Acórdão nº 97/14.6TELSB-B.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelSIM
Data da Resolução03 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: No Processo n.º 97/14.6TELSB da Secção Única do Tribunal Central de Instrução Criminal, por despacho de 06-11-2015 (cfr. fls. 48 e 49), no que agora interessa, foi decidido: «Do adiamento do acesso aos autos nos termos do artº 89º nº 6 do CPP.

Na sequência das profundas alterações ao Código de Processo Penal, introduzidas pela Lei 48/2007, de 29 de Agosto, em vigor desde o dia 15 de Setembro de 2007, foi aplicada aos presentes autos o regime de segredo de justiça nos termos do disposto no artº 86º nº 3 do CPP.

Versam assim os presentes autos de inquérito a investigação de factualidade susceptível de integrar, em abstracto, a prática do crime de branqueamento, p. e p. pelo artº 368ºA do CP, precedido pela prática de crimes de burla cometidos na China.

Assim, face aos crimes investigados, os presentes autos encontram-se sujeitos ao regime de segredo de justiça por um período de 14 meses, ao abrigo das disposições conjugadas nos artºs 89º, nº 6. 276º, ns. 1 e 3 a), 215º, nº 2 e 1º, al. m), todos do CP.

O prazo de duração máxima do presente inquérito encontra-se praticamente decorrido, expirando no dia de hoje.

Contudo, como aduzido pelo titular da acção penal, a presente investigação não se mostra ainda concluída, nem tão pouco se encontram esgotadas todas as diligências que importa realizar, acrescida da necessidade da investigação proceder à analise dos elementos já apreendidos, designadamente documentação em língua chinesa, pelo que, atento a matéria sob investigação nos presentes autos, a publicidade, nesta fase, iria afectar de modo irremediável a investigação em curso, a eficácia das futuras diligências e, bem assim, a descoberta da verdade material sobre os factos ilícitos sob investigação.

Assim, ao abrigo do nº 6 do artº 89º do CPP, defere-se ao doutamente promovido e, determina-se o adiamento, por um período de três meses, do acesso aos autos por parte dos demais intervenientes processuais, prazo esse que atingirá o seu términos em 06-02-2016.

Notifique Oportunamente, devolva os autos ao DCIAP.» Por não se conformar com o assim decidido, interpôs o arguido Xiaodong Wang o presente recurso que, na sua motivação, traz formuladas as seguintes conclusões (cfr. fls. 2 a 8) que se transcrevem: «A.

-O presente recurso interposto pelo Arguido e ora Recorrente, tem por objecto o despacho de fls. 1140/1141 do Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa, com o qual, não pode o ora Recorrente conformar-se, nem aceitá-lo, por considerá-lo violador dos artigos 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, do art.º 20.º n.º 3, 4 e 5; do n.º 2 do art.º 32.º da Constituição da República Portuguesa, do art.º 86.º n.º 1 e 89.º n.º 6 do Código de Processo Penal.

B.

-No Douto despacho de que ora se recorre, é mencionado: "{...) O prazo de duração máxima do presente inquérito encontra-se praticamente decorrido, expirando no dia de hoje.

Contudo, como aduzido pelo titular da acção penal, a presente investigação não se mostra ainda concluída, nem tão pouco se encontram esgotadas todas as diligências que importa realizar, acrescida da necessidade da investigação proceder à análise dos elementos já apreendidos, designadamente documentação em língua chinesa, pelo que, atento a matéria sob investigação nos presentes autos, a publicidade, nesta fase, iria afectar de modo irremediável a investigação em curso, a eficácia das futuras diligências e, bem assim, a descoberta da verdade material sobre os factos ilícitos sob investigação. Assim, ao abrigo do n.º 6 do art.º 89 do CPP, defere-se ao doutamente promovido e, determina-se o adiamento, por um período de três meses, do acesso aos autos por parte dos demais intervenientes processuais, prazo esse que atingirá o seu términos em 06-02-2016." C.

-O despacho de que ora se recorre indica de forma extremamente genérica os motivos de facto que justificam a não publicidade dos presentes autos.

D.

-A fundamentação da promoção do Ministério Público para o efeito também terá sido manifestamente genérica e insuficiente.

E.

-O despacho ora recorrido coloca manifestamente em causa os interesses e os direitos de defesa do Recorrente.

F.

-Mais, o despacho de que o Arguido ora recorre, coloca claramente em causa o princípio da celeridade do processo, conforme resulta do próprio despacho, que menciona que o processo se encontra sujeito ao segredo de justiça há 14 meses.

G.

-Acresce que também coloca manifestamente em causa o princípio da presunção de inocência, do qual emerge: "O direito a ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa (...)", direito consagrado no art.º 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no n.º 2 do art.º 32º da Constituição da República Portuguesa.

H.

-O despacho recorrido viola o art.º 20.º n.º 3, 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

I.

-Mais, o art.º 86º, n.º 1 do Código de Processo Penal estabelece que: "1 - O processo penal é, sob pena de nulidade, público, ressalvadas as excepções previstas na lei." J.

-Ora, não resulta minimamente do despacho de que o Arguido ora recorre, que o acesso dele aos autos, pudesse afectar de modo irremediável a investigação em curso, a eficácia das eventuais futuras diligências e, bem assim, a descoberta da verdade material sobre alegados factos ilícitos sob investigação.

K.-Antes pelo contrário, o acesso aos autos pelo Arguido, ora Recorrente, permitiria esclarecer e demonstrar de forma cabal e rápida a verdade material, ou seja, que o Recorrente nunca cometeu qualquer ilícito criminal e que os presentes autos só podem ter um único desfecho que é o arquivamento.

L.-Doutra forma, estão a ser violados os mais elementares direitos, liberdades e garantias fundamentais do Recorrente.

M.-Assim, o Douto despacho que decretou o adiamento, por um período de três meses, do acesso aos autos pelo Recorrente, deverá ser revogado, sendo substituído por decisão que admita o acesso pelo Arguido ao mesmo para que lhe seja possível demonstrar com a maior brevidade a sua inocência.

Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. suprirão, deverá ser o despacho ora recorrido totalmente revogado, e, em consequência, ser permitido o acesso aos autos pelo ora Recorrente, assim se fazendo a COSTUMADA JUSTIÇA!» Admitido o recurso (cfr. fls. 50) e, efectuada a necessária notificação, apresentou resposta o Mº Pº (cfr. fls. 10 a 24), em que concluiu: «Atenta a gravidade dos ilícitos objecto do presente inquérito, as dificuldades sentidas pela investigação por estar em causa a prática de factos na República Popular da China, a circunstância do acesso aos autos pelo arguido ser susceptível de prejudicar a descoberta da verdade e o facto do arguido não se encontrar sujeito a medida de coacção privativa da liberdade considera-se que o despacho recorrido não merece qualquer reparo, devendo ser mantido nos seus precisos termos, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.

» Após o que veio a ser mantido o despacho proferido e ora posto em crise (cfr. fls. 51 e v.º) Remetidos os autos a esta Relação, nesta instância a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer (cfr. fls. 57 a 59) no sentido da improcedência do recurso.

Apesar de ter sido dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do Art.º 417º do C.P.Penal, o recorrente nada disse.

Exarado o despacho preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento em conferência, nos termos do Art.º 419º do C.P.Penal.

Cumpre, agora, apreciar e decidir.

* Vejamos: São as “conclusões” formuladas na motivação do recurso que definem e delimitam o respectivo objecto – Art.ºs 403º e 412º do C.P.Penal.

Como resulta das transcritas conclusões do mesmo, a questão que se nos coloca é a seguinte: -Eventual revogação do despacho impugnado, a fim de se permitir o acesso aos autos por parte do recorrente.

Apreciemos, pois, a mesma: Antes da publicação da Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, que procedeu à 15.ª alteração do Código de Processo Penal, o processo penal encontrava-se em segredo de justiça durante a fase de inquérito, uma vez que, de acordo com o disposto no Art.º 86º...

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