Acórdão nº 18/14.6PFLRS.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE GON
Data da Resolução29 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em Conferência, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1.–No processo comum com intervenção do tribunal singular n.º18/14.6PFLRS, procedeu-se ao julgamento do arguido A…, melhor identificado nos autos, pela imputada prática, em autoria material e na forma consumada, de factos susceptíveis de integrarem um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º1, als. b) e c) e 2 do Código Penal, com referência ao seu art. 26.º, “incorrendo ainda nas penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de alma, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de violência doméstica, nos termos dos n.º 4 e 5 da mesma disposição legal” (acusação de fls. 80 e seguintes) A assistente, B…, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a condenação deste a pagar-lhe, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o montante de €5.000,00.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: «Nestes termos, e pelo exposto, decide-se: Parte criminal a)-Absolver o arguido A… da prática, em autoria material e na forma consumada, de factos susceptíveis de integrarem um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º n.º 1, als.b) e d), 2, 4 e 5 do C.P.

b)-Condenar o arguido A…: como autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 143.º, n.º 1 e 145.º, n.º 1, al. a), e n.º 2, por referência ao art. 132.º, n.º 2, al. b), todos do Código Penal), na pena de (oito) meses de prisão substituída por 240 (duzentos e quarenta) dias de multa, à razão de 7,00€ (sete euros) diários, num total de 1.680,00€ (mil seiscentos e oitenta euros) (…) Parte civil a)-Julga-se o pedido de indemnização civil deduzido, pela assistente/demandante, parcialmente procedente e, em consequência, condena-se o arguido/demandado a pagar-lhe a quantia de 1.000,00€ (mil euros) a título de danos não patrimoniais. (…)» 2.–O arguido recorreu desta sentença, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): 1.-… 2.-… 3.–Salvo o devido respeito, que é muito, entende o Arguido, ora recorrente, que o Tribunal a quo não fez uma correta apreciação dos factos e da respectiva prova e, em consequência, errou na aplicação do Direito, violando o disposto no artigo 71.º n.º 1 e 2, do Código Penal, nos artigos 13.º n.º 2, 32.º n.º2 e 205.º, todos da Constituição da República Portuguesa, §6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 97.º n.º 5, 125.º, 127.º,374.º n.º2 e 379.º n.º1 alínea a), todos do Código de Processo Penal, e ainda o previsto no artigo 483.º do Código Civil.

  1. –Na douta Sentença recorrida foi dada como provada matéria de facto sem que tenha sustentação na prova produzida em sede de audiência de julgamento e, por outro lado, há matéria que resultou provada que não foi incluída nos factos considerados provados.

    5….

  2. –No entender do Arguido, ora recorrente, os factos mencionados como 4, 6, 12 e 13 supra, foram incorrectamente apreciados e considerados como provados, dado que à luz da prova produzida em audiência de julgamento, impõe-se decisão diversa da recorrida.

  3. –No ponto 4 dos factos considerados provados, afirma-se que «o Arguido desferiu a esta um empurrão, vindo a mesma a cair no chão».

  4. –A Sentença erra na medida em que não ficou provado que o Arguido desferiu um empurrão à Assistente, porquanto: i)-O Arguido, nas declarações que prestou, negou que tivesse empurrado a Assistente. [Ficheiro nº 20160420120635_5529921_2871232 Temporização - 00:32:45 a 00:33:00] ii)-A testemunha J… afirmou que o arguido empurrou o filho AA… (e não a Assistente). [Ficheiro n° 20160301113051_5529921_2871232 Temporização-00:01:18 a 00:01:45] iii)-A testemunha AA… referiu que sentiu um impulso nas costas. (Ficheiro n° 20160420113812_5529921_2871232 Temporização - 00:08:10 a 00:08:40) iv)-A testemunha P… disse não ter visto nenhuma agressão. (Ficheiro n.º 20160301114344_5529921_2871232 Temporização - 00:08:30 a 00:09:30).

  5. –Se esta prova tivesse sido devidamente apreciada, seria forçoso concluir a não prova de que o arguido desferiu um empurrão à assistente.

  6. –Também não existe no acervo probatório produzido em julgamento qualquer elemento que permita considerar como provado que o arguido «agiu deliberada e conscientemente, com o intuito, concretizado, de mo/estar a integridade física da sua ex-companheira B…», como referido no ponto 6 dos factos provados.

  7. –Não tendo ficado provado que o arguido desferiu um empurrão à Assistente, necessariamente não se verificou a concretização/materialização de qualquer intuito.

  8. –Relembramos a este propósito o trecho do depoimento prestado pelo menor AA… sobre o sucedido no dia 17/12/2013, onde resulta patente que o mesmo não consegue confirmar o que aconteceu naquele dia, sendo bem patente toda a incerteza sobre o sucedido, como, aliás, fez questão de vincar. [Ficheiro n.º 20160420113812_5529921_2871232 Temporização - 00.02.35 a 00.04.55 e 00.08.06 a 00.09.40] 18.–….

    (…) 31.–Por tudo o que foi exposto, resulta que o Tribunal a quo condenou o Arguido com fundamento em ter considerado (mal) como provados os factos 4, 6, 12 e 13 supra referidos, ou seja, por ter formado a convicção errónea de que o Arguido desferiu um empurrão à Assistente.

  9. –A douta Sentença recorrida, pela ausência de qualquer elemento probatório que a suporte, como acima explanado, padece de erro na apreciação da prova produzida nos termos do disposto na alínea c) do n. ° 2 do artigo 410. ° do Código de Processo Penal.

  10. –Por outro lado, não tendo ficado provada a acção típica dada como provada, resulta igualmente a insuficiência para a decisão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º, ambos do Código de Processo Penal.

  11. –….

    (…) 35.–O teor do depoimento prestado pelo menor AA… e o esclarecimento feito pela técnica que o acompanhou são, no mínimo, elementos suficientes para estabelecer a dúvida sobre o que o menor afirmou em tribunal.

  12. –E havendo dúvida, estava obrigado a decidir em benefício do Arguido.

  13. (…) 56.–Finalmente, sendo o pedido de indemnização fundamentado na prática pelo arguido do crime pelo qual vinha acusado, e não se tendo provado o seu cometimento, não é devida qualquer indemnização, impondo-se também nesta parte a absolvição do arguido.

    Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta Sentença ser revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta - a ABSOLVIÇÃO DO ARGUIDO· assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! 3.–O Ministério Público junto da 1.ª instância apresentou resposta, no sentido de que o recurso não merece provimento.

    4.–A assistente também respondeu ao recurso, pugnando pelo seu não provimento e concluindo (transcrição das conclusões): (…) 5.–Admitido o recurso, subiram os autos a este Tribunal da Relação, onde o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que se reporta o artigo 416.º do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de C.P.P.), subscrevendo a posição do Ministério Público junto da 1.ª instância, deu parecer no sentido de que o recurso não deve ser provido.

  14. –Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do C.P.P., procedeu-se a exame preliminar, após o que, colhidos os vistos, os autos foram à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma.

    II–Fundamentação.

  15. -Dispõe o artigo 412.º, n.º 1, do C.P.P., que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

    (…) No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação de recurso, as questões que se suscitam são as seguintes: - Impugnação da matéria de facto/erro de julgamento/ invocada violação do princípio in dubio pro reo /vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e do erro notório na apreciação da prova; - Enquadramento jurídico-penal da conduta do arguido; - Pedido de indemnização civil.

  16. –Da sentença recorrida.

    2.1.-O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1)-O arguido e B… viveram em comunhão de mesa, leito e habitação, desde Março de 2006 até Janeiro de 2011 residindo na Avenida …, em …, tendo um filho dessa união, AA…, nascido no dia 21 de Julho de 2007.

    2)-Em Janeiro de 2011, apesar de separados, o arguido permaneceu a viver na mesma casa que B…, embora em quartos separados.

    3)-No dia 17 de Dezembro de 2013, cerca das 19:00, quando se encontrava na via pública, o arguido dirigiu-se apressadamente na direcção de B, que estava com o menor, a quem disse “AA… é comigo que tu queres estar, é comigo que tu tens que estar, eu vou-te levar comigo", perante o que o menor fez menção de querer ir para o colo da mãe.

    4)-Quando o menor já estava ao colo da mãe, o arguido desferiu a esta um empurrão, vindo a mesma a cair no chão, onde caiu de costas e bateu com a cabeça na estrada, o que lhe provocou, directa e necessariamente, um hematoma na aludida zona e no cotovelo direito, e dores.

    5)-Enquanto algumas pessoas que por ali passavam ajudavam B… a levantar-se, o arguido disse, em alto e bom som, "eu é que sou o pai, é uma vaca, é uma reles ".

    6)-O arguido agiu de forma livre, deliberada e conscientemente, com o intuito, concretizado, de molestar a integridade física da sua ex-companheira, B…, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    (…) 12)-Devido ao empurrão que o arguido aplicou na assistente, derrubando-a, esta teve hematomas e sentiu dores na cabeça e no cotovelo.

    13)-Tendo o arguido, causado tais agressões na frente da criança, e dos pais da assistente, pessoas de idade, e de todos os quantos passavam na via pública o que humilhou, ofendeu aquela na...

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