Acórdão nº 235/13.6TBPDL.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL MARQUES
Data da Resolução19 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: I.A... Z.

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instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma ordinária contra a COMPANHIA DE SEGUROS A., S. A.

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pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de €250.140,00, acrescida de juros moratórios, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais emergentes do atropelamento de que foi vítima no dia 4/09/2008 pelo veículo automóvel de matrícula ...-36-55, segurado na ré, quando seguia apeado pela berma da via onde aquele circulava, no dia 4/9/2008, do qual vieram a resultar danos físicos e psicológicos na sua pessoa, os quais ainda perduram.

Contestou a ré alegando que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do autor, que seguia etilizado pela rua, tendo-se desequilibrado para cima da viatura segurada, o que não sucederia se tivesse escolhido o outro lado da via onde havia passeio para circulação de peões.

Realizou-se a audiência preliminar e nesta foi proferido despacho saneador, fixados os facto assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi proferida a sentença, na qual se decidiu: Julgar a ação parcialmente procedente e consequentemente: “a)condeno a ré Companhia de Seguros A., S. A. a pagar ao autor, a título de indemnização, por danos não patrimoniais advenientes do acidente de viação ocorrido no dia 4/9/2008, a quantia total de 6 000 €.

b)Absolvo a ré do mais que contra ela foi pedido.

c)As custas da ação ficam a cargo do autor e da ré, na proporção do respetivo decaimento”.

Inconformados, quer o autor, quer a ré interpuseram recurso de apelação.

Nas suas alegações a ré formulou as seguintes conclusões: 1-O acidente deu-se por única e exclusiva responsabilidade do peão.

2-De facto foi aquele que, muito provavelmente em consequência do seu estado de alcoolémia (valor indicativo de 2,66g/L no sangue, 6 horas após o acidente) e uma vez que cambaleava na rua, caiu sobre a lateral esquerda da parte traseira do veículo segurado na Ré.

3-Veículo esse que ao avistar o peão cuidadosamente reduziu a sua velocidade de forma a não causar qualquer dano.

4-O acidente deu-se numa via de dois sentidos de trânsito muito estreita sendo certo que naquele momento circulavam veículo em sentido contrário ao do condutor do veículo segurado na Ré.

5-No outro lado da via existia um passeio de 80 cm no qual o peão podia transitar.

6-O veículo seguro na Ré seguia a uma distância de cerca de 80 a 91 centímetros da parede do lado onde seguia o autor.

7-Já o veiculo segurado na R. tinha passado quase completamente pelo peão quando este caiu sobre a caixa com o ombro.

8-A responsabilidade do acidente, ficou a dever-se única exclusivamente ao peão.

9-Nem se diga que deve ser assada responsabilidade pelo risco, já que verificando-se que o acidente se ficou a dever a culpa exclusiva do peão fica afastada a responsabilidade objectiva do detentor do veículo, prevista no art.º 505 do C. Civil.

10-Com todo o devido respeito as circunstâncias no caso concreto apontam para o afastamento da responsabilidade do condutor do veículo seguro na Ré e consequentemente da Ré no cumprimento do disposto no art.º 505 do código civil.

11-Pelo supra exposto, deverá ser absolvida do pedido.

Nas suas alegações o autor formulou as seguintes conclusões: I-A testemunha Paulo... ouvida entre os minutos 9:46:44 a 10:03:02 disse que o Sr. Z. encostou-se à parede para que a carrinha passasse. Esta ao passar pelo A. fez com que este batesse com a cabeça contra a caixa e contra a parede, o levasse de arrasto, rodopiasse e caísse redondo no chão desmaiado.

2-Mais disse que o condutor da carrinha só parou porque gritou "Pára, pára e ele parou.". Se não tivesse gritado ele não parava (minuto 4,50) e que "mesmo encostado à parede a carrinha pegava-lhe na mesma "(minuto 14:15).

3-Também a testemunha Rui..., depoimento prestado entre os minutos 11:09:18 e 11:24:23 disse que a carrinha vinha junto à parede, passou por ele, sentiu "pum" e viu o A. no chão. "Bateu com o braço e a cabeça e ficou logo ali É um sítio muito perigoso e já tem acontecido vários acidentes. Não tem passeio. Se calhar um passo em falso e a carrinha levou-o consigo. A gente tem tendência a se virar sempre para a parede. " 4-O condutor Filipe..., depoimento prestado entre os minutos 11:24:24 e 11:39:15 afirmou que tem que "se encostar um bocadinho para passar dois carros." (minuto 12:55) (Parece que pressenti que ia bater. Quando passei sabia que podia bater." (minuto 14:20). E mesmo assim passou ....

5-Por isso, o tribunal devia ter dado como provado os números 1 e 2 da Base Instrutória e não provados os números 32, 35, 36, 37 e 41 desta Base.

6-A testemunha Helena..., depoimento prestado entre os minutos 10:07:42 e 10:22:47 disse que “depois do acidente o A. é diferente. Agora a gente quando fala com ele ele diz as coisas, três, quatro, cinco vezes e quando lhe dizemos que já disse isto ele diz "desculpa, não me lembrava" (minuto 5:05). “Quando cheguei ao hospital não o reconheci. Parecia um bicho. A parte do olho estava para baixo. Parecia um saco de sangue. Não falava, não se lembrava de nada. Até parecia que estava morto. Levanta-se 3/4 vezes por noite. Não consegue dormir." (minuto 7:00). "Não tem força e tem vezes que se desequilibra" (minuto 9:00). “Tem tonturas. Hoje não é a mesma pessoa que era antes do acidente.” (minuto 12:00) 7-A testemunha Maria M... Z... (minuto 10:23:37 a 10:46:31) disse que antes do acidente era uma pessoa normal (minuto 4:35) que depois do acidente dá-lhe tonturas (minuto 6:05), que dizia uma coisa e daqui a bocadinho estava a dizer a mesma coisa, que toma medicação para a tensão e de tempos a tempos para o colesterol, tem vertigens, medo de subir escadas e de alturas (minuto 8:00) e baixa estima por não ter ficado a 100/100%.

8-Face aos depoimentos das testemunhas Helena... e Maria Natália... o tribunal devia ter dado como provada a matéria constante dos números 8, 9, 11, 12, 13, 14,16,21,22,25,26,27 e 28.

9-O condutor da Ré ao circular junto à berma e parede da Rua do ... de frente para o A. devia ter parado para que este passasse em segurança uma vez que vinham carros em sentido contrário, a rua é estreita e não tem passeio do lado por onde caminhava foi o único culpado na produção do acidente e como tal deve ser declarado.

10-Em virtude do acidente o A. sofreu traumatismo craniano e fratura alinhada do complexo zigomático malar direito, esteve em estado de coma pelo menos 3 dias, passou a sofrer de insónias, a ter dores de cabeça, a sentir-se zonzo, com tonturas, vertigens e medo das alturas, esquecimentos frequentes, a tomar medicamentos para a tensão, colesterol e para dormir e a sentir-se inseguro e com natural baixa estima, pelo que não deve ser compensado em quantia inferior a 50.000,00 € a título de danos não patrimoniais.

11-Em virtude do acidente o A. ficou com uma IPP de 8 % com afetação para o trabalho habitual, devendo como tal ser compensado a título de danos patrimoniais em 8.022,40 €, tendo em conta a sua idade e por referência ao SMN para a Região Autónoma dos Açores.

12-Assim não o tendo entendido a douta sentença recorrida violou, entre outros, o disposto nos arts. 66.°, 70.°, 483.°, 563.°, 562.° e 566.° todos do Código Civil.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente por provada e por via dele substituir-se a douta sentença recorrida por outra que condene a Ré nos termos supra expostos.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

* II.

As questões a decidir resumem-se, essencialmente, a saber: - se é caso de alterar a matéria de facto; -se é caso de imputar culpa na produção do acidente a ambos os intervenientes no acidente e, em caso de resposta afirmativa, em que proporção; -se é caso de alterar o valor indemnizatório fixado na sentença.

* III.

Da questão de mérito: Da impugnação da matéria de facto: Sustenta o autor apelante que: A.Com fundamento nos depoimentos das testemunhas Paulo... , Rui... e Filipe..., o tribunal devia ter dado como provado os números 1 e 2 da Base Instrutória e não provados os números 32, 35, 36, 37 e 41 desta Base.

Estes têm a seguinte redacção: 1-O veículo ...-36-55, ao passar pelo autor, embateu na cabeça e cara deste do lado direito, fazendo com que o mesmo redopiasse sobre si, e caísse sem sentidos no chão.

2-O condutor do ...-36-55, só se apercebeu do embate pelos gritos dos populares que ali se encontravam. (quesito 2.°).

Não provados: 32-Na ocasião o autor seguia cambaleando 35-No momento em que o ...-36-55 passava pelo autor este desequilibrou -se e caiu para cima da caixa da viatura 36-junto à roda de trás 37-tendo vindo a cair ao solo, nesta decorrência 41-O autor desequilibrou-se nos termos referidos em 35º, por se encontrar embriagado.

B.Com fundamento nos depoimentos das testemunhas Helena... e Maria Natália..., o tribunal devia ter dado como provada a matéria constante dos números 8, 9, 11, 12, 13, 14,16, 21, 22, 25, 26, 27 e 28.

Estes têm a seguinte redacção: 8-e era alegre e bem-disposto. (quesito 8.°) 9-e era um trabalhador ativo. (quesito 9.°) 11-O autor passou a ter insónias e a acordar duas ou três vezes por noite. (quesito 11.°) 12-e a ter dores de cabeça? 13-e sentindo que está sempre zonzo.

14-e a ter esquecimentos frequentes 16-O autor não consegue pegar em pesos superiores a dois quilos? 21-O autor passou a tomar medicação para a tensão e colesterol. (quesito 21.º) 22-e medicamentos para dormir. (quesito 22.°) 25-O autor passou a ter medo de subir e descer escadas. (quesito 25.°) 26- ... e vertigens e medo das alturas. (quesito 26.°) 27-O autor passou a ser uma pessoa insegura. (quesito 27.°) 28-e com baixa auto estima Ouvida toda a prova gravada, cumpre decidir.

Quanto à dinâmica do acidente: Propugna o apelante que se dê como provados os factos que constituíam os arts. 1º e 2º da base instrutória e não provados os que constituem os n.ºs 32º, 35º, 36º, 37º e 41º.

Nesta matéria, o tribunal considerou apenas demonstrado...

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