Acórdão nº 10032/16.1T8LSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 17 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução17 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa Relatório: AAA residente em Lisboa, intentou, com o patrocínio do Ministério Público, a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra BBB, E.P.E., com sede em Lisboa, pedindo: -Seja declarado e reconhecido que a A. exerce função na categoria profissional de enfermeira; -Seja declarado e reconhecido que a A. presta serviço de qualidade, quantidade, natureza e em horário igual aos enfermeiros da mesma categoria profissional que a sua e contratados no regime de CTRFP; -Seja declarado e reconhecido que assiste à A. o direito a receber do R. a mesma retribuição que resulta do reposicionamento da carreira dos enfermeiros em funções públicas, desde 01/01/2013 em diante, no valor base de € 1.201,48, incluindo férias, subsidio de férias e de Natal; E em consequência: -Seja o R. condenado a equiparar o vencimento da A. com o vencimento auferido pelos enfermeiros integrados na função pública, desde 01/01/2013; -Seja o R. condenado a pagar à A. a quantia de € 8.163,90 referente às diferenças de retribuição base, férias, subsídio de férias e Natal, desde 01/01/2013 até 31/03/2016; -Seja o R. condenado a pagar à A. juros de mora à taxa de 4%, vencidos e vincendos, sobre as quantias peticionadas, até integral pagamento.

Fundamentou a sua pretensão no princípio trabalho igual salário igual, já que, tendo sido admitida ao serviço do R. em 4/6/2007 mediante contrato individual de trabalho, exerce funções em condições de igualdade relativamente àquelas em que exercem os enfermeiros que trabalham para o R. mediante contrato de trabalho em funções públicas, inexistindo fundamento para a discriminação salarial que se verifica desde Janeiro de 2013.

O R. contestou sustentando que os enfermeiros em regime de contrato de trabalho em funções públicas estão sujeitos a uma prestação de trabalho mais exigente, mormente a deveres a que não estão adstritos os enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho, por terem vedada a possibilidade de acumulação de funções públicas em actividades de prestação de cuidados de saúde e limitada a admissibilidade do exercício de funções privadas em acumulação.

Após audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu o R. do pedido.

A A., não conformada, apelou, formulando a final as seguintes conclusões: 1- Em face dos factos assentes o julgador deveria ter condenado a Ré de harmonia com o pedido constante da petição inicial.

2- Resulta da factualidade assente que as funções da autora e dos demais enfermeiros que trabalham no mesmo serviço são iguais às desempenhadas pelos enfermeiros com vínculo à ré de contrato de trabalho em funções públicas.

3- É que na sentença foi dado como assente que: “19.– A R. não reposicionou a remuneração da A, a partir de 01/01/2013, para o nível 15, aplicando apenas tal Diploma aos enfermeiros contratados ao abrigo do RCTFP, que viram a sua retribuição base passar de € 1.020,06 para € 1.201,48.

  1. – Continuando a A. a auferir a retribuição base de € 1.020,06 pelo desempenho das mesmas funções de enfermeira, com o mesmo nível e categoria profissional e no mesmo horário que os enfermeiros contratados ao abrigo do RCTFP ao longo dos anos de 2013, 2014 e 2015.

  2. – Apesar da A. prestar e continuar a prestar serviço de qualidade, quantidade, natureza e horário iguais ao trabalho prestado pelos enfermeiros contratados ao abrigo do RCTFP.

  3. – As funções que a A. exerce são as de enfermagem e são exactamente iguais às desempenhadas para o R. pelos enfermeiros com vínculo à função pública, contratados ao abrigo do RCTFP.-“.

    4- Reconheceu ainda o julgador na sentença ora recorrida que,-“ No caso vertente, alegou e provou a A – aliás sem oposição do R. – que aufere uma remuneração mensal inferior a outros colegas seus, com igual categoria profissional, idêntico horário de trabalho e em execução das mesmas funções, quer em qualidade, quer em quantidade, quer ainda na sua natureza” 5- Invoca-se na sentença que subsiste uma diferença no modo de prestação da actividade de enfermeiro entre a A. e aqueles seus colegas e refere-se que estes últimos com o seu contrato de trabalho regidos pela Lei nº 35/2014 estão sujeitos a várias restrições que não abrangem os trabalhadores contratados através de contrato individual de trabalho.

    6- Sucede que dos factos assentes não ficou provado o invocado modo diferente de prestação por banda da A.

    7- Segundo a sentença, um enfermeiro com contrato de trabalho em funções públicas tem a sua liberdade contratual no que à actividade laboral concerne, muito mais coarctada que o seu congénere em situação idêntica à da A.

    8- A defesa da ré a invocar as limitações de acumulação de funções dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, ou seja, com a diferença de regimes aplicável, não colhe no caso em apreço.

    9- Na verdade o Código do Trabalho também tem inúmeras restrições à prestação laboral em regime de acumulação ou até mesmo ao princípio da imparcialidade.

    10- Veja-se o amplo elenco dos deveres do trabalhador que resultam do disposto no art.º 128º., do Código do Trabalho.

    11- E trata-se de uma enumeração meramente exemplificativa.

    12- A diferente natureza do vínculo, tal como se expende do Ac. do T.R. de Lisboa de 4-6-2014, in WWW.dgsi.pt, isto é trabalhador em regime de emprego público e em regime de contrato de trabalho, não tendo tal factor qualquer influência na quantidade, natureza e qualidade do trabalho, o princípio a trabalho igual, salário igual, numa vertente positiva, exige daquele uma atitude activa de equiparação substantiva em matéria retributiva, e, por inerência, em matéria de promoção profissional.

    13- No caso vertente e da matéria de facto assente não resulta que a diferente natureza do vínculo tenha qualquer influência na quantidade, natureza e qualidade do trabalho da A. em comparação com as dos outros enfermeiros em regime de emprego público.

    14- Temos assim que o diferente tratamento remuneratório dada pela R. à A. no caso em apreço nos autos mostra-se irrazoável, arbitrário e discriminatório.

    15- Há pois por banda da Ré uma violação do princípio de trabalho igual salário igual por a Ré não ter procedido ao reposicionamento remuneratório da autora previsto no artigo 5º do Decreto-Lei n.º 122/2010 e desde 01 de Janeiro de 2013, como fez com os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas.

    16- No caso dos autos e tendo em consideração que se provou que a autora desempenha as mesmas funções que são iguais às dos seus colegas que têm contrato de trabalho em funções públicas e que todos têm a mesma carga horária não existe fundamento para a diferenciação de tratamento.

    17- O facto de a A. ter com a Ré um vínculo laboral de natureza privada, um contrato de trabalho, não determina qualquer influência na quantidade, natureza e qualidade do trabalho.

    18- Temos pois que o princípio da igualdade de tratamento a impor que a trabalho igual salário igual exigia a condenação da Ré nos termos indicados na petição inicial.

    19- A autora (tem) direito a receber a mesma retribuição que os enfermeiros da função pública com a mesma carga horária, sendo este reposicionamento salarial com efeitos a 01 de Janeiro de 2013.

    20- A sentença recorrida violou o preceituado nas disposições conjugadas dos arts. 13º,17º, 18º, 59º., n1, al.a), da C.R.Portuguesa e arts. 23º e 270º., do C. do Trabalho e arts. 23º.,25.º e 144º., nº 2, da LGTFP.

    21- Normativos que devem ser interpretados e aplicados com o sentido e alcance sustentado no presente recurso.

    22- A sentença ora recorrida deverá, assim, ser revogada e substituída por outra a condenar a Ré em conformidade com os factos assentes e o pedido exarado na petição inicial.

    O R. não apresentou contra-alegações.

    O objecto do recurso consiste apenas na reapreciação da questão que constitui o cerne do litígio, qual seja, se existe fundamento material bastante que justifique o diferente tratamento salarial verificado no período de Janeiro de 2013 a Setembro de 2015 entre os enfermeiros que prestam serviço num Centro Hospitalar EPE ao abrigo do regime de contrato individual de trabalho, por comparação com os enfermeiros que prestam serviço na mesma entidade ao abrigo do regime de...

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