Acórdão nº 2330/16.0T8LSB-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelLEOPOLDO SOARES
Data da Resolução25 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


RELATÓRIO: AAA, residente na Praceta (...), intentou [1]acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude de despedimento contra BBB, S.A.

, com sede na Av. (…).

Juntou o competente formulário e demais elementos.

Realizou-se audiência de partes.

[2] A entidade patronal apresentou articulado de motivação do despedimento.

[3] Alegou, em resumo, que a Autora encontrava-se ao seu serviço , desde 1 de Maio de 2010, desempenhando as funções de assistente no Departamento “Assistência Lar”: Em 1 de Outubro de 2005, enviou uma mensagem de correio electrónico, através da caixa electrónica aberta a todos os colaboradores do departamento que gere o serviço de Assistência Lar, para o endereço electrónico com domínio “luzsaude.pt”, no nome “rita.barros” (caixa postal pertencente à organização onde a trabalhadora também presta serviço), a qual tinha anexos 14 ficheiros que continham informação relativa à actividade da empresa, a fornecedores, a procedimentos internos e a processos de assistência prestados pela ora Ré (…).

Com o envio dos ficheiros a Autora transmitiu a informação contida nesses ficheiros a terceiros, concretamente à entidade que explora o Hospital (…), em cujo sistema informático e de comunicações foi recebida e armazenada a referida informação.

A Autora transmitiu e permitiu a divulgação dos procedimentos internos detalhados, o “modus operandi” da sua entidade empregadora e a forma de organização dos seus processos no sistema informático – informação que constitui a base essencial do negócio da empresa.

O principal accionista do grupo empresarial “(…)” a que pertence o Hospital (…) é a (…), cuja actividade, no mercado segurador, é concorrencial com a actividade da Ré e dos clientes a quem esta presta serviço, designadamente a (…).

Concluiu pela violação, pela trabalhadora, dos deveres de respeito, lealdade e sigilo a que se encontra obrigada.

Sustenta que tal comportamento, pela sua gravidade, tornou impossível a subsistência da relação laboral.

A Autora contestou.

[4] Alegou, em síntese, que não divulgou qualquer informação relativa à actividade da Ré.

Ao endereço do correio em causa, para o qual foi enviada a informação a que se referem os autos , apenas ela tem acesso.

Por outro lado, a Ré acedeu à correspondência junto do seu correio electrónico sem o seu consentimento.

Assim, violou o disposto no art. 22º do CT.

Os documentos em causa são apenas notas de trabalho.

Não violou os deveres cuja violação lhe é imputada.

Concluiu pela ilicitude do despedimento.

In fine, mas sem que tenha deduzido, expressamente, pedido reconvencional, solicitou a respectiva reintegração e o pagamento das retribuições vencidas e vincendas até ao trânsito da acção.

[5] A Ré respondeu à contestação.

[6] Esta resposta, em 7 de Junho de 2015, foi declarada ilegal[7]nos seguintes moldes: “ I.Inadmissibilidade da resposta à contestação de fls. 318 dos autos: A Ré respondeu, a fls. 318 a 320 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido, ao articulado de contestação apresentado pela Autora.

Nos termos do nº 4 do art. 98º L do CT, defendendo-se o trabalhador por excepção ou deduzindo este reconvenção, pode o empregador responder à respectiva matéria no prazo de 10 dias.

No caso em apreço, a Autora não deduziu reconvenção (o pedido constante da contestação decorre da lei em caso de declaração de ilicitude) e apenas se defendeu por impugnação.

Por conseguinte, por não assistir à Ré a faculdade de responder à contestação, impõe-se declarar a ilegalidade do articulado de resposta, bem como a inadmissibilidade dos documentos juntos com a mesma.

Pelo exposto, determino o desentranhamento da resposta à contestação e documentos juntos.

Custas do incidente a cargo da Ré, fixando-se em uma UC a taxa de justiça.

II.Valor da causa O valor da causa será fixado na decisão final (art. 98º L nº 3 CPT.

III.Dispensa da audiência preliminar.

Visto que a audiência preliminar se destina à fixação da matéria assente e controvertida e que a causa não assume especial complexidade, declaro-a dispensada.

IV.Despacho saneador “Stricto sensu”.

  1. Pressupostos processuais.

    O tribunal é competente internacionalmente, em razão da matéria e da hierarquia.

    A Autora é dotada de personalidade e capacidade judiciárias, de legitimidade “ad causam”, e está regularmente patrocinada.

    A Ré é dotada de personalidade judiciária, de legitimidade “ad causam”, e está regularmente representada e patrocinada.

    O processo é o próprio.

    Inexistem nulidades, questões prévias ou outras excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

    * V.Dispensa de selecção da matéria assente e controvertida: Dada a simplicidade da causa, abstenho-me de fixar a matéria de facto assente e seleccionar a matéria controvertida (arts. 62º, nº 1 ex vi do art. 98º -M, nº 3, do CPT).

    * V. Meios probatórios: Admito os róis de testemunhas de fls. 138 e 301 dos autos.

    Admito a prova documental junta.

    * VI. Julgamento: Mantém-se a data designada para julgamento.

    Data supra “ – fim de transcrição.

    Irresignada , com esse despacho , em 15.6.2015[8], a Ré arguiu nulidade decisória e recorreu.

    [9] A Autora foi notificada da interposição desse recurso ( vide fls. 361), nos termos do nº 2 do artigo 81º do CPT/2010[10].

    O mesmo veio a ser admitido, mas em separado.

    [11] Todavia, a Ré veio a desistir da sua interposição , sendo que foi declarada extinta a instância de recurso.

    [12] Foi proferido despacho saneador[13].

    Dispensou-se a selecção da matéria de facto assente e controvertida.

    Realizou-se julgamento - que foi gravado - em duas sessões realizadas em 23-6-2016 e 12-7-2016 ( vide actas de fls. 367 a 375 e 379 a 389).

    Por despacho constante da acta de fls. 379 a 389 , foi proferida decisão quanto à matéria de facto provada e não provada, que não foi objecto de reclamação.

    Foi proferida sentença[14]que - em sede dispositiva - teve o seguinte teor: “Por todo o exposto, decide este Tribunal julgar a presente acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolver a Ré (…), do pedido formulado pela Autora (…) Custas pela autora.

    Valor da causa: € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) .

    Notifique e registe” – fim de transcrição.

    A Autora recorreu.

    [15] Concluiu que: “1–A Recorrida não podia ter tido acesso às mensagens electrónicas da Recorrente por força do disposto no artigo 22º do CT e arts. 34.º, n.º 1, 32.º, n.º 8 e 18.º da CRP.

    2–Que a prova obtida com violação do artigo 22º do CT e da deliberação nº 1638/2013 de 16 de Julho de 2013 da CNPD é nula.

    3–A Recorrente não divulgou o conteúdo da mensagem electrónico a terceiros e resulta dos autos que a Recorrida não logrou provar que tal acontecido, pois apesar do endereço (…), estar alojado no grupo (…) só a aquela tinha acesso ao mesmo.

    4–Não estando provado que a Recorrente divulgou qualquer informação a terceiros como consta da acusação do processo disciplinar não existe violação dos deveres laborais, pelo que o seu despedimento é ilícito e também não existe a impossibilidade da relação de trabalho com a Recorrida.

    5–O tribunal “a quo” decidiu mal quando considerou que estavam quebradas as bases de confiança entre a Recorrida e a Recorrente, e decidiu pela licitude do seu despedimento, pois se a prova produzida é nula, por violação do artigo 22º de CT e porque não está provado, nos autos, que a tenham sido divulgados os conteúdos das mensagens, a terceiros, só uma decisão podia ser dada que é o despedimento da Recorrente foi ilícito.

    6–O Tribunal “a quo” decidiu ainda erradamente quando não considerou a alegação da Recorrente de que a prova produzida pela Recorrida era nula e consequentemente o despedimento promovido pela Recorrida era ilícito.“ – fim de transcrição.

    Assim, defende que deve ser proferido acórdão que substitua a decisão proferida pelo Tribunal “a quo” e considere que não existe causa para o despedimento da Recorrente por a prova produzida pela Recorrida ser nula, nomeadamente por divulgação por terceiros do conteúdo da mensagem electrónica o ser visto que o endereço electrónico para onde foi remetido é apenas de acesso pessoal.

    A Ré contra alegou.

    [16] Concluiu que: “ A.

    Considerando que a comunicação enviada pela A., ora Recorrente, continha apenas ficheiros, como anexos da mesma, cujos nomes coincidiam com o “assunto”, que foi enviada a partir da caixa postal electrónica do Departamento Assistência ao Lar, da ora Recorrida, sendo esta de utilização colectiva, que não continha qualquer espécie de mensagem no corpo do mail, antes se resumindo a uma transferência de ficheiros de caráter profissional do servidor da ora Recorrida para o servidor da organização (…), não pode uma tal comunicação ser considerada mensagem de natureza pessoal, para nenhum efeito, designadamente, para os efeitos previstos no art. 22º do Código do Trabalho.

    B.

    O endereço (…) não constitui um endereço de uma caixa postal pessoal, mas sim de uma caixa postal da organização empresarial onde a A./Recorrente se insere e para quem desenvolve a sua actividade profissional, não tendo sido feita prova de que apenas ela, ora Recorrente, tinha acesso às mensagens enviadas para o identificado endereço postal.

    C.

    As circunstâncias em que a comunicação enviada pela ora Recorrente para a (…) foi detectada, permitem também concluir que não houve um acesso indevido da Coordenadora do Departamento à referida comunicação, desde logo porque a R. desconhecia que o endereço electrónico actualmente utilizado pela ora Recorrente era aquele para onde os ficheiros haviam sido enviados.

    D.

    Assim, bem andou a douta sentença recorrida, ao considerar legítimo o acesso e a utilização da comunicação que fundamentou o despedimento da A./Recorrente, por não encontrar fundamento legal que a excluísse como meio de prova.

    E.

    O que motivou o despedimento da ora Recorrente foi o facto de esta ter transmitido a informação contida nos ficheiros anexados ao mail que se discute no presente processo, para o domínio de outra organização, na medida em que...

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