Acórdão nº 646/14.0PCOER.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelVASCO DE FREITAS
Data da Resolução29 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência, os Juizes do Tribunal Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: No âmbito do Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular que corre termos na Comarca de Lisboa Oeste Amadora, Instância ..., Secção Criminal , J ... com o nº 646/14.0PCOER, foi submetido a julgamento o arguido J.P.D., tendo sido proferida sentença que decidiu: -Condenar o arguido na prática de um crime de abuso sexual de menor, previsto e punido pelo artigo 171º n.º3 alínea a) do Código Penal, na pena de 3 meses de prisão; -Condenar o arguido na prática de um crime de abuso sexual de menor, previsto e punido pelo artigo 171º n.º3 alínea do Código Penal, na pena de 10 meses de prisão; -Condenar o arguido na prática de um crime de abuso sexual de menor, previsto e punido pelo artigo 171º n.º1 do Código Penal, na pena de 13 meses de prisão; -Condenar o arguido na prática de um crime de abuso sexual de menor, previsto e punido pelo artigo 171º n.º1 do Código Penal, na pena de 15 meses de prisão; -Condenar o arguido na prática de um crime de abuso sexual de menor, previsto e punido pelo artigo 171º n.º2 do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão; -Condenar o arguido na prática de um crime de extorsão, previsto e punido pelo artigo 223º n.º1 do Código Penal, na pena de 2 meses de prisão; -Condenar o arguido na prática de um crime de extorsão, previsto e punido pelo artigo 223º n.º1 do Código Penal, na pena de 2 meses de prisão; -Condenar o arguido na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, mediante regime de prova assente em plano individual de readaptação social, através de acompanhamento psicoterapêutico na área da sexualidade, impendendo sobre este a obrigação de responder a todas as convocatórias que para o efeito lhe vierem a ser feitas pelo Tribunal e pelos técnicos de reinserção social.

No que se refere à parte cível: -Absolver da instância cível a demandada EEP Lda em relação ao pedido deduzido, em nome próprio, por H.L.S. e A.A.S.; -Absolver da instância cível a demandada EEP Lda em relação ao pedido deduzido, em nome próprio, J.M.C. e P.F.C.; -Condenar o demandado no pagamento à demandante I. da quantia de €6.000, acrescida de juros vincendos desde a data da sentença até integral pagamento, absolvendo-o do restante montante peticionado.

-Condenar o demandado no pagamento à demandante C. da quantia de €2.000, acrescida de juros vincendos desde a data da sentença até integral pagamento, absolvendo-o do restante montante peticionado.

-Condenar a demandada no pagamento à demandante I. da quantia de €15.000, acrescida de juros vincendos desde a data da sentença até integral pagamento, absolvendo-a do restante montante peticionado.

-Condenar a demandada no pagamento à demandante C. da quantia de €15.000, acrescida de juros vincendos desde a data da sentença até integral pagamento, absolvendo-a do restante montante peticionado.

Inconformado com a decisão condenatória, dela vieram interpor recurso J.M.C. e mulher P.F.C. ,em seu nome próprio e na qualidade de pais e legais representantes de sua filha menor de idade, C.e H.L.S. e mulher A.A.S. ,seu nome e na qualidade de pais e legais representantes de sua filha menor de idade, I. , concluindo nos seguintes termos: 1.Afigura-se que assiste legitimidade aos demandantes no que concerne a deduzirem, como fizeram, o pedido de indemnização civil que faz fls., sendo o tribunal penal competente para decidir todas as questões prejudiciais penais e não penais que interessem à decisão da causa, assim consignando que o processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e que nele se resolvem todas as questões relevantes, independentemente da sua natureza.

  1. Relativamente à indemnização dos danos reflexos, no nosso modesto entender, há que reconhecer, como é o caso, que há situações de lesões graves que se repercutem nos familiares das próprias vitimas, neste caso. dos próprios pais das menores vitimas não só do comportamento censurável do arguido, como da própria demandada.

  2. Essas lesões geram nos familiares, neste caso, em especial nos pais, que amam os seus filhos, pais ligados às vitimas por fortes laços afectivos, estados de intranquilidade, de angustia e de desespero ou que provocam grave perturbação no seu modo de vida, como in casu, se verificou.

  3. Afigura-se-nos inquestionável que, no presente caso, face à prova produzida e face ao que decorre da experiência comum, que o desgosto e o sofrimento dos pais destas menores é, por um lado, se assim se pode dizer incomensurável e por outro que sempre merece a tutela do direito e consequente o direito a serem indemnizados pelos danos não patrimoniais sofridos e que continuam a sofrer.

  4. Assim, no tocante à questão- indemnização dos danos reflexo -pugna-se pela ressarcibilidade dos danos não patrimoniais sofridos pelos parentes das vítimas neste caso dos pais, mesmo no caso de não ter ocorrido o falecimento daquelas, no seguimento e de acordo com a doutrina supra citada que aqui sufragamos.

  5. No que concerne aos danos não patrimoniais atribuídos às menores afigura-se que tais danos porque suficientemente graves para merecerem a tutela do direito,como aliás reconhece a douta sentença recorrida, são ainda assim inaceitáveis no seu quantum indemnizatório e, neste sentido, deve a condenação do demandado e da demandada, com recurso a juízo de equidade, fixar-se nos montantes supra referidos: 15.000,006 e 40.000,006 para a menor I. ,a pagar, respectivamente, pelo demando e pela demandada e 10.000,006 e 40.000,006 a pagar, respectivamente, pelo demando e pela demandada, à menor C., a que acrescerão, em ambas as situações, os respectivos juros, á taxa legal, até efectivo e integral pagamento.

Nestes termos e nos demais de direito que V.Exas doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais.

Assim, fazendo, farão V.Exas JUSTIÇA” De igual modo a demandada “EEP Ldª” veio interpor recurso da decisão apresentando as seguintes conclusões: a)Obviamente, por ser um Estabelecimento de Ensino com várias décadas, comprestígio e que sempre pautou os seu relacionamento com os alunos de forma exemplar, que o Colégio …………….., não declina a sua perturbação pelos acontecimentos, lamentando-os; b)Mas do sentimento supra enunciado, para a admissão de uma responsabilidade, objetiva, pelo sucedido às ofendidas, vai a distância imposta pelo nexo de causalidade, que, obviamente não se verificou; c)-Com o devido respeito, que é muitíssimo, pelo trabalho do Tribunal a quo, que culminou numa sentença muito bem estruturada e com uma preocupação em explicar a decisão, parece-nos que existiram fatos que o Tribunal a quo não relevou e que serão fundamentais para um enquadramento, determinante, para se aferir o nexo de causalidade e o, eventual montante indemnizatório; d)Na data dos fatos, com doze anos e oito meses, os Pais das ofendidas, já permitiam que as mesmas possuíssem telemóveis, não os controlando; e)Como se verifica nos fatos provados, havia uma relação das ofendidas com o arguido, fora do espaço do Colégio …………, com trocas de mensagens de telemóvel; f)Querer responsabilizar o colégio ………… pelo fato de duas jovens de doze anos e oito meses, se terem apaixonado por um jovem de dezanove anos e que com o mesmo tivessem brincadeiras menos próprias, parece-nos uma desresponsabilização, total, dos Pais e uma responsabilização, excessiva, do citado estabelecimento de ensino; g)Em grande parte dos Estabelecimentos de Ensino, públicos ou privados, os alunos de 12/13 anos convivem com alunos de 18/19 anos, não estando proibidos os contatos entre os mesmos; h) E, por maioria de razão, o mesmo acontece nos ATL, nas aulas de natação, em atividades desportivas, nas aulas de línguas....

i)Querer transformar brincadeiras entre jovens, numa obrigatoriedade do Colégio …………. prever uma situação que não era previsível, parece-nos uma "americanização" da justiça Portuguesa, de todo indesejável e que não está em consonância com o nosso sistema jurídico; j)Se o arguido teve as "brincadeiras" que logrou alcançar com as ofendidas, foi com o consentimento das mesmas que, segundo o Tribunal se apaixonaram pelo mesmo; k)O Colégio ………….., dificilmente poderia prever que havia troca de sms entre o arguido e as ofendidas, que intensificavam uma relação, fora das barreiras do estabelecimento; I)Será que as jovens, a quem os Pais davam liberdade para usarem telemóveis, se quisessem, não poderiam enganar os Progenitores e, inclusivamente, encontrarem-se com o arguido fora da Escola? m)Obviamente que sim..

n)- Na verdade, não se provou nas audiências de julgamento, que existisse coação da parte do arguido, temor reverenciai, ou algo que obstasse a que as ofendidas reportassem a sua, eventual, situação de desconforto, ao Colégio ……………… ou aos seus Progenitores; o)Acrescenta-se que o Tribunal a quo, não consegue estabelecer um nexo de causalidade entre a atuação do arguido e os danos, eventualmente, sofridos pelas ofendidas.

p)O sentimento de mal-estar das ofendidas deveu-se à atuação do arguido, per se, ou a toda a panóplia posterior resultante de conversas com os Pais, vergonha, publicitação das situações junto dos colegas com eventual proliferação pelas redes sociais, etc. ? q)A ofendida foi por sua vontade com o arguido para a casa de banho, escondendo-se da vigilância dos funcionários do colégio por saber que os mesmos nunca o permitiriam; r)E seria possível ao Colégio evitar que tal acontecesse, tendo a ofendida colaborado com o arguido? s)Começa-se, em Portugal, a verificar uma "americanização" da nossa justiça, muito incentivada pelos meios de comunicação social, desresponsabilizando uns em detrimento de outros, por forma a se obter indemnizações que, para serem obtidas, no seu processo, penalizam mais os próprios ofendidos do que aqueles a quem pedem as indemnizações....

t)Caberia ao Tribunal a quo, um desenvolvimento analítico, separando a...

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