Acórdão nº 3615/14.6TBCSC.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelFERREIRA DE ALMEIDA
Data da Resolução20 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa .

Relatório: 1.A... propôs, contra O... SA, acção comum, distribuída ao 2º Juízo Cível de Cascais, pedindo a condenação daquela a pagar ao B... o montante em dívida, acrescido de juros moratórios, por virtude de empréstimo contraído pela A. e P..., entretanto falecido, garantido por seguro contratado com a R.

Contestou a R., alegando, designadamente, haver procedido à anulação do seguro em causa - concluindo pela improcedência da acção.

Efectuado julgamento, foi proferida sentença, na qual se considerou a acção parcialmente procedente, reconhecendo-se à A. o direito de ver pago pela R. ao B... a quantia correspondente ao capital mutuado, e ainda não reembolsado, no montante de € 68.929,44.

Inconformada, veio a R. interpor o presente recurso de apelação, cujas alegações terminou com a formulação das seguintes conclusões : -Resultou provado que P... faleceu em 3/7/2013, constando do respetivo certificado de óbito que a causa directa da morte foi um "melanoma maligno do dorso metastizado", e que “o tempo aproximado entre o inicio da doença e a morte foi de seis anos” (factos provados nºs 1 e 21).

-Mais resultou provado que "Em 28/2/2007 o referido P... foi a uma consulta da sua médica de família no centro de saúde da sua área de residência, aí tendo esta referenciado o mesmo para uma consulta da especialidade de dermatologia, para observação e eventual excisão de um neva do dorso ("verruga"), tendo-lhe sido marcada consulta da especialidade de dermatologia para 11/6/2007 (factos provados nº 13 a 15).

-A referida "verruga" correspondia a um melanoma maligno de nível IV de Clark, com espessura de Breslow de 7,5 mm, tendo tal diagnóstico sido comunicado ao sr. P... em 20/6/2007, pelo que o sr. P... começou a ser acompanhado pelo IPO desde 3/7/2007 (factos provados nºs 16 a 17).

-Ora, em 6/6/2007, o sr. P... juntamente com a apelada, na sequência de terem solicitado ao B... a concessão de um crédito hipotecário, subscreveram a proposta de adesão ao "Seguro de Vida Crédito Habitação", a que corresponde a apólice nº 00061190, estando a ora apelante aí identificada como seguradora e o B... como tomador do seguro e entidade credora (factos provados nºs 2 e 4).

-No acto de subscrição, ao sr. P... e à apelada foi apresentando um questionário clínico, contendo várias questões sobre o respectivo estado de saúde destes e ainda sobre o historial clínico dos mesmos, entre quais se destacavam as seguintes: “1.Já o aconselharam a consultar um médico, a ser hospitalizado, a submeter-se a algum tratamento ou intervenção cirúrgica? 4.Tem alguma alteração física ou funcional, teve algum acidente grave, foi submetido a alguma intervenção cirúrgica ou recebeu alguma transfusão de sangue?” (facto provado nº 5).

-A apresentação do questionário clínico constitui uma prática corrente por parte das seguradoras, integrando uma das formas de declaração inicial do risco, quer pelo candidato a tomador do seguro quer pela pessoa segura, onde mediante perguntas simples e claras, tem-se por objetivo permitir a ponderação por parte da seguradora, dos riscos a correr com a celebração do contrato que lhe é proposto (neste sentido, ac. STJ, de 6/7/2011).

-As perguntas que integravam o questionário clínico, em especial as que foram mencionadas, são formuladas propositadamente em termos genéricos, de forma a abarcar toda e qualquer situação que possa ter relevo para a seguradora, auxiliando desta forma o proponente a evidenciar os factos essenciais do risco, para que desde modo possa ser efectuada uma correcta ponderação (ac. Rel. Lisboa, Proc. nº 419/11.1TVLSB.L1).

-O questionário em causa permitia respostas de "sim” ou “não", tendo sido preenchido por funcionário do tomador do seguro consoante as respostas obtidas por parte do sr. P... e da apelada, que responderam negativamente a todas as perguntas, tendo ainda, posteriormente, assinado uma declaração em como atestavam a veracidade das respostas dadas (factos provados nºs 4 a 7).

-Em face das respostas dadas ao questionário, e após análise da proposta submetida, a ora apelante veio a aceitar a mesma em 26/9/2007, passando a apelada e o falecido P... a ser titulares do certificado individual nº 98062115, figurando ambos como pessoas seguras na apólice, e ficando responsáveis pelo pagamento do prémio mensal total de € 37,46, a que correspondia um capital seguro de € 75.000 (facto provado nº 9).

-Não obstante, só em momento posterior ao óbito, aquando da participação do sinistro, é que a ora apelante tomou conhecimento da doença que afectava o sr. P... e que o veio a vitimar em 3/7/2013 (factos provados nºs 22 e 23).

-Do exposto, e tendo em consideração os factos dados como provados, decorre que tanto o sr. P... como a ora apelada, aquando da subscrição da proposta de adesão, omitiram à ora apelante o historial clínico do sr. P... e o real estado de saúde deste, ao não terem respondido com veracidade ao facto deste último já ter sido aconselhado a consultar um médico e se tinha alguma alteração física.

-As perguntas em causa eram objectivas, sendo o seu teor perfeitamente perceptível por parte de um homem médio, que apenas deveria responder afirmativamente ou negativamente às mesmas, tendo como intuito, nesta fase pré-contratual, permitir à ora apelante recolher informação para posterior análise, caso se mostrasse necessário.

-Por força da exclusão decorrente do art. 3º, nº1, 2ª parte, do Dec-Lei 72/2008, de 16/4, ao caso sub judice é aplicável o art. 429º do C.Comercial, sendo entendimento unânime que em face deste normativo legal, tanto a declaração que omita factos (declaração reticente), como a declaração errónea (declaração inexacta), às perguntas feitas questionário clinico, sejam dolosas ou resultem apenas de negligência, podem conduzir à anulação do contrato de seguro, desde que suscetíveis de influir na existência ou nas condições do contrato, as quais, caso a seguradora delas tivesse conhecimento, contrataria de forma diferente ou não contrataria de todo (ac. Rel. Lisboa, de 12/3/2009, Proc. nº 9551/2008-1; acs. Rel. Porto, de 6/11/2007 e 12/10/2009, Procs. nºs 0724884 e 0856741).

-Decorre ainda do mencionado artigo que “No caso de inexactidão ou de reticência conhecidos após o sinistro e, provada a essencialidade do facto inverídico ou omitido, para influenciar a formação da vontade do segurador, não é exigível o nexo causal entre o sinistro e o facto omitido, pois o único requisito, quer do artigo 429º do Código Camercial, quer do regime geral do erro vicio é a existência de omissões ou reticências condicionantes da declaração negocial e não o nexo entre aquelas e o evento desencadeador da obrigação resultante do contrato de seguro”, realidade expressamente plasmada nas condições gerais da apólice (cfr. ac. Rel. Lisboa nº 9551/2008-1 de 12/3/2009) (facto provado nº 10).

-Atento ao ónus que sobre si recaía, a ora apelante logrou fazer prova de que o contrato não teria sido aceite sem que tomasse conhecimento do resultado da consulta de dermatologia para que estava referenciado, com indicação para eventual excisão, caso tivesse sido informada disso mesmo.

-Bem como nunca teria aceite a sua adesão posteriormente, uma vez que as testemunhas A..., S... e M... depuseram todas com isenção e coerência, afirmando que, caso tivesse sido respondido afirmativamente ao questionário, a ora apelante teria solicitado esclarecimentos aos proponentes, sendo ainda todas peremptórias ao afirmar que o seguro nunca seria aceite caso a ora apelante tivesse conhecimento que o sr. P... era portador de melanoma maligno de nível IV de Clark, com espessura de Breslow de 7,5 mm, dado o estado avançado da doença e o alto grau de mortalidade que lhe está associado.

-Ao abrigo da jurisprudência supra mencionada, influenciam a avaliação do risco as questões relativamente às quais existiam na proposta de seguro perguntas específicas, como é o caso das perguntas presentes no questionário clínico que foi apresentado ao sr. P... e à apelada.

-Nem se percebe como poderiam a apelada e o sr. P... não terem referido que este último foi referenciado para uma consulta de especialidade, dado que esta iria realizar-se nos 5 dias seguintes ao do preenchimento da proposta de seguro, ou seja no dia 11/6/2007, e tal pergunta lhes era concretamente colocada.

-Deste modo, a omissão perpetrada subsume-se a uma...

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