Acórdão nº 769/14.5TAFUN.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução08 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: 1.–Nestes autos de processo comum nº 769/14.5TAFUN e após a realização da audiência de julgamento, o tribunal singular condenou, pelo cometimento em autoria material de um crime contra a genuinidade, qualidade ou composição de géneros alimentícios e aditivos alimentares, previsto nos artigos 2.°, 3.°, n.° 1, e n.° 3, 24, n.° 1, alínea c), 81, alíneas a) e e), e 82, n.° 1, alínea b), n.° 2, alínea c), do Decreto-Lei n.° 28/84, de 20 de Janeiro, a arguida L. II - DPL, S. A., na pena de noventa dias de multa, à taxa diária de quarenta euros, o arguido J.S.P., na pena de sete meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, a arguida G.F.E., na pena de sete meses de prisão, substituída por duzentos e dez dias de multa, à taxa diária de sete euros, e na pena de setenta dias de multa, à dita taxa diária, e em cúmulo material destas penas na pena única de duzentos e oitenta dias de multa, à taxa diária de sete euros e o arguido C.G.C., na pena de sete meses de prisão, substituída por duzentos e dez dias de multa, à taxa diária de seis euros, e na pena de setenta dias de multa, à dita taxa diária, e em cúmulo material destas penas na pena única de duzentos e oitenta dias de multa, à taxa diária de seis euros.

Os arguidos L. II - DPL, S. A., G.F.E. e J.S.P. interpuseram recurso e da motivação extraiu as seguintes conclusões (transcrição): 1.–Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida em 2 de Setembro e depositada em 5 de Setembro, pela qual os ora Recorrentes foram condenados pela prática, a título de dolo, de um crime contra a genuinidade, qualidade ou composição de géneros alimentícios e aditivos, previsto e punido nos termos do. 24.°, n.° 1, al. c), do Decreto-Lei n.° 28/84, de 20 de Janeiro.

  1. –A douta sentença proferida incorreu em erro na apreciação da matéria de facto, porquanto dá como provados factos relativamente aos quais foi efectuada prova cabal de se não terem.

  2. –O douto Tribunal a quo deu como provado o facto sob n.° 7 e como não provados os factos: 8.°, 9.°, 11 .°a 22.° da Contestação apresentada por L. II e 9o a 31.° da Contestação apresentada pelos Arguidos G.F.E. e J.S.P.. Salvo o devido respeito por entendimento diverso o douto Tribunal a quo não poderia ter dado como provados e não provados os factos enunciados por ter sido produzida, nos autos e em audiência de julgamento, prova em sentido contrário.

  3. –Contrariamente ao afirmado na douta sentença recorrida e no que aos factos provados e não provados supra transcritos importa o depoimento da testemunha JCT a partir do minuto 00:04:40 e até ao minuto 00: 22:00 do seu depoimento.

  4. –Importa também ter presente o depoimento da testemunha SF a partir do minuto 00:01:30, bem como o depoimento da testemunha MPC a partir do minuto 00:01:36 , aqui se dando por integralmente reproduzidos os depoimentos supra transcritos para os devidos e legais efeitos.

  5. –Os depoimentos supra transcritos determinariam desde logo o afastamento do facto provado sob n.° 7 da acusação, porquanto o depoimento logo do Inspector da IRAE JCT, demonstra que o Recorrente J.S.P. não se encontrava no estabelecimento em apreço, não acompanhou a visita efectuada à loja, sequer foi chamado a tomar nota da ocorrência em representação da empresa.

    Inexiste assim, relativamente à Recorrente qualquer sustentação de facto para a condenação pela prática dos factos em apreço.

  6. –Mais demonstra ser do conhecimento directo da IRAE, na pessoa dos seus inspectores, que o Recorrente J.S.P. exerce funções de representação da Arguida L. , exercendo fiscalização em todas as lojas da RAM, incluindo na de Porto Santo, que se situa geograficamente numa ilha distinta da Madeira. Por tal facto e conhecimento o Recorrente foi constituído arguido, inexistindo, no entanto, qualquer facto objectivo ou subjectivo praticado pelo Recorrente que determinasse a sua identificação como agente material do ilícito.

  7. –Acresce que resulta devidamente demonstrado que as funções exercidas pelo Recorrente J.S.P. não são ao nível da operação de loja, mas numa hierarquia superior na qual contacta essencialmente com a gerência, não lhe cabendo de facto a verificação de validades em loja. Extraindo-se dos depoimentos transcritos que o Recorrente J.S.P. não teve conhecimento, senão posterior ao sucedido, da ocorrência do ilícito detectado pela IRAE, não se podendo, consequentemente afirmar, como o faz a douta sentença recorrida que o mesmo se encontrava com capacidade de decisão e que se conformou com o resultado sucedido.

  8. –Forçoso será concluir que o Recorrente não teve qualquer intervenção, conhecimento ou sequer consciência do facto que constitui infracção ou seja a existência de produtos fora do prazo de validade, senão posterior, não estando assim presente no momento da prática do ilícito, não só em posição de o praticar enquanto agente material, sequer de o impedir pela total ausência de conhecimento, sequer consciência do mesmo.

  9. –Igual entendimento se deverá extrair quanto à Recorrente G.F.E., com efeito, a Recorrente não obstante encontrar-se presente na data dos factos não teve qualquer intervenção, nem consciência dos mesmos. Apesar das suas funções, enquanto gerente da loja a verdade é que no caso em apreço e como resulta claramente do depoimento da testemunha MPC, na data em apreço a Recorrente questionou a testemunha sobre o estado e existências de frangos tendo sido informada por aquela que tido estava em conformidade. Não se pode como tal falar em capacidade de decisão para agir de modo diferente, sequer de conformação com o sucedido. A Recorrente G.F.E. foi induzida em erro quanto às validades pela testemunha supra, não se tendo conformado com qualquer situação de ilicitude.

    Inexiste assim, relativamente à Recorrente qualquer sustentação de facto para a condenação pela prática dos factos em apreço.

  10. –Mais se diga que sequer se vislumbra fundamento ou sustentação factual para que os Recorrentes, pessoas singulares se mostrem condenados a título de dolo, porquanto a matéria dada como provada é claramente omissa em demonstração de factos que configurem sequer o preenchimento dos elementos objectivos do ilícito. Inexiste qualquer descrição factual de qualquer acto praticado pelos Recorrentes que configure a prática objectiva do ilícito, mostrando-se o incumprimento das suas tarefas de supervisão manifestamente afastado pelos depoimentos prestados e supra transcritos.

  11. –Os próprios inspectores da IRAE concretamente a testemunha JCT, foi peremptório em afirmar que a identificação dos Arguidos pessoas singulares, nessa qualidade resulta somente do conhecimento das funções dos mesmos e não por apreensão de qualquer facto que determinasse ou demonstrasse a prática do ilícito por qualquer deles.

  12. –A matéria de facto é omissa na demonstração de actos dos Recorrentes que configure a possibilidade de imputação do ilícito a título de dolo.

  13. –A mera constatação da existência de frangos com prazo de validade expirado, nas 24 horas da data da visita recorde-se, não preenche o elemento subjectivo do ilícito, a acusação é sustentada numa constatação objectiva e nada mais, sendo omissa na real apreensão de quem foram os agentes materiais e no apuramento das suas intenções/motivação.

  14. –Inexiste sustentação para a condenação dos Recorrentes, pessoas singulares quer na prática objectiva, quer no elemento subjectivo do ilícito.

  15. –Igualmente terá de concluir-se pela ausência de ilicitude na conduta da Recorrente L. ., porquanto a factualidade supra transcrita e alegada em sede de contestação pela Recorrente L. , mostra-se plenamente demonstrada, concretamente a existência de um departamento de controle de qualidade e segurança alimentar, a existência de instruções de trabalho, um plano de formação e prestação de formação aos trabalhadores, bem como a existência de processos disciplinares na sequência da situação e consequente apuramento de responsabilidades.

  16. –A prova produzida demonstra que o facto ilícito detectado resulta de uma falha humana, praticada por funcionários, em incumprimento das normas e procedimentos estabelecidos pela Recorrente. Acresce que os mesmos não integram os órgãos societários, ou de qualquer modo detêm poderes de representação. Motivo pelo qual não se encontram preenchidos os pressupostos de condenação da pessoa colectiva.

  17. –Mal andou o douto Tribunal a quo, na apreciação da prova produzida e no entendimento extraído quanto aos factos provados e não provados os quais deverão ser tidos no sentido oposto ao adoptado pelo Tribunal a quo, consequentemente, deverá a douta sentença recorrida ser revogada com as legais consequências.

  18. –Caso assim se não entenda, o que por dever de patrocínio se equaciona sempre se dirá que a douta sentença recorrida condenou os Recorrentes em moldura penal excessiva, desde logo, porquanto decidiu pela imputação a título de dolo, o que se mostra claramente afastado em face da prova produzida.

  19. –Na condenação do Recorrente J.S.P. foram tidos em consideração antecedentes reportados a decisões transitadas em julgado em 2002 e 2005, ou seja, relativamente às quais se encontra já decorrido o prazo máximo para PDCmento definitivo, devendo tais antecedentes ser desconsiderados, não se vislumbra fundamento para o decretar de pena de prisão, ainda que suspensa na sua aplicação atenta a manifesta ausência de gravidade dos factos apurados.

  20. –É excessivamente gravosa a pena decretada à Recorrente G.F.E. porquanto como a douta sentença em crise bem refere se trata de uma situação primária.

  21. –Excessivo se mostrando igualmente o valor diário fixado à Recorrente L. desde logo porque não resultam demonstrados quaisquer factos da existência de perigo para a saúde pública, por outro lado, não pretendendo menorizar a gravidade resultante da existência de registo criminal a este propósito, não deixará de se notar que se trata de 6 registos, com datas de...

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