Acórdão nº 21447-15.2T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 09 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

1.-Relatório: A e B, intentaram acção declarativa com processo comum, contra C , pedindo que, em consequência da procedência da acção : A)Seja declarado que, em 27 de Março de 2015, cessou, por caducidade, o contrato de arrendamento celebrado em 02.11.2001, que teve por objecto o 1.° andar esquerdo/frente e o 2.° andar do número 44 da Rua do …., em Lisboa, os quais fazem parte do prédio urbano sito na Rua do …., em Lisboa; B)Caso o Réu não entregue os referidos andares até 28 de Setembro de 2015, inclusive, seja o mesmo condenado a entregar às Autoras, livres e desocupados de pessoas e bens, os referidos 1.° andar esquerdo/frente e o 2.° andar do número 44 da Rua do …., em Lisboa; C)Caso o Réu deixe de pagar, a título de indemnização e em relação a cada um dos meses de Agosto e de Setembro, ambos de 2015, a mensalidade da renda, no valor de 250,00€, seja o mesmo condenado a pagar às Autoras o valor mensal de 250,00€, por cada um dos dois referidos meses que não tiver pago, e bem assim os juros de mora, à taxa legal, sobre cada quantia mensal de 250,00€ devida, contados do dia 1 (um) do mês imediatamente subsequente àquele a que cada quantia mensal de 250,00€ disser respeito; D)Caso o Réu se constitua em mora na entrega do 1.° andar esquerdo/frente e/ou do 2.° andar, seja o mesmo condenado a pagar às Autoras, a título de indemnização elevada para o dobro, a quantia mensal de 500,00€, por cada mês ou fracção de mês, a partir de 01 de Outubro de 2015 e até à data em que os ditos andares venham a ser entregues às Autores, livres e desocupados de pessoas e bens, bem como os juros de mora, à taxa legal, sobre cada quantia mensal 500,00€ devida, contados do dia 1 (um) do mês imediatamente subsequente àquele a que cada quantia mensal de 500,00€ disser respeito.

1.1.-Para tanto , alegaram as autoras , em síntese, que : -Na qualidade de cabeça-de-casal de herança indivisa de D, a autora A , em 2/11/2001, arrendou ao Réu, para sua habitação, os 1.° andar esquerdo/frente e o 2.° andar do número 44 da Rua do …., em Lisboa; -Acordado ficou que o prazo do arrendamento seria de um ano, sendo a renda anual de 600.000$00; -Sucede que, tendo as autoras procedido e ultimado a partilha da herança indivisa de D, comunicaram ao Réu em 1/4/2015 a caducidade do arrendamento, caducidade cuja declaração judicial impetram do tribunal .

1.2.-Após citação, veio o Réu apresentar contestação, aduzindo no essencial oposição por excepção e por impugnação motivada, maxime invocando que o comportamento das AA configura o exercício abusivo de um direito e , ademais, é o Réu credor das AA de elevada quantia que despendeu em obras realizadas no locado e que o tornaram habitável.

1.3.-Realizada a audiência prévia, foi no âmbito da mesma proferido saneador tabelar , identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova, não tendo sido deduzidas reclamações, e , efectuada a audiência de discussão e julgamento , foi finalmente proferida a competente sentença que pôs termo à acção, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor : (…) III-DECISÃO.

Pelo exposto, julgo procedente, por provada, a presente acção e, em consequência, 1.-Declara-se que em 27 de Março de 2015 cessou, por caducidade, o contrato de arrendamento celebrado em 02.11.2001, e que teve por objecto o 1.° andar esquerdo/frente e o 2.° andar do número 44 da Rua do …., em Lisboa, os quais fazem parte do prédio urbano sito na Rua do Norte, n.°s 38 a 46 e na Travessa da …. n.°s 9 a 13, em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da extinta freguesia da Encarnação sob o artigo 144 e, actualmente, na freguesia da Misericórdia sob o artigo 234, e descrito na 4.a Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.° 2.468 ; 2.-Condena-se o réu C a entregar às autoras A e B, livres e desocupados de pessoas e bens, os referidos 1.° andar esquerdo/frente e o 2.° andar do número 44 da Rua do …., em Lisboa, os quais fazem parte do prédio urbano sito na Rua do …., n.°s 38 a 46 e na Travessa da ….n.°s 9 a 13, em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da extinta freguesia da Encarnação sob o artigo 144 e, actualmente, na freguesia da Misericórdia sob o artigo 234, e descrito na 4.a Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.° 2.468; 3.-Caso o réu não o tenha feito, condena-se o mesmo a pagar às autoras, a título de indemnização e em relação a cada um dos meses de Agosto e de Setembro de 2015, a mensalidade da renda, no valor de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros ), bem assim os juros de mora, à taxa legal, sobre cada quantia mensal de € 250,00 devida, contados do dia 1 (um) do mês imediatamente subsequente àquele a que cada quantia mensal de € 250,00 disser respeito e, 4.-Condena-se o réu a pagar às autoras, a título de indemnização elevada para o dobro, a quantia mensal de € 500,00 (quinhentos euros), por cada mês ou fracção de mês, a partir de 01 de Outubro de 2015 e até à data em que os ditos andares venham a ser entregues às autores, livres e desocupados de pessoas e bens, bem como os juros de mora, à taxa legal, sobre cada quantia mensal € 500,00 devida, contados do dia 1 (um) do mês imediatamente subsequente àquele a que cada quantia mensal de € 500,00 disser respeito.

Custas da acção pelo réu - artigo 527.° n.° 1 do Código de Processo Civil.

Notifique e registe.

Lisboa, 19.07.2016 “ 1.4.-Discordando da sentença proferida, e inconformado com o desfecho da acção, veio o réu C recorrer, sendo que, no âmbito das pertinentes conclusões recursórias, explanou o apelante do seguinte modo: A)Considera o Tribunal a quo na sua sentença que o Apelante/Réu "não logrou demonstrar que as autoras, ou a 1ª Autora, em específico, lhe criaram a convicção de que não invocariam a caducidade do contrato de arrendamento. Com efeito, nem se vislumbra fundamento legal para que essa situação pudesse concretizar-se, posto que a 1.ª Autora estava a dar de arrendamento ao autor um bem que fazia parte de uma herança indivisa e, naturalmente, não poderia dispor dele para além de certos limites. " B)Porém, salvo o devido respeito e melhor entendimento, não assiste razão do Douto Tribunal.

C)Ao contrário do que é alegado na Sentença de que ora se recorre, ao longo de 25 anos as Autoras/Apeladas criaram e mantiveram sempre no espírito do Apelante/Réu de que não iria ser efectuada qualquer partilha da herança, uma vez que se trata apenas de duas herdeiras, ou seja, mãe e filha, pelo que deveria ter sido considerado provado o tema da prova.

D)Com efeito, o avô do Apelante/Réu, faleceu em 18 de Agosto de 1990, pelo que a partilha foi feita apenas em 2015 ( 25 anos depois ), tendo a sua avó, 1.ª Autora/Apelada sempre exercido as suas funções de cabeça-de-casal e nesta qualidade celebrado com o Apelante/Réu, em 2 de Novembro de 2001, o contrato de arrendamento em causa nos presentes autos ( vd. ponto 2 da matéria de facto dada como provada ).

E)Mais, quer na data da celebração do contrato de arrendamento em causa nestes autos, quer posteriormente, nunca houve qualquer intenção das Apeladas em proceder a qualquer partilha.

F)Importa salientar que, conforme se pode verificar pela leitura do ponto 11 dos factos provados, o que está em causa não é a existência de uma real partilha, em que os imóveis existentes são adjudicados a uma ou a outra parte, mas sim uma mera formalização de uma situação já existente.

G)Com efeito, o imóvel em causa foi adjudicado, na respectiva proporção legal de 5/6 para a l.ª Autora/Apelada e de 1/6 para a 2.a Autora/Apelada, mantendo a primeira Autora/Apelada a quase totalidade da propriedade do imóvel objecto do locado.

H)Ou seja, na realidade não houve qualquer partilha, pois a situação mantém-se exactamente da mesma forma à que legalmente existiria se não fosse efectuada a partilha, em que uma das herdeiras teria direito à respectiva proporção legal 5/6 do imóvel e a outra herdeira a 1/6 do mesmo imóvel.

I)Ora, as Autoras/Apeladas apenas celebraram a partilha nesta altura e nestes moldes, com o fim único e exclusivo de terminar o contrato de arrendamento com o Apelado/Réu, invocando o direito previsto na alínea c) do artigo 1051.° do Código Civil.

J)Porém, de acordo com a nossa jurisprudência e doutrina não é admissível o exercício de um direito que não tenha senão o fim de prejudicar outrem, como é manifestamente o presente caso.

L)Por outro lado, o imóvel foi adquirido pela cabeça de casal na sua quase totalidade (5/6).

M)De acordo com o Acórdão da Relação de Lisboa, datado de 23-11-1995, em www.dgsi.pt: " O artigo 1051° n.° 1 al. c) do Código Civil, na parte em que estabelece a caducidade do contrato de arrendamento pela cessação dos poderes legais de administração com base nos quais o contrato foi celebrado, não tem aplicação nos casos em que o locador, cabeça-de-casal da herança indivisa a que pertença o prédio locado, venha posteriormente a adquirir a propriedade do mesmo por lhe ser adjudicado em partilha. " N)E ainda o Acórdão da Relação do Porto, datado de 11-12-2003, em www.dgsi.pt: " Se o que vier a ser por partilha, proprietário do bem arrendado, anuiu no arrendamento, ele não caduca ".

O)Ora, a 1.° Autora/Apelada, que anuiu no arrendamento, adquiriu a quase totalidade do imóvel em causa nos presentes autos (5/6) e a 2.a Apelada/Autora ao longo dos 14 anos de existência do arrendamento também anuiu no mesmo, pelo menos tacitamente, uma vez que tinha perfeito conhecimento de que o Apelante/Réu, e que é seu filho, "fez do locado a sua morada de família há mais de 14 anos e recuperou o imóvel conforme o descrito em 15 com a expectativa de que poderia manter o arrendamento enquanto o desejasse", ( vd. ponto 18 .° dos factos provados).

P)Destarte, salvo o devido respeito e melhor entendimento, dúvidas não podem restar que as Autoras criaram efectivamente no Apelado/Réu a convicção de que não invocariam a caducidade do contrato de arrendamento, o que fez com que o mesmo...

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