Acórdão nº 40-14.2T8STB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelIL
Data da Resolução28 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, no Tribunal da Relação de Lisboa.

I-RELATÓRIO: L..., intentou contra M..., advogada e COMPANHIA DE SEGUROS ..., SA, acção declarativa sob a forma de processo comum, pedindo que as rés sejam condenadas solidariamente no pagamento ao autor da quantia de € 20.845,00 e juros desde a citação, deduzido na responsabilidade da seguradora e eventual franquia convencionada.

Alegou, em resumo, que a 1ª ré exerce a profissão de advogada e a ORDEM DOS ADVOGADOS celebrou com a 2ª ré um contrato de seguro garantindo o risco pela actividade profissional dos advogados, inscritos na Ordem.

O autor mandatou a 1ª ré, como advogada, para o patrocinar num processo criminal, no qual era acusado de um crime de violência doméstica. Realizado o julgamento, o autor foi condenado na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa, com sujeição a regime de prova. Tendo sido deduzido pedido cível, o autor foi condenado a pagar à assistente uma quantia global de € 36.036,30, por danos patrimoniais e não patrimoniais e juros vencidos e vincendos.

Discordando, quer da pena de prisão, quer dos valores indemnizatórios, o autor e a sua mandatária decidiram interpor recurso da sentença. A 1ª ré informou que o prazo de interposição de recurso findaria em Setembro de 2012, no entanto o autor foi informado já em Setembro que já não poderia recorrer pois o prazo findara em Julho, tendo a sentença transitado em julgado. Com a não interposição do recurso, o autor foi privado do direito de obter uma redução da pena de prisão e de reduzir para valores aceitáveis o montante indemnizatório fixado. A probabilidade de obter vencimento no recurso é de 80%, pelo que o autor tem direito, pela perda de chance a € 20.845,00. A responsabilidade da 1ª ré resulta do facto de não ter cumprido o mandato conferido, omitindo por negligência, o acto de recurso e a responsabilidade da 2ª ré resulta de ter assumido o risco pela actividade profissional da ré.

A ré M... impugnou a matéria alegada pelo autor, dizendo que o mandato foi conferido conjuntamente à Drª N... Em Julho de 2012 foi pedida uma provisão ao autor para taxas de justiça e honorários, caso optasse pela interposição de recurso, sendo que o autor não pagou à ré a provisão pedida, tal como nunca pagou quaisquer outras quantias. O autor não pode obter nos presentes autos aquilo que não conseguiu no âmbito do processo-crime.

A ré COMPANHIA DE SEGUROS ... alegou, em síntese, que o autor não invocou ou demonstrou quaisquer prejuízos passíveis de serem indemnizados, bem como a existência de qualquer nexo de causalidade entre os factos e os pretensos danos sofridos, não ficando provado qualquer dano emergente da conta da 1ª ré consubstanciados numa perda de oportunidade ou de “chance”. A conduta da ré não foi negligente nem tão pouco omissa, porquanto não resulta que o autor tenha mandatado a ré para interpor recurso e consequentemente que a provisionou para tal.

O autor respondeu às contestações.

Foi proferida SENTENÇA que julgou a acção improcedente e absolveu as rés do pedido.

Não se conformando com a sentença, dela recorreu o autor, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: SOBRE A MATÉRIA DE FACTO: 1ª-O recorrente julga incorrectamente julgado o artigo 13° da petição inicial.

  1. -Os concretos meios de prova que impõem decisão diferente são os documentos n° 9 e n° 10 juntos com a petição inicial (e o depoimento de A..., gravado a 00:04 53 a 00:16:08 do depoimento de A...).

    SOBRE A MATÉRIA DE DIREITO: 3ª-O contrato de mandato judicial e normas do Estatuto da Ordem dos Advogados foram violadas pela recorrida F..., como está reconhecido na sentença.

  2. -Está também reconhecida a sua culpa, que não foi ilidida.

  3. -Está provada a perda de chance - omissão do recurso.

  4. -Existe nexo de causalidade entre a omissão de recurso e a perda de chance.

  5. -Na verdade, a sentença proferida tem várias ilegalidades, acabadas de expor na motivação, que vão desde o montante exagerado da indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais fixados, ao apuramento da indemnização segundo a equidade, sem previamente se ter relegado o apuramento da indemnização para execução de sentença, e ainda a fixação de juros a partir do momento impróprio.

  6. -Atendendo às circunstâncias em que o arguido praticou os factos, muitos dos quais sem danosidade social que os enquadrasse em ilícito criminal, a pena de prisão não deveria exceder o período de um ano, sendo certo que se justificava a atenuação especial.

  7. -Não tem de se provar que o recurso obteria, necessariamente, ganho de causa, mas que era provável o êxito do recurso.

  8. -Atentos os erros de direito da sentença criminal, parece-nos demonstrada essas fortes possibilidades de obter ganho no recurso.

  9. -A indemnização por danos morais não devia ultrapassar, por excesso, os € 5.000,00 e por danos patrimoniais, não devia exceder, também por excesso, os € 10.000,00, razão pela qual foi suportado um diferencial de € 21.056,03.

  10. -Foram violados, por erro de interpretação, os artigos 483º, 562º a 564°, 798° e 799° do Código Civil.

  11. -A Mmª Juiz interpretou tais normas no sentido de que exigiam para conferir direito a indemnização mais factos provados, quando, na nossa interpretação, todos os factos integradores de indemnização estão alegados e provados.

    Termina, pedindo que seja revogada a sentença recorrida e a recorrida M... condenada no pagamento de € 5.000,00 (valor da franquia) e juros e a recorrida Companhia de Seguros ... na quantia de € 15.845,00 e juros, ambos desde a citação.

    As recorridas contra-alegaram, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    II-FUNDAMENTAÇÃO.

    A)Fundamentação de facto.

    Mostra-se assente a seguinte matéria de facto: 1º-A 1ª ré M... exerce a profissão de advogada, tendo escritório em Lisboa, estando inscrita na Ordem dos Advogados Portugueses desde 30 de Janeiro de 1987, com a cédula profissional nº 6294L - (facto admitido por acordo – vide acta de audiência prévia).

    1. -A Ordem dos Advogados celebrou com a 2ª ré COMPANHIA DE SEGUROS ... um contrato de seguro, garantindo o risco pela actividade profissional dos advogados inscritos na Ordem, pela apólice nº 2866129 - (facto admitido por acordo – vide acta de audiência prévia).

    2. -Nos termos do Ponto 10 das Condições Particulares da apólice em causa, sob a epígrafe “Período de Cobertura”, a apólice em causa vigora pelo período de “24 meses, com data de início de 01 de Janeiro de 2012 às 00:00h e vencimento às 00:00 de 01 de Janeiro de 2014” - (artigo 6º da contestação da 2ª ré).

    3. -De acordo com o Ponto 7 das Condições Particulares da apólice: “A seguradora assume a cobertura da responsabilidade do segurado por todos os sinistros reclamados pela primeira vez contra o segurado ou contra o tomador do seguro ocorridos na vigência das apólices anteriores, desde que participados após o início da vigência da presente apólice, sempre e quando as reclamações tenham fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional, coberta pela presente apólice, e, ainda, que tenham sido cometidos pelo Segurado antes da data de efeito da entrada em vigor da presente Apólice” - (artigo 7º da contestação da 2ª ré).

    4. -Nos termos do Ponto 12 do artigo 1º das Condições Especiais da Apólice em causa, considera-se como RECLAMAÇÃO: “Qualquer procedimento judicial ou administrativo iniciado contra qualquer SEGURADO, ou contra a SEGURADORA (…) Toda a comunicação de qualquer facto ou circunstância concreta conhecida por primeira vez pelo Segurado e notificada oficiosamente por este à Seguradora (…)” - (artigo 8º da contestação da 2ª ré).

    5. -Nos termos do artigo 3º das Condições Especiais da Apólice 002866129, estabelece-se ainda que “ficam expressamente excluídas da cobertura da presente APÓLICE as RECLAMAÇÕES: a) Por qualquer facto ou circunstância conhecidos do SEGURADO à data de início do PERÍODO DE SEGURO, e que já tenha gerado ou possa razoavelmente vir a gerar RECLAMAÇÃO; (…) ” - (artigo 9º da contestação da 2ª ré).

    6. -Nos termos do artigo 10º/1 das Condições Especiais da Apólice em causa: “ O SEGURADO, nos termos definidos no ponto 1. do artº 8º das Condições Especiais, deverá comunicar ao Corretor ou à SEGURADORA, com a maior brevidade possível, o conhecimento de qualquer RECLAMAÇÃO efectuada contra ele ou de qualquer outro facto ou incidente que possa vir a dar lugar a uma reclamação. (…) ” A comunicação referida em 1, dirigida ao Corretor ou à SEGURADORA ou seus representantes, deverá circular entre os eventuais réus de modo tal que o conhecimento da RECLAMAÇÃO possa chegar à SEGURADORA no prazo razoável.” - (artigo 10º da contestação da 2ª ré).

    7. -O montante limite de indemnização – € 150.000,00 – sempre deverá ser descontada a franquia geral contratada, no montante de € 5.000,00, a qual, nos termos contratados, fica a cargo exclusivo do arguido - (artigo 11º da contestação da 2ª ré).

    8. -O autor outorgou procuração a favor da 1ª ré F... para o patrocinar no processo-crime que correu termos no 3º Juízo Criminal de Lisboa – 3ª secção – processo nº 1128/11.7S6LSB - (artigo 3º da petição inicial).

    9. -O autor era acusado, nesse processo, de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 192º nº 1 alínea b) e nº 2 do Código Penal - (facto admitido por acordo – vide acta de audiência prévia).

    10. -Realizado o julgamento, o autor foi condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão, suspensa, com sujeição a regime de prova (facto admitido por acordo – vide acta de audiência prévia).

    11. -Tendo sido deduzido, na acção penal, pedido cível pela assistente e sua companheira, A..., o mesmo...

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