Acórdão nº 659/12.6TVLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa .

1.-Relatório: A e B , intentaram acção declarativa de condenação, contra C ( BANCO ) , peticionando a condenação da Ré a restituir à herança de D, representada pelos herdeiros autores, a quantia de € 61.000,00, indevidamente paga, acrescida de juros vencidos à taxa legal de 4% ao ano desde 15.01.2008 até integral pagamento, sendo os já liquidados no valor de €10.201,21.

1.1.-Para tanto invocaram os AA, em síntese, que : -Sendo os autores sobrinhos e legítimos herdeiros de D, falecida em Janeiro de 2008, certo é que à data do falecimento da referida D , em Janeiro de 2008, era a mesma cliente da ré, sento titular de uma conta na agência de Aveiro; -Sucede que, tendo a referida D falecida em 12/1/2008, certo é que, veio posteriormente a ser debitado junto da ré um cheque no valor de €61.000,00, pretensamente emitido pela falecida, com datada de 15.01.2008; -O referido cheque, estando é certo emitido à ordem de E, agente da GNR, a verdade é que nele mostrava-se aposta uma falsa assinatura de D, pois que efectuada pelo referido E, o qual de resto veio a ser acusado criminalmente ; -O Cheque em causa, apesar de integrar uma assinatura falsa de D, apenas foi pela Ré C pago porque não cumpriu esta última com a sua obrigação de verificar a veracidade da assinatura no cheque aposta, pois que, a assim ter procedido, como de resto lhe era exigido, facilmente teria constatado estar na presença de um título falsificado.

1.2.-Após citação da Ré, veio a C.

contestar a acção , por excepção [ excepcionando a preterição de litisconsórcio necessário activo ] e por impugnação motivada , aduzindo que , para além de o cheque em causa nos autos ter sido depositado numa máquina ATS em 13.01.2008 , para crédito da conta à ordem de E, a verdade é que , não apenas a assinatura nele aposta foi conferida por semelhança com a constante na ficha de assinaturas respeitante à abertura da conta , como, ademais, veio a concluir-se existir alguma semelhança entre a assinatura constante do cheque no campo respeitante ao sacador e a constante da mencionada ficha de assinaturas .

Destarte, porque a assinatura constante do cheque é idêntica à constante da ficha de assinaturas no que concerne aos seus elementos característicos, o banco Réu acabou por pagar o cheque, sendo que, ainda assim, e dado o montante aposto no cheque, também telefonou previamente para o titular da conta no período que antecedeu o pagamento do cheque, mas sem qualquer sucesso.

1.3.-Após réplica dos AA, foi proferido despacho a deferir incidente de intervenção principal provocada da co-herdeira da falecida como associada dos autores e , bem assim, foi indeferido o incidente de intervenção principal provocada de E, vindo porém, mais tarde, a proferir-se decisão de admissão de incidente de intervenção provocada acessória de E e ordenada a sua citação.

1.4.-Citado o interveniente E, nada veio dizer, e , realizada uma audiência prévia, nela foi proferido despacho saneador, tabelar, fixando-se a matéria de facto assente e a base instrutória da causa, peças estas que não foram objecto de qualquer reclamação.

1.5.-Por fim, realizado que foi o julgamento com observância do formalismo legal, concluído o mesmo e conclusos os autos para o efeito, foi proferida a sentença, sendo o respectivo segmento decisório do seguinte teor (…) Decisão: Por todo o exposto, julga-se a presente acção improcedente e, em consequência, absolve-se a Ré dos pedidos formulados pelos autores.

Custas pelos autores e interveniente E Registe e notifique” Lisboa, 21.07.2016”.

1.6.-Notificados da sentença identificada em 1.5., e da mesma discordando, vieram então os AA A e B, interpor apelação, apresentando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões : 1ª-A convicção da M. Juiz a quo, descrita e vertida na sentença recorrida, fundada na prova pericial e testemunhal produzida nos autos está em total contradição com a prova produzida, pelo que não resta dúvida sobre o manifesto erro de julgamento da matéria de facto e de direito subjacente à sentença recorrida.

2a-A conclusão vertida na sentença recorrida de que a Ré, cumpriu com o seu ónus da prova e conseguiu ilidir a presunção de culpa estipulada legalmente, e que por ter conferido a assinatura por semelhança com a constante da folha de assinaturas, a Ré agiu com o zelo necessário e bastante está inquinada de manifesto erro sobre os pressupostos de facto e de direito que as regras do direito probatório material impõem.

3a-Quanto à matéria de facto, delimita-se o objecto do presente recurso aos factos considerados como provados nos nºs 9) , 10) e 11) do Relatório da sentença quanto à matéria de facto aí considerada provada. A prova produzida nos autos, quer a prova documental junta aos autos, quer a produzida em audiência de julgamento (prova testemunhal gravada), impõem diferente conclusão, como se demonstrou ao longo dos itens 6 a 20 das presentes alegações, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, para os efeitos de delimitação do objecto de conhecimento do presente recurso e de síntese na formulação das conclusões, tudo conforme resulta das regras definidas no CPC sobre esta matéria.

4a-A conclusão final contida na sentença recorrida não é coerente com a prova colhida nos autos, padece de erro de apreciação objectiva da prova produzida, perfeitamente sindicável pelo tribunal superior ad quem e detectável pela mera apreciação da prova documental mais relevante para o efeito, vertida no Relatório Pericial produzido e junto aos autos em maio de 2015. A corroborar esta conclusão e em manifesta contradição com a decisão da matéria de facto proferida pela M. Juiz a quo, também a prova testemunhal produzida.

5a-Assim, por uma questão de lógica e clareza na exposição começa-se por demonstrar a deficiência evidenciada no ponto 10) da matéria de facto considerada provada. Constata-se que, segundo o Relatório Pericial, junto aos autos em 03-07-2015, por Ofício da Polícia Judiciária ( laboratório de polícia científica) n° 329252355 de 09-01-2005, na página 4, consta o seguinte: " Resultados Obtidos: Comparação A-I Comparando a escrita suspeita A com a dos autógrafos de D, Q (Quadro I, fotos 1 a 4 ), quer de pormenor ( vd setas do mesmo quadro I ) - CONCLUSÃO - Admite-se como muitíssimo provável que a escrita suspeita da assinatura (doc 1 deste relatório), não seja da autoria de D. - " (sublinhados nossos) De salientar, ainda, a nota constante da página 3 do supra referido relatório pericial, na qual se salienta "o traçado irregular, pouco fluente e com formas desenhadas" da assinatura suspeita (ou seja, falsa). Ao que acrescenta: “ As referidas características apresentadas pela assinatura suspeita, indiciam a sua obtenção por uma eventual tentativa de imitação ” 6ª-Da leitura integral e atenta deste Relatório Pericial não subsiste dúvida sobre a falsidade da assinatura, a qual contém claros indícios de imitação, "observam-se numerosas diferenças e escassas semelhanças de reduzido valor, quer de aspecto geral " (...) pelo que o ponto 10) da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, ao afirmar que a assinatura aposta no cheque era semelhante à que se encontrava na folha de assinaturas da cliente, não tem sustentação na prova pericial, contraria clara e objectivamente o resultado deste meio probatório, sem qualquer fundamento aceitável.

  1. -Não é aceitável que a M. Juiz tenha desconsiderado o Relatório Pericial produzido no âmbito dos presentes autos, a pedido da Ré C e que determinou, aproximadamente, dois anos de espera pela realização do mesmo. É factual e resulta do próprio teor do Relatório Pericial realizado em 2015, que assinatura apresentava numerosas diferenças e escassas semelhanças com a da titular da conta, ou seja, não era semelhante à da titular da conta.

    Isto é exactamente o contrário do que se encontra vertido no facto n° 10) da matéria provada, pelo que terá de se alterar em conformidade com a verdade material apurada.

  2. -É manifesta a contradição e a violação das regras de direito probatório, ao desvalorizar em absoluto o Relatório Pericial produzido no âmbito dos presentes autos. Mas, mesmo que a M. Juiz resolvesse atender ao Relatório Pericial constante do processo criminal (o que por mera hipótese se admite), não se percebe como pode a partir daí extrair a conclusão vertida no ponto 10) da matéria de facto, em total contradição, aliás, com o decidido pelo Tribunal Criminal, quer em sede de 1ª instância quer pelo Tribunal da Relação, por Acórdão já transitado em julgado. Aliás, a este propósito, diga-se que também o ponto 6) da matéria de facto contém uma incorrecção, porquanto o processo de Inquérito aí referido já há muito se extinguiu. Esta questão não se afigura relevante do ponto de vista da decisão final, porém é elucidativo quanto à da falta de rigor na apreciação e elaboração do relatório da sentença.

  3. -Em síntese, o facto considerado provado no ponto 10) da matéria de facto provada, é totalmente contraditório com o que consta no Relatório Pericial, produzido no âmbito dos presentes autos, junto em maio de 2015, pelo que o seu conteúdo deve ser alterado, passando a constar o seguinte: 10) A assinatura efectuada por E, ou a seu mando, constante no lugar destinado ao nome do sacador contém numerosas diferenças e escassas semelhanças com aquela de D que consta da ficha de assinaturas do banco.

  4. -Ligada a esta questão está uma outra que resulta, ainda, da consideração da M. Juiz a quo, quanto ao procedimento de conferência de assinatura e à especial qualificação e experiência do funcionário [ (factos provados em 9) e 11) da matéria de facto da sentença recorrida] que procedeu à conferência das assinaturas, bem assim como ao comportamento zeloso e cuidadoso da Ré C. Consta da sentença recorrida que, nesta matéria, a M. Juiz a quo alega ter formado a sua convicção na prova testemunhal produzida, com referência às três testemunhas...

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