Acórdão nº 324/14.0TELSB-Q.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução24 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–Relatório: I-1.)Inconformado com a decisão aqui melhor constante de fls. 971 verso a 972, em que o Mm.º Juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal, na sequência da oposição deduzida aos arrestos preventivos que havia sido decretados pelos despachos de 15 de Maio de 2015 (prédio urbano denominado de Lote 1, sito no Loteamento ... -..., freguesia ... e prédio urbano sito na Rua ..., em Évora - cfr. entre o mais, fls. 304) de 28 de Maio de 2015 (bens móveis encontrados nas respectivas residências, vide fls. 510/11), e de 18 de Junho de 2015 (veículos automóveis melhor identificados a fls. 620), o indeferiu “quer no tocante à “questão prévia” quer no tocante aos fundamentos da oposição”, recorreu o aí Oponente J.S..., melhor identificado nos autos, para esta Relação, sustentando as seguintes conclusões: 1.ª-Além de manifestamente incompleta, a Decisão é errada, injusta e ilegal.

Do vício de omissão de pronúncia da Decisão.

  1. -Não obstante ter apresentado, no passado dia 7 de setembro, um requerimento autónomo através do qual arguiu o exato mesmo vício da Decisão que agora argui, por cautela de patrocínio, o Recorrente vem arguir agora, em sede de Recurso, a nulidade da Decisão, que se funda na omissão de pronúncia decorrente da falta de apreciação de três pedidos formulados na Oposição, a saber: i)O pedido formulado no artigo 98.º da Oposição, onde se requereu que o Banco de Portugal fosse oficiado para fazer juntar a estes autos as declarações prestadas por F.C..., no âmbito do processo identificado com o n.º 58/14/CO; ii)O pedido para que as testemunhas elencadas na Oposição fossem inquiridas; iii)O pedido no sentido de que o Recorrente fosse autorizado a prestar declarações de parte.

  2. -A nulidade da Decisão, que ora se argui, resulta tanto do recurso às normas do ordenamento processual civil, como da aplicação das normas do ordenamento processual penal. 4.ª-Percorrendo a Decisão – note-se, quer a Decisão propriamente dita, quer a promoção do Ministério Público a que o Tribunal a quo aderiu e cujo teor deu por integralmente reproduzido – não se vislumbra uma única palavra sobre os três pedidos formulados na Oposição, a que anteriormente se fez referência.

  3. -A ausência de pronúncia relativamente a esses três pedidos é tanto mais surpreendente quanto mais é sabido que os mesmos compreendiam praticamente a totalidade dos meios de prova oferecidos pelo Recorrente.

  4. -Além de ser notório que a Decisão, ao ignorar os pedidos formulados sobre os meios de prova, coarctou gravemente o exercício do direito de defesa que assiste ao Recorrente, mais a mais quando este refutou diretamente, na sua Oposição, todos os fundamentos do arresto preventivo, o certo é que a circunstância de aqueles pedidos não terem sido apreciados gera, necessariamente, a nulidade da Decisão.

  5. -É o que resulta expressamente do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil – aplicável a qualquer decisão judicial e não apenas às sentenças, por força do disposto no artigo 613.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.

  6. -Note-se que, por efeito do artigo 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 613.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e conforme resulta da Doutrina e da Jurisprudência, não oferece dúvida que o Tribunal a quo estava obrigado a apreciar os três referidos pedidos formulados na Oposição.

  7. -Não procede, por isso, o argumento de que o Tribunal a quo não apreciou estes pedidos, porque a decisão sobre os mesmos ficou prejudicada pela solução dada a outras questões (rectius, pela decisão que determinou a manutenção da «medida de arresto provisório» decretada contra o Recorrente), pois se se considerasse que a solução dada “à causa” afastou a necessidade de apreciar os três referidos pedidos do Recorrente, nesse caso, estar-se-ia a inverter a lógica do iter decisório que qualquer tribunal de um Estado de Direito Democrático está obrigado a seguir: num primeiro momento, cada uma das partes tem a possibilidade de produzir os seus meios de prova e, só depois de apreciada a prova produzida por cada umas das partes, o tribunal está em condições de decidir. 10.ª-Em síntese, do ponto de vista processual civil, a Decisão é nula nos termos conjugados dos artigos 608.º, n.º 2, e 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil (aplicáveis por força do artigo 613.º, n.º 3, do mesmo diploma), pois o Tribunal a quo não se pronunciou sobre questões que estava obrigado a apreciar, o que se invoca para todos os efeitos legais.

  8. -A Decisão é ainda e também inválida no estrito plano processual penal.

  9. -Assim, no travejamento do incidente de arresto preventivo previsto no artigo 228.º do Código de Processo Penal, que remete para o Código de Processo Civil, a aludida Decisão constitui para, todos os efeitos, um ato decisório final, e, enquanto decisão final (daquele incidente) que materialmente é, fica sujeita ao regime de vícios decisórios consagrado no artigo 379.º do Código de Processo Penal, em título dedicado à sentença.

    13.ª-A Decisão incorre em ostensiva omissão de pronúncia relativamente a três pedidos relativos a diligências de prova expressamente formulados na Oposição, a qual é cominada com nulidade no citado artigo 379.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

  10. -Com efeito, caberia e cabe necessariamente, por parte do Tribunal a quo, pronúncia (fundamentada) sobre aqueles meios de prova indicados na Oposição, e isto sob pena de evidente e grosseira ilegalidade e invalidade, considerando quer o carácter altamente agressivo e gravoso da medida de garantia patrimonial aplicada, quer ainda a obediência devida aos princípios da necessidade e da subsidiariedade, que devem enquadrar e orientar a aplicação deste tipo de medidas (cf. artigo 193.º do Código de Processo Penal), por definição restritivas (forte e violentamente restritivas) de direitos fundamentais, em conjugação, bem assim, com os princípios do processo equitativo, do contraditório e da proibição de indefesa (cf. artigos 20.º e 32.º, n.ºs 1, 3 e 5, da Constituição da República Portuguesa, e artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem), corolários elementares de um núcleo mínimo de justiça processual.

  11. -Em suma, do ponto de vista processual penal, a Decisão é nula, nos termos do disposto no artigo 379.º, n.º 1, alíneas a) e c), do Código de Processo Penal, o que se invoca para todos os efeitos legais.

  12. -Caso assim não se entenda, o que só por cautela de patrocínio se equaciona, a Decisão seria sempre irregular, nos termos do disposto nos artigos 97.º, n.º 5, e 123.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o que igualmente se invoca para todos os efeitos legais.

  13. -Em conformidade com tudo o que vem de se expor, deixa-se igualmente alegado para os devidos efeitos que a norma constante do artigo 372.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 228.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), em conjugação com o disposto nos artigos 97.º, n.º 5, 123.º, n.º 1, e 379.º, n.º 1, alíneas a) e c), estes do Código de Processo Penal, é materialmente inconstitucional, por violação dos artigos 2.º, 3.º, 20.º, n.ºs 3, 4 e 5, e 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Constituição da República Portuguesa, quando interpretada no sentido de que, sendo requerida pelo visado a realização de diligências de prova na Oposição (apresentada após decretamento de arresto preventivo, nos termos do aludido artigo 228.º do Código de Processo Penal), tal requerimento não constitui questão que deve ser apreciada, fundamentada e decidida pelo tribunal.

  14. -Termos em que devem os vícios processuais ora alegados ser julgados procedentes e, consequentemente, deve a Decisão ser declarada nula (ou, caso assim não se entenda, irregular), sendo a mesma ser substituída por outra que, pronunciando-se (fundamentadamente) sobre os três pedidos acima explicitados, admita e determine a produção dos meios de prova aí oferecidos.

    Da errada decisão de indeferimento do pedido de acesso aos elementos de prova que sustentaram o decretamento do arresto preventivo 19.ª-Escudando-se na fundamentação expendida na promoção do Ministério Público de fls. 9682 e ss., o Tribunal a quo decidiu indeferir o pedido formulado pelo Recorrente, no artigo 23.º da Oposição, no sentido de que o mesmo fosse notificado de todos os meios de prova que serviram de base ao decretamento do arresto preventivo.

  15. -A tese do Tribunal a quo não está correta, pois assenta no errado pressuposto de que o Recorrente pretende, de alguma forma, aceder irrestritamente a toda a documentação constante destes autos, podendo, desse modo, perturbar a “descoberta da verdade”.

  16. -O Recorrente não ignora que este processo está em fase de investigação e que o mesmo se encontra sob segredo de justiça e foi por essa razão que o Recorrente não requereu, na sua Oposição, o acesso ilimitado a estes autos, mas, apenas e só, que fosse notificado de todos os meios de prova que, supostamente, serviram de suporte à decisão de decretar o arresto preventivo.

  17. -O Recorrente fê-lo propositadamente, para que assim se pudesse realizar um exercício de concordância prática entre os interesses que o segredo de justiça pretende acautelar e o legítimo direito de defesa do Recorrente, garantindo que este exerce livremente os seus direitos à tutela jurisdicional efetiva e ao contraditório.

  18. -Ora, a Jurisprudência que se debruçou sobre este tema – não aquela que o Ministério Público invocou na sua promoção e que nada tem que ver com o caso dos autos, já que essa respeita a uma situação de recusa de acesso somente a “certos elementos do processo”, e não a um caso de recusa de acesso à totalidade dos elementos probatórios, como sucede nestes autos – não deixa margem para dúvidas: para o exercício efetivo do direito de defesa há que permitir ao visado o acesso aos elementos existentes no processo que fundamentaram a decisão que se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT