Acórdão nº 5880-17.8T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelANABELA CALAFATE
Data da Resolução21 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–Relatório: F... instaurou procedimento cautelar comum contra C... e I... requerendo que estes sejam condenados a: I–procederem à retirada do veículo automóvel de marca Mercedes Benz, modelo C200 Kompressor, com a matrícula 32-32-VN, do lugar de estacionamento nº 48, na Cave 1 do prédio identificado no art. 3º da p.i.; II–absterem-se de utilizar, por qualquer meio e modo, o referido lugar de estacionamento; III–pagarem à requerente uma sanção pecuniária compulsória de montante diário não inferior a 150 € por cada dia de atraso no cumprimento da providência que vier a ser decretada, após o seu decretamento, nos termos do disposto nos artigos 829º-A do Código Civil e 365º nº 2 do CPC.

Alegou, em síntese: –a requerente é dona e possuidora da fracção autónoma designada pela letra NNN do prédio urbano sito na Calçada das Lages à Av. Afonso III, lote 21, em Lisboa composta de parte habitacional e do lugar de estacionamento nº 48 situado na cave 1 no qual tem estacionado o seu automóvel desde a compra da fracção; –os requeridos são donos da fracção designada pela letra JJJ composta de parte habitacional e do lugar de estacionamento nº 51 situado na cave 1; –recentemente, os requeridos passaram a estacionar o seu automóvel no lugar de estacionamento nº 48 da cave 1 propriedade da requerente, recusando-se a deixar de utilizar esse espaço e privando assim a requerente da sua utilização; –devido a essa actuação dos requeridos, vê-se a requerente obrigada a estacionar diariamente o seu automóvel no exterior do prédio, o que lhe tem causado prejuízos e incómodos além do receio de ser assaltada pois o prédio está localizado numa área isolada e onde tem havido vários assaltos.

Os requeridos deduziram oposição, invocando, em resumo: –são os proprietários do lugar de estacionamento com o nº 51 sito na cave 1; –desde a data das respectivas aquisições, quer a requerente quer os requeridos vinham ocupando na cave 1, os estacionamentos nº 48 e 51, respectivamente, nos espaços físicos indicados no mapa promocional exibido pelo proprietário/construtor na convicção de que correspondiam às telas finais aprovadas pela CML; –porém, em meados de 2010 vieram todos os condóminos a verificar que existe discrepância entre o mapa promocional e as telas finais referentes à cave 1, pois alguns dos lugares de estacionamento marcados no solo não estão de acordo com estas; –assim, segundo as telas finais o lugar onde os requeridos vinham estacionando o seu veículo não é o 51 mas sim o 54 pertencente à fracção OOO; –e também segundo as telas finais o lugar de estacionamento da requerente é o nº 48 situado na cave 2 e não na cave 1; –em Setembro de 2016 o condómino da fracção OOO informou os requeridos que pretendia ocupar o seu lugar de estacionamento até então ocupado por estes; –os requeridos passaram então a estacionar no lugar que de acordo com as telas finais aprovadas pela CML corresponde ao nº 51 sito na cave 1; –de acordo com as telas finais não existe na cave 1 qualquer espaço de estacionamento nº 48; –a requerente tem disponível o lugar de estacionamento nº 48 na cave 2; –o direito da requerente não está a ser ameaçado nem existe probabilidade séria de lesão grave e/ou de difícil reparação de tal direito.

A requerente respondeu ao abrigo do disposto no art. 3º nº 3 do CPC dizendo, no essencial: –há um desfasamento entre aquilo que sempre foi a realidade do condomínio quanto aos lugares de estacionamento e as telas finais da CML; –de acordo com as telas finais a requerente vê deslocado o seu lugar de estacionamento da cave 1 para a cave 2; –as telas finais são desconformes com a escritura pública de constituição da propriedade horizontal, com as descrições prediais das fracções, com a ficha técnica de habitação e com o contrato promessa de compra e venda outorgado pela requerente; –a alteração da disposição dos lugares de estacionamento pretendida pelos requerentes só poderá fundamentar-se e conformar-se com a eventual alteração do título constitutivo da propriedade horizontal.

Realizada a audiência final foi proferida decisão que julgou improcedente o procedimento cautelar.

Inconformada, apelou a requerente, terminando a alegação com as seguintes conclusões: 1.

–A douta sentença recorrida incorre num erro de apreciação de um concreto meio de prova, mais precisamente da designada “planta promocional” junta à Ficha Técnica de Habitação, a fls. 20 dos autos, uma vez que esta, contrariamente ao referido pelo Tribunal a quo, faz menção ao “espaço 48”, como pertencente à fracção NNN (9F – 9º andar, letra F, fracção da propriedade da Requerente); 2.

–Trata-se de um claro e manifesto erro de análise do Tribunal a quo, uma vez que o número 48 é perfeitamente visível no canto inferior direito do lugar de estacionamento assinalado/desenhado na “planta promocional” em questão (fls. 20); 3.

–Trata-se de um erro tanto mais evidente até porque o próprio Tribunal a quo já havia dado como provado que o “espaço 48” estava indicado na “planta promocional” (cfr. Facto Provado 20); 4.

–O erro na apreciação deste concreto meio de prova inquina a posterior análise feita pelo Tribunal a quo relativamente a outros meios de prova documentais constantes dos autos, fazendo-o extrair ilações e conclusões igualmente erradas quanto ao Contrato Promessa de Compra e Venda (a fls. 36 vº), ao Contrato de Compra e Venda (a fls. 21), à Caderneta Predial da fração NNN (a fls. 12), à Ficha Técnica de Habitação (a fls. 14 a 19) e à Escritura de Constituição em Propriedade Horizontal (fls. 23vº a 34); 5.

–Verifica-se pois que o Tribunal a quo não realizou, convenientemente, o exame crítico dos elementos probatórios disponíveis nos autos, porquanto as “plantas promocionais” (a fls. 20 e 20vº), o Contrato Promessa de Compra e Venda (a fls. 36 vº), o Contrato de Compra e Venda (a fls. 21), a Caderneta Predial da fracção NNN (a fls. 12), a Ficha Técnica de Habitação (a fls. 14 a 19) e a Escritura de Constituição em Propriedade Horizontal (fls. 23vº a 34) impunham que o Tribunal a quo concluísse pela existência do direito de que a Apelada se arroga; 6.

–E, deste modo, o Tribunal a quo também não conferiu valor probatório a documentos autênticos que impunham decisão diversa da proferida; 7.

–Acresce que o Facto Provado 20 é incompatível com a fundamentação que levou o Tribunal a quo à conclusão da existência de lapso de escrita na Escritura de Constituição em Propriedade Horizontal (fls. 23vº a 34), no Contrato de Compra e Venda (a fls. 21) e na Caderneta Predial da fracção NNN (a fls. 12), pelo que a douta sentença recorrida é nula, nos termos do disposto no artigo 615º, n.º 1, alínea c) do CPC; 8.

–O Contrato Promessa de Compra e Venda (a fls. 36 vº), o Contrato de Compra e Venda (a fls. 21), a Caderneta Predial da fracção NNN (a fls. 12), a Ficha Técnica de Habitação (a fls. 14 a 19) e a Escritura de Constituição em Propriedade Horizontal (fls. 23vº a 34) não contêm qualquer lapso de escrita, sendo todos conformes com as “plantas promocionais” (fls. 20 e 21vº); 9.

–Existe uma total consonância entre o Contrato Promessa de Compra e Venda (a fls. 36 vº), o Contrato de Compra e Venda (a fls. 21), a Caderneta Predial da fracção NNN (a fls. 12), a Ficha Técnica de Habitação (a fls. 14 a 19) e a Escritura de Constituição em Propriedade Horizontal (fls. 23vº a 34) de que o lugar de estacionamento 48 é sito na Cave 1 das “plantas promocionais” (correspondente ao lugar 51 na Cave 1 de acordo com as “telas finais”); 10.

–O único documento constante dos autos que menciona o lugar de estacionamento 48 como sendo na Cave 2 são as “telas finais”; 11.

–As “telas finais” são desconformes com o Contrato Promessa de Compra (a fls. 36vº), o Contrato de Compra e Venda (a fls. 21), a Caderneta Predial da fracção NNN (a fls. 12), a Ficha Técnica de Habitação (a fls. 14 a 19) e a Escritura de Constituição da Propriedade Horizontal (fls. 23vº a 34); 12.

–As “telas finais” são ainda desgarradas daquela que foi a realidade vivida “desde sempre” pelos condóminos, uma vez que desde o início da utilização dos lugares de garagem no prédio e até 2010 foi pacífico entre todos os condóminos a utilização de tais lugares de acordo com as “plantas promocionais”, tal qual Requerente e Requeridos sempre fizeram (cfr. Factos Provados 11, 12, 15 e 17; e Ata de Condomínio a fls...

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