Acórdão nº 16183/13.7T2SNT.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.

1. Relatório: 1.1.-AAA, veio a ser incorporada na BBB –sociedade incorporante que prossegue nos autos como A.

[1] –, intentou a presente acção de processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra CCC, pedindo a condenação do Réu a pagar à Autora a título de indemnização acordada pelas partes, a quantia de € 1.000.000,00 acrescida dos juros de mora que se vençam desde a data da citação do R. até integral e efectivo pagamento, à taxa de 4% ao ano, nos termos dos arts. 559º e 805º, n.º 2, alínea b) do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

Para tanto alegou, em síntese: que, em adenda celebrada em 8 de Agosto de 2008 ao contrato de trabalho que vinculava as partes e em cujo âmbito o R. exercia as funções de director técnico do laboratório de análises clínicas, o R. se comprometeu a não constituir, a não participar ou a não colaborar, directa ou indirectamente, quer como sócio, quer como legal representante, ou ainda como colaborador ou empregado, em qualquer outro Laboratório de Análises Clínicas, independentemente da sua forma ou natureza jurídicas, durante o prazo de 5 (cinco) anos a contar de 8 de Agosto de 2008; que, não obstante, o R. violou a obrigação contratual assumida, tendo, dentro do prazo estabelecido assumido a gerência de duas sociedades comerciais detentoras de laboratórios de análises clínicas e concorrentes da Autora; que a A. tem direito, por isso, ao pagamento da cláusula penal de um milhão de euros, fixada na dita cláusula contratual.

Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação, o R. veio a apresentar contestação na qual defendeu a sua absolvição e alegou, em síntese: que as sociedades em causa correspondiam às excepções identificadas na aludida cláusula 3ª da adenda ao contrato de trabalho, pelo que não se verifica o incumprimento da mesma; que a A. tinha conhecimento de que o R. assumiu a gerência das sociedades e que tal assunção não violava o dever de lealdade; que caso se considerasse válida a cláusula a mesma não seria aplicável, por um lado porque a A. não teve e não alegou quaisquer prejuízos e porque o montante fixado sempre seria desproporcional. Formula um pedido de condenação da A. como litigante de má fé, bem como um pedido de condenação em indemnizações por danos morais e patrimoniais futuros.

A Autora respondeu à contestação nos termos de fls. 140 e ss.

Foi proferido despacho a convidar o R., a esclarecer se pretende a condenação da Autora na presente acção, caso em que deve deduzir tal pedido devidamente liquidado relativamente a eventuais danos já sofridos e indicando um valor quanto a danos futuros, e atribuindo um valor à reconvenção e pagando a respectiva taxa de justiça[2], uma vez que na contestação não se encontra deduzido, separadamente, pedido reconvencional (despacho de fls. 175). O R. não acedeu a este convite, pelo que se considerou que não foi deduzido qualquer pedido reconvencional (despacho de fls. 314).

Realizada a audiência prévia foi proferido despacho saneador, e fixado o objecto do litígio. Anunciou ainda a Mma. Juiz a quo que iria proferir decisão de mérito, o que fez em 2016.06.16, prolatando sentença em que julgou improcedente a acção e absolveu o R. do pedido.

1.2.-A A., inconformada interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: “1ª-Salvo o devido respeito, a sentença recorrida padece de erro na interpretação e aplicação do direito aos factos provados, nomeadamente da cláusula 3ª da Adenda ao contrato de trabalho que as partes celebraram, em 8 de Agosto de 2008, e que está junta aos autos, cuja violação se encontra documentalmente comprovada e é geradora de responsabilidade contratual do R. para com a A., correspondente à indemnização fixada pelas partes, a título de cláusula penal, pelo incumprimento das obrigações assumidas pelo R. naquele contrato.

  1. -A matéria de facto assente impõe diferente interpretação e aplicação do direito, pelo que deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue a acção procedente e condene o R. no pedido.

  2. -Encontra-se comprovado documentalmente nos autos – factos provados 7 e 8º - que, em 4 de Outubro de 2012 (i.e. dentro do prazo de exclusividade de 5 anos fixado na adenda ao contrato de trabalho celebrada pelas partes, em 8 de Agosto de 2008), o R. assumiu a gerência de sociedades detentoras de outros laboratórios de análises clínicas e não deu conhecimento à A. – facto provado 9º. Contudo, na sentença recorrida, o Tribunal a quo absolveu indevidamente o R. do pedido.

  3. -É manifesta e flagrante a violação pelo R. da obrigação assumida na citada cláusula contratual, porquanto, objectiva e subjectivamente, dentro do período de exclusividade de cinco anos que concedeu à A., assumiu a gerência de sociedades detentoras de outros laboratórios de análises clínicas e não deu conhecimento à A. Assim, perante a factualidade comprovada nos autos, dificilmente se compreende a improcedência da acção.

  4. -A interpretação perfilhada na sentença recorrida para o teor da citada cláusula contratual não pode proceder, pela simples razão de que retira todo o sentido a essa cláusula e esvazia de conteúdo as obrigações contratuais aí estipuladas e assumidas, em clara violação do disposto nos arts. 236º a 238º do Código Civil.

  5. -O Tribunal a quo concluiu que a adenda ao contrato de trabalho celebrada pelas partes contém cláusulas válidas e oponíveis ao trabalhador R. com uma ressalva em relação ao parágrafo 3º da cláusula terceira da adenda, onde se impõe que a desvinculação do R. em relação às sociedades identificadas só pode ocorrer se não prejudicar os interesses da A., sua entidade patronal, por, alegadamente, limitar o poder do R. dispor dos seus bens. Todavia, como bem se refere na decisão recorrida, mesmo a pretensa invalidade parcial daquela cláusula contratual não determinaria a invalidade de todo o contrato (adenda), pelo que as restantes cláusulas se mantêm válidas. E, para a decisão do objecto da lide é totalmente irrelevante a alegada imposição da venda de participações sociais, pelo que revela-se desnecessário refutar a argumentação ínsita na sentença recorrida sobre a pretensa invalidade dessa cláusula.

  6. -Com efeito, a violação das obrigações contratuais imputada ao R. assenta no facto de ter assumido a gerência de laboratórios de análises clínicas concorrentes da A., em clara violação do dever de lealdade previsto no art. 121º, n.º 1 e) do Código do Trabalho de 2003 [actual art. 128, n.º 1 f)], que nada tem a ver com a aludida situação da alienação das participações sócias que o R. detinha enquanto sócio dessas sociedades.

  7. -A improcedência da acção veio a ser julgada pelo facto do Tribunal recorrido ter considerado, erradamente, salvo o devido respeito, que o R. não violou o dever de lealdade e as obrigações assumidas na referida cláusula terceira da adenda ao contrato de trabalho celebrada pelas partes.

  8. -Resulta inequívoco do corpo principal da citada cláusula contratual que as partes pretenderam que o R. não participasse nem colaborasse, a qualquer título, incluindo como legal representante (gerente/administrador) noutros laboratórios de análises clínicas.

  9. -À data da venda do (...) (7 de Agosto de 2008), o R. tinha participações minoritárias noutros Laboratórios de Análises Clínicas, nomeadamente, no (...). Deste modo, as partes estabeleceram no parágrafo 3º da cláusula contratual que o R. se comprometia a desvincular-se dessas sociedades, para assim, poder cumprir a obrigação principal de exclusividade assumida no corpo principal da mesma cláusula contratual.

  10. -Resulta do contexto factual assente nos autos que o parágrafo 3º da cláusula contratual supra citada foi determinado pelo exclusivo interesse do R., pois, se não tivesse sido acordado, a A. só adquiriria a sociedade (...) no futuro, depois daquele se desvincular daqueles outros Laboratórios de análises clínicas. E, tanto que assim foi, que, prontamente, em cumprimento das obrigações assumidas na cláusula contratual em apreço, o R. comunicou à A., em 31 de Julho de 2009, isto é, menos de um ano após a celebração da adenda ao contrato de trabalho entre as partes, que ia desvincular-se dos outros Laboratórios de análises Clínicas em que detinha participações minoritárias, como se encontra provado nos autos – cfr. ponto 48. dos factos provados. E o R. efectivamente desvinculou-se das sociedades (...) e (...), como também resulta da factualidade provada – cfr. pontos 44. a 47. dos factos provados, vindo a renunciar aos cargos de gerente que desempenhava naquelas duas sociedades, em 24 de Setembro de 2010.

  11. -A A. não manifestou ao R. nenhum prejuízo para os seus interesses com a desvinculação do R. daqueles outros Laboratórios de análises clínicas, que jamais se verificaria, pois deu como cumprida por aquele a obrigação que assumiu na cláusula 3ª da Adenda ao contrato de trabalho, acima transcrita.

  12. -Naturalmente, era à A. que competia, nos termos do parágrafo 3º da citada cláusula contratual, dizer se a desvinculação do R. daqueles outros Laboratórios de análises clínicas prejudicava, ou não, os seus interesses, nada tendo dito. Fica, por conseguinte, totalmente infirmado o argumento, meramente conclusivo e sem sustentação fáctica, plasmado na sentença recorrida, da A. poder ter algum interesse na manutenção do R. noutros laboratórios de análises clínicas, por alegada e pretensa angariação de clientela. Esta situação nunca constituiu um pressuposto da relação laboral estabelecida pelas partes, nem do negócio celebrado, pelo que não pode ser considerada como argumento para a decisão da presente causa, como indevidamente o R. veio alegar nos autos. As partes previram expressamente a obrigação do R. de se desvincular de todos os outros laboratórios de análises clínicas. Se não o tivessem querido, não teriam incluído a...

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