Acórdão nº 470-12.4TYLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução09 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

1.-Relatório: A , intentou acção especial nos termos do disposto no art. 1484°-B do pretérito Código de Processo Civil ( anterior ao de 2013), contra B ( Lda ) e C , peticionando que, julgada a acção provada e procedente : a)-Seja decretada a suspensão provisória do Requerido do cargo de gerente da sociedade B ; b)-Seja o Requerido destituído do cargo de gerente da sociedade B.

1.1.-Para tanto, alegou o autor, em síntese que : -Requerente e Requerido são sócios da sociedade Requerida, sendo titular de uma quota de €1.750,00 e , o requerido, de uma quota de €500,00; - Porém , o requerido C, para além de sócio gerente da 1ª Ré , é também sócio e gerente da sociedade D ; -Ora, não obstante a D , ter por objecto a mesma actividade da Ré Renapel, sendo sua concorrente directa, o 1º Réu , sem o conhecimento ou autorização do Requerente ou dos demais sócios da sociedade Requerida, instalou no espaço desta a sociedade D; -Ademais, a D, nunca ofereceu qualquer contrapartida pela utilização das instalações da B, sabendo de resto o 2º Réu que a situação da 1ª Ré é débil em termos económicos e financeiros ; -A actuação do Requerido C, é , assim, incumpridora dos deveres de um gestor criterioso e ordenado, na medida em que cedeu gratuitamente um espaço da sociedade Requerida a terceiro, lesando assim os seus interesses, sendo a sua conduta violadora dos deveres de cuidado e de lealdade do artº 64º,nº1, do CSC.

1.2.-Após citação de ambos os RR, apenas o réu C apresentou contestação , deduzindo no essencial impugnação motivada, maxime alegando que o Requerente sabia e consentiu na instalação da D, no armazém B do prédio sito em Frielas , e , ademais, entre ambas as sociedades não existe sequer qualquer concorrência, sendo ao invés a D cliente da Ré.

Termina o réu C, por pugnar pela improcedência da acção e, consequentemente, pela sua absolvição do pedido.

1.3.-Ouvidos os demais sócios da sociedade Requerida [ (…) ] , foi designada uma data para a realização da audiência , e , concluída a mesma ( em 21/9/2016 ) , veio em 7/10/2016 a ser proferida decisão que : a)-Considerando o tempo transcorrido desde a propositura da acção, julgou que há muito se perdeu a utilidade quanto ao pedido de suspensão, pelo que , em sede de adequação formal do processado, decide conhecer apenas do pedido principal de destituição do Requerido C das funções de gerente da sociedade .

b)-Julga totalmente procedente, por provada, a acção e, consequentemente, determina a destituição do requerido C, casado, contribuinte fiscal n.° 000000430, residente na Praceta (…) Odivelas, do exercício das funções de gerente na sociedade B., pessoa colectiva n.° 501 712 500, com sede na Rua …… n.° 7, Armazém-A, Frielas, 2660-023 Loures.

c)-Fixa as Custas pelos requeridos - art. 527° n.° 1 e 2 do Código de Processo Civil.

1.4.-Notificado da sentença identificada em 1.3., e da mesma discordando, veio então o requerido C, interpor recurso de apelação, que admitido foi e com efeito meramente devolutivo , formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões: I-A acção baseava-se numa única circunstância de facto: ter sido consentida pelo Recorrente a ocupação de um Bloco de armazéns da B pela sociedade D, de que este é sócio e que ele domina, sem ter havido ainda pagamento de renda.

II.-Desse facto, o Recorrido extraiu três fundamentos: i) que a dita ocupação foi um acto surpreendente para o gerente Autor, ora Recorrido, feito à sua revelia; ii) que esse facto violava uma obrigação de não concorrência e iii) que havia lesão para o património social pelo não ingresso das rendas; III.-Dos três fundamentos supra referidos, os dois primeiros improcederam categoricamente por ter sido provada a sua falsidade, resultando até nítida uma actuação do recorrido reveladora de má-fé. Com efeito, trata-se de factos cuja falsidade o Recorrido conhecia muito bem.

IV.-Pelo que, não será despiciendo chamar à colação o artigo 542.°, n.° 2 alíneas b) e a) do NCPC, que estipula que, diz-se de litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave (...) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa (...) - cf. artigo 542.°, n.° 2 alínea b) do CPC. E quem, da mesma forma tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar - cf. artigo 542.°, n.° 2 alínea a) do NCPC.

V.-O único fundamento em que o ora Recorrente decaiu foi nas consequências que se retiraram da omissão de pagamento, até à data, de rendas pela D.

VI.-Tal facto, como adiante se demonstrará, não é justificativo de uma justa causa de destituição. Para chegar a essa conclusão, importa olhar para o caso concreto e começar por coligir os factos essenciais para se formar uma decisão adequada.

OS FACTOS RELEVANTES PARA O JUÍZO A EFECTUAR NESTE CASO VII.-Da decisão sobre a matéria de facto lavrada nos autos retira-se que: a.-A B é uma sociedade familiar, pertencente a duas famílias - a do Recorrido e a do Recorrente - cujo propósito único é a construção e comercialização de um parque de armazéns em Frielas.

b.-A B só existe como veículo societário para duas famílias levarem a cabo um projecto de construção de armazéns.

c.-A B não possuía qualquer património, nem gerava rendimentos suficientes para sustentar a construção e foi necessário o financiamento por parte dos sócios para ocorrer a todas as despesas (matéria de facto dada como provada, factos 21 e 22).

d.-Ficou acordado que o ora Recorrente e ora Recorrido e respectivas famílias financiariam a B em partes iguais,- 50%/50% - quer através de aportes directos de dinheiro ou outros bens, quer por avalização de empréstimos bancários (matéria de facto dada como provada, facto 23).

e.-A paridade de aportes financeiros por cada uma das famílias, em cumprimento do acordo a que se refere o facto provado 23 era, assim, o cerne deste negócio, o "centro nevrálgico" da actividade societária, o "norte" da aferição de quais os interesses sociais dignos de protecção.

f.-O acordo de aporte paritário de financiamentos à B foi sendo cumprido e levado à prática desde o começo da execução até sensivelmente meados de 2005. (matéria de facto dada como provada, facto 24) g.-Sendo que a partir de 3 de Janeiro de 2006, o Recorrido, deixou de o cumprir e passou a ser o Recorrente, sozinho, a financiar a sociedade, com um intervalo de 3 aportes do Recorrido entre Maio e Agosto de 2006. (matéria de facto dada como provada, facto 26) h.-Em vez de cumprir o supra referido acordo de financiamento paritário da sociedade, o Recorrido deixou que se cavasse um enorme desequilíbrio nos aportes financeiros efectuados por ambas as partes (um gigantesco saldo €1.729.818,63 de dinheiro posto a mais pelo Recorrente!).

i.-Para além do Recorrido não fazer os pagamentos devidos para o financiamento da Sociedade, recusou-se a assinar documentos bancários necessários para a obtenção de financiamentos fulcrais por parte da B (matéria de facto dada como provada, facto 28).

j.-Foi o ora Recorrente quem geriu toda a empreitada de construção dos armazéns, inclusivamente foi ele quem resolveu todos os problemas daí decorrentes, nomeadamente um litígio com o empreiteiro da obra. (matéria de facto dada como provada, facto 29).

k.-Toda a estrutura administrativa da B era providenciada pelo ora Recorrente e a sua empresa - D ( matéria de facto dada como provada, facto 30 e 31 ).

l.-O ora Recorrente viu diminuída a sua capacidade de gerir os seus outros negócios, dos quais, aliás, vive, posto que a B é uma sociedade que não gera rendimentos e só exige financiamentos, m.-A circunstância do profundo desequilíbrio nos aportes financeiros supra referida dominava naturalmente a relação entre os sócios, ressaltando a absoluta imperatividade de se efectuar um acerto de contas e se sanar o gigantesco prejuízo que assolava o Recorrente, n.-Até final de Julho de 2011, a D tinha os seus armazéns em Sacavém, através de arrendamento, (matéria de facto dada como provada, facto 32 e 33).

o.-Desde que foi iniciada a construção dos Armazéns da B, que ficou aceite que a D, se o desejasse, iria ocupar um dos Blocos dos Armazéns, (matéria de facto dada...

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