Acórdão nº 37/13.0TBHRT.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelALVES DUARTE
Data da Resolução16 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I - Relatório: AA intentou a presente acção declarativa, com processo comum, contra BB, pedindo que seja julgada procedente, por provada, e por via disso, condenada a pagar-lhe o montante de € 49.250,00, acrescida de juros vincendos à taxa legal de 4% desde a citação e até integral e efectivo pagamento, alegando, em síntese, que: •autora e ré celebraram, entre si, um contrato de trabalho sem desde 04/03/1992; •a autora tinha a categoria de técnica de análises s/curso; auferia o vencimento mensal declarado de € 770,00, pago por meio de cheque, emitido entre os dias 1 e 8 de cada mês; •tais quantias apenas ficavam disponíveis, pelo menos, dois dias após o depósito; •desde há alguns meses os salários deixaram de ser pagos pontualmente, com atrasos superiores àqueles; •tendo passado a ser pagos por várias vezes; a ré entregava à autora, como parte integrante do seu salário, uma quantia que, ultimamente, se cifrava em € 1.200,00, que acrescia àqueles € 700,00; •essa quantia era entregue em dinheiro, e foi acordada devido à disponibilidade da trabalhadora para exercer as funções inerentes ao funcionamento do BB; •assim, além das funções de técnica de análises, a autora desempenhava as de recepcionista e de secretariado; •a autora também se deslocava em viatura sua para fazer colheitas, não só no Faial, como nas Ilhas do Pico, Flores e São Jorge, quando solicitado, sem que lhe fosse devido qualquer outro tipo de ajuda ou abono, por compreendida na parte não declarada do vencimento; •em Dezembro de 2012, a ré comunicou à autora que o vencimento daquele mês, assim como os subsequentes, passaria a ser de € 770,00; •a autora opôs-se a isso, pois assumiu compromissos e encargos atendendo ao seu vencimento efectivo; •aqueles empréstimos bancários tiveram em consideração tal vencimento; •quando a autora faltava por doença, e apesar das declarações médicas, a ré descontava nos dias de férias os dias de doença, sem pedido ou consentimento da autora; •daí que a autora tenha resolvido o contrato de trabalho por carta registada; •a ré deve à autora as férias, subsídio de férias relativos ao ano de 2012, que se venceram a 1 de Janeiro de 2013, e que a autora não gozou (€ 1970,00 x 3 = € 5910,00); •a ré deve à autora 10 dias de férias, subsídio de férias e férias não gozadas referentes a 2011 (€ 1900,00 : 30 dias x 10 dias = € 1970,00); •a ré deve à autora o subsídio de Natal referente a 2012 (€ 1970,00); •a autora sempre viveu apenas do rendimento do seu trabalho, com o que se sustenta a si e à sua filha; paga a despesa com empréstimo para aquisição de casa própria; •na sequência do sucedido, a autora sofreu graves prejuízos que a obrigaram a recorrer a ajuda monetária de amigos e familiares; tendo em conta a culpa da ré, e o tempo de vigência do contrato, deve fixar-se uma indemnização de 30 dias por cada ano de trabalho, nos termos do disposto no artigo 443.º, do Código do Trabalho, o que perfaz o valor de € 39.400,00 (1970,00 € x 20 anos).

Citada a ré, foi convocada e realizada audiência de partes, na qual as mesmas não quiseram acordar sobre o litígio que as divide.

Na sequência da notificação para esse efeito, a ré contestou, por excepção e por impugnação, alegando, em resumo, que: •não foi convencionado qualquer acréscimo ao seu vencimento de € 770,00 ; •a este salário apenas acresce o subsídio de alimentação no valor mensal de € 6,20 e as diuturnidades no valor de 5 x € 17,00; •ocasionalmente era entregue à autora uma compensação, a título de ajudas de custa, para as situações por si referidas; •as deslocações a outra Ilha eram suportadas pela ré, e por si liquidadas; •com excepção da falta verificada a 08/07/2011, a ré nunca descontou qualquer falta ao seu vencimento; •apenas foi descontado o subsídio de alimentação correspondente a férias; •no decorrer do ano de 2012 foram verificadas 12 faltas: falta justificada a 4 e 5 de Janeiro, dia e meio e falta não justificada a 13 de Janeiro de 2012, da parte da tarde, tendo sido descontado um dia e três dias de subsídio de alimentação, falta justificada para os dias 24 e 26 de Abril, dois dias, e falta não justificada verificada a 5 de Abril de 2012, da parte da tarde, descontados dois dias de subsídio de alimentação, não tendo sido descontados os dias de baixa; a 27 de Agosto, a autora faltou da parte da manhã, em 10 de Setembro faltou o dia inteiro, em 8 de Outubro faltou da parte da manhã, e a 17 de Dezembro, faltou o dia inteiro; •todas as faltas correspondem a uma segunda-feira, pelo que nos termos do n.º 3 do artigo 256.º, do Código do Trabalho, deveria ter sido descontado em salário o correspondente à totalidade dos dias de descanso a par com a falta verificada; •no entanto, foram somente subtraídos os valores correspondentes ao subsídio de alimentação, sempre numa óptica de bom relacionamento e de tolerância; •a ré foi confrontada por um pedido de aumento, invocando que, caso tal não lhe fosse concedido, por razões pessoais teria de sair do país; •a autora também trabalha a recibo verde para outra entidade, auferindo quantia correspondente ao salário mínimo nacional; •o pedido, uma vez negado, gerou o presente processo; no mais, impugna a versão da autora, pelo que a ré nada deve à autora a título de indemnização por resolução com justa causa; E em jeito de reconvenção, atenta a ilicitude da cessação do contrato por iniciativa da trabalhadora, entende a ré que: •a mesma lhe deve pagar a quantia de € 1540,00, por inobservância do prazo de pré-aviso; •a esta quantia acresce o valor de € 17.500,00 a título de lucro cessante resultante dos serviços que a ré deixou de poder prestar nos meses de Janeiro e de Fevereiro de 2013; •finalmente, todos os produtos que a ré utilizava para a elaboração das análises ficaram inutilizados, por caducidade dos mesmos, importando um prejuízo no valor de € 9.500,00, que a autora deve indemnizar à ré, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 401°, do Código do Trabalho; a autora litiga com base em factos falsos pelo que deve pagar à ré os honorários que esta gastará, no valor de € 1.500,00, acrescidos de IVA.

Pede, assim, que o Tribunal, julgando: •pela improcedência da acção, absolva a ré do pedido; •a reconvenção procedente, condene a autora/Reconvinda no pedido reconvencional; •verificada a litigância de má fé da autora, a condene a pagar a competente indemnização à ré.

A autora respondeu à contestação e à reconvenção, pugnando: •pela não verificação da matéria incorrectamente denominada por excepção; •quanto ao pedido reconvencional, impugna a sua pretensão, pois sendo a directora técnica da ré sempre poderia a mesma exercer a actividade que, até então, a autora vinha desempenhando, ao invés de permanecer numa farmácia que também lhe pertence; quanto aos reagentes, os mesmos têm prazos alargados de caducidade, pelo que não caducaram nos 2 ou 3 dias que a ré quis fechar o laboratório; conclui, por fim, pela improcedência da alegada litigância de má fé.

E concluiu pela improcedência da reconvenção com a sua consequente absolvição do pedido reconvencional, e, bem assim, pela improcedência da arguida litigância de má fé.

Foi lavrado despacho saneador, seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória, o qual foi objecto de reclamações, atendidas por despacho de folhas 139 e seguintes, como segue: "Notificada do despacho saneador elaborado nos presentes autos, veio a ré apresentar reclamação contra a matéria de facto, referindo que o que resulta das alíneas C) e E) da matéria assente foi por si impugnado no artigo 48.º da contestação.

Ora, lê-se em tal artigo o seguinte: 'O vertido nos restantes artigos da douta P.I não correspondem à verdade, pelo que se impugna expressamente'.

Na contestação, o réu pode defender-se por impugnação ou por excepção (artigo 487.º do Código de Processo Civil). No que à impugnação diz respeito, e uma vez que impugnar significa contrariar, refutar ou negar a veracidade de certos factos, o cumprimento do ónus de impugnação, consubstanciado na tomada de posição definida sobre os factos articulados na petição inicial ou no instrumento de reconvenção, exige que o impugnante assuma uma posição clara, frontal e concludente sobre eles, não bastando para o efeito a negação genérica do articulado.

Não cumpre, assim, o ónus de impugnação o réu que, em relação à maioria dos factos articulados pelo autor, se limita a dizer que não correspondem à verdade, pelo que se impugnam. Pelo contrário, será necessária uma negação dirigida a determinada espécie factual ou a um conjunto de factos, desde que assuma um recorte bem definido em função da sua densidade, heterogeneidade e extensão.

Não obstante, e uma vez que a selecção da matéria de facto não se pode impor à verdade material, verifica-se que o facto assente E) é, efectivamente, contrariado por documentos juntos com a contestação, pelo que importa eliminar o mesmo da matéria assente e aditar um novo facto à base instrutória, sob o artigo 14.º e com a seguinte redacção: 14.º A ré pagou as férias e subsídio de férias referentes ao ano de 2012, as quais não foram gozadas, nem 10 dias de férias, subsidio de férias e férias não gozadas referentes ao ano de 2011, bem como o subsidio de Natal do ano de 2012? Corrija no local próprio, lançando cota da correcção.

Realizada a audiência de julgamento, foi em seguida proferida sentença, na qual o Mm.º Juiz julgou: 1.

a acção parcialmente procedente e, em consequência: a)condenou a ré a pagar à autora a quantia de global de € 1.710,00, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal, contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento; b) absolveu a ré quanto ao demais peticionado contra si pela autora; 2.

a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência: a) condenou a autora/reconvinda a pagar à ré/reconvinte a quantia de global de € 1.710,00, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva...

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