Acórdão nº 3265/10.6TBCSC.1.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DE DEUS CORREIA
Data da Resolução21 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam na 6.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: J... veio instaurar execução especial para pagamento de alimentos contra seu pai: L..., ambos melhor identificados nos autos.

A execução foi liminarmente indeferida.

Para melhor esclarecimento transcreve-se o teor da decisão de indeferimento liminar do requerimento executivo: “Salvo o devido respeito, a presente acção executiva não pode prosseguir por falta de título executivo.

Vejamos.

A pensão de alimentos em discussão foi fixada na menoridade da jovem. Com a maioridade da mesma cessaram as responsabilidades parentais – cfr. artº 1877º do Código Civil (CC). Sendo que, nos termos do disposto no artº 1879º do CC “os pais ficam desobrigados de prover ao sustento dos filhos e de assumir as despesas relativas à sua segurança, saúde e educação na medida em que os filhos estejam em condições de suportar, pelo produto do seu trabalho ou outros rendimentos, aqueles encargo.” Contudo, nos termos do artº 1880º do CC, “se, no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado o filho não houver completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere o artigo anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete.” Ou seja, a obrigação de alimentos fixada na menoridade não assenta nos mesmos pressupostos que assenta a fixação de uma pensão na maioridade do jovem.

Estamos perante dois direitos diferentes, embora o conteúdo, na prática, possa ser igual. E assim é porquanto, a fixação de alimentos a filho maior depende da verificação de vários requisitos em simultâneo que não são exigíveis na menoridade. Na menoridade a obrigação dos pais pagarem alimentos resulta do simples facto da incapacidade do menor, que é naturalmente incapaz de cuidar da sua pessoa ou prover ao seu sustento. De acordo com o disposto no artº 1874º do CC, os pais estão vinculados ao dever de assistência dos seus filhos, compreendendo tal dever a obrigação de prestar alimentos e a de contribuir, durante a vida em comum e de acordo com os recursos próprios, para os encargos da vida familiar. Decorrendo do disposto no nº 1 do artº 1878º do CC, a obrigação dos pais de velar pela segurança e saúde dos filhos, bem como de prover ao seu sustento. Tal obrigação assume-se mesmo como um dever fundamental, porquanto resulta do disposto no nº 5 do artº 36º da Constituição da República Portuguesa, que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos. Mas isto tudo assenta no facto dos filhos serem incapazes conforme expressamente o diz o artº 123º do CC quando dispõe que “salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercício de direitos.” Daí que a obrigação de prover ao sustento do filho menor seja uma obrigação legal que não depende sequer das possibilidades económicas dos progenitores, que a título exemplificativo se vê no artº 2005º do CC quando este permite àquele que for obrigado a alimentos “se mostrar que os não pode prestar como pensão, mas tão-somente em sua casa e companhia, assim poderão ser decretados”. Com a maioridade de uma pessoa, tudo isso muda, deixando essa pessoa de estar inibida de exercer direitos, de precisar dos pais ou outra pessoa para o representar e para gerir a sua pessoa e bens.

Podendo, como tantos jovens fazem, trabalhar para angariar o seu sustento ou, pelo menos, ajudar nesse sustento. Assim, para que se possa continuar a exigir dos pais a participação no sustento do filho maior há que verificar se existem outros requisitos – que não aqueles que se verificavam na menoridade – para justificar essa participação. São estes requisitos que obrigam à instauração de nova acção pois que o direito do filho maior a alimentos é um direito novo, que nasce com a sua maioridade e com a verificação dos requisitos legais.

Esses requisitos, cumulativos, são: - continuação dos estudos com vista a obter formação académica ou profissional com vista a alcançar a autonomia; - aproveitamento nesses estudos; - o cumprimento dos deveres de filho que permita concluir-se pela razoabilidade de se exigir do progenitor não guardião o pagamento de uma pensão; ou, - a existência de uma cláusula de desculpação caso se constate que o filho não cumpre com os seus deveres (de respeito, de manter o progenitor não guardião informado acerca da sua pessoa e estudos, cordialidade, e visitas), como por exemplo, ter sido o progenitor não guardião a ter dado aso ao afastamento do filho.

Todos estes requisitos nascem apenas e tão só na maioridade do jovem pois, até essa maioridade, o menor pode até nem ter aproveitamento escolar, pode até nem visitar o progenitor não guardião, pode até ter atitudes menos correctas, que nenhuma dessas circunstâncias permite isentar o progenitor não guardião de participar no sustento do filho, apenas e tão só porque o mesmo é menor, e por isso, incapaz. Dito por outras palavras, a obrigação de um pai pagar alimentos a filho menor assenta exclusivamente no facto do mesmo ser incapaz, enquanto que a obrigação de um pai pagar alimentos a um filho maior assenta na verificação de outros requisitos. Dúvidas não podem, assim, restar de que a pensão de alimentos fixada na menoridade não transita automaticamente para a maioridade, sendo que se tratam de dois direitos distintos e autónomos. Pelo que o título judicial que servia de base aos incumprimentos suscitados na menoridade da jovem não é o mesmo necessário para accionar o direito a alimentos na maioridade. Ora, a exequente, enquanto filha maior do executado, parte do pressuposto que a obrigação de pagar alimentos a filho maior nasceu na menoridade e que se mantém automaticamente na maioridade, esquecendo-se que se trata de dois direitos diferentes. Daí ter concluído que o não pagamento da pensão de alimentos na maioridade traduz um mero incidente de incumprimento que deve ser tramitado no Tribunal, através desta acção executiva. Como já vimos, tal não está correcto porquanto, com a maioridade, há que verificar a existência dos requisitos legais que permitam a fixação de uma pensão de alimentos ao progenitor não guardião.

E...

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