Acórdão nº 378/14.9PBFUN.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelSIM
Data da Resolução14 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.

-Relatório: No processo comum singular n.º 378/14.9PBFUN da Instância Local – Secção Criminal (Juiz 2) do Funchal da Comarca da Madeira, por sentença de 15-07-2016 (cfr. fls. 210 a 225), no que agora interessa, foi decidido: «Por tudo o exposto, julga-se a acusação apenas parcialmente procedente e, em conformidade, absolve-se o arguido A. da autoria do crime p. e p. pelo art° 152°, n°s 1, al. b) e 2 do C. Penal e do crime p. e p. pelo art° 212°, n° 1 do C. Penal e condena-se este mesmo arguido, pela autoria do crime p. e p. pelos art°s 143°, n° 1, 145°, n° 1, al. a) e 132°, n° 2, al. b) do C. Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo período de 1 (um) ano e, pela autoria do crime p. e p. pelo art° 143°, n° 1, do C. Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de 5 (cinco) euros, perfazendo um total de 400 (quatrocentos) euros.

Vai ainda o arguido condenado no pagamento das custas do processo, com 4 (quatro) U. C. de taxa de justiça.

Julga-se totalmente procedente o pedido cível deduzido por "Serviço de Saúde da R. A. M., E. P. E.", condenando-se o demandado A. ao pagamento à demandante do montante de 128,91 euros (cento e vinte e oito euros e noventa e um cêntimos), acrescido de juros moratórios, à taxa anual de 4%, contados desde a notificação do pedido e até integral pagamento.

Sem custas cíveis (cfr. art° 4o, n° 1 al. n) do R. C. P.).

Remeta boletins ao registo criminal, após trânsito em julgado.

Notifique.» O arguido A.

não aceitou esta decisão e dela recorreu (cfr. fls. 229 a 241 v.º), extraindo da motivação as seguintes conclusões: «i.-Vem o arguido, A., ora Recorrente, interpor recurso da Douta sentença proferida nos autos à margem referenciados, que o condena na prática de um crime de ofensas à integridade física agravada previsto e punido pelos artigos 143.° n.° 1, 145.° n.° 1 alínea a) e artigo 132.° n.° 2, alínea b) do Código Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo período de 1 (um) ano e bem assim pela autoria de um crime de ofensas à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.° n.° 1 do Código Penal, na pena de multa de € 400,00 (Quatrocentos euros).

ii.-O ora Recorrente insurge-se contra douta sentença.

iii.-Prima, douta acusação proferida fls ..., é, em nosso entendimento, nula.

iv.-Na verdade, os factos imputados na acusação de 1 a 5, ao Recorrente e que reportam ao crime de violência doméstica, não deveriam ter figurado novamente do libelo acusatório, na medida em que já tinham sido objeto de uma outra acusação, acusação essa que culminou na suspensão provisória do processo, processo n.° 635/08.3PDFUN, tendo o arguido, como douta sentença impugnada reconhece, cumprido as injunções a que foi sujeito (artigo 281.° do CP).

v.-In casu, o libelo acusatório narra factos e deduz acusação por crimes que já foram punidos e que, inclusive como reconhece sentença impugnada, para os quais não tem legitimidade para a deduzir, pelo que, se entende, pela sua nulidade vi.-Por outro, o libelo acusatório, sem legitimidade, imputa ao arguido o crime de dano previsto e punido pelo artigo 212.° do Código Penal.

vii.-Tal facto é (re)afirmado no preâmbulo da douta sentença impugnada, que refere que sendo este um crime de natureza semi-pública, e não tendo havido queixa quanto a este, e "não se tendo especificado a conduta danosa", não tem o MP legitimidade para deduzir a acusação.

viii.-Ainda Assim, douto Tribunal a quo leva a factologia a julgamento, considerando-os como provados (vide sentença impugnada - FACTOS PROVADOS RELEVANTES).

ix.-MAS a fim de "emendar a mão", absolve o Arguido, ora Recorrente destes tipos objetivos de ilícitos criminais, ALTERANDO A SUA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA, subsumindo-o o suposto crime de violência doméstica em ofensas à integridade física qualificada.

x.-Neste senso, o libelo acusatório proferido, sofre de uma nulidade.

xi.-A douta acusação viola assim o princípio de caso julgado; os factos imputados ao arguido no presente processo, já tinham sido objeto de arquivamento no processo n.° 635/08.3PDFUN, tendo o arguido, como douta sentença impugnada reconhece, cumprido as injunções a que foi sujeito.

xii.-Como foi também violado o princípio ne bis idem, expresso no artigo 29.° n.° 5 da CRP.

xiii.-In casu, isso sucedeu (Vide FACTOS PROVADOS RELEVANTES), xiv.-Nulidade, essa que condicionou todo o processo, pois toda a acusação, toda a produção de prova, designadamente testemunhal da acusação baseou-se nos factos integradores do crime de violência doméstica (Basta ver a matéria dada como provada na sentença impugnada).

xv.-Termos em que, deve-se declarar nula a acusação e absolver o arguido de todos os crimes imputados.

xvi.-Mais, ainda que não se considere o supra referido, tais factos e que constam de 1 a 5 do libelo acusatório, deveriam ter sido expurgados nos termos do artigo 311.° do CPP, xvii.-Então se aqueles factos.... os de violência doméstica ... JÁ FORAM PUNIDOS, e os e de dano ... o MP não tem legitimidade os mesmos não podem, fazer parte da acusação, e não podem, por conseguinte, constar dos factos provados e respetiva fundamentação jurídica de douta sentença impugnada.

xviii.-Pelo que, entende, salvo melhor opinião, o ora Recorrente, que o Tribunal a quo deveria ter rejeitado a acusação.

xix.-e que a mesma, pelos vícios que se imputam, padece de nulidade, pois o "direito penal é direito penal do facto e não do agente".

xx.-Mas, por hipótese académica que se suscita dada a jurisprudência, afigura-se-nos ainda, porém, que o se o referido vício da acusação não provocar a sua nulidade, provocará a sua improcedência na totalidade.

xxi.-Considerando, o Acórdão da Relação do Porto, processo n.° 581/10.0GDSTSP1, de 27/06/2012, em que foi relator Pedro Vaz Pato: Será nula, nos termos do referido artigo 283°, n° 3, b), uma acusação que não contem a narração dos factos imputados ao arguido. Se a acusação contém a descrição desses factos e eles não constituem crime, porque deles não constam factos que consubstanciem um, ou maisT dos elementos constitutivos de um qualquer crime, a acusação será improcedente, e não nula.

xxii.-Sem prescindir, do supra alegado, entende-se, ainda, que douta sentença enferma de nulidades.

xxiii.-Na verdade, Douto Tribunal a quo, dando-se conta, na elaboração da sentença de tais nulidades e ilegitimidades, "absolve" o arguido do crime de violência doméstica e do dano, xxiv.-Contudo, dá como provados, factos que constam da acusação e que fazem parte do tipo objetivo de ilícito do crime de violência doméstica e que não poderiam entrar no presente processo, sob pena da violação do princípio ne bis in idem, xxv.-encadeando-os, com o facto, alegadamente ocorrido em Março de 2014, subsumindo-o já como crime de ofensa a integridade física agravada, e condenando o Recorrente numa pena de 10 meses suspensa na execução por um ano.

xxvi.-Entendemos aqui, à melhor opinião, que o Tribunal a quo, além de ter julgado o arguido 2 vezes pelo mesmo crime, (de violência doméstica), conforme se denota da matéria provada e se poderá inferir de partes dos depoimentos que infra se debitará, xxvii.-alterou de forma substancial os factos descritos na acusação e bem assim alterou a sua qualificação jurídica, xxviii.-e não cumpriu os termos dos artigos 358.° e 359.º do CPP, quer dando uso do contraditório ao Recorrente, e ou procedendo a sua denúncia ao MP para proceder criminalmente, caso fossem autonomizáveis, não sendo, deveria ter absolvido o arguido.

xxix.-Douto Tribunal a quo, condenou o arguido, por factos diversos dos descritos na acusação e também alterou a sua qualificação jurídica.

xxx.-Pelo que, em nosso entender, douta sentença é nula, por violação dos artigos 379.° n.° 1, alínea b), 358.°, 359º, e artigo 410.° n.° 3 do CPP.

xxxi.-Entendemos ainda com o devido respeito, que a nosso ver, existe uma contradição insanável da fundamentação de sentença impugnada.

xxxii.-In casu, douto Tribunal a quo, pese embora ter proferido, a falta de legitimidade do MP para ter pronunciado o Recorrente pelo crime de violência doméstica, já que "(...) este crime (...) já foi objeto de arquivamento (...) em virtude de o arguido ter cumprido as injunções impostas (...) tem força de caso julgado. (...) Tendo as cumprido, uma nova acusação por estes factos significaria uma clara violação do princípio ne bis in idem, segundo o qual uma pessoa não pode ser julgada duas vezes pelo mesmo facto. Seguramente que o arguido pode ser novamente julgado e condenado por um crime de violência doméstica, mas tendo de ser desconsideradas os factos já objeto do anterior arquivamento (...) Toda a factualidade descrita nos cinco primeiros parágrafos da acusação já foi especificadamente imputada ao arguido, a título de violência doméstica, tendo ele já cumprido injunções, como efetiva punição por esse crime, pelo que tal pedaço de vida já não poderá servir para conjugado factos posteriores fundamentar a condenação do arguido pelo crime de violência doméstica (...) xxxiii.-vem dar tais factos como provados.

Neste sentido Vide factos provados relevantes " (...) o arguido e A.N. foram casados entre si, desde 30/07/84 até ao ano de 2015.

Tem nove filhos (...) Durante o período de vida em comum, por diversas vezes, em datas não concretamente apuradas, o arguido, no interior da residência comum, agrediu A.N. Nunes, desferindo-lhe bofetadas na cara, pontapés nas pernas e puxando-lhe os cabelos, e dirigiu-lhe impropérios, tais como "puta do caralho", e intimidações "como eu vou matar-te".

O arguido ingeria, por vezes, bebidas alcoólicas em excesso.

Com o intensificar das agressões, ameaças e insultos que atingiam a A.N.... esta separou-se do arguido, em meados de 2012 (...) (...) No dia 4 de Março de 2014 (...) Este ao vê-la, interpelou-a, com a expressão "A.N. quero falar contigo".

Tendo-o ela ignorado, ele munido...

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