Acórdão nº 62/17.1T8TVD.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução13 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: AAA, residente em (…), Lourinhã, propôs, com o patrocínio do Ministério Público, contra BBB, S.A.

, com sede no Porto, a presente acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, alegando, em síntese, que, após ter sido entrevistado e aprovado para efeitos de admissão profissional pela empresa (…), em 22 de Agosto de 2014 celebrou com a Ré contrato de trabalho temporário com termo certo de 30 dias, sendo a referida (…) a empresa utilizadora. No dia 5 de Fevereiro de 2016, a Ré comunicou-lhe a intenção de não renovação do contrato de trabalho que assim caducaria a 21.02.2016. O motivo invocado para a celebração do contrato de trabalho temporário - «reforço temporário da triagem manual devido ao aumento de material transferido do CTE para o CTO para reprocessamento» - além de insuficientemente concretizado, é falso, pois nunca teve qualquer relação com as funções desempenhadas na execução do contrato de trabalho, que correspondiam a necessidades permanentes e diárias, pelo que o contrato deve ser considerado como um contrato de trabalho sem termo, de acordo com o disposto nos arts. 181.º, n.º 2, 147.º, n.º 1, al) a e c e 141.º, n.º 3 do Cód. de Trabalho, e como tal deve a ordem de cessação do contrato ser considerada um despedimento ilegal que ocorreu sem justa causa nem procedimento disciplinar, o que lhe confere direito à reintegração ou o direito a indemnização por antiguidade.

Dos 54 dias de férias a que tinha direito pelo tempo de trabalho prestado o Autor apenas gozou 5 dias pois a Ré não marcou, autorizou ou permitiu que o Autor gozasse 49 dias de férias, que embora pagas, não foram gozadas.

Por ter sido despedido da forma acima narrada sofreu um forte abalo emocional e nervoso, estado de choque, sentiu-se muito desanimado, sofreu um intenso desgosto, perdeu a vontade de comer, teve dificuldade em dormir, passou a ficar facilmente irritável e em estado de apatia, passou a sofrer de grande ansiedade e angústia, foi obrigado a colocar a casa de morada de família à venda contando com o apoio de familiares para viver.

Concluiu peticionando que seja o contrato de trabalho considerado como contrato por tempo indeterminado, não temporário e sem termo, em função da inexistência de motivo justificativo de termo ou sua insuficiente concretização e a comunicação de caducidade equivalente a um despedimento ilegal e a Ré condenada a pagar-lhe: a)-€ 1.845,00 a título de indemnização por cessação ilegal de contrato de trabalho; b)-€ 4.108,65 relativos a indemnização por violação do direito de férias; c)-€ 10.000,00 referentes a danos não patrimoniais sofridos causados por cessação ilegal de contrato de trabalho; d)-juros de mora à taxa legal sobre todas as peticionadas quantias.

A Ré contestou, impugnando parcialmente os factos alegados pelo Autor, confirmando a celebração do contrato de trabalho temporário e alegando as circunstâncias relativas à celebração do contrato de utilização de trabalho temporário que lhe subjaz, por si celebrado com a empresa utilizadora, (…), SA., nomeadamente e, em síntese, que: O motivo justificativo do recurso ao trabalho temporário, a descrição das funções, assim como todos os restantes elementos com base nos quais elaborou o contrato de trabalho temporário com o Autor foram fornecidos pela empresa utilizadora, que foi quem entrevistou e selecionou o Autor.

A empresa de trabalho temporário não pode avaliar ou fiscalizar se os motivos que a empresa utilizadora indica como justificativos para o recurso ao trabalho temporário correspondem ou não à realidade, nem o trabalho que o trabalhador temporário efectivamente pratica nas instalações da empresa utilizadora e sob as ordens desta.

O contrato celebrado com o Autor não ultrapassou o seu prazo máximo de duração e foi feito caducar a 21 de Fevereiro de 2016, por indicação da empresa utilizadora, com cumprimento do período de pré-aviso e pagamento de todos os créditos salariais devidos pela cessação do contrato, não existindo por isso despedimento ilícito nem direito a qualquer compensação nem a indemnização por danos não patrimoniais advenientes da alegada ilicitude da cessação do contrato.

A responsabilidade pela marcação das férias do Autor era da empresa utilizadora, nos termos do art. 185º, nº 3, do Código do Trabalho, pelo que não pode ser responsabilizada por uma eventual violação do direito a gozo de férias do trabalhador temporário, ora Autor.

A fls. 47 foi proferido despacho saneador que, procedendo a apreciação parcial do mérito da causa, julgou improcedente o pedido de condenação da R. no pagamento ao A. de € 4.108,65 a título de compensação pela violação do direito de férias, dele absolvendo a R..

O A. interpôs recurso deste despacho, que subiu juntamente com o recurso também por ele interposto da sentença, proferida após audiência de julgamento e que julgou a acção improcedente por não provada e absolveu a R. dos pedidos.

O recorrente formula as seguintes conclusões: No recurso do despacho saneador: 1ª- Não foram correctamente interpretadas as normas jurídicas contidas nos arts. 237.º, n.º 1, 241.º, n.º 1, 246.º, n.º 1 e 185.º, n.º 3, todos do Cód. do Trabalho 2.º- que mesmo, nos casos de contrato de trabalho temporário, não dispensam e antes obrigam o empregador (empresa de trabalho temporário) quanto ao dever de assegurar e garantir o efectivo gozo do direito de férias pelo trabalhador, ainda que a concreta marcação de tal período caiba à gestão da empresa utilizadora.

3.º- Ao não considerar assim violou a douta decisão as normas que atrás se alude, na 1.ª conclusão.

Assim, deverá pois o presente recurso obter provimento, alterando-se por conseguinte tal parte da decisão judicial sob censura e ordenando-se a sua substituição por uma outra que mande prosseguir os autos em tal parte com condenação da R. no pagamento de 4.108,64 euros a título de compensação por violação do direito de férias.

No recurso da sentença: 1.ª- Não foram correctamente interpretadas as normas jurídicas contidas nos arts. 3.º, n.º 4, 180.º, n.º 2 e 180.º, n.º 3, todos do Cód. do Trabalho 2.º- que mesmo, nos casos de concorrência de nulidade do termo aposto no contrato de trabalho temporário, com a nulidade do termo aposto no contrato de utilização de trabalho temporário, com consequente conversão da modalidade do contrato de trabalho em contrato por tempo indeterminado não impedem a responsabilização da Empresa de Trabalho Temporário por despedimento ilícito do A. e condenação no pagamento das indemnizações peticionadas 3.º- Pois a estatuição do art. 180.º, n.º 3 do Cód. de Trabalho visando a protecção do trabalhador ao permitir o acesso a um contrato de trabalho sem termo com a empresa utilizadora 4.º- Não tem por objectivo a eliminação da possibilidade do exercício de direitos contra a empresa de trabalho temporário, ao abrigo do art. 180.º, n.º 2 do Cód. do Trabalho que o A. sempre perspectivou como seu empregador de acordo com o contrato celebrado e com a comunicação de cessação de contrato da autoria da R.

5.º- Em caso de dúvida o princípio do «favor laboratoris» expresso no art. 3.º, n.º 4 do Cód. do Trabalho sempre permitiria fazer prevalecer os sujeitos jurídicos identificados no texto do contrato escrito celebrado e a aplicação do art. 180.º, n.º 2 do Cód. do Trabalho 6.º- Por dever entender-se que o regime do art. 180.º, n.º 3 do C.T. não é absolutamente imperativo e de aplicação automática, porque fixado para protecção do trabalhador 7.º- Não eliminando a alternativa hipótese de demanda da empresa de trabalho temporário nos termos do permitido pelo regime do art. 180.º, n.º 2 do C.T.

8.º - Ao não considerar assim violou a douta decisão as normas que atrás se alude, mormente as indicadas na 1.ª conclusão.

Assim, deverá pois o presente recurso obter provimento, alterando-se por conseguinte tal parte da sentença sob censura e condenando-se a R. no pagamento de 1845 euros a título de indemnização por cessação ilegal de contrato de trabalho, segundo as normas legais indicadas na petição inicial e na motivação de recurso supra explanada e 10 000 euros por danos não patrimoniais sofridos pelo A. tal qual dado como provado em sede de douta sentença.

A recorrida contra-alegou ambos os recursos, pugnando pela respectiva improcedência.

As questões suscitadas nos recursos são: - num contrato de trabalho temporário, sobre qual das empresas – ETT ou utilizadora – recai o dever de compensar o trabalhador pela violação do direito ao gozo de férias previsto no art. 246º do CT; - se a concorrência da nulidade do termo aposto ao contrato de trabalho temporário com a nulidade do termo aposto ao contrato de utilização impede ou não que a empresa de trabalho temporário seja responsabilizada por despedimento ilícito. Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1)-A Ré é uma empresa de trabalho temporário, sendo detentora do competente alvará para a sua actividade; 2)-O Autor foi contratado pela Ré mediante um contrato de trabalho temporário, a termo certo, para prestar o seu serviço, de “operador semi-especializado”, à empresa utilizadora « (…), SA”, com início em 22.08.2014 e termo previsto para dia 21.09.2014, mediante pagamento duma retribuição base mensal ilíquida de € 615,00 3)-No texto do contrato de trabalho temporário consta a...

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