Acórdão nº 254/09.7TBVPV.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução11 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Decisão: Acordam na 2ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I - José .......e Maria ……., instauraram a presente acção declarativa comum com processo ordinário, contra A……., S.A., com sede em Pontevedra, Espanha, e P….. – Conservas e Pesca, S.A., com sede na Zona ……, Lote ….., Cabo da Praia, Praia da Vitoria, pedindo: a) A declaração da nulidade da oferta de aquisição de acções da sociedade P ......., efectuada por parte da 1.ª R. e bem assim a aquisição dessas mesmas acções, posteriormente operada por escrito particular, ordenando-se o cancelamento do respectivo registo na conservatória do registo comercial; b) A declaração da inconstitucionalidade do artigo 490.º do Código das Sociedades Comerciais, por violação expressa dos artigos 13.º e 62.º da CRP.

Para a hipótese de improcedência dos pedidos principais formulados, a título subsidiário, pediram: c) A declaração de que as acções de que o A. é titular na sociedade P ....... sejam adquiridas pela 1.ª Ré, desde a data de propositura da presente acção, fixando-se o valor de cada acção da indicada sociedade em dinheiro, atendendo a todos os factos expostos e de acordo com avaliação judicial a ser ordenada; d) A condenação da 1.ª R. a pagar ao A. a quantia a que tiver direito, atenta a participação detida na Ré, quantia que deverá ser acrescida dos juros legais, contados desde a data de propositura da acção, até integral pagamento.

Alegaram, para o efeito, ser o A. dono e legitimo possuidor de 75.000 acções da sociedade “P .......”, que se encontram penhoradas, sendo que as mesmas vieram a ser reduzidas a 6.000 acções, no valor nominal de € 5,00, em virtude da operação de redução e aumento de capital dessa sociedade, da qual o A. não teve conhecimento atempado, e relativamente à qual instaurou uma acção de anulação de deliberações sociais que corre termos pelo Tribunal Judicial da Praia da Vitoria, sob o nº 1078/08.4 TBAGH. Referem que no dia 31/03/2009, a 1ª R., “A ………”, fez publicar o anúncio correspondente ao documento junto como nº 3, informando os interessados dos termos da sua proposta de aquisição de 6.000 acções representativas do capital social da “P .......” ao abrigo do disposto no art 490º do CSCom, pelo preço de € 5,06 por cada acção, sendo que nesse anúncio tal R. não invocou que dispunha de 90% ou mais do capital social da “P .......”, tendo feito apenas constar que a oferta era destinada ao “domínio total do capital social” daquela empresa. A fixação do valor da contrapartida oferecida foi aparentemente “justificada” num relatório elaborado por um Revisor Oficial de Contas, supostamente independente, o qual estaria patente na sede de ambas as sociedades e depositado na respectiva conservatória do registo comercial. O prazo da oferta decorreria entre os dias 30 de Março e 6 de Abril de 2009, tendo ficado referido que os accionistas deveriam enviar as suas intenções de venda para a sede da sociedade oferente (que em lado algum se encontrava referida) mediante carta registada com aviso de recepção. O A. teve conhecimento através da CRCom da existência de uma carta, que lhe terá sido dirigida, datada de 30/03/2009, mas que não recebeu, da qual consta, aí sim, a indicação da sede da 1ª R. e a invocação da sua titularidade de 97,97% do capital social da “P .......”, na qual é apresentada ao A. uma “oferta de aquisição das seis mil acções (…) de que é titular, pelo montante de € 30.370,00 a pagar em numerário e imediatamente”. No dia 08/04/2009, a 1ª R. fez publicar um acto de registo referente a “Aquisição de Acções Tendente ao Domínio Total”, aquisição com a qual o A. não concorda, não aceita e não reconhece como válida, não aceitando ainda a contrapartida oferecida pela 1ª R. para a aquisição das suas acções, motivo pelo qual não as alienou no período determinado no anúncio, entendendo que não se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 490º do C.S.C para que a oferta acima referida seja válida.

Coloca, no entanto, como questão prévia, a decisão da acção de anulação de deliberações sociais acima referida, pois que era titular de 25% do capital social da “P .......” e viu a sua participação reduzida a 2,03% daquele capital por virtude de deliberações ilegais tomadas numa assembleia geral não convocada com a antecedência legal e na qual não participou, sendo que a ser julgada procedente tal acção será anulada toda a operação que conduziu a redução e ao aumento de capital da “P .......” por parte da 1ª R., motivo pelo qual aquela ficará titular tão só de uma participação de 75% do capital social daquela empresa, caindo por terra o primeiro fundamento para que possa proceder a aquisição das acções pertença do A.

E entendem, em última análise, que a acção terá que ser julgada procedente, porque a 1ª R. não tem sede em Portugal, mas sim em Pontevedra, Espanha, pelo que não se mostra preenchido o primeiro pressuposto de que a lei faz depender a aplicação do art 490º do CSC, sendo, consequentemente, nulo todo o processo de aquisição das acções do A.

As RR. contestaram, em contestações autónomas, arguindo a incompetência internacional e territorial do tribunal, a coligação ilegal dos pedidos, a ilegitimidade da 2ª R., e a não inconstitucionalidade do art 490º CSC. Requereram a suspensão da presente acção até que se mostre transitada em julgada a sentença que venha a ser proferida na referida acção de impugnação de deliberações sociais da R “P .......” , no mais pugnando pela improcedência total da acção, admitindo a relação de domínio, oferta e aquisição em causa, considerando-as não viciadas e perfeitamente válidas, pugnando ainda pela condenação dos AA. como litigantes de má fé.

Replicaram os AA., defendendo a competência do tribunal e a inexistência de cumulação ilegal de pedidos.

Em audiência prévia foi julgada improcedente a excepção de incompetência internacional e territorial, bem como a de ilegitimidade da 2ª R. e, tendo-se considerado prejudicial a aludida acção de anulação de deliberações sociais, foi declarada suspensa a instância nestes autos até ao trânsito em julgado dos autos nº 1078/08 .4TBAGH.

Essa acção foi julgada improcedente na 1ª instância, improcedência que foi confirmada no Tribunal da Relação, e, após, no STJ, aí por acórdão de 16/2/2016.

Na prossecução da acima aludida audiência prévia, foi decidida a admissibilidade da cumulação de pedidos e procedeu-se ao imediato conhecimento do mérito da causa, julgando-se a acção procedente por se ter entendido ser requisito de aplicação do disposto no art 490º CSC que ambas as sociedades tenham sede em Portugal e, em consequência, declarou-se a nulidade da oferta de aquisição de acções da 2ª R. P ....... – Conservas e Pesca, S.A. efectuada pela 1ª R. A…………, S.A. mencionada em IV. dos factos provados e a nulidade da aquisição de acções registada e mencionada V. dos factos provados, ordenando-se o cancelamento do respectivo registo na conservatória do registo comercial, julgando-se improcedente o pedido de litigância de má fé formulado pelos RR.

II – Do assim decidido, apelaram as RR. que concluíram as respectivas alegações do seguinte modo: I. O n.º 2 do artº 481º do Código das Sociedades Comerciais viola frontalmente os princípios de não-discriminação em razão da nacionalidade emergente do Tratado de União Europeia e os princípios da igualdade e da equilibrada concorrência empresarial estabelecidos pela Constituição da República Portuguesa.

  1. Assim, a interpretação literal e irrestrita da referida norma apresenta-se como inconstitucional e contrária ao direito europeu, que àquela norma se sobrepõe.

  2. Assim, deverá considerar-se aquela norma do n.º 2 do art.º 481.º tacitamente revogada por força da aprovação do Tratado que Institui a Comunidade Europeia e do Tratado de União Europeia ou, pelo menos, ser a mesma restritivamente interpretada, no sentido de que a referência à necessidade de sede em Portugal, se refere à necessidade de sede em Estado-Membro da União Europeia, IV. Ou, em todo o caso, ser a referida norma desaplicada, por via da sua inconstitucionalidade.

  3. O despacho-sentença recorrido viola assim o n.º 1 do art.º 9.º do Código Civil, os artigos 9.º, 18.º, 49.º, 54.º e 61.º do Tratado de União Europeia e os artigos 13.º e 81.º, alínea f) da Constituição da República Portuguesa.

  4. E em consequência e no que diz respeito aos presentes autos, ser revogada a sentença recorrida e ordenado o prosseguimento dos autos.

    O A. apresentou contra alegações concluindo-as nos seguintes termos: 1- O douto despacho de fls. dos autos ora em crise, deve manter-se pois não padece de qualquer nulidade e consubstancia uma solução que consagra a justa e rigorosa interpretação e aplicação ao caso sub judice das normas e princípios jurídicos competentes.

    2- O art. 490º do CSC, apenas é aplicável quando ambas as sociedades Rés tenham sede em Portugal.

    (neste sentido, vd. o novo “Código das Sociedades Comerciais Anotado” da Clássica de Lisboa, com a coordenação de António Cordeiro, Almedina, 2009, anot. 5 b) ao artº 490º por Ana Perestrelo de Oliveira 3- Na verdade, esse artigo aparece consagrado no capítulo III, do Título VI, do CSC, relativo às sociedades coligadas, e a disposição geral de tal título, constante do art. 481º do CSC, refere que: nº 1 – O presente título aplica-se apenas a relações que, entre si, estabeleçam sociedades por quotas, sociedades anónimas e sociedades em comandita por acções. nº 2 – O presente título aplica-se apenas a sociedades com sede em Portugal, salvo quanto às excepções previstas nas alíneas a), b), c) e d).

    (sublinhado nosso) 4- Assim, como a situação em causa, não é contemplada em qualquer uma dessas excepções previstas nas alíneas referidas, o mencionado art. 490º do CSC. só poderá ser aplicado quando quer a sociedade dominante (a Ré A……., S.A.) quer a dominada (P ....... – Conservas e Pesca, S.A.) tenham sede em Portugal e, 5- As próprias excepções supra mencionadas, tal como o Tribunal refere “aparecem...

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