Acórdão nº 481/15.8YHLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLA C
Data da Resolução18 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: SPA–Sociedade portuguesa de Autores CRL, Associação de utilidade Pública, deduziu acção declarativa, com processo comum, contra M...M...T..., pedindo a condenação a pagar-lhe a quantia global de € 5.099,18, onde já inclui juros vencidos, e os juros vincendos, a título de compensação relativa ao direito de sequência pela venda das obras «Almoço do Trolha» e «Pisa III», os quais não foram por esta integralmente pagos.

Alegou ter a R. sido proprietária das identificadas obras, terem as mesmas sido vendidas, assistindo ao seu autor - que a A. representa – o direito a receber uma participação sobre o preço obtido pela referida venda. Tal valor é aquele que resulta de taxas degressivas por faixas de preço, tendo a R. apenas pago parte do valor apurado pela A. ser o devido.

* A Ré contestou alegando fundamentalmente que o valor que pagou é o que resulta da Lei, pelo que nada mais tem a pagar, uma vez que da Lei não resulta, contrariamente ao alegado pela A., que as percentagens em causa e relativas aos escalões de preços de venda enunciados, se apliquem a parcelas do preço de venda, cumulando-se sucessivamente umas com outras, como pretende a A..

* Foi proferida sentença final que julgou a acção procedente.

Não se conformando com a decisão, dela apelou a R., formulando as seguintes conclusões: 1.Nos termos do disposto no nº 4 do artº 54 do CDADC, na redacção da Lei 24/2006, de 30 de 24/2006, a participação do autor de obra de arte no preço de venda calcula-se através de um sistema de taxas degressivas, por escalões de preço, conforme aos estabelecidas nas suas diversas alíneas; 2.E não, ao contrário do que sustenta a sentença recorrida, através da aplicação das taxas a parcelas ou tranches do preço da venda em causa.

  1. De facto, o sistema de cálculo adoptado pelo Mrtssmº Srº Juiz “a quo” não tem qualquer correspondência no pensamento legislativo e não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso; 4.Assim sendo: a) a obra “PISA III” foi vendida pelo preço de € 55.000, pelo que a participação do respectivo Autor, a título de direito de sequência, corresponde a 3% sobre o referido montante, ou seja, € 1.650, nos termos da alínea b) do nº 4 do artº 54 do citado diploma legal; b) a obra “ALMOÇO DO TROLHA” foi vendida pelo preço de € 350.000, pelo que a participação do respectivo Autor, a título de direito de sequência, corresponde a 1% sobre o referido montante, ou seja, € 3.500, nos termos da alínea c) do nº 4 do artº 54 do citado diploma legal.

  2. Nestes termos, a recorrente entregou à recorrida a quantia devida de € 5.150, conforme esta, aliás, admite no artº 46 da pi; 6.Pelo que à recorrida nada mais é devido pela recorrente.

  3. Ao decidir como decidiu, violou a sentença de que vem interposta a presente APELAÇÃO, o disposto no nº 4 o artº 54 do CDADC, na redacção da Lei 24/2006, de 30 de 24/2006, bem como as regras de interpretação da Lei constantes do artº 9 do CC.

    Em suma: deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que julgue a presente acção totalmente improcedente.

    * Foram apresentadas contra-alegações onde se conclui nos seguintes termos: a)Discute-se nos presentes autos a responsabilidade da Recorrente pagar à Recorrida € 5.000,00, acrescidos de juros de mora no valor de € 99,18, a título de direito de sequência, decorrente da venda de duas obras plásticas de que aquela era titular; b)A Recorrente era proprietária de duas obras plásticas - “Almoço de Trolha” e “Pisa III”; c)As duas obras foram criadas pelo autor J...P...; d)O autor J...P... é representado pela Recorrida; e)Estas obras foram vendidas no leilão ...3, promovido pela leiloeira Palácio C...V..., pelo valor de € 350.000,00 em relação à obra “Almoço de Trolha” e € 55.000,00, em relação à obra “Pisa III”; f)A Recorrente pagou à Recorrida € 3.500,00, referentes à primeira obra e € 1.650,00, relativos à segunda; g)A Recorrente é ainda responsável pelo pagamento de € 5.000,00, a título de direito de sequência, pela venda destas duas obras; h)O artigo 54º do CDADC resulta da transposição da directiva 2001/84/CE; g)Esta directiva visa assegurar a criação de um mercado de arte interno, uniforme, com o estabelecimento, a fixação e a aplicação de taxas o mais uniformes possível; h)Na transposição das directivas, os Estados-Membros estão vinculados a uma obrigação de resultado a alcançar, ficando apenas com liberdade de transposição quanto à forma e aos meios utilizados nessa mesma transposição; i)Esta obrigação significa que os Estados-Membros estão vinculados a interpretar o direito nacional à luz do texto e da finalidade da directiva, de forma a garantir que seja alcançado o resultado pretendido; j)A interpretação do artigo 54º do CDADC deve ser feita à luz da directiva 2001/84(CE, (e não uma interpretação literal, como sugere a Recorrente), de modo a alcançar-se o resultado pretendido com a aprovação deste legislativo europeu; l)A interpretação sugerida pela Recorrente conduz a conclusões incompreensíveis, como é o caso da venda de uma obra pelo valor de € 600.000,00 implicar o pagamento a título de direito de sequência inferior em € 460,00, em relação à venda de uma obra plástica por € 49.000,00; m)De acordo com o disposto no n.º 3 do art. 9º do Código Civil, “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”; n)Como bem explicita o Meritíssimo Juiz a quo, embora o legislador tenha utilizado uma diferente redacção na transposição da directiva, não podemos deixar de entender que queria dizer o mesmo; o)O valor a pagar aos autores a título de direito de sequência deverá, por isso, ser alcançado com base no cálculo de taxas degressivas por faixas de preço; p)A Recorrida mantém, assim, uma dívida para com a Recorrente, que ascende a € 5.000,00; q) A sentença recorrida interpretou e aplicou correctamente o artigo 54º do CDADC, pelo que deverá ser confirmada na íntegra.

    Conclui no sentido de dever a mesma ser mantida.

    * Questões a decidir: Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC, a questão a decidir é tao só a de saber qual o alcance a dar ao artigo 54º, nº 4, do CDADC e, assim, decidir o diferendo entre as partes: a participação sobre o preço obtido é fixada por referência a parcelas de preço de venda ou sobre o preço de venda.

    * FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: A matéria de facto que a 1ª instância enunciou, e não foi impugnada, é a que segue: 1.A A. é uma cooperativa de direito privado, sem fins lucrativos, criada para a gestão colectiva dos direitos da propriedade intelectual e a defesa e promoção dos bens culturais, reconhecida como pessoa colectiva de utilidade pública.

  4. Tendo por objecto, nomeadamente, a gestão, em representação dos seus cooperadores e beneficiários, das obras e prestações de cujos direitos sejam titulares, independente do seu género, forma e expressão, mérito e objectivo, qualquer que seja o modo de utilização e exploração ou processo técnico da sua reprodução.

  5. Compete-lhe administrar as obras intelectuais cujos direitos lhe hajam sido transmitidos, autorizando, mediante os competentes contratos, e fiscalizando a sua utilização e exploração sob qualquer forma e por qualquer meio, e cobrando e arrecadando os respetivos direitos.

  6. De acordo com os seus Estatutos, compete ainda à SPA “agir, em representação dos seus cooperadores e beneficiários (…), perante as autoridades judiciais, policiais e administrativas competentes, no exercício e na defesa dos direitos de autor de que eles sejam titulares, tanto de carácter patrimonial como moral, nos casos de usurpação, contrafacção ou todos aqueles em que esses direitos hajam sido violados ou se mostrem ameaçados, requerendo a adopção de todas as medidas conducentes à sua eficiente protecção e ao seu integral respeito, designadamente através da propositura e acompanhamento...

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