Acórdão nº 928/16.6T8LSB-A.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução06 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: ... INVESTMENTS LIMITED, sociedade com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, em 14/01/2016, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BANCO ESPÍRITO SANTO, S.A. (doravante, BES) e NOVO BANCO S.A. (doravante, NB), formulando os seguintes pedidos: 1.– Condenação dos réus a pagar solidariamente à autora: a)- A quantia de € 650.000,00 a título de capital correspondente à subscrição de obrigações; b)- Os juros de mora calculados sobre o capital aplicado, à taxa legal anual de 4% a partir da citação até efetivo e integral pagamento.

  1. – Deverá conhecer-se a título incidental, nos termos do disposto nos artigos 161.º, n.º 2, alínea d), e 162.º, n.º 2, ambos do CPA, e no artigo 91.º do CPC a nulidade parcial das deliberações do BdP de 3 e 11 de agosto de 2014, juntas à presente ação.

  2. – Os Réus deverão, ainda, ser condenados em custas de parte e honorários aos mandatários da autora, e demais consequências legais.

    Alegou, em suma, que em 27/11/2009 adquiriu por sugestão e conselho do seu gestor do BES, obrigações Espírito Santo Tourism (Europe), S.A., no valor global de €950.000,00, constando em 03/08/2014, data da medida de resolução aplicada pelo Banco de Portugal (BdP) ao BES, na sua carteira de títulos o valor de €650.000,00, com vencimento em 22/11/2014 e previsão de pagamento de juros anuais à taxa de 5,85%.

    Não obstante, a autora não foi reembolsada do investimento na data do vencimento.

    O BES violou o dever de informação enquanto banqueiro e intermediário financeiro no que diz respeito ao elevado risco inerente à subscrição daquelas obrigações, bem como em relação à situação económica em que o BES já naquela data se encontrava.

    Em face da medida de resolução aplicada ao BES e transmissão da provisão efetuada para reembolso da dívida do GES e das obrigações inicial e publicamente assumidas para reembolso da dívida do BES colocada no retalho, o NB é solidariamente responsável pelo referido reembolso dos referidos €650.000,00.

    A deliberação do BdP de 03/08/2011 e de 11/08/2104 ao excluírem da transferência de responsabilidades as obrigações, garantias, responsabilidades ou contingências assumidas na comercialização em sede de intermediação financeira pelo GES, anteriores a 30/06/2014, viola princípios constitucionais (princípio da igualdade) e são parcialmente nulas nos termos do artigo 161.º, n.º 2, alínea d), do Código do Procedimento Administrativo (CPA). Trata-se de questão incidental que, de acordo com o estatuído no artigo 91.º do CPC e 162.º, n.º 2, do CPA, pode ser conhecida a título incidental nesta ação.

    Subsidiariamente, alega que, caso se entenda que a transmissão das obrigações em causa nestes autos, foram excluídas pelas deliberações citadas, então, tendo a Espírito Santo Tourism (S.A.) sido vendida em agosto de 2013, deixou de integrar o GES, não ficando a sua comercialização abrangida por aquela exclusão, sendo o NB responsável pela indemnização peticionada.

    Contestaram os réus, e no que agora releva para o conhecimento do presente recurso, o NB excecionou a competência em razão da matéria dos tribunais cíveis para conhecer da alegada ilegalidade das deliberações do BdP.

    Ademais, estando em apreciação se, por via das alegadas nulidades das deliberações do BdP, será possível imputar ao NB alguma responsabilidade pelo pagamento das obrigações subscritas pela autora, a questão em apreciação nestes autos não é incidental, mas essencial.

    Concluiu, assim pela sua absolvição da instância nos termos do artigo 99.º do CPC.

    A autora respondeu como consta de fls. 143 a 147 deste Apenso, defendendo a improcedência da exceção de incompetência absoluta rem razão da matéria.

    Em 14/06/2016 (Ref.ª 354168787 – fls. 148 a 150 deste Apenso), foi proferido despacho, que vem a ser o recorrido, que julgou «procedente a exceção da incompetência do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa em razão da matéria quanto ao pedido de apreciação da nulidade parcial das deliberações do Banco de Portugal de 3 e 11 de agosto de 2014 e, consequentemente, absolv[eu] as RR. da instância quanto a tal pedido, nos termos dos arts. 99º nº 1 e 278º nº 1 al. a) do C.P.C.» Inconformada, apelou a autora apresentando as conclusões infra transcritas, concluindo pela improcedência da exceção invocada e revogação da decisão recorrida.

    Respondeu o NB defendendo a manutenção do decidido.

    O recurso foi admitido por despacho de fls. 639 do processo principal (1.ª parte).

    CONCLUSÕES DA APELAÇÃO.

    1. –A Autora/Recorrente pede a condenação das Rés/Recorridas a pagar-lhe a quantia de €650.000,00, acrescida dos juros de mora, e, a “título incidental”, de acordo com o artigo 91.º do CPC, solicita que se conheça da nulidade parcial das deliberações do Banco de Portugal (BdP) de 3 e 11 de agosto de 2014.

    2. –O Réu NB invocou a exceção da incompetência absoluta em razão da matéria deste Tribunal quanto à solicitada nulidade parcial das deliberações do BdP, alegando que tal questão só poderia ser apreciada e decidida pelos Tribunais Administrativos, e por Douto Despacho de fls. ..., de que ora se recorre, o Tribunal considerou que a medida de resolução do BdP integra a causa de pedir da ação, afirmando que a questão da apreciação das decisões do BdP é fundamental, pertencendo aos Tribunais Administrativos e, consequentemente, julgou procedente a exceção da incompetência em razão da matéria, absolvendo as Rés desse pedido.

      ASSIM, 3.ª–A questão que se coloca é, a de se saber, se o Tribunal Judicial Cível de Lisboa, onde a ação foi proposta, é, ou não, materialmente competente para conhecer do objeto da ação, bem como do pedido formulado a título incidental.

      ORA, 4.ª–Como é sabido e nos parece pacífico, a competência material afere-se pela forma como o autor configura a ação, sendo esta definida pelo pedido, pela causa de pedir e pela natureza das partes.

      Ou seja, 5.ª–Para se fixar a competência dos tribunais em razão da matéria, deve atentar-se à relação jurídica material em debate e ao pedido dela emergente, segundo a versão apresentada em juízo pelo demandante.

    3. –Compulsando as circunstâncias acima mencionadas, verifica-se que a Autora formulou um pedido de indemnização cível (objeto do processo) contra o NB (condenação solidária) baseando-se em vários argumentos (causa de pedir), a saber: assunção da obrigação de reembolso, assunção da garantia do seu pagamento, e transmissão da responsabilidade do Réu BES pela intermediação financeira ao Réu NB.

    4. –Pelo que, a questão da nulidade parcial não é essencial, mas sim incidental.

    5. –Acresce que, analisada a PI, constata-se que a Autora não peticiona a impugnação de qualquer ato administrativo do Conselho de Administração do BdP, mas limita-se a arguir a nulidade parcial das deliberações do BdP de 3 e 11 de agosto de 2014, a título meramente incidental tendo, por isso, o Tribunal Judicial Cível competência para conhecer dessa invalidade parcial a título incidental ao abrigo do disposto no artigo 91.º, n.º 1, do CPC.

    6. –Delimitado o objeto do processo, verifica-se que não estamos perante uma causa que seja subsumível à competência do foro administrativo, confirmando essa tese a natureza das partes.

    7. –A Autora não peticiona ao Tribunal que declare a invalidade parcial da medida de Resolução do BdP. Trata-se, antes, de uma questão incidental que nos termos do artigo 91.º, n.º 1, do CPC deve ser apreciada incidentalmente pelo Tribunal.

    8. –Não se deve confundir competência enquanto medida de jurisdição para conhecer o objeto da ação com competência incidental.

    9. –Sendo o Tribunal Cível o competente em razão da matéria para o conhecimento da questão principal ou fundamental submetida pela Autora ao escrutínio judicial, será também ele o competente para o conhecimento da nulidade parcial conexa deduzida na PI, enquanto isoladamente considerada, fosse competente, o foro administrativo.

    10. –A decisão de que se recorre, tendo em conta o objeto da ação e o peticionado a título meramente incidental viola o disposto no artigo 91.º, n.º 1, do CPC, devendo ser revogada com todas as consequências legais.

      Nos termos expostos, conclui-se, que deve improceder a exceção dilatória de incompetência absoluta em razão da matéria, devendo ser...

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