Acórdão nº 502/13.9S4LSB.L2-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelCID GERALDO
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam, em Conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.

-Relatório: 1.-No processo comum colectivo nº502/13.9S4LSB da 1.ª Secção Criminal da Instância Central da Comarca de Lisboa, Juiz 21, por acórdão de 27-01-2015, foi decidido: a)condenar o arguido M.S., pela prática, como autor material, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131º e 132º, n.º 2, alíneas b), e j), do Código Penal, na pena de 20 (vinte) anos de prisão; b)condenar o arguido M.S., pela prática, como autor material, de um crime de coacção, previsto e punido pelos artigos 154º, nº 1, e 155º, nº1 alínea a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão; c)em cúmulo das penas parcelares, condenar o arguido M.S., na pena única de 21 (vinte e um) anos de prisão; d)condenar o arguido M.S. a pagar a título de indemnização pela perda do direito à vida de MCS, a quantia de €80.000,00 (oitenta mil euros); e)condenar o arguido M.S. a pagar a título de indemnização pela dor, angústia, medo e terror, vivenciados pela vítima MCS, nos momentos que antecederam a sua morte, a quantia de €20.000,00 (vinte mil euros); f)condenar o arguido M.S. a pagar a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelo menor MMLS, representado pelos assistentes JL e NL; g)absolver o arguido M.S. do pedido de indemnização, no montante de €40.000,00 (quarenta mil euros), deduzido pelo assistente JL; h)absolver o arguido M.S. do pedido de indemnização, no montante de €40.000,00 (quarenta mil euros), deduzido pela assistente NL.

* O arguido interpôs recurso do acórdão, extraindo da motivação as seguintes conclusões: 1.Na verdade e sempre com o devido respeito, não se pode conformar o ora recorrente quer da matéria de facto dada como provada, quer da pena aplicada decorrente da primeira.

  1. Desde logo, o arguido recorre porque não concorda com as penas que lhe foram aplicadas, pois com o devido respeito, as condenações que lhe foram impostas e que ora se impugna são, salvo melhor opinião e saber, desadequadas, excessivas e desproporcionais para as circunstâncias do caso. E pugnará pela reposição da verdade até ao fim, tendo a prova produzida em audiência sido apreciada de forma errada aquando da motivação da decisão sobre a matéria de facto.

  2. Daí que se discorde, do direito aplicado e da desajustada dosimetria da pena, bem sustentada sim numa equívoca apreciação da prova produzida em Julgamento, como adiante se detalhará.

  3. O arguido ora recorrente não prestou declarações nos presentes autos.

  4. Tendo-o feito, apenas em sede de primeiro interrogatório judicial, já na vigência do atual código processo penal é certo.

  5. Devendo por isso, e desde logo, usufruir e beneficiar do princípio da presunção de inocência, o que, salvo melhor opinião e saber, assim não sucedeu.

  6. Na precisa lição de Germano Marques da Silva o princípio da presunção de inocência consagrado no Art.° 32°, n.° 2 da CRP integra uma norma diretamente vinculativa e constitui um dos direitos fundamentais do cidadão. (Art.° 18°, n° 1 da CRP).

  7. Quanto ao livre convencimento do juiz, este traduz-se como uma autêntica limitação ao livre convencimento ou persuasão racional, porquanto a livre convicção do juiz, não pode ir ao ponto de desfavorecer o arguido (Art.°, 61°, nº 1, alínea c) conjugado com o Art.° 343°, n°1, ambos do CPP).

  8. No caso Sub Júdice, o acórdão recorrido, ao formar como formou o livre convencimento do juiz, traduziu-se como uma autêntica limitação ao livre convencimento ou persuasão racional, porquanto a livre convicção do juiz, não pode ir ao ponto de desfavorecer o arguido (Art.°, 61°, n°1, alínea c) conjugado com o Art.° 343°, n°1, ambos do CPP), ferindo o princípio do in dúbio pro reu.

  9. Pelo que, também por isso a sentença que ora se recorre deve ser declarada nula.

  10. Sendo inconstitucional quando interpretados no seguinte sentido: "Ao formar o livre convencimento, o juiz, não se encontra limitado ao livre convencimento ou persuasão racional, porquanto a livre convicção do juiz, pode ir ao ponto de desfavorecer o arguido (Art.°, 61°, n°l, alínea c) conjugado com o Art.° 343°, n°1, ambos do CPP), ferindo o princípio do in dúbio pro reu." 12.Tal interpretação viola ainda o art.° 6° da Convenção para a proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais com as modificações introduzidas pelo Protocolo n° 11 acompanhada do Protocolo adicional e dos Protocolos nos 4, 6, 7 e 13, e os artigos 32°, n.° 2 e 18.°, n.° 1, ambos da C.R.P.

  11. Inconstitucionalidade que desde já igualmente se argui.

  12. -O Tribunal "a quo" condenou o arguido: a)Pela prática, como autor material, de um crime de homício qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.° e 132.°, n.°2, alíneas b) e j) do Código Penal (doravante designado de CPP), na pena de 20 (vinte) anos de prisão; b)Pela prática, como autor material, de um crime de coacção, previsto e punido pelos artigos 154.°, n.°1 e 155.°, n.°1, alínea a), do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão; c)Um cúmulo das penas parcelares, condenar o arguido na pena única de 21 (vinte e um) anos de prisão; 15.-Surgem confirmados como provados no douto Acórdão, factos que, efectivamente, não correspondem à realidade e cuja prova deveria ter sido feita em audiência de discussão e julgamento de forma mais rigorosa e exactidão, nos termos do artigo 410.° do CPP.

  13. -Em consequência da matéria de facto erroneamente fixada ou apreciada, também o enquadramento jurídico dos factos se mostra inteiramente desprovido de rigor.

  14. -Sendo certo, que várias das provas produzidas em audiência apontavam em sentido divergente ou contraditório.

  15. -Não teve, o tribunal "a quo" o cuidado e o rigor de analisar toda a prova produzida e cuja valoração era legalmente passível e exigível.

  16. -Nomeadamente, os relatórios periciais e o depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência e julgamento.

  17. -O dever de fundamentar as decisões judiciais decorre diretamente da Constituição: "as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prescrita na lei" — artigo 205.°, n.° 1 da Constituição da República portuguesa.

  18. -Tendo o presente recurso como objecto a reapreciação da matéria de facto, nos termos do artigo 412.°, n.° 3 do CPP, o recorrente deve especificar: a)os pontos de facto que considera incorretamente julgados; b)as provas que impõem decisão diversa da recorrida; c)as provas que devem ser renovadas; 22.-Cumprindo o disposto no referido normativo, os pontos que foram incorretamente julgados foram os pontos 27 a 34; 62 e 70 da matéria assente, que aqui se dão por integralmente reproduzidos em termos textuais, para todos os efeitos legais.

  19. -A verdade é que a convicção do tribunal "a quo" deveria ser adquirida através de um processo racional e ponderado, na análise crítica dos diversos dados e contributos carreados pelas provas produzidas.

  20. -Não se percebe o percurso lógico e coerente efectuado pelo tribunal "a quo", para decidir da maneira que decidiu.

  21. -Ao não fundamentar a sua decisão, deverá ser considerada inconstitucional a norma do artigo 374.°, n.°2 do CPP, por violação do artigo 205.° da CRP, quando interpretada no sentido de que "O juiz não está obrigado a proceder ao exame crítico das provas podendo limitar-se a efectuar meros juízos conclusivos", inconstitucionalidade essa que desde já se argui.

  22. -Analisando criticamente a prova efectivamente produzida em audiência, não pode o tribunal dar como provado que o arguido é imputável.

  23. -Violou assim o tribunal "a quo" o disposto no artigo 127.° do CPP.

  24. -Entende o arguido que o reconhecimento pessoal efectuado nos autos em sede de inquérito, deverá ser nulo.

  25. -Conforme resulta do depoimento da testemunha EV, gravado no sistema aúdio do tribunal no dia 28/01/2014, afere-se que antes de ser efectuado o reconhecimento pessoal, foi mostrado à testemunha uma única fotografia do arguido nos autos, o que só por si, invalida e inquina o reconhecimento pessoal que lhe seguiu.

  26. -Pelo exposto, é de concluir, que o reconhecimento pessoal efectuado de seguida, se encontra inquinado, pois a mesma foi com grande grau de probabilidade influenciado pelo reconhecimento fotográfico que não obedeceu ao disposto no n.°5 do artigo 147.° do CPP, logo nulo, nulidade essa que se argui nos termos do n.° 7 do artigo 147.° do CPP e que o tribunal "a quo" deveria ter conhecido oficiosamente.

  27. -Vem o arguido condenado na pena de 2 (anos) pela prática de um crime de coacção, punido e previsto pelos artigos 154.°, n.°1 e 155.°, n.°1, alínea a) do CP.

  28. -Salvo melhor entendimento, não pode concordar o arguido com tal condenação.

  29. -Ora, nos termos do n.°1 do artigo 154.° do CP, "quem por meio de violência ou de ameaça com mal importante, constranger outra pessoa a uma acção ou omissão, ou a suportar a uma actividade, é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa (...)".

  30. -A coacção é, pois, a imposição a alguém de uma conduta contra a sua vontade.

  31. -Sendo que, constranger é obrigar alguém a assumir uma conduta que não depende da sua vontade, ou seja, é violar a liberdade de autodeterminação.

  32. -Ora, não se consegue perceber o preencimento objectivo e subjectivo de tal crime.

  33. -Porquanto, não foi mostrada nenhuma pistola pelo arguido de forma a prejudicar a liberdade de determinação no ofendido.

  34. -Muito menos, um sentimento de insegurança no ofendido, porquanto após ter largado o arguido, o mesmo foi atrás do recorrente dizendo-lhe que ia tomar nota da matrícula e dar conhecimento às autoridades policiais quando chegassem ao local.

  35. -Quer com isto dizer, que as simples palavras proferidas pelo arguido, sem haver qualquer contacto físico ou um meio idóneo (neste caso, a apresentação da pistola no acto), não constituem um molde capaz de ser concretizado.

  36. -Mais relevante, não constitui sequer uma ameaça de forma a prejudicar a liberdade de determinação e um sentimento...

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