Acórdão nº 475/15.3YLPRT.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução22 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório: JOSÉ (residente na Rua …….l, n.º …,., Santo Amaro de Oeiras) intentou, no Balcão Nacional do Arrendamento, em 6/02/2015, procedimento especial de despejo contra MARIA (residente na Rua ……., n.º …, 3º esq., Lisboa), peticionando fosse a Ré condenada a entregar-lhe o locado livre e devoluto de pessoas e bens, invocando a resolução do contrato de arrendamento habitacional em vigor sobre o 3º andar esquerdo do prédio sito na Rua …. …., nº …., freguesia de Penha de França, Lisboa, mediante notificação judicial avulsa, por falta de pagamento das quantias correspondentes ao aumento das rendas, dado que a arrendatária não realizou, atempadamente, a invocação da circunstância prevista no art. 35º do NRAU - RABC inferior a 5 RMNA.

Para tanto, alegou: - Por carta registada com aviso de recepção enviada à Requerida em 27/12/2012, o Requerente comunicou a sua intenção de proceder à actualização da renda e à transição do contrato de arrendamento para o regime geral; - Nessa carta, o Requerente propôs que o contrato passasse a ter prazo certo, com a duração de 3 (três) anos e que a renda fosse aumentada de € 91,00 para € 196,95; - No dia 14/01/2013, o Requerente recebeu um envelope do qual constava como remetente a Requerida, contendo i) a cópia do respectivo Bilhete de Identidade, ii) um documento dirigido às Finanças, por si mesma subscrito; iii) uma Declaração com o timbre da Autoridade Tributária e Aduaneira – Serviço de Finanças de Lisboa – também subscrito pela Requerida; - O conteúdo do referido envelope veio a ser judicialmente reconhecido como a invocação da circunstância prevista no artigo 35º do NRAU; - Por meio de carta de 18/07/2013, a Requerida enviou ao Requerente documento comprovativo de que o RABC do seu agregado familiar, durante o ano fiscal de 2012, era de € 5.306,44; - A Requerida continuou a pagar a renda mensal de € 91,00, em vez da actualizada (€ 196,95); - Por carta de 16/07/2014, a Requerida enviou ao Requerente documento comprovativo de que o RABC do seu agregado familiar, durante o ano fiscal de 2013, era de € 5.130,35; - Em resposta, por carta de 22/07/2014 (embora erroneamente datada de 22/04/2014), o Requerente transmitiu à Requerida que a prova anual do seu rendimento não fora feita tempestivamente, pelo que, nos termos do artigo 35º, nº 5, do NRAU, a Requerida deixou de poder prevalecer-se da circunstância de o RABC do seu agregado familiar ser inferior a 5 RMNA, o que consequenciava que a renda passaria a ser de € 196,95, a partir da que se venceu em Fevereiro de 2014 (a invocação inicial havia sido feita em Janeiro de 2014); - Uma vez que, não obstante, a Requerida continuou a pagar a renda antiga, no valor de € 91,00, em vez da actualizada (€ 196,95), encontra-se por pagar, desde Fevereiro de 2014, uma diferença no valor mensal de € 105,65 – o que, multiplicado por 10 meses, perfaz € 1.056,50, capital este a que acrescem juros moratórios, à taxa anual de 4 %, até ao seu integral pagamento, bem como as rendas que, no todo ou em parte, se vencerem até à efectiva entrega do locado; - Tendo decorrido mais de dois meses sobre a data em que a Requerida deixou de pagar a totalidade da renda, tornou-se inexigível ao senhorio a manutenção do contrato de arrendamento em causa, nos termos do art. 1083º, nº 3, do Código Civil; - Por notificação judicial avulsa feita à Requerida em 18/12/2014, o Requerente declarou resolvido o contrato de arrendamento.

A Requerida deduziu Oposição, alegando – nuclearmente - que procedeu ao pagamento das rendas devidas, não sendo exigível o montante reclamado, a título de rendas, pelo Requerente, porquanto a Requerida procedeu à comunicação atempada dos seus rendimentos ao senhorio.

Invocou, ademais, que o Requerente faz um uso indevido do procedimento e peticionou a sua condenação no pagamento de indemnização, no montante de € 20.000,00 e multa, nos termos do art. 15º- R do NRAU.

Findos os articulados, procedeu-se à inquirição das testemunhas arroladas pela Requerida (na sua Oposição), finda a qual foi proferida Sentença (datada de 2/09/2015) com o seguinte teor decisório: «Nesta conformidade, julgando improcedente a presente acção, decide-se: a)Absolver a requerida dos pedidos formulados pelo requerente.

b)Condenar o requerente no pagamento à requerida de indemnização no montante de € 3.000,00, bem como de multa que se fixa em 10 vezes a taxa de justiça devida.

c)Condenar o requerente no pagamento das custas do processo, nos termos do art. 527º do C. Processo Civil.

Notifique e registe.» Inconformado com o assim decidido, o Requerente interpôs recurso da referida sentença – o qual foi admitido como de Apelação, com subida imediata e com efeito devolutivo (cfr. arts. 676º, 678º, 680º, n.º 1, 684º B, 685º, n.º 1, 691º, n.º 1 e 692º, todos do C.P.C.) -, tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: “A – Por terem sido expressamente invocados e não impugnados e constarem dos documentos juntos com o requerimento de despejo, devem passar a constar do elenco dos factos provados, os seguintes factos: 1– No âmbito do procedimento de transição do contrato de arrendamento dos autos para o regime do NRAU, em 27/12/2012, o ora autor comunicou à ré a sua intenção de proceder à atualização da renda e à transição do contrato de arrendamento para o Novo Regime do Arrendamento Urbano tendo, além do mais, proposto que a renda fosse aumentada dos € 91,00 então em vigor para € 196,95.

2– No dia 14 de Janeiro de 2013, a ré enviou uma carta que veio a ser judicialmente considerada como tendo a forma adequada para o efeito, para obstar ao pretendido aumento da renda, nos termos do disposto no artigo 35º do NRAU.

3– Até ao final do mês de Janeiro de 2014, a recorrida não invocou que se mantinham as condições relacionadas com o seu RABC e, nessa medida, que pretendia prevalecer-se das mesmas, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 35º do NRAU.

4– Por carta de 22 de Julho de 2014, o recorrente comunicou à recorrida que, por falta de prova do rendimento (ou de envio de certidão a atestar que a mesma fora pedida no prazo legal), isto é, em Janeiro de 2014, deixava a recorrida de poder prevalecer-se do regime estabelecido no artigo 35º do NRAU, tendo transmitido que, com efeitos a Fevereiro de 2014, a renda passara para € 196,95.

5– A recorrida continuou a pagar mensalmente apenas a quantia de € 95,00, o que significa que não pagou as diferenças entre os € 196,95 e os € 95,00, isto é, € 101,95 / mês.

6– No dia 5 de Dezembro de 2014, o recorrente apresentou Notificação Judicial Avulsa contra a recorrida, por meio da qual declarou resolvido o contrato de arrendamento e pediu a condenação da recorrida no pagamento de € 1.056,50 mais juros referente à diferença das rendas mensais pagas pela recorrida (€ 95,00) e as que o recorrente referia serem devidas (€ 196,95).

7– Tal notificação foi concretizada no dia 17 de Dezembro de 2014.

B– Tendo em consideração o depoimento das testemunhas Lino T... e Cristina T... – únicos elementos de prova carreados a este propósito – o Tribunal não poderia ter considerado provado o facto 54, que estabelece: “A requerida tem experimentado uma permanente angústia e desespero, não consegue dormir, mal come, e teve mesmo de se deslocar ao hospital.” C– Com efeito, nenhuma prova foi produzida quanto aos seguintes factos: (i) que a angústia da recorrida tenha sido permanente; (ii) que a recorrida não consegue dormir; (iii) que mal come e (iv) que teve que se deslocar ao hospital.

D– Assim, compulsada a prova testemunhal produzida, o recorrente considera que apenas poderia ter sido julgado provado que a recorrida experimentou angústia, abalo e instabilidade emocional, pelo que o facto provado n.º 54 deverá passar a ter a seguinte redação: 54– A requerente tem experimentado angústia, abalo e instabilidade emocional.

E– Depois de ouvidos os depoimentos prestados, não foi proferida qualquer prova nos autos sobre a matéria do agravamento da doença oncológica de que a recorrida infelizmente padece.

F– Deve, por conseguinte, o facto 55 dos factos provados ser julgado “não provado”.

G– Quanto ao facto 56 dos factos provados, apenas se pode aceitar, face à prova testemunhal produzida, que a recorrida tem 71 anos e que padece de doença oncológica, mas já não se aceita que não tenha podido contar com apoio pessoal ou afetivo e de que a mesma receie ser vetada a um completo abandono.

H– O que resultou dos referidos depoimentos foi que a recorrida tem podido contar com o apoio pessoal e afetivo, não apenas das Instituições locais, onde avultam a Junta de Freguesia e a Misericórdia, mas também pessoais, de que as próprias testemunhas são um bom exemplo, sendo que a testemunha ………. se tem inclusivamente disponibilizado a ajudar financeiramente a recorrida, a título pessoal.

I– Deve, pois o facto n.º 56, salvo no que respeita à idade da recorrida, ser julgado “não provado”.

J– O recorrente desconhece a situação de saúde em que presentemente a recorrida se encontra, sendo certo que a prova produzida não trouxe qualquer informação relevante sobre o assunto. Por outro lado, o alegado – e inexistente – exercício de pressão é conclusivo, pelo que não pode figurar no elenco dos factos provados.

K– Deve por conseguinte o ponto 57 dos factos provados ser julgado “não provado”.

L– A resolução do contrato de arrendamento foi realizada com base no disposto no artigo 1083º, n.º 3 do Código Civil.

M– O artigo 35º, n.º 5 do NRAU refere que no mês correspondente àquele em que foi feita a invocação da circunstância regulada no presente artigo [RABC inferior a 5 RMNA] (não no mês correspondente àquele em que o valor do RABC foi comunicado, mas ao da invocação das referidas circunstâncias) e pela mesma forma, o arrendatário faz prova anual do rendimento perante o senhorio, sob pena de não poder prevalecer-se da mesma.

N– Assim, caso pretendesse prevalecer-se de tais...

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