminado por pagamento integral das prestações contratualmente previstas, pelo que, pelo menos desde 28 de Março de 2007, não subsiste qualquer responsabilidade relativamente à garantia prestada por aval na livrança preenchida no valor de € 189.910,72.

  7. -O valor ainda em dívida ao autor é perfeitamente comportável para que a devedora principal o possa pagar ao autor.

  8. -O autor tem constituída a seu favor pela devedora principal, hipoteca voluntária sobre imóvel que vale pelo menos € 300.000,00.

  9. -As doações referidas não impedem, nem agravam a cobrança pelo autor dos seus créditos, nem é propósito do contestante obviar a que este recebesse os seus créditos ou delapidar o património; 7.-Os bens doados são de muito pouco valor e vieram ao contestante por sucessão hereditária de seus pais, sendo o propósito da doação manter na família bens que vinham de pais e avós; 8.-A venda dos bens não renderá mais de € 5.000,00, pelo que o seu valor em nada interfere com a possibilidade do autor receber os seus créditos.

    Notificada, a autora veio responder à contestação, em 16.01.2012, alegando o seguinte: 1.

    -A acção cambiária não prescreveu, tendo a livranças ajuizadas sido objecto de Execução Comum para a qual os RR. foram citados e não lograram reagir deduzindo oposição.

  10. -Quanto aos penhores, a dívida aposta nas livranças referentes aos primeiro e terceiro financiamentos é o resultado do capital em dívida, após o resgate dos penhores; 3.

    -O segundo financiamento ficou reduzido ao montante inscrito na livrança após a feitura da escritura de compra e venda do imóvel objecto do contrato de locação.

  11. -Estes financiamentos apenas ficaram garantidos pelas livranças e pelos penhores referidos na petição inicial, pelo que impugna o alegado pelo réu contestante quanto à existência de uma hipoteca.

    Proferido o despacho saneador, em 07.05.2012, foi elaborada a condensação com a fixação dos Factos Assentes e a organização da Base Instrutória.

    Foi suspensa a instância, porquanto as partes se propunham obter um acordo para por termo ao litígio, o qual se gorou.

    Foi levada a efeito a audiência de discussão e julgamento, em 14.12.2015, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 05.01.2016, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Pelo exposto, julgo a presente ação totalmente procedente por provada e, em consequência, declaro ineficazes em relação ao A. Banco, S.A., na medida do que se mostrar necessário para integral satisfação do seu crédito, as doações realizadas entre os RR. Carlos …, Santos …. e Martins …., efetuadas através de escrituras públicas realizadas no Cartório Notarial de Lisboa, da notária A.S.A.P., nos dias 20 de Dezembro de 2007, 4 de Abril de 2008 e 5 de Maio de 2008, dos seguintes direitos: a)-Direito de 8/24 avos sobre o prédio urbano, sito em Lisboa, na Travessa de ….., freguesia de Alcântara, concelho de Lisboa, descrito na 6ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº 1071 e inscrito na matriz sob o artigo 1629 da mesma freguesia; b)-Direito de 8/24 avos sobre o Prédio urbano, sito em Cruz …, freguesia de Santa Clara, concelho de Coimbra, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o nº 2530 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo 436 da mesma freguesia; c)-Direito de 8/24 avos do Prédio urbano, sito em Cruz …, freguesia de Santa Clara, concelho de Coimbra, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o nº 2532 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo 437 da mesma freguesia; e d)-Direito de 8/24 avos sobre o Prédio rústico, sito no Casal ....., freguesia de Santa Clara, concelho de Coimbra, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o nº 2535 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo 405 da mesma freguesia.

    Inconformado com o assim decidido, o 2º réu, SANTOS …., interpôs em 02.03.2016, recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.

    São as seguintes as CONCLUSÕES do recorrente: i.

    -Considerando-se os fatos provados e não provados, já elencados neste articulado, e a análise pormenorizada dos documentos constantes nos autos, na sua maioria trazidos pelo próprio A., deve a sentença do Tribunal a quo ser reformada, uma vez que não se encontram preenchidos os requisitos da impugnação pauliana, nomeadamente quanto à comprovação, por parte do A., do montante da dívida e quanto à impossibilidade do credor, face ao ato impugnado, de obter a satisfação integral do seu crédito.

    ii.

    -E, em consequência, ser a ação julgada improcedente e serem os RR. absolvidos do pedido, mantendo-se eficazes, também em relação ao A., as doações celebradas.

    iii.

    -Termos em que e nos demais de Direito deve ser dado provimento ao presente Recurso e, por via dele, ser reformada a sentença do Tribunal a quo, tudo com as legais consequências.

    A autora apresentou contra-alegações, em 2.03.2016, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: i.-É, assim, por demais evidente, que o Tribunal valorou correctamente as provas, pelo que, nada há que alterar.

    ii.-Resulta, assim, demonstrado, que o Autor, provou, como lhe competia o montante das dívidas, o mesmo não se diga quanto aos Réus, a quem competia trazer ao processo bens penhoráveis de igualou maior valor, o que foi referido na douta sentença recorrida, a propósito do ónus da prova a cargo dos Réus, podendo, ler-se ali, o seguinte: " No que respeita à alínea h) do mesmo preceito legal, resulta igualmente preenchido o requisito, desde logo, pelo facto dos R.R. não terem logrado provar nos autos que os obrigados possuíam bens penhoráveis de igualou maior valor, aos transmitidos pelos atos de disposição impugnados.

    Na realidade, apesar do alegado pelo 1º Réu na sua contestação, nenhuma prova foi feita nos autos da existência de qualquer outro património de qualquer dos devedores principal ou garante que seja suficiente para garantir o pagamento do crédito do A. , cabendo como referimos tal prova aos RR ..

    iii.-Tendo ficado provado, o montante das dívidas, que ascendia, à data da entrada da petição inicial, em juízo, 10/02/2010, a €472.678,46, e não tendo sido trazido pelos Réus aos autos bens penhoráveis de igualou maior valor, tendo ainda ficado provado que o 1º Réu, sócio gerente da Comércio de Automóvel e avalista das livranças que caucionam as dívidas, doou, aos filhos, em 20/12/2007, 04/04/2008 e 05/05/2008, os únicos direitos sobre os imóveis de que era titular, sendo o crédito do Autor anterior às doações, mostram-se reunidos, todos os requisitos legais, para a procedência da acção, pelo que, outra não poderia ter sido a decisão do Tribunal "a quo “.

    iv.

    -Independentemente, do valor dos direitos sobre os imóveis, objecto das doações impugnadas, o certo é que, de tais doações, resulta indubitavelmente, para o credor, um agravamento da impossibilidade de obter satisfação integral do seu crédito.

    v.-É, assim, notório, que não assiste qualquer razão, nem de facto, nem...

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