Acórdão nº Nº1316/12.9PFLRS.L2-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE GONÇALVES
Data da Resolução18 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam, em Conferência, os Juizes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-RELATÓRIO: 1.

No processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 1316/121.9PFLRS, foi a arguida M, melhor identificada nos autos, acusada de factos integradores da prática, em autoria material e concurso efectivo, de: -um crime de violência doméstica, na forma consumada, previsto e punido no art.º 152º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do Código Penal.

-um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido nas disposições conjugadas dos arts. 22º, 23º, 73º e 131º e 132º, nºs 1 e 2, alíneas b), d) e e ) do Código Penal, agravado nos termos do disposto no art. 86º, nº3 da Lei nº 5/2006, de 23 de fevereiro; -um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86º, nº1, al. d), com referência aos arts. 3º, al. g), 4º, nº1, todos da Lei 5/2006, de 23-02.

Foram deduzidos pedidos de indemnização civil contra a arguida/demandada por : -B, peticionando a sua condenação no pagamento do montante de 10.000,00 Euros, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais causados; -Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE, nova designação do Hospital de Santa Maria, EPE, peticionando a condenação da arguida/demandada no ressarcimento das despesas correspondentes à assistência hospitalar a que o seu comportamento dera lugar no dia 5 de agosto de 2012, no valor de €147,00; -SGHL – Sociedade Gestora do Hospital de Loures, S.A. tendo em vista o ressarcimento dos valores despendidos com a assistência prestada ao ofendido pelo demandante entre o dia 5 de agosto de 2012 e 8 de outubro de 2012, após a sua transferência do Hospital de Santa Maria.

Realizado o julgamento, foi proferido acórdão que decidiu nos seguintes termos: «Destarte, o presente Tribunal Coletivo decide: I) RESPONSABILIDADE JURÍDICO-PENAL.

a) CONDENAR a arguida na pena de 3 (três) anos de prisão pelo crime de violência doméstica, previsto e punido no art.º 152º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do Código Penal, com a agravação prevista disposto no art. 86º, nºs 3 e 4 da Lei nº 17/2009, de 6 de Maio ; b) CONDENAR a arguida na pena de 7 (sete) anos de prisão pelo crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 22º, 23º, 73º, 131º, 132º, nºs. 1 e 2, al. b) do Código Penal, agravado nos termos do disposto no art. 86º, nº 3 da Lei 5/2006, de 23 de fevereiro c) ABSOLVER a arguida das qualificativas previstas nas alíneas d) e e) do art. 132º do Código Penal; d) ABSOLVER o arguida da prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelos arts. 2º, nº1, al. m), 3º, nº2, al. f), 4º, nº1 e art. 86º, nº1, al. d) da Lei 5/2006, de 23-02.

e) Em cúmulo jurídico das penas parcelares aludidas em a) e b), CONDENAR a arguida na PENA ÚNICA de 8 (OITO) ANOS DE PRISÃO.

* B) RESPONSABILIDADE JURÍDICO-CIVIL.

I–O Tribunal julga procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido por SGHL – Sociedade Gestora do Hospital de Loures e, em consequência: a)CONDENA a demandada M no pagamento do valor correspondente às despesas a que deu lugar o tratamento do ofendido B, em consequências das agressões perpetradas por aquele, no valor de 5.986,97 Euros (cinco mil novecentos e oitenta e seis euros e noventa e sete cêntimos); II–O Tribunal julga procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido por Centro Hospitalar Lisboa Nortes, EPE e, em consequência: a)CONDENA a demandada M no pagamento do valor correspondente às despesas a que deu lugar o tratamento do ofendido B, em consequências das agressões perpetradas por aquele, no valor de 147,00 Euros (cento e quarenta e sete euros); III–O Tribunal julga procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido por B. e, em consequência: a)CONDENA a demandada M no pagamento de uma indemnização ao ofendido B, tendo em vista o ressarcimento dos danos causados, no valor de 10.000,00 Euros (dez mil euros); (…).» 2.A arguida não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, tendo esta Relação proferido acórdão que declarou nulo o acórdão recorrido e, em consequência, determinou a sua substituição por outro que suprisse a apontada nulidade.

  1. Na sequência, foi proferido novo acórdão pela 1.ª instância, que, no tocanta ao dispositivo, condenou nos mesmos termos do acórdão anterior.

  2. Mantendo-se inconformada, recorreu a arguida, tendo extraído da motivação as seguintes conclusões (transcrição): 1.Foram incorretamente julgados os factos dados como provados nos números 2 a 8 e 12 a 16.

  3. Houve erro notório na apreciação da prova.

  4. Há exceção dos factos ocorridos a 4 de agosto de 2012 mais nenhum outro é determinado ou determinável no tempo.

  5. Todos os factos que o tribunal dá como provados terão acontecido entre 2011 e Agosto de 2012 e não a partir de 2009.

  6. O ano de 2011 corresponde ao regresso de França do demandante.

  7. Após o regresso de França onde esteve a trabalhar durante 3 meses, o arguido fez um casamento por conveniência.

  8. E anunciou que pretendia trazer do Brasil a mulher com que se relacionara anteriormente, mãe dos seus filhos. Foram estes os motivos que intensificaram as discussões entre o casal. Os ciúmes.

  9. O demandante negou sempre que alguma vez tivesse casado.

  10. Uma testemunha confirmou ter tido conhecimento junto do registo civil que existia um casamento do demandante.

  11. O tribunal recusou-se a apurar se efetivamente durante o relacionamento com M, B casou por conveniência com uma outra mulher.

  12. O tribunal a quo refere apenas a existência de problemas monetários e não considera os ciúmes existentes na relação.

  13. Foi também em 2011 que o demandante foi condenado pelo tribunal por agressão à sua companheira, ora arguida.

  14. O tribunal a quo valoriza apenas o testemunho do demandante fazendo crer que este se limitava a ser agredido e que não tinha atitudes violentas que fossem susceptíveis de defesa pela arguida.

  15. A testemunha do demandante E refere isso mesmo: “Era violência, andavam à porrada”.

  16. Nos factos que segundo o tribunal a quo consubstanciam o crime de violência doméstica, o tribunal apenas valoriza as declarações do demandante.

  17. Para além do demandante, do ofendido, não há uma única testemunha que tenha presenciado qualquer tipo de agressão.

  18. No dia 4 de agosto de 2012 mais uma vez o ciúme esteve na base da discussão que levou aos fatos pelos quais a arguida é condenada por homicídio na forma tentada.

  19. Neste dia 4 de agosto, o demandante não consegue explicar porque não saiu pela porta se efetivamente tinha tirado a chave à arguida.

  20. As explicações do demandante sobre os factos ocorridos na referida data são feitos de forma imprecisa e contraditória.

  21. Os testemunhos prestados pelo demandante e pela única testemunha dos factos ocorridos a dia 4 de agosto, não são suficientes para concluir que a arguida terá deixado cair o demandante ou terá largado o pé e em desequilíbrio o demandante tenha caído.

  22. Não se consegue igualmente apurar, porque é que o demandante estava já com uma perna de fora.

  23. A forma como o demandante cai é consentânea com uma queda propositada e não com um empurrão. O demandante caiu com os pés e não por impulso dado por terceiro que o tenha feito cair de cabeça ou de costas.

  24. Na verdade o tribunal não conseguiu explicar de forma cabal e sem que subsistam dúvidas os factos que entende dar como provados e não foram.

  25. O testemunho de J, foi desvalorizado pelo tribunal porque a testemunha estaria alcoolizada. Na verdade, todos os presentes, incluindo a arguida e o demandante admitiram ter bebido para além da conta e desde a manhã porque a cerimónia em que participavam e que incluía a morte da galinha e a sua degustação, assim o exigia.

  26. Sobre estes factos, a arguida que poderia ter optado pelo silêncio também prestou declarações logo no início do julgamento mostrando abertura em explicar o que tinha ocorrido.

  27. O que a arguida não pode fazer é dizer ao tribunal o que o tribunal quer ouvir.

  28. E se confessa ter agredido, B após queda no solo também poderia admitir que o tinha empurrado pela janela.

  29. Não o faz porque efetivamente a arguida não empurrou B.

  30. A arguida nunca teve a intenção de matar B.

  31. Perante a dúvida o tribunal deveria ter aplicado o princípio “in dubio pro reu” e absolvido a arguida do crime de homicídio qualificado na forma tentada.

  32. Tanto assim que a arguida após o sucedido foi visitá-lo ao hospital, pediu-lhe desculpa e assinou o termo de responsabilidade para a operação do demandante.

  33. Não ficou igualmente provado que tenha sido por causa de uma mensagem e de um alegado feitiço que o demandante tinha medo da arguida.

  34. Não considerando o “princípio in dúbio pro reu”, deveria pelo menos o tribunal a quo considerar que os factos que integram o tipo legal de homicídio qualificado na forma tentada integram o conjunto de factos que materializam a violência doméstica e existindo um concurso aparente, uma vez que se verifica a existência de uma relação de subsidiariedade entre ambos os tipos legais, punir a arguida pelo crime de homicídio qualificado na forma tentada e absolvido do crime de violência doméstica.

  35. A pena aplicada é excessiva.

  36. As penas de 3 e 7 anos de prisão pelos crimes de violência doméstica e homicídio qualificado, na forma tentada, respectivamente não se apresentam adequadas às necessidades de prevenção e desproporcional face à gravidade do ilícito.

  37. O tribunal “a quo” não ponderou de forma criteriosa e adequada as diversas circunstâncias atenuantes que depõem a favor da arguida, em especial as constantes das alíneas c) e d) do artigo 71º do Código Penal.

  38. O tribunal recorrido desrespeitou a aplicação das regras atinentes às finalidades das penas previstas nos números 1 e 3 do artigo 40º e violou ainda a regra estruturante do processo penal, segundo a qual em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, conforme o nº2 do mesmo artigo. 38.O tribunal não considera como atenuante o fato de depois do sucedido a arguida ter visitado B no hospital, um...

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