Acórdão nº 16519-15.6T8LSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Setembro de 2017
Magistrado Responsável | MARIA MANUELA GOMES |
Data da Resolução | 14 de Setembro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório: 1.
–R...
e M...
intentaram acção com processo comum, contra a “Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública – IGCP, EPE”, pedindo a sua condenação a reconhecer-lhes o direito de propriedade de certificados de aforro e a pagar-lhos, sendo que, em Outubro de 2014 o seu montante era de € 61.627,96, devendo acrescer-lhes juros de mora vencidos e vincendos.
A acção foi julgada procedente, sendo os juros de mora fixados à taxa de 4%.
A Ré recorreu alinhando, no final, as seguintes conclusões: A.–A Sentença recorrida julgou a acção procedente e, consequentemente, condenou a Apelante a reconhecer os Apelados como legítimos proprietários dos certificados de aforro, bem como a pagar a quantia de € 61.627,96, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde a data de 06 de Outubro de 2014 e até integral pagamento.
B.–O exercício do direito ao reembolso dos certificados de aforro de que a decessa M..., mãe dos Apelados, era titular prescreveu pelo decurso do prazo de dez anos contados do óbito da aforrista.
C.–O prazo de prescrição dos certificados de aforro série B deve contar-se, conforme resulta do regime previsto no Decreto-Lei n º 47/2008, de 13 de Março, bem como do critério previsto no artigo 306º do Código Civil, a partir da data do óbito do aforrista e não a partir da data em que os herdeiros tomaram conhecimento da existência dos certificados.
D.–Com efeito, é a partir da data do óbito do aforrista que, por força da transmissão sucessória prevista no artigo 7.° do Decreto-Lei n.º 47/2008, o direito ao reembolso dos certificados de aforro pode objectivamente ser exercido.
E.–O Regime Jurídico dos Certificados de Aforro de Série B, foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 122/2002, de 4 de Maio, que alterou o artigo 7.° Decreto-Lei n.° 172-B/86, alargando o prazo prescricional de cinco para dez anos.
F.–Essa extensão do prazo teve em vista a protecção dos direitos dos aforristas e dos seus herdeiros, igualando-o ao prazo para o exercício de direitos sobre a herança (artigo 2041.º n.º 1 do Código Civil).
G.–Porém, no entender da Apelante, e em face da evolução legislativa verificada relativamente à matéria subjudice, o prazo prescricional de dez anos deve, necessariamente, e conforme resulta da interpretação da lei, começar a partir da data do óbito do aforrista.
H.–Estabelecer um prazo prescricional de dez anos que apenas começaria a correr a partir do momento em que os herdeiros tomassem conhecimento da existência dos certificados de aforro não se afiguraria adequado e equilibrado, em face dos interesses, necessariamente contrapostos, das partes.
I.–Desde logo porque, actualmente, existem mecanismos que permitem aos herdeiros tomar conhecimento, de modo célere e simplificado, do acervo patrimonial do “de cujus”, neste caso, o regime central dos certificados de aforro.
J.–No caso sub-judice pelo menos uma das herdeiras, a Apelada M..., sabia pelo menos que a sua mãe fora já subscritora de um certificado de aforro, que aquela na qualidade de movimentadora, resgatou em 27/08/1998, pelo que seria expectável a consulta do sobredito regime central dos certificados de aforro.
K.–Sublinhe-se que a prescrição se destina, precisamente, a obstar à «eternização» de direitos, mormente com o fito de protecção do devedor mas também por razoes de protecção da certeza ou segurança jurídica.
L.–A norma geral da prescrição - artigo 306.º n.º 1 do Código Civil - institui um regime objectivo, o que determina que, para que o prazo prescricional comece a correr, basta que o direito possa objectivamente ser exercido, dispensando-se o conhecimento por parte do credor do direito que lhe assiste.
M.–O não conhecimento do direito pelo titular - que corresponderia a uma impossibilidade subjectiva de exercício do mesmo - não é motivo obstaculizador ao decurso do prazo prescricional.
N.–Como já aludido, é manifesta a inércia dos Apelados no tocante ao exercido do direito ao reembolso dos certificados de aforro de que sua mãe era titular, a qual não pode ser recompensada.
O.–Assim andou mal o Tribunal a quo quando decidiu que apenas a partir de Abril de 2014 os Apelados poderiam exercer o direito, «pois, até lá, não podiam exercer um direito que desconheciam existir» (cfr. Sentença).
P.–O entendimento ora exposto resulta, no entender da Apelante, da interpretação actualista, teleológica e histórica da norma do artigo 7.° do Decreto-Lei, n.º 172-B/86.
Q.–Tendo o Tribunal a quo perfilhado uma interpretação diversa da supra violou o disposto no artigo 7º do Decreto-Lei n.º 172-B/86, pelo que a decisão em case merece reparo.
Contra alegaram os recorridos para concluírem: 1.º–A Ré, ora Recorrente, manifestou o seu desacordo com a douta Sentença proferida, em 23/09/2016, pelo Tribunal a quo, acusando-a de vio.ar o disposto no art.º 7º do DL n.º 172-B/86, de 30 de Junho, na redação dada pelo DL n.º 47/2008, de 13 de Março, porque considera que o prazo de prescrição dos certificados de aforro série B deve contar-se a partir da data do óbito do aforrista e não a partir da data em que os herdeiros tomaram conhecimento da existência dos certificados.
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–Não assiste, salvo melhor opinião, qualquer razão à Recorrente nas alegações e conclusões que na aplicação do direito, formula, não padecendo, a Sentença de erro os factos da acção se encontram 3.º–A Apelante expressamente reconhece que integralmente provados; porém, defende que o prazo de prescrição dos certificados de aforro, no caso de óbito do titular, actualmente fixado em 10 anos, começa a correr a partir do decesso, independentemente do seu conhecimento pelos herdeiros.
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–Defende a Apelante que os Autores/Apelados não sabiam da existência dos certificados de aforro porque foram negligentes, uma vez que tinham ao seu dispor o registo central, criado pelo Decreto-Lei n.º 47/2008, que aditou ao Decreto-Lei n.º 122/2002, de 04 de Maio o art.º 9.º A, que lhes permitia facilmente tomar conhecimento da sua existência.
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–E conclui, no ponto 30. das suas alegações que “Através do registo central de certificados de aforro – o qual já tinha sido instituído aquando do óbito de M..., a 04/12/2002 – os Apelados poderiam ter obtido informações acerca da existência de certificados de aforro de que a falecida M... fosse titular. Se não o fizeram foi por mera inércia ou incúria”.
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–Ou seja, no entender da Apelante, os Apelados foram negligentes porque 2002, ano do óbito da mãe destes, os mesmos não usaram dos mecanismos legais previstos num diploma que viria a ser publicado no futuro…6 anos depois, em 2008 2008…!? 7.º–Assim, atendendo a que o óbito aconteceu em 2002, e o registo central, foi criado em 2008, é juridicamente inadmissível daqui retirar ilações que pudessem relevar a favor da tese da Apelante.
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–Com todo o respeito, só por aqui, se poderia concluir da total ausência de razão da Apelante.
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–Por outro lado, o que está em causa nestes autos não é a interpretação de uma norma, mas sim a sua estrita...
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