Acórdão nº 29185/12.1T2SNT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: JOAQUIM FERNANDO ... ... (com residência em Rua ……. Almeida, n.º …, 2.º esquerdo, em …..) intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum sumário, contra … SEGUROS, SA (com sede em .. ……., na Maia), pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe: (a) a quantia de 12.319,10€ (doze mil trezentos e dezanove euros e dez cêntimos), a título de reparação dos danos provocados no veículo de matrícula 75-...-…, de sua propriedade; (b) os danos pela privação de uso desse veículo, contabilizados até à propositura da presente acção na quantia de 5.740€ (cinco mil setecentos e quarenta euros); (c) a quantia de 10€ (dez euros) por cada dia de paralisação daquela viatura até integral pagamento; e (d) os juros vincendos sobre a quantia total de 18.059,10€ (dezoito mil e cinquenta e nove euros e dez cêntimos), à taxa de 4% ao ano, a contar da citação do réu até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: -No dia 22.04.2011, entre as 03h15m e as 03h45m, na Rua José Brandão de Almeida, em Mem Martins, deflagrou um incêndio na viatura automóvel de matrícula VD-...-..., propriedade de António João ... ..., que se propagou ao veículo de matrícula 75-...-..., propriedade do Autor; -À data deste sinistro, a responsabilidade civil decorrente da circulação da viatura VD-...-... mostrava-se transferida para a Ré; -Deste sinistro resultaram os danos que o Autor pretende agora ver ressarcidos.

A Ré contestou, por excepção e por impugnação.

Defendendo-se por excepção, alegou que que o sinistro em apreço não configura um acidente de viação, nem foi resultado do risco próprio do veículo do seu segurado, donde decorre a sua irresponsabilidade pelo sucedido; em qualquer caso, dado a viatura segurada ter sido furtada em momento imediatamente anterior ao alegado sinistro, inexiste responsabilidade do seu segurado pela sua oclusão, pelo que também por esta razão não pode ser assacada qualquer responsabilidade.

Defendendo-se por impugnação, alegou que: -Da avaliação efectuada ao veículo ... através da oficina escolhida pelo Autor, concluiu-se que o valor estimado para reparação do veículo da A. ascendia à quantia de € 12.319,10; -Com base na peritagem efectuada, foram os salvados do veículo ... avaliados em € 160,00; -Apurou-se, com base na pesquisa de mercado quanto ao valor comercial para veículos com as mesmas características (marca, modelo, ano de matrícula, quilometragem, extras, etc.) do veículo da A. que, à data do evento participado, o veículo ... tinha um valor comercial de cerca de € 2.255,00; -Assim, nos termos do artigo 41º, nº 1, al. c), do DL 291/2007, de 21 de Agosto, foi o veículo do A. considerado como perda total; -Ainda que a Ré fosse responsável pelo ressarcimento dos danos resultantes do incêndio do veículo VD, a reparação do veículo do A., tendo em conta a diferença entre o valor venal apurado e o valor orçamentado para a referida reparação, seria economicamente inviável, por excessivamente onerosa para o devedor, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 566.º, n.º 1, 2.ª parte do Código Civil; -Por isso, caso houvesse alguma responsabilidade imputável à Ré, por via da celebração do contrato de seguro em apreço nos autos, deveria ser o A. indemnizado pela quantia de € 2.255,00 (valor do veículo ... à data do evento em apreço nos autos), com a dedução do valor de € 160,00, caso o A. pretendesse ficar em posse dos salvados, o que perfaz a quantia total de € 2.095,00; -Não podendo a Ré, pelas razões supra explicitadas, assumir a responsabilidade pela ocorrência do incêndio em apreço nos autos, não poderá, igualmente, ser responsabilizada pela alegada privação de uso decorrente do incêndio que afectou o veículo do A.; -De qualquer modo, e por estar em causa uma situação de perda total do veículo ..., a Ré não estava igualmente obrigada, nos termos do disposto no artigo 42.º, n.ºs 1 e 2 do DL 291/2007 de 21 de Agosto, a disponibilizar ao A. um veículo de substituição, pelo que sempre improcederia o pedido indemnização respeitante aos danos alegadamente sofridos pelo A., consubstanciados nos prejuízos resultantes da privação do uso do ....

O Autor respondeu à Contestação, quanto à matéria das excepções deduzidas pela Ré, tendo aproveitado esse articulado para requerer a intervenção principal provocada do referido ANTÓNIO JOÃO ... ... (proprietário do veículo de matrícula VD-...-...), o que lhe veio a ser deferido por despacho de 11.12.2014.

Regularmente citado, o chamado ANTÓNIO JOÃO ... ...

contestou, alegando não ser responsável pelo alegado sinistro porquanto a viatura VD lhe havia sido furtada em momento imediatamente anterior ao mesmo.

Findos os articulados, o processo foi saneado – tendo, nesse âmbito, sido julgada improcedente a aventada excepção de ilegitimidade da Ré seguradora -, definiu-se o objecto do litígio e enunciaram-se os Temas da Prova.

Discutida a causa em Audiência de Julgamento, foi proferida Sentença (datada de 30/12/2015) com o seguinte teor decisório: «Por todo o supra exposto, esta Secção Cível julga a acção parcialmente procedente e em conformidade: 1.-Condena o réu, N SEGUROS, SA, a pagar ao autor, JOAQUIM FERNANDO ... ..., a quantia global de 7.745€ (sete mil setecentos e quarenta e cinco euros) de capital, acrescida dos juros de mora, calculados à taxa supletiva legal de 4% ao ano, contados desde a data de citação do réu, que ocorreu em 05.12.2012, até integral e efectivo pagamento, a que se soma a quantia diária de 10€ (dez euros) até ao momento em que for colocado à disposição do autor o dinheiro correspondente à indemnização devida pela perda total da viatura (2.005€), indo no mais absolvido.

  1. -Absolve o chamado, ANTÓNIO JOÃO ... ..., dos pedidos formulados pelo autor nestes autos.

  2. -Condena o autor e o réu ao pagamento das custas da presente acção, em razão do respectivo decaimento, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil.» Inconformada com o assim decidido, a Ré Seguradora interpôs recurso da referida sentença – admitido como de Apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo (artigos 644.º, n.º 1, alínea a), 645.º, n.º 1, alínea a), e 647.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil) -, tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: “1-A ora Recorrente não se conforme com a imputação da responsabilidade pela reparação dos danos sofridos pelo Autor em consequência do sinistro em discussão dos autos atribuída pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida 2-Não se conforma ainda a Recorrente com os montantes arbitrados na douta sentença a título de dano privação de uso do veículo do Autor.

    3-Com o devido respeito, não pode o ora Recorrente concordar com a quantificação da indemnização fixada pelo Tribunal a quo na medida em que a mesma se revela excessiva face aos danos sofridos pelo Autor e aos valores atualmente aceites pela jurisprudência maioritária.

    4-Entendeu a douta sentença recorrida responsabilizar a Recorrente, enquanto Companhia de Seguros para a qual se encontrava transferida a responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo com a matrícula VD-...-..., veículo donde deflagrou o incêndio a que se reportam os presentes autos, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo Autor ora Recorrido em sequência daquele evento.

    5-Sucedeu que, da matéria dada como provada, apurou-se que: -No dia 22.04.2011, pelas 3 horas, na Rua ……, em ……., deflagrou um incêndio no veículo automóvel de matrícula VD-...-..., pertencente ao chamado.

    (ponto 1.1 da matéria de facto dada como provada); -Tal deflagração resultou de causa não concretamente apurada.

    (ponto 1.2 da matéria de facto dada como provada); -Este incêndio propagou-se também ao veículo automóvel de matrícula 75-...-..., pertencente ao autor, que se encontrava estacionado junto ao de matrícula VD. (ponto 1.3 da matéria de facto dada como provada); (…) -O referido veículo de matrícula VD havia desaparecido da Rua Padre Andrade, em Mem Martins, local onde se encontrava aparcado e trancado, em momento não concretamente apurado mas posterior às 00h00m do referido dia 22.04.2011.

    (ponto 1.13 da matéria de facto dada como provada); -Deste facto o chamado deu conhecimento à polícia e ao réu.

    (ponto 1.14 da matéria de facto dada como provada); -A responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo VD encontrava-se à data do referido sinistro transferida para o réu pela apólice n.º 0002349.

    (ponto 1.15 da matéria de facto dada como provada).

    6-A Recorrente, ainda em fase extrajudicial teve conhecimento da ocorrência do incêndio deflagrado no dia 22 de Abril de 2011, no veículo com a matrícula VD-...-..., por si seguro e que o veículo com a matrícula 75-...-..., propriedade do Recorrido, tenha sofrido danos em consequência da propagação das chamas originadas pelo incêndio deflagrado no veículo VD.

    7-Sucede que, à luz do contrato de seguro titulado pela apólice n.º 0002349, não pode a Recorrente assumir qualquer responsabilidade pela reparação dos danos resultantes daquela ocorrência no veículo propriedade do Recorrido, na medida em que o sinistro objecto dos presentes autos não configura (quer em estrito, quer em lato sensu) um acidente de viação.

    8-Considera-se um acidente de viação o acontecimento não intencionalmente provocado, de carácter anormal e inesperado, gerador de consequências danosas, causado por um veículo (ou animal) numa via destinada à circulação.

    9-Da conjugação das normas contidas nos artigos 4.º, n.º 1 e 80.º, n.º 1 do Decreto- Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto (Regime do Sistema do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel) e ainda do artigo 150.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 114/94, de 16 de Março (Código da Estrada), decorre a sujeição/ obrigatoriedade da contratação de um seguro que vise garantir a responsabilidade pela reparação dos danos, corporais e/ou materiais...

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