Acórdão nº 1735/09.8TACSC.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelFILIPA COSTA LOUREN
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM EM CONFERÊNCIA, NA 9ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA RELATÓRIO O arguido, no processo 1735/09.8 TACSC, da Comarca de Lisboa Oeste-cascais-Inst. Local- Secção Criminal-J2, D..., devidamente identificado nos autos, foi acusado em 29.11.2013, pela prática de dois crimes de violação da obrigação de alimentos, ambos p.p. pelo artº 250º nº 3 do Código Penal.

Foi designado Julgamento e recebida a acusação a fls 491.

O arguido contestou e veio invocar questões prévias.

Assim veio a ser proferido o despacho judicial, do qual P..., a ora assistente recorreu, não se conformando com o seu teor, pois o mesmo ordenou em suma o arquivamento dos presentes autos, dando sem efeito a realização do julgamento.

Não se conformando com aquele despacho, como já se disse, veio a assistente, devidamente identificada nos autos interpor recurso daquele despacho a fls. 670 até 675, apresentando entre o mais as seguintes conclusões: II- DAS CONCLUSOES: 23.Conforme resulta de Douto Despacho exarado a fls dos Autos e que se quer em crise, e com a qual a exponente, mãe de dois filhos, não se conforma, veio, o Douto Tribunal, declarar extinto o procedimento criminal instaurado contra o arguido e determinar o arquivamento os Autos, dando, consequentemente, sem efeito o Julgamento aprazado não realizando prova alguma sobre a matéria.

24.Fê-lo por duas ordens de razoes: Por um lado sustentou a tese de que a Assistente “lançou mão” de um Incidente de Incumprimento de Responsabilidades Parentais que cessou por acordo transitado em julgado em 31/3/2014 e que ao faze-lo, ocorreu uma renuncia tácita ao exercício da acção penal pela prática do crime de violação da obrigação de alimentos, pelo que, concluiu o Tribunal, que o direito de queixa da mãe dos menores (alegadamente exercido em 23/6/2009) é insusceptível de produzir efeitos por a mesma ter, em data anterior, renunciado tacitamente ao exercício daquele direito. Por outro lado, sustentou o despacho, como segundo motivo de arquivamento dos autos, o facto de a menor M… haver completado os 16 anos em 7/10/2008 pelo que competia a esta para, depois dessa data, apresentar queixa contra o pai, o que nunca fez, pelo que o requerimento subscrito pela mãe em 23/6/2009 nunca poderia produzir efeitos quanto aquela filha pelo que, nessa matéria, inexistiria queixa o que inviabilizaria o processo. Não tem razão em ambos os casos.

25.Mas diga-se que, independentemente de ter ou não razão devia conceder às partes, dado que foi formulada uma Acusação pelo Ministério Publico, recebido o processo, marcada Audiência de Julgamento e concedido prazo ao arguido para apresentar Contestação, o direito e oportunidade de produzirem prova, legal e factual, que sustentasse a acusação. 26.Foi, em momento prévio à realização de Julgamento, vedado ao Ministério Público e à Assistente hipótese de exercer os seus direitos o que constitui uma nulidade nos termos do estatuído no artº 120º do CPP. 27.Acresce que, precisamente ao invés do que consta na Decisão (e como consta do Apenso I dos autos de processo 323/2000 que correram termos pelo 1º Juízo de Família do Tribunal de Cascais e cuja Certidão consta do processo) a assistente em primeiro lugar, em 2007, instaurou o Incidente Cível por Incumprimento e só depois (em 2008) é participou, face aos factos entretanto apurados, o ilícito comportamento do arguido. 28.Ora a decisão diz, sem fundamento, o inverso.

29.É que foi só no decurso do Incidente que a queixosa teve conhecimento de que o arguido, de forma voluntaria, desempregou-se para não pagar as Pensões de Alimentos, como consta de tal apenso com uma carta assinada pelo próprio arguido. 30.Assim sendo, e desde logo, existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a qual, aliás, nem é referenciada em sede de Decisão, o que constitui um vicio nos termos da alínea a) do artº 410º do CPP. 31.Igualmente existe erro notório na apreciação da parca prova existente, face à decisão, nos termos do artº 410º nº 2 c) do CPP, pois ao contrário do que consta na Decisão, a exponente primeiro instaurou o Incidente Cível por Incumprimento e só depois (em 2008) é participou criminalmente. 32.Assim sendo não existiu renuncia tácita ( ou mesmo expressa) ao que quer que seja. 33.Sem prejuízo havia que apurar, também, em sede probatória a conduta dos intervenientes e a execução ou do acordo e se a verba foi ou não paga e o que consta no próprio acordo (que não excluiu as pendências judiciais e é objecto de execução).

34.Assim, e sem prejuízo da produção de prova por efectuar, a queixa não é datada de momento anterior ao Incidente de Incumprimento. 35.Por outro lado há que ver que a Pensão de Alimentos não paga diz respeito a dois menores, sendo que um (V…) em 2007, 2008, 2009 e 2010 era menor pelo que qualquer questão, quanto ao mesmo, de legitimidade de instauração de queixa crime não se coloca, o que significa que, por aqui, sempre deveria prosseguir os Autos. 36.Mas mesmo quanto à filha M…, igualmente sempre se dirá que a mesma era menor e o exercício de queixa podia ser suprido nos termos do artº113º do CP dado que o processo começou antes de 23 de Junho de 2009. 37.Considera-se, pois, insuficiente a prova produzida para a condenação em causa bem como erro notório na apreciação da mesma. 38.Violando-se nestes termos os direitos de defesa dos intervenientes processuais consagrados no art° 32°, n°1 da C.R.P.

39.Termos em que deverá revogar-se a decisão recorrida.

Como é de Justiça! O recurso foi admitido a folhas 608.

MºPº junto da primeira instância respondeu á motivação do recurso apresentado pela assistente da seguinte forma: III DAS CONCLUSÕES 1.

Tal como se decidiu na decisão recorrida, a assistente/recorrente, antes de ter exercido o seu direito de queixa, já havia lançado mão de incidente de natureza civil tendo em vista obter o pagamento dos alimentos em dívida aos seus filhos menores, ocorrendo, assim, uma renúncia tácita ao direito de queixa contra o arguido pela prática do crime de violação da obrigação de alimentos.

2. Estando em causa crime de natureza semi-pública, como sucede no caso em apreço, a instauração de incidente de natureza civil perante o Tribunal Civil, para obter o pagamento de alimentos devidos a menores em dívida, antes do exercício do direito de queixa, vale como renúncia implícita a este direito de queixa, pelo que não merece qualquer reparo a decisão recorrida ao declarar extinto o procedimento criminal movido nestes autos contra o arguido e a determinar o arquivamento do processo, com fundamento no facto de o direito de queixa exercido pela recorrente ser insusceptível de produzir os efeitos pretendidos por ter havido, previamente, renúncia tácita a esse direito.

3. Não existe qualquer nulidade na justa medida em que não se impunha a realização de julgamento e a subsequente produção de prova posto que o Tribunal a quo constatou a existência de uma questão prévia que tinha que ser, como efectivamente, foi apreciada por constituir obstáculo à apreciação do mérito da causa.

4.

Deverá, pois, ser mantida a decisão recorrida.

Foi cumprido o nº 4 do artº 414º do CPP.

Remetidos os autos para o Tribunal da Relação de Lisboa, o Digno Procurador-Geral Adjunto em douto parecer a fls 726, nele apôs o seu “visto”, nada tendo a acrescentar à resposta apresentada pelo MºPº, junto da 1ª instância, com a qual concorda.

Foi cumprido o artº 417º nº 2 do C.P.P.

O arguido respondeu alegando em síntese dever ser julgado improcedente o recurso e nos seguintes termos: VI - EM CONCLUSÃO: 1º São quatro as questões a decidir no presente recurso: 1ª) Se foram violados os direitos de defesa da assistente e do Ministério Público, ao não lhes ser dada oportunidade de produzir prova; 2ª) Se existe insuficiência para a decisão recorrida da matéria de facto provada e, em simultâneo, erro notório da apreciação da prova existente; 3ª) Se a ora recorrente, com a dedução do incidente de incumprimento da regulação do poder paternal, renunciou ao direito de queixa pelo crime dos autos; 4ª) Se à recorrente assistia legitimidade para exercer o direito de queixa em relação a sua filha Margarida e se o mesmo poderia ser suprido (questão prejudicada por resposta positiva à anterior).

2º A matéria de facto respeitante à apresentação de queixa decorre dos próprios autos e a relativa ao incidente de incumprimento da regulação do poder paternal apenas é susceptível de ser provada por via documental, estrando provada por certidões judiciais, que constituem documentos autênticos e, portanto, fazem prova plena dos factos neles atestados, que não pode ser destruída por qualquer outro meio de prova; a produção de outra prova seria um acto inútil, que não é lícito praticar.

3º O Ministério Público teve oportunidade de se pronunciar e efectivamente pronunciou-se sobre as excepções deduzidas pelo arguido, não sendo afectado no exercício dos seus poderes processuais, enquanto a ora recorrente, à data da contestação e do despacho de fls. 598, não era ainda assistente, pelo que não gozava dos direitos que a lei reconhece àqueles.

4º Não houve violação de qualquer direito do M.P. ou da assistente e a situação não se reconduz a qualquer nulidade, pelo que, a ocorrer eventual irregularidade, a mesma se teria por sanada por falta de tempestiva arguição.

5º Não podendo a prova relevante para a decisão impugnada ser outra que não a constante dos autos e sendo esta absolutamente esclarecedora da tramitação processual, não ocorre o alegado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

6º Não houve erro na apreciação da prova, muito menos erro notório: a recorrente reconhece que primeiro instaurou o incidente cível por incumprimento e só depois participou criminalmente, factualidade esta em que assentou a decisão e que os autos comprovam.

7º O procedimento criminal pelo crime de violação de obrigação de alimentos depende de queixa; a prévia dedução do pedido perante o...

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