Acórdão nº 2866/12.2TJLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelROSA RIBEIRO COELHO
Data da Resolução26 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: I-O Ministério Público intentou contra G. Renting, S.A., a presente ação declarativa, nos termos dos artigos 25º e 26º, nº 1, alínea c) do Dec. Lei nº 446/85, de 25/10[1], pedindo que sejam declaradas nulas as cláusulas 17ª, nº 4 e 20ª, nº 1 do formulário de contrato utilizado pela ré na sua atividade comercial e, ainda, que esta seja condenada a abster-se de se prevalecer delas em contratos já celebrados, de as utilizar em contratos que de futuro venha a celebrar, e a dar a publicidade que discrimina à decisão condenatória a proferir. Pediu também que fosse dado cumprimento ao disposto no art. 34º do mesmo diploma, enviando-se certidão da sentença à Direcção-Geral da Política de Justiça do Ministério da Justiça.

Alegou, em síntese, que aquelas cláusulas, constantes do modelo contratual proposto pela ré aos seus clientes sem que seja objeto de negociação, violam os arts. 12º e 19º, c) – a primeira – e o art. 18º, l) – a segunda – sendo, por isso, nulas.

Contestou a ré pugnando pela improcedência da ação.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença onde, com decisão sobre a matéria de facto, se julgou a ação procedente, declarando-se nulas as cláusulas aludidas e condenando-se a ré a abster-se de as utilizar no futuro nas suas relações contratuais de fornecedora e a dar publicidade à parte decisória desta sentença, por anúncio publicado em dois números seguidos, de dois jornais diários de âmbito nacional, com os caracteres em dimensão não inferior a 10 no estilo arial, e intervalo entre linhas de 1,5.

Apelou a ré, tendo apresentado alegações onde, pedindo a revogação da sentença e a sua absolvição dos pedidos, com declaração da validade das cláusulas em causa, formula as conclusões que passamos a transcrever: 1.ª)A sentença recorrida padece de erro de julgamento dos factos constantes das alíneas V), X) e A1), dados como provados, sendo que os mesmos deverão ser julgados não provados; 2.ª)A alínea V) dos factos provados contraria o facto dado como provado na alínea L), ou seja, permite pressupor que haverá contratos que se renovem e que o valor do aluguer não seja igual ao valor inicialmente acordado, quando ficou provado que o contrato não prevê qualquer alteração do valor do aluguer após renovação; 3.ª)A redação da alínea V) dos factos provados deverá ser alterada, a passar a constar apenas como provado que “Quando os contratos se renovam o valor do aluguer mantém-se igual ao valor inicialmente acordado.”; 4.ª)Não foi provado o facto constante da alínea X), que contraria os factos provados constantes da alínea i), já que está provado na alínea i) “(…) A duração do contrato, que pode ser por 12, 18, 24, 36, 42, 48 ou 60 meses (“Termo inicial base … meses”);”, e provado documental nos Doc.s n.os 1 a 16 juntos com a contestação. Acresce ainda que não foi feita qualquer prova sobre qual o “valor útil dos equipamentos informáticos”, e é do senso comum, que tal “valor útil” varia de caso para caso, de Locatário para Locatário, consoantes os mais diversos fatores, como por exemplo, o fim pretendido com a utilização do equipamento; a intensidade de utilização do equipamento; a necessidade de utilização do equipamento; etc.; 5.ª)Não ficou provado o facto dado como provado na alínea A1), pois não existe qualquer prova que o sustente, antes pelo contrário, o facto de ter sido provado que o valor dos alugueres se mantém após o termo inicial, ou seja, durante a renovação do contrato, demonstra que o valor do aluguer corresponde à contrapartida pela disponibilização para uso dos bens locados; 6.ª)O contrato não prevê qualquer financiamento, amortização de capital financiado e remuneração pelo financiamento e nenhuma prova foi produzida que permitisse ao Tribunal considerar provado o que consta da alínea A1), como se o contrato em causa não fosse um típico contrato de locação, sujeito ao regime jurídico dos artigos 1022.º e seguintes do Código Civil; 7.ª)O mesmo equipamento pode ser alugado por diversos valores consoantes os Locatários, ou a duração do contrato, que tal não constitui qualquer exceção de que o valor do aluguer corresponde à contrapartida pela disponibilização dos bens alugados, para o uso do Locatário, já que para uns Locatários o valor de uso dos bens poderá ser diferente consoante a atividade que desenvolvam, o fim a que se destinam os bens alugados, a intensidade ou grau de necessidade dos bens locados; 8.º)O contrato utilizado pela Recorrente deverá ser qualificado em termos jurídicos como contrato de locação ou aluguer de bens móveis, sujeito ao regime jurídico dos art. 1022.º e seguintes do Código Civil, pois prevê a disponibilização de bens móveis mediante a obrigação de pagamento dos alugueres ajustados, sendo renovável automaticamente por sucessivos períodos de seis meses, até ser denunciado por qualquer das partes, com a antecedência de três meses, sem que haja qualquer alteração do valor do aluguer; não prevê qualquer possibilidade de aquisição dos bens locados por valor determinado ou determinável no contrato; e expressa e reiteradamente prevê a obrigação do Locatária de restituição dos bens, findo o contrato; 9.ª)A cláusula 17, n.º 4 das condições gerais de locação não é desproporcionada, na medida em que prevê, em caso de cessação do contrato, por resolução, o mesmo regime que resulta em caso de cessação do contrato, por denúncia, previsto na cláusula 19, n.º 5, das condições gerais de locação, e que é semelhante ao regime jurídico que resulta do art. 1045.º, n.º 2, do Código Civil; 10.ª)A cláusula 17, n.º 4, das condições gerais de locação constitui uma cláusula penal que respeita o disposto nos artigos 810.º, 811.º, 812.º e 1045.º do Código Civil, não sendo proibida, e não constitui qualquer cláusula penal desproporcionada, no sentido de existir uma desproporção sensível entre o custo para o Locatário e o benefício para a Locadora; 11.ª)A cláusula 17, n.º 4, das condições gerais de locação constitui uma cláusula penal com fins ressarcitórios e coercitivos, que não viola o art. 19.º, al. c) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro; 12.ª)A sentença recorrida, ao julgar inválida a cláusula 17, n.º 4, das condições gerais de locação viola os artigos 19.º, al. c) do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, e artigos 810.º, 811.º, 812.º e 1045.º do Código Civil; 13.ª)A sentença recorrida, ao julgar inválida a cláusula 17, n.º 4, das condições gerais de locação, contraria a interpretação e julgamento da mencionada cláusula feitos pelo Tribunal da Relação Lisboa, e por centenas de Tribunais de Norte a Sul de Portugal, incluindo os diversos Acórdãos e Decisões mencionados, nomeadamente, nos Processos n.os 1866/10.1YXLSB, 680/10.9YXLSB, 2485/10.8TVLSB, 2593/10.5YXLSB, 1248/11.8TJLSB, 2673/10.7TVLSB, 2082/10.8TJLSB, 1572/10.7TJLSB, 2635/09.7TJLSB, 946/11.0TJLSB, 2602/09.0TJLSB, 1095/09.7YXLSB, e 187/10.4YXLSB, todos transitados em julgado, que julgaram válida a cláusula penal 17, n.º 1 e 4 das Condições Gerais de Locação; 14.ª)A cláusula 20, n.º 1, das condições gerais de locação não é nula, nem proibida; 15.ª)A sentença recorrida ao julgar inválida a cláusula 20, n.º 1, das condições gerais de locação violou os artigos 18.º, alínea L, do Decreto-Lei n.º 446/85, já que tal cláusula contratual não prevê a cessão de dívidas (que seria proibida), mas a cessão de créditos, que os artigos 577.º e 588.º do Código Civil expressamente admitem, sem necessidade de consentimento do devedor; e 16.ª)O objectivo da cláusula 20, n. 1, das Condições Gerais de Locação é permitir dar de garantia os direitos de crédito resultantes de contratos de locação, no caso da Locadora necessitar de se financiar, sem necessidade de formalizar cessão de créditos, sendo que se efetivamente o crédito for cedido, o cessionário terá que comunicar ao Locatário a cessão do crédito, para que este lhe passe a pagar os alugueres, não resultando para o Locatário qualquer prejuízo ou benefício de tal cláusula.

Em contra-alegações o Mº Pº sustenta a improcedência da apelação.

Colhidos os vistos cumpre decidir, sendo questão sujeita à nossa apreciação a de saber se: -é de alterar a decisão proferida sobre os factos nos termos pretendidos pela apelante; -as cláusulas contratuais em discussão devem, ou não, ser consideradas como nulas.

Na sentença descrevem-se como provados os seguintes factos: A)A Ré encontra-se matriculada com o NIPC 5………..e com a sua constituição inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa (doc. nº 1).

B)A Ré tem por objecto social “Aluguer de equipamento de escritório, de máquinas e de equipamento informático incluindo software e hardware, actividades relacionadas e revenda de equipamentos usados. Aquisição de equipamentos informáticos, software e outros bens para aluguer e aluguer dos mesmos…” (doc. nº 1).

C)A Ré não celebra contratos com consumidores, mas tão somente com pessoas colectivas ou clientes empresariais (empresários em nome individual ou profissionais liberais), que estejam interessados em alugar equipamentos de escritório, máquinas ou equipamentos informáticos para o exercício das respectivas actividades comerciais ou profissionais.

D)Como a Ré não tem equipamentos para vender, os interessados em alugar terão que escolher os bens e o fornecedor, sendo que a Ré, quando acorda alugar, compra previamente os bens ao fornecedor escolhido, que os entrega ao cliente interessado no aluguer.

E)Os bens normalmente alugados pela ora Ré são computadores, softwares, impressoras, fotocopiadoras, centrais telefónicas e outros equipamentos informáticos.

F)Os equipamentos informáticos alugados pela Ré são bens de desvalorização muito rápida.

G)No exercício da sua actividade, a Ré procede à celebração do contrato que designa de “Locação”, apresentando aos interessados que com ela pretendam contratar um clausulado já impresso, de que fazem parte integrante as “Condições Gerais de Locação” e os “Termos e...

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