Acórdão nº 7996-15.6T8SNT-B.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Novembro de 2016
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 24 de Novembro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.
1.-Relatório: A, Residente no Seixal, intentou acção declarativa contra a MASSA INSOLVENTE de B, representada pelo seu Administrador de Insolvência, Carlos A...V...V..., pedindo que, no âmbito de acção proposta ao abrigo do disposto no artº 125º do CIRE : a)Seja anulada a resolução comunicada pelo Administrador de Insolvência através de carta de 27/7/2012, e , consequentemente, seja determinada a manutenção da validade e eficácia do contrato de compra e venda das acções tituladas ao portador da Sociedade …, S.A.
Alegou o autor, para tanto e em síntese, que: -recebeu do Sr. Administrador da Insolvência uma comunicação através da qual era-lhe declarada a resolução, a favor da massa insolvente, do contrato de compra e venda relativo às acções tituladas ao portador da Sociedade …., S.A.,; -Sucede que, o autor , em 01.06.2012 , adquiriu - pelo preço de €498.000,00 , que pagou - à B as referidas acções, desconhecendo de todo, nessa data, que a insolvente se encontrasse em situação de insolvência ou em iminência da mesma ; -Ademais, tendo o processo de insolvência tido o seu início em 07.04.2015, já haviam então decorrido mais de dois anos entre a data de celebração do negócio resolvido e a data de início do processo, pelo que já se mostrava caducado o direito à resolução do contrato, quando esta foi efectivada mediante carta de resolução enviada pelo Senhor AI datada de 27.07.2015 e recebida pelo Autor; -De igual modo , porque em razão do que foi alegado na comunicação de resolução, apenas em abstracto poderia existir fundamento para a resolução incondicional nos termos da alínea h), do nº1, do artº 121º, do Cire, certo é que também se exigia que o acto oneroso tivesse sido – o que não aconteceu - realizado pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência .
1.1.-Citada a Ré , apresentou a mesma contestação, deduzindo defesa por impugnação motivada, alegando v.g. que a alegada realização do negócio entre a insolvente e o Autor não se mostra devidamente documentada, a que acresce que é o próprio Autor que junta aos autos , e para demonstrar o efectivo exercício dos seus direitos sociais, uma Acta de Assembleia Geral realizada em 07.10.2013.
Por outra banda, esclarece a Ré que, apenas a partir da data da Assembleia Geral realizada em 07.10.2013, é que se pode concluir que o autor adquiriu e lhe foram entregues as acções , razão porque não pode proceder de todo a invocada caducidade do direito de resolução do negócio.
Acrescenta também a contestante que o Autor, ao confessar na petição inicial que pagou o preço do negócio ao pai da insolvente, então está-se na presença de um acto claramente prejudicial à massa insolvente e do qual tem de resultar a má-fé do Autor.
1.2.-Dispensada a realização da audiência prévia , foi então proferido o despacho saneador, tabelar, sendo o conhecimento da excepção peremptória arguida – da caducidade do direito de impugnar – pelo demandante relegado para a sentença a proferir após a audiência de discussão e julgamento.
1.3.-Finalmente, realizada que foi a audiência de discussão e julgamento ( iniciada a 27/4/2016 e concluída a 18/5/2016 ) , com observância do formalismo legal, e conclusos que foram os autos para o efeito, foi proferida sentença , sendo o respectivo segmento decisório do seguinte teor : “ (…) Decisão Pelo exposto, julgando a presente acção procedente, declaro verificada a caducidade do direito à resolução do contrato de compra e venda das acções tituladas ao portador da Sociedade …., S.A e, consequentemente, sem nenhum efeito, a declaração de resolução do mesmo.
Registe e notifique.
Nos termos do disposto no art. 303º , do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a actividade processual relativa a qualquer incidente cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, não é objecto de tributação autónoma.
Assim, e porque no caso concreto as custas são a cargo da massa insolvente, não há lugar a custas.
Transitada em julgado a presente sentença, conclua no apenso A.
Sintra, 19.07.2016” 1.4.-Inconformada com a sentença indicada em 1.3., da mesma apelou então a demandada MASSA INSOLVENTE de B , apresentando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões [ demasiado extensas, e algo repetitivas - ad nauseam - , não tendo a recorrente cumprido as exigências legais de necessária , obrigatória e salutar sintetização - cfr. artº 639º, do CPC - , das mesmas constando matéria de todo supérflua para identificar o objecto da apelação, apenas não se tendo determinado o cumprimento do nº3, do artº 639º, do CPC, por razões de celeridade ] : 1.A aqui Recorrente não se conforma com o teor da decisão proferida pelo Tribunal a quo, que julgou a acção procedente em virtude de declarar verificada a caducidade do direito à resolução.
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E o inconformismo da aqui exponente resulta ainda mais evidente quando, analisando o teor da douta Sentença proferida, ficamos convictos que o distinto Tribunal se decidiu pelo preenchimento dos demais pressupostos de que depende a resolução de negócios em benefício da massa insolvente.
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Com efeito, sabendo-se que o regime estatuído nos artigos 120º e ss. do CIRE, comporta o preenchimento de três requisitos essenciais, consistentes na temporalidade, prejudicialidade do acto e má fé do terceiro.
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Entendemos que os requisitos da prejudicialidade e da má fé estão, no caso em apreço, indubitavelmente preenchidos.
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Mas detenhamo-nos um pouco nos contornos do negócio em crise nestes autos e “sua descoberta” por parte do AI: 6.Na sequência da declaração de insolvência de B, o Dr. …. assumiu funções de Administrador de Insolvência e apurou que a insolvente figurava como titular de participações correspondentes a 99,68% do capital social da empresa “…., S. A.” – facto provado 9.
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O conhecimento de tal circunstância adveio-lhe do facto de em sede de registo comercial relativo à indicada sociedade anónima “….e”, a Insolvente constar como subscritora das aludidas participações – vide Docs. Juntos com a contestação especificamente, Docs. 1 e 2.
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Em consequência, a insolvente foi notificada, em Assembleia realizada nos autos principais em 18.06.2015, para juntar documentos ou esclarecer a detenção dessa participação.
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A insolvente fez juntar aos autos principais o contrato que o Autor junta no presente apenso como Doc. 1 com a sua PI.
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No entanto, entendeu a aqui Recorrente que as explicações fornecidas não eram adequadas, antes colidiam frontalmente com aquelas que se consideram ser as mais elementares regras da normalidade do acontecer.
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Efectivamente, não se concebe nem se vislumbra como se possa conceber que num negócio de quase meio milhão de euros os respectivos contraentes se bastem com a celebração de um contrato por mero documento particular, totalmente inapto, na nossa opinião, à prova inequívoca do que no mesmo foi inscrito.
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Do mesmo modo, não se concebe que o contrato tenha sido, alegadamente, celebrado no mesmíssimo dia que a empresa é transformada em sociedade anónima, com a subscrição da quase totalidade do capital social desta sociedade a ser assumida e registada a favor da insolvente.
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E se a isto somarmos o incompreensível facto de, pretensamente, o preço das acções vir a ser feito em Angola e em numerário, no “equivalente da moeda local”, mais convictos ficamos de que o negócio é suspeito.
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Não compreendemos como quem paga quase meio milhão de euros o faço em numerário.
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E consideramos que a prudência do homem médio jamais o determinaria a efectuar o pagamento de tanto dinheiro em numerário, pois tal método de pagamento torna impossível a prova de que o mesmo ocorreu.
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Prova essa que, num negócio feito por mero escrito particular e num outro país que não aquele em que ocorreu a entrega do dinheiro, se tornava ainda mais importante.
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Qualquer suspeição do AI transformou-se, neste caso, em certeza, pois o quantitativo devido pela celebração do negócio não foi apreendido nos autos nem empregue noutros bens apreendidos à insolvente e não proporcionou qualquer aumento do activo – facto provado 13.
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Em conformidade, agindo no uso das competências que a lei lhe atribui, o AI procedeu à resolução do negócio em benefício da massa insolvente.
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A tal propósito, afirmamos, desde já, que a declaração resolutiva expedida e que se mostra junta aos autos cumpriu, no nosso modesto entender, com as formalidades e motivação exigíveis nos termos do artigo 123° do CIRE.
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Tanto assim foi que o Autor, ao abrigo do artigo 125° do CIRE, impugnou a resolução e manifestou, em sede de PI, inteiro conhecimento quanto à matéria com relevância para os presentes autos.
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Entre outros aspectos, o Autor invocou, na sua PI, a caducidade da resolução aqui operada, sustentando que o negócio se celebrou em 01.06.2012, cfr. contrato que juntou como Doc. 1 » impugnado nos termos do artigo 444° do CPC pela aqui Recorrente; 22.E alegou que a contrapartida pela celebração do negócio foi paga ao pai da insolvente [ vide, entre outros, 2° a 6° da PI ]; 23.Que foi por sua exigência que a sociedade “…..
” foi transformada em sociedade anónima [ 10° da PI ]; 24.Que, “evidentemente, a partir da data da aquisição das acções representativas do capital social da sociedade “…., S.A.
”, o aqui Autor passou a exercer a integralidade dos respectivos direitos sociais, Designadamente, o aqui Autor fez-se representar em todas as assembleias gerais daquela Sociedade entretanto realizadas”, conforme documentos que juntou [ 11.° e 12.° da PI ]; 25.Que “desconhecia, como continua a desconhecer, se àquela data de 1 de Junho de 2012, a Ex.ma Senhora D.
B se encontra em situação de insolvência ou em situação de iminente insolvência” [14º da PI].
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De notar que, salvo melhor opinião, em sede de contestação o Autor preencheu, desde logo, o requisito de prejudicialidade.
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Realizadas as audiências de discussão e julgamento oportunamente agendadas, o distinto Tribunal...
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