Acórdão nº 450/10.4TMSTB.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelVAZ GOMES
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: * I.1. Inconformado com a sentença de 21/10/2015 que, julgando a acção de regulação do exercício de responsabilidades parentais relativo ao menor procedente, atribuiu a guarda do mesmo à mãe com exercício exclusivo do poder paternal e fixou um regime de visitas do pai, não fixando prestação alimentícia a cargo do progenitor não guardião, dela apelou o Ministério Público, em cujas alegações conclui: 1. Os alimentos incluem tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário e educação (art.º 2003º do Código Civil) e a sua fixação deve obedecer aos critérios do art.º 2004º, nº1, do mesmo diploma legal, segundo o qual os alimentos são proporcionais aos meios daquele que houver que prestá-los e às necessidades daquele que houver que recebê-los.

  1. Contudo, nesta matéria há outras questões a ponderar, nomeadamente a obrigação que impende sobre os pais de prestarem alimentos aos filhos, obrigação imposta por preceitos legais como o artigo 1878º, nº1, do Código Civil, e igualmente por preceitos constitucionais como os nºs 3 e 5 do art.º 36º da Constituição da República Portuguesa e ainda no art.º 27º, nº2, da Convenção sobre os Direitos da Criança, assinada em Nova Iorque a 26 de Janeiro de 1990, aprovada pela Resolução da Assembleia da República nº 20/90 e Ratificada por Decreto do Presidente da República nº 49/90 de 12 de Setembro.

  2. A obrigação alimentar reveste tal importância que para a sua concretização admite-se, inclusivamente, a utilização de meios expeditos, como o mecanismo pré-executivo actualmente previsto no art.º 48º do RGPTC, ao abrigo do qual se permite o desconto, directo e imediato, no vencimento do devedor da pensão de alimentos devida a menor e que se traduz num procedimento especial mais célere que a acção executiva.

  3. Tal relevância encontra expressão igualmente a nível da tutela criminal, mediante a previsão do artigo 250º do Código Penal, o qual pune com pena que pode atingir um ano de prisão aquele que, estando legalmente obrigado a prestar alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação no prazo de dois meses seguintes ao vencimento.

  4. Acresce que, a não fixação de alimentos no caso em apreço, impossibilita o recurso ao Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, uma vez que o funcionamento desta garantia tem como pressuposto a fixação judicial da respectiva prestação alimentar, gerando uma situação de flagrante injustiça relativamente a menores igualmente carenciados de alimentos e a favor dos quais foi fixada tal prestação.

  5. Tal solução redundaria ainda numa inaceitável vantagem para o infractor, uma vez que o progenitor conhecedor das suas obrigações e que decide ausentar-se para parte incerta não curando de se assegurar de que estão garantidas as condições de sobrevivência do seu filho menor em condições de dignidade, não pode ser tratado de forma mais benévola do que aquele que, enfrentando dificuldades económicas, ainda assim contribui na medida das suas possibilidades para o sustento dos filhos.

  6. A decisão a proferir, incidindo em bloco sobre todas as questões relativas à vida da criança, deve nortear-se pelo superior interesse do menor e este não deve ser duplamente penalizado - pelo desinteresse do pai que se desvinculou e desinteressou em acompanhar o desenvolvimento do filho e pelas dificuldades económicas decorrentes da ausência de contributo de um dos progenitores para a satisfação das suas necessidades básicas.

  7. Desta forma, e relativamente ao quantum da prestação a fixar nos casos em que é desconhecida a condição económica do obrigado a alimentos, deverá a decisão ser tomada com base na equidade, tomando por referência as necessidades normais de uma criança da mesma idade e sem quaisquer circunstâncias especiais a ponderar, nomeadamente problemas de saúde, sendo certo que se trata de processo de jurisdição voluntária em que o juiz não está vinculado a critérios de legalidade estrita mas antes a princípios de conveniência e oportunidade, como decorre do disposto nos artigos 986º, nº 2, e 987º do Código de Processo Civil.

  8. A decisão do Mmº Juiz deve, pois, ser revogada, nesta parte, e substituída por outra que fixe uma prestação de alimentos a cargo do progenitor em quantia não inferior a 100 € mensais, valor considerado como o estritamente necessário para garantir a satisfação das necessidades básicas do menor e que tenha como referência o ordenado mínimo nacional; Assim se fazendo JUSTIÇA.

I.2. Recebido o recurso, foram os autos aos vistos dos Meritíssimos Juízes-adjuntos que nada sugeriram; nada obsta ao conhecimento do mérito do recurso.

I.3.

Questão a resolver: Saber se ocorreu erro de julgamento de direito, ou seja, erro na interpretação e aplicação das normas contidas nos art.ºs, 1878, 2003 e 2004, n.º 1 do CC, 36 n.ºs 3 e 5 da CRP, 27/3 da Convenção sobre os Direitos da Criança aprovada em Nova Iorque em 26/1/1990 e aprovada pela Resolução da AR 20/90ratificada por Decreto do Presidente da República n.º 49/90 de 12/09, 986/2 e 987 do CPC que deverão ser interpretadas no sentido da fixação de uma pensão alimentícia ao progenitor não guardião, citado editalmente, nas situações em que se desconhece as condições de vida do alimentante, por este se ter ausentado para parte incerta.

II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO I.1.É o seguinte o teor da decisão recorrida: I - RELATÓRIO O Ministério Público veio instaurar a presente providência tutelar cível para regulação do exercício das responsabilidades parentais em representação do menor Denilson, sendo requeridos: -Joelson, com última residência na Rua ...: e - Célia, residente na Rua ..., em Setúbal.

Para o efeito, alegou que o menor é filho dos requeridos, os quais se encontram separados, não existindo acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais.

* Designado dia para conferência de pais, não foi possível o acordo por ausência dos progenitores, sendo ordenada a realização de inquéritos sobre a situação da mãe e do menor.

* O Ministério Público veio exarar parecer no qual promove que os menores fiquem a residir com a progenitora, sendo o exercício das responsabilidades parentais exercido em exclusivo por esta, fixando-se um regime de visitas relativamente ao progenitor e a correspondente obrigação de alimentos (fls. 131 a 135).

* O Tribunal é competente.

O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem.

As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias; são legítimas e encontram-se devidamente representadas.

Inexistem outras excepções dilatórias, nulidades ou outras questões prévias que cumpra conhecer.

* II - QUESTÕES A DECIDIR A) - A fixação da residência da criança e o exercício das responsabilidades parentais; B) - O regime de contactos pessoais entre a criança e o progenitor não residente; C) - A obrigação de alimentos a favor da criança a cargo do progenitor não residente.

* III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO III - I - FACTOS PROVADOS 1) - O menor Denilson nasceu em 2 de Fevereiro de 2007, em Nice, França, e é filho de Joelson e de Célia (documento de fls. 4).

2) - Os pais do menor encontram-se separados residindo este com a mãe.

3) - A requerida sofre de uma deficiência física como consequência de meningite meningocócica, com amputação dos membros inferiores, auferindo uma pensão de invalidez de trezentos e nove euros e setenta e seis cêntimos, subsistindo ainda o agregado familiar com a ajuda de familiares do ramo materno.

4) - Recebe ainda o abono do menor no valor de € 49,27, € 84,86 relativo a uma outra filha Naiara e cento e cinquenta euros de pensão de alimentos desta menor.

5) - O agregado suporta cerca de quinhentos e quarenta euros em despesas, beneficiando o menor de SASE em relação às refeições escolares.

6) - O menor frequenta o 3.º ano na Escola EB/JI da ... estando bem integrado na escola e tendo um bom relacionamento com colegas e adultos.

7) - A progenitora é uma figura presente na vida do filho, acompanhando-o no seu percurso escolar, manifestando o menor vontade em conviver com o pai.

8) - O progenitor encontra-se ausente em parte incerta, não convive com o filho nem contribui para o seu sustento.

* III - II - MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO O Tribunal alicerçou a sua convicção com base na certidão de assento de nascimento do menor e no inquérito realizado pela segurança social, os quais não foram infirmados por qualquer outro meio de prova.

* IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Os filhos estão sujeitos às responsabilidades parentais até à maioridade ou emancipação, competindo aos pais, no interesse dos filhos, velar pela sua segurança, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens (artigos 1877.º e 1878.º, ambos do Código Civil).

Por via do princípio constitucional de igualdade dos progenitores, o exercício das responsabilidades parentais pertence a ambos os pais na constância do matrimónio, devendo ser exercido de comum acordo, presumindo-se esse acordo quando um dos pais pratica acto que integra esse exercício (artigos 36.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa e 1901.º, n.º 1 e 1902.º, n.º 1, ambos do Código Civil).

O exercício das responsabilidades parentais deve ser regulado “de harmonia com os interesses da criança” (artigo 40.º, n.º 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível).

O interesse da criança é um conceito jurídico indeterminado optando o legislador por um conceito...

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