Acórdão nº 277/07.0TQPDL-D.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelARLINDO CRUA
Data da Resolução20 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1].

I–RELATÓRIO: 1–C.

, residente na Rua ….., P. D., interpôs processo especial de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais, na vertente do regime de visitas, do menor filho L. F.

, contra M.

, residente na Rua………, nos quadros do artº. 41º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível – aprovado pela Lei nº. 141/2015, de 08/09.

Alegou, em síntese, o seguinte: – Por acordo celebrado no apenso C de Alteração da Regulação das Responsabilidades Parentais, datado, de 07/04/2016, e devidamente homologado, determinou-se que o menor L. F. teria convívios com o pai, no PEF, com periodicidade quinzenal ; – Todavia, apenas foi possível realizar um encontro, pois a Requerida mãe não levou o filho aos demais encontros agendados, não tendo sequer justificado a sua não comparência ; – Face ao incumprimento da mãe o PEF suspendeu as visitas entre pai e filho, não tendo o requerente convivido com o menor desde 20 de Junho de 2016 ; – Tal situação é um caso claro de alienação parental, de afastamento do filho de um dos progenitores, provocado pelo outro ; – O relatório do PEF é claro ao dizer que bastou uma visita para que, no seu final, pai e filho conseguissem conversar tranquilamente durante algum tempo, sem intervenção técnica ; – Devido ao seu comportamento, de sucessivo e reiterado incumprimento, altamente censurável, deverá a mãe ser condenada em multa, nos termos do n.º 1 do art.º 41.º do RGPTC ; – Bem como indemnizar o Requerente pelos danos morais causados, devidos ao tempo que tem passado, sem que possa ver o filho, pelo crescimento e evolução do menor, que o pai tem perdido e pelo sofrimento, desgaste psicológico, tristeza constante, noites mal dormidas, que a ausência de um filho provoca num pai ; – Todo este sofrimento do pai, de consequência directa da conduta ilícita da mãe, merece a tutela do direito, podendo e devendo ser indemnizável, em montante nunca inferior a 10.000,00 € (Dez mil euros), nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 41.º do RGPTC.

Conclui, deduzindo o seguinte petitório: “termos em que se requer a V. Ex.ª se digne ordenar a realização de todas as diligências que se possam revelar com utilidade para o cumprimento, por parte da mãe/requerida, que deverá ainda ser condenada em multa, cujo montante deverá ser decidido por V. Ex.ª e em indemnização a favor do pai/requerente, no valor de 10.000 € (Dez mil euros) nos termos peticionados, à qual acrescem juros à taxa legal desde a notificação do presente pedido até efectivo e integral pagamento”.

2– A fls. 14 e 15 veio a Requerida responder ao alegado pelo Requerente, aduzindo que o mesmo nunca fez caso do filho, que o usa para atingi-la, que apenas pretende vingar-se da Requerida e que sempre foi vítima do mesmo. Acrescenta que apenas pretende proteger o filho, que não quer estar com o pai, devido aos traumas que este lhe infligiu.

No final, arrolou testemunhas cuja audição requer.

3– Nos quadros do nº. 3 do artº. 41º do RGPTC, foi realizada conferência de progenitores no dia 27/04/2017, tendo ambos prestado declarações, mas sem lograrem acordar acerca do presente processo especial de incumprimento.

Em tal sede, foi designada data para audição das testemunhas arroladas por Requerente e Requerida, nos termos do nº. 5 do artº. 39º, ex vi do nº. 7 do artº. 41º, ambos do RGPTC, bem como para audição do menor.

4– Tais inquirições e audição vieram a ocorrer, conforme actas de fls. 37 a 39.

5– Foi então proferida sentença, datada de 09/07/2017 – cf., fls. 40 a 42 -, que findou com a seguinte DECISÃO: “Nestes termos e em conformidade declara-se improcedente, por não provada, a presente ação de incumprimento da regulação do exercício das responsabilidades parentais, e em consequência absolve-se a requerida do pedido de condenação em multa e de pagamento de indemnização ao requerido.

Custas pelo requerido.

Registe e notifique”.

6– Inconformado com o decidido, o Requerente interpôs recurso de apelação, em 13/09/2017, por referência à decisão prolatada.

Apresentou, em conformidade, o Recorrente as seguintes CONCLUSÕES: “1- Entende o recorrente que alguns pontos da matéria de facto que suportam a decisão proferida na presente ação foram decididos com erros de interpretação.

2- No que concerne ao facto constante do ponto 8 da fundamentação de facto da douta sentença recorrida, é referido que o menor terá adoptado no dia 20 de junho uma "postura ambivalente, umas vezes recusando comunicar com o pai e outras respondendo às questões que o pai colocava", não sendo possível retirar-se deste comportamento dúbio ser contra sua a vontade o convívio com o seu pai.

3- O relatório do PEF, datado de 6 de julho de 2016, reitera que bastou uma única visita para que pai e filho lograssem conversar tranquilamente no seu final durante algum tempo, sem qualquer intervenção técnica (Doc. 1).

4- Pese embora tenha sido pacífico o término deste encontro entre pai e filho, a mãe deixou de comparecer ou justificar as suas faltas nas visitas que tinham sido agendadas posteriormente.

5- Se, por um lado se alude no ponto 9 da fundamentação de facto a uma recusa do menor em comparecer nas visitas que foram agendadas para os dias 27 de junho e 4 de julho, por outro é, no mínimo, de estranhar não ter sido dada qualquer justificação por parte da progenitora relativamente à falta de aviso de que não iria comparecer, e ao facto de não ter devolvido as chamadas telefónicas que as técnicas do PEF lhe fizeram a fim de apurar a causa de tais ausências.

6- Ora, tendo sido o menor confiado à guarda e cuidados da progenitora, a quem foi conferido o exercício exclusivo das responsabilidades parentais, como se encontra referido no ponto 2 da fundamentação de facto, não parece descabido inferir a existência de incumprimento do direito de visita do progenitor em relação ao menor.

7- Este incumprimento por parte da mãe torna pouco verosímil que ela não tenha tido qualquer contributo em obstar aos convívios do menor com o pai, em nada abonando este comportamento no sentido da promoção dos encontros entre pai e filho.

8- Destarte, o facto de o menor dizer que é ele que não gosta do pai e que sempre que o vê reacende na sua memória todos os infortúnios passados outrora resulta da influência da sua progenitora que, ao não comparecer, nem justificar as suas ausências revela ser ela a causadora da falta de relação entre pai e filho.

9- Releva sobremaneira mencionar que tal inadimplemento não consubstanciou uma situação esporádica, na medida em que em setembro de 2014 a mesma progenitora já havia adotado a mesma atitude, tendo faltado a um encontro agendado pelo PEF, cf. se refere no relatório junto (cit.

Doc. 1).

10- Não obstante ter sido dado como não provado o facto de a mãe ter tido o intuito de afastar o filho do progenitor, impedindo que "construa com este uma relação, para assim punir e ferir o progenitor", a verdade é que o recorrente, em virtude de não conviver com o filho desde o dia 20 de junho de 2016 porquanto o PEF suspendeu entretanto as visitas, passou a dormir mal e a padecer de um incomensurável sofrimento de tristeza.

11- Nesse sentido, atentem-se os depoimentos das testemunhas A. e R..

12- Em face do exposto, não é expectável afirmar, como o fez a douta sentença recorrida na motivação da decisão de facto, que a mãe é "totalmente alheia" à recusa do filho em conviver com o pai, não se conseguindo descortinar a razão pela qual incumpriu os deveres a que estava adstrita e a que já se mencionou supra.

13- Esta situação constitui um caso evidente de alienação parental, em que um dos progenitores contribui para o afastamento do filho relativamente ao outro progenitor.

14- Na mesma motivação da decisão de facto também se aborda a inexistência de qualquer conduta culposa da requerida, aspeto que, com a devida vénia à douta sentença recorrida, não é de acompanhar, na medida em que não foi referido nem se vislumbra haver lugar aqui a nenhuma causa de exclusão de culpa por parte da progenitora.

15- É que, de outro modo, estão abertas as portas a futuros incumprimentos das obrigações da progenitora decretadas pelo Tribunal, na medida em que não lhe é apontada nenhuma consequência.

16- Á revelia do que foi decidido na douta sentença recorrida, entende-se ser de aplicar o art.º 41.º, n.º 1, do RGPTC.

17- O Tribunal de primeira instância começa por citar o preceito em causa, não o aplicando ao caso sub judice com o fundamento de não ser possível imputar o incumprimento supramencionado a título de culpa. No entanto, a culpa tem duas modalidades: o dolo e a negligência ou mera culpa (omissão da diligência que era exigível ao agente), subdivindo-se esta última em negligência consciente e negligência inconsciente.

18- Segundo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, n.º 07S3655, de 13 de dezembro de 2007 (SOUSA PEIXOTO), "há negligência consciente quando o agente previu a verificação do facto ilícito como possível, mas por leviandade, precipitação, desleixo ou incúria acreditou na sua não verificação, e só por isso não tomou as providências necessárias para o evitar. E diz se que há negligência inconsciente quando o agente não chega sequer, por imprevidência, descuido, imperícia ou inaptidão, a conceber a possibilidade de o facto se verificar, podendo e devendo prevê-lo e evitar a sua verificação, se tivesse usado da diligência devida".

19- Ora, não tendo sido provada a culpa na modalidade dolosa, já não parece de afastar a imputação à progenitora do incumprimento do direito de visita a título de negligência consciente, na medida em que o representou como possível, mas por incúria acreditou na sua não verificação, não tendo tomado, por conseguinte, as providências necessárias para o evitar.

20- Por conseguinte e em virtude do seu comportamento, que se pautou por um sucessivo e reiterado incumprimento, altamente censurável, deverá a mãe ser condenada em multa, nos termos do n.º...

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