Acórdão nº 947/13.4PCLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 31 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelCID GERALDO
Data da Resolução31 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em Conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: 1.–No processo nº 947/13.4PCLSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa (Instância Central Criminal – 1ª Secção - J14), o Ministério Público acusou, em processo comum para julgamento em Tribunal Colectivo, L. e M., pela prática, em co-autoria material e concurso real, de: -um crime de roubo, na forma tentada, p, e p. no artº 210º/1/ 22º e 23º do Código Penal; -e um crime de furto simples, p. e p. no artº 203º do Código Penal.

* Após julgamento, foi proferida decisão que julgou a acusação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência: A-Condenou o arguido L.: a)pela prática de um crime de roubo, na forma tentada, p, e p. no art.º 210.2/1, 22.2 e 23.2 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; b)pela prática de um crime de furto simples, p. e p. no artº 203.s do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; Em cúmulo jurídico, condenou o arguido na pena única de 2 (dois) anos de prisão.

B-Absolveu o arguido M.

, da prática dos crimes de roubo, na forma tentada, p, e p. no art.2 210.2/1, 22.2 e 23.2 do Código Penal e de furto simples, p. e p. no art.2 203.2 do Código Penal, pelos quais vinha condenado.

* Não se conformando com a decisão, interpôs o arguido L. recurso, com os fundamentos constantes da motivação e com as seguintes conclusões: I-Vem o presente recurso interposto da douta decisão do Tribunal da Comarca de Lisboa (Instância Central Criminal – 1ª Secção -J14) proferida em 6/4/2016 nos presentes Autos, que condenou o Recorrente L. na pena de dois anos de prisão, pela prática de um crime de roubo na forma tentada, II-A referida decisão, em nosso modesto entender, padece dos seguintes vícios: a)Omissão de pronúncia; b)Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; c)Errado julgamento do facto provado nº 8.

A)Da Omissão de Pronúncia.

III-No que respeita ao primeiro vício apontado, bastará ler os factos dados como provados (que nos parece desnecessário reproduzir) para verificarmos que nenhuma menção é feita à situação pessoal dos arguidos, designadamente condições sociais, nível de escolaridade, comportamento anterior e posterior aos factos, etc. E como tal, não deu o Tribunal cumprimento ao disposto no Artº 71º nº 2 do CP, que dispõe que na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, nomeadamente "... as condições pessoais do agente e a sua situação económica..." e "...a conduta anterior ao facto e a posterior a este..." (alíneas d) e e) do citado preceito).

IV-E atendendo ao dever que recai sobre o tribunal de procurar a verdade material (Art9º340º nº 1 do CPP) não podia o Tribunal, como o fez na fundamentação, justificar a ausência de referências a essas circunstâncias com a ausência dos arguidos, uma vez que os tribunais dispõem de instrumentos (designadamente mandados de detenção e condução) para os fazer comparecer em audiência de julgamento. E não o tendo feito, violou o referido Artº 340º nº 1 do CP (renunciando à descoberta da verdade material), daí resultando que a douta decisão recorrida não se pronunciou sobre factos essenciais à justa decisão da causa, não cumprindo os requisitos do artº 374º nº 2 do CP, com a consequência da sua NULIDADE, prevista no artº 379º nº 1 al- a) do mesmo diploma.

B)Da Insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada.

V-Pelas mesmas razões, a decisão recorrida padece também de insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada. De fls. 331 dos Autos resulta que não foi elaborado relatório social para determinação da pena aplicada ao Arguido, desculpando-se a DGRSP com o facto de o mesmo não ter comparecido à entrevista com as técnicas de reinserção social, sem que todavia se faça qualquer prova da convocatória para essa entrevista, ou de que o arguido a tenha recebido. Tão pouco o Tribunal insistiu na elaboração desse relatório, se necessário emitindo mandado de condução aos serviços sociais, para realização do mesmo. Mais uma vez, se violou o principio da verdade material, previsto no Artº 340º nº 1 do CPP.

VI-A importância do relatório social, sobretudo em casos como o dos Autos, em que está em causa uma pena de curta duração (2 anos) que permite a sua substituição por multa ou suspensão da aplicação da pena, é perfeitamente explícita no Douto Acórdão da Relação de Guimarães de 18/4/2016 (Processo nº 235/13.6GEBRG.G1), disponível em www.dgsi.pt, sublinhando-se que na avaliação da personalidade expressa nos factos deverão ser ponderados os elementos disponíveis de socialização e inserção do arguido na comunidade, e que na falta desses elementos, se impõe a necessidade de realização de um relatório social para julgamento (nos termos do Artº 370º do CPP), indispensável para habilitar o tribunal no conhecimento de factores actualizados, com particular incidência no juízo sobre a escolha e determinação da medida concreta da pena principal.

VII-Concluindo o mesmo Acórdão (na senda aliás do Douto Acórdão do STJ de 13-12-2007, disponível no mesmo site) que a decisão que não contenha esses elementos padece do vício da insuficiência para a decisão da matéria dada como provada do arts 410º nº 2 al. a) do CPP quanto à globalidade da fundamentação de facto, a qual é de conhecimento oficioso, e determina o reenvio do processo, nos termos dos Artºs 420º-A e 426º do CPP.

VIII-Termos em que, face ao vício ora apontado à decisão ora recorrida (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, prevista no artº 410º nº 2 al. a) do CPP, se deve proceder, nos termos dos artºs 420º-A e 426s do CPP, ao reenvio do processo ao tribunal recorrido, de forma a suprir-se essa insuficiência.

C)Do errado julgamento do facto provado nº 8.

IX-Refere o facto provado nº 8: "Seguidamente, o arguido L., exibindo uma faca, ordenou a R.P. que lhe entregasse tudo o que tivesse no bolso, tendo-lhe aquele respondido negativamente". Ora tal facto encontra-se incorrectamente julgado, sendo a prova concreta que impõe diferente entendimento dos factos ocorridos o próprio depoimento em audiência de julgamento da testemunha R.P. (Refs 20160316103527 17775605 2871051) que afirma: "Comigo veio ter um rapaz que me apontou uma faca ... eu não dei o telemóvel... ele passou para outro rapaz". E questionado sobre a identidade de quem lhe apontou a faca, não hesitou e declarou claramente: "O rapaz que me apontou a faca era o tal M....".

X-Daqui resulta inequivocamente que ao Recorrente não pode ser imputado o crime de roubo na forma tentada, pois nem a própria vítima refere qualquer participação sua nesse acto; e nem mesmo o do furto da carteira de C.D., pois é o Facto Provado nº 9 que refere; "Entretanto, um dos elementos do grupo do arguido L. pegou na carteira de C.D. que estava no chão, e puseram-se todos em fuga, fazendo-a coisa sua". A provar-se a posse de algum dos telemóveis furtados à referida C.D., quanto muito poderia ser-lhe imputado um crime de receptação. Para além da audição dos testemunhos prestados em audiência, não nos parece necessária qualquer renovação da prova, para se concluir pela absolvição do arguido do crime de roubo na forma tentada de que foi acusado, se entretanto (e como se espera) este Colendo Tribunal não determinar o reenvio do processo ao tribunal recorrido, assim se fazendo a melhor JUSTIÇA! * O Digno Magistrado do Ministério Público apresentou a sua contra-motivação concluindo que deve se negado provimento ao recurso interposto e confirmado o douto acórdão sob censura nos seus precisos termos.

* Neste Tribunal a Ex.m.ª Procuradora-Geral Adjunta concordou com a resposta do MºPº na 1ª instância, concluindo pela improcedência do recurso.

* 2.–A sentença recorrida fixou a matéria de facto da seguinte forma: DOS FACTOS PROVADOS.

Realizada audiência de julgamento, provaram-se os seguintes factos: 1.-No dia 19 de Outubro de 2013, cerca das 03h45m, o arguido L. encontrava-se na Rua da Rosa, no Bairro Alto, em Lisboa, acompanhado mais cinco indivíduos, cuja identidade não foi possível apurar.

  1. -Nessa altura também se encontravam R.P., C.D., D.M., A.C., R.V., M.G., M.P.F. e mais dois ou três jovens, todos amigos entre si.

  2. -Ao avistar este grupo, o Arguido L. e seus acompanhantes abeiraram-se daqueles.

  3. -Nessa ocasião C.D. tinha deixado no chão a sua carteira, que continha vários pertences pessoais, entre os quais um telemóvel de marca "LG" modelo P970, no valor de € 120,00 (cento e vinte euros).

  4. -Iniciou-se então um desentendimento entre os elementos de ambos os grupos, espalhando-se os seus membros.

  5. -R.P. pediu-lhes que se "acalmassem".

  6. -Então, um dos indivíduos abordou R.P.e desferiu-lhe uma forte bofetada.

  7. -Seguidamente, o arguido L., exibindo uma faca, ordenou a R.P. que lhe entregasse tudo o que tivesse no bolso, tendo-lhe aquele respondido negativamente.

  8. -Entretanto, um dos elementos do grupo do arguido L.pegou na carteira de C.D. que estava no chão, e puseram-se todos em fuga, fazendo-a coisa sua.

  9. -Alguns metros após iniciarem a fuga, atiraram a carteira para o solo, que acabou por ser recuperada.

  10. -O arguido L. foi identificado por R.P. na R. do Alecrim, momentos depois da PSP ter sido alertada.

  11. -O telemóvel de C.D. foi apreendido na posse de M.Candé.

  12. -O arguido L. agiu livre e conscientemente, em...

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