Acórdão nº 187/14.5TBTVD.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE LEAL
Data da Resolução21 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Em 23.01.2014 Banco, S.A.

intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Torres Vedras (atualmente, Secção Cível da Instância Local de Torres Vedras, da Comarca de Lisboa Norte) ação com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, nos termos do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.9, contra S e P.

O A. alegou, em síntese, que no exercício da sua atividade comercial, em 26.5.2008 emprestou à R. S a quantia de € 19 500,00, para o pagamento do preço de um automóvel que esta comprara. A importância do empréstimo, juros, comissão de gestão, despesas de transferência de propriedade, imposto de selo, de abertura de crédito e prémio de seguro de vida deveria ser paga em 96 prestações mensais no valor de € 287,11 cada, sem prejuízo de o número de prestações poder ser inferior ou superior em função do acréscimo ou decréscimo da taxa de juro inicialmente acordada em função da variação da taxa Euribor. Em virtude das atualizações da taxa Euribor o prazo do contrato foi reduzido de 96 para 84 prestações, sendo o valor da última de € 24,62. A R. apenas pagou as primeiras 58 prestações, não pagando a 59.ª, vencida em 10.5.2013, vencendo-se então todas no montante, cada uma, de € 287,11 e de € 24,62 a última. Está pois em dívida o montante de € 7 202,37, a que acrescem juros à taxa de 7,72% ao ano, desde 10.5.2013, até integral e efetivo pagamento. Aos juros já vencidos, no montante de € 394,55, acresce imposto de selo, à taxa de 4% ao ano, estando vencido o montante de € 15,78. O R. P assumiu-se como fiador do contrato de mútuo, em responsabilidade solidária.

O A. terminou pedindo que os RR. fossem condenados, solidariamente, a pagarem ao A. a importância de € 7 202,37, acrescida de € 394,55 de juros vencidos até 24.01.2014 e de € 15,78 de imposto de selo sobre estes juros e ainda os juros que se vencessem, à taxa anual de 7,72%, desde 25.01.2014 até integral pagamento, bem como o imposto de selo que, à referida taxa de 4%, sobre estes juros recaíssem.

Citados os RR., apenas a R. S contestou.

A R. arguiu a nulidade do contrato de crédito, na medida em que não lhe foram prestadas, nem pelo vendedor do veículo que comprou, nem pelo A., informações e explicações sobre o contrato de mútuo e suas cláusulas, assim como não lhe foi entregue qualquer exemplar do contrato. Daí que a R. não se tenha inteirado do conteúdo do contrato, só posteriormente se apercebendo que as prestações que lhe eram exigidas não correspondiam àquilo que o vendedor lhe havia garantido aquando da assinatura do mesmo, sendo de valor bastante mais elevado do que supunha. A insustentabilidade das prestações levou a R. a contrair, através do vendedor do veículo, um segundo empréstimo, junto de outro banco, com o qual o vendedor assegurou que seria amortizado o empréstimo contraído junto do A., passando a R. a suportar prestações mensais mais suaves. Contudo o vendedor guardou para si o montante entregue por este segundo banco, sem amortizar o empréstimo contraído junto do A.. Pelo que a R. ficou a suportar dois financiamentos correspondentes ao mesmo bem.

A R. concluiu que, face ao alegado, a ação deveria ser julgada totalmente improcedente, por não provada, e em consequência ser declarada a nulidade do alegado “contrato de mútuo com fiança”, sendo a R. absolvida de todos os pedidos.

A convite do tribunal, o A. pronunciou-se sobre a arguida nulidade do contrato, pugnando pela sua improcedência e alegando que a R. atuava com abuso de direito.

A R. respondeu, pugnando pela inadmissibilidade da aludida pronúncia e reiterando o alegado na contestação.

Realizou-se audiência de julgamento, com início em 23.4.2015, e em 04.6.2015 foi proferida sentença, que culminou com o seguinte dispositivo, que se transcreve: “Nestes termos, julga-se a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condenam-se os RR., solidariamente entre si, a pagar ao Autor, a quantia € 287,11 (duzentos e oitenta e sete euros e onze cêntimos) – valor correspondente à 59ª prestação vencida em 10/05/2013 e não paga – bem como no pagamento das demais 25 (vinte e cinco) prestações de capital antecipadamente vencidas na referida data, acrescidas de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa anual de 7,72%, desde 10/05/2013 até integral pagamento, bem como do correspondente imposto de selo sobre esses juros, à taxa legal de 4%, tudo a liquidar em execução de sentença nos termos do artigo 609.º n.º 2 do C. P. C, absolvendo, no mais, os RR, do pedido deduzido pelo A..

Custas pelo A. e pelos RR., na proporção do respectivo decaimento – cfr. artigo 527.º n.ºs 1 e 2 do C. P. C..

” A R. S apelou da sentença, tendo apresentado alegação em que formulou as seguintes conclusões: I. Vem o presente Recurso de Apelação interposto da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou a acção parcialmente procedente, por provada, e em consequência: II. Condenando os RR, solidariamente entre si, a pagar ao Autor, a quantia de €287,11 (duzentos e oitenta e sete euros e onze cêntimos) – valor correspondente à 59ª prestação vencida em 10/05/2013 e não paga – bem como no pagamento das demais 25 (vinte e cinco) prestações de capital antecipadamente vencidas na referida data, acrescidas de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa anual de 7,72%, desde 10/05/2013 até integral pagamento, bem como do correspondente imposto de selo sobre esses juros, à taxa legal de 4%, tudo a liquidar em execução de sentença nos termos do artigo 609º, nº 2 do C.P.C., absolvendo, no mais, os RR, do pedido deduzido pelo A.; III. Face aos factos alegados pela Ré/Recorrente, e à prova produzida nos autos, impunha-se considerar que os mesmos deveriam resultar como não provados e, por conseguinte, deveria a Ré ser absolvida dos pedidos contra si formulados; IV. As questões que importava serem decididas pela Douta Sentença recorrida consistiam essencialmente em “analisar” as seguintes questões: a eventual nulidade do contrato celebrado entre Autor e Réu/Fiador, por ausência de remessa de exemplar no momento da sua assinatura pelos Réu/Fiador, bem como da alegada falta de informação sobre as cláusulas no mesmo insertas, e se a factualidade alegada e provada permitiria concluir pela condenação solidária dos Réu/Fiador; V. Em conformidade com o disposto no art.º 640º do CPC, enumeram-se os concretos pontos de facto que se considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação de prova, que impunham, no entender dos subscritores, decisão diversa da recorrida quanto aos pontos da matéria de facto impugnados; VI. A douta Sentença recorrida não deu por provada a factualidade constante dos números 1 a 10 dos “factos não provados”, mas, atenta a prova produzida nos autos, entende a Ré/Recorrente que tal factualidade resultou efectivamente provada; VII. A Prova Documental junta aos autos é composta, designadamente, pelo contrato de mútuo com fiança assinado pelos Réu/Fiador, documentação emitida pelo Autor remetida ao fornecedor/vendedor Marco (…), para que este a entregasse aos Réu/Fiador, declaração de venda do veículo automóvel, datada de 2010, emitida pelo fornecedor/vendedor Marco (…); VIII. Do contrato de mútuo com fiança, constante de fls. 29-30 dos autos, assinado pelos Réu/Fiador na presença apenas do fornecedor/vendedor, constam duas cruzes, local onde os Réu/Fiador deveriam proceder à colocação da sua assinatura, o que indicia com elevado grau de probabilidade que, no momento da assinatura, não se encontrava presente qualquer funcionário/representante do Autor/Recorrido; IX. Ausente o representante do Autor/Recorrido no acto da formalização do contrato, terá de se concluir, igualmente com elevado grau de certeza, que o clausulado não foi explicado aos Réu/Fiador; X. A Ré/Recorrente não estranhou a ausência de representantes do Autor/Recorrido, pois acreditou na boa-fé e na experiência do fornecedor/vendedor quando o mesmo lhe transmitiu que aquele documento era uma mera proposta para aprovação pelo Autor, e que, posteriormente, voltariam a ser contactados pela financeira com o objectivo da mesma proceder aos esclarecimentos das importantes dúvidas que os Réu/Fiador tinham sobre os elementos do futuro contrato; XI. Só após esses esclarecimentos o contrato seria, em caso de concordância de ambas as partes, formalizado com a assinatura; XII. A documentação supra indicada, demonstrando, como inequivocamente demonstra, a sucessiva ausência de representantes do Autor (técnicos capazes) tem de nos forçar a concluir que, independentemente dos juízos e conclusões que se venham a retirar dessa ausência, os Réu/Fiador não tinham condições para conhecer dos elementos base que serviriam de suporte ao contrato de mútuo; XIII. A ausência dos representantes do Autor/Recorrido nunca poderá ser colmatada com a mera presença do vendedor/fornecedor, por o mesmo não ser um técnico com capacidade e conhecimentos que lhe permitisse, em nome do Autor/Recorrido, proceder cabalmente a todos os esclarecimentos das dúvidas legitimamente suscitadas pelos Réu/Fiador; XIV. No âmbito do contrato em causa nos presentes autos, todas as questões levantadas pelos Réu/Fiador, acerca do conteúdo das cláusulas, quer as gerais quer as específicas, terão que ser suficientemente explicadas, dada a sua pertinência para a esclarecida decisão dos Réu/Fiador em contratar ou não com a financeira, oro Autor/Recorrido; XV. O mesmo se aplica ipsis verbis ao Réu/Fiador, tendo em conta os deveres decorrentes da sua assunção como garante do cumprimento pontual do indicado contrato; XVI. O conhecimento completo e esclarecido de todo o clausulado é condição sine qua non para uma decisão informada de contratar ou não; XVII. Tendo em conta a ausência de formação do fiador na área em causa, seria de esperar que fossem relevantes para a decisão de contratar: a) O benefício de excussão...

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