Acórdão nº 1830/14.1T8LSB.L1-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL MARQUES
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

Relatório.

I.-MANUEL DA SILVA ... ...

, intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra ANTÓNIO MANUEL ... ...

, peticionando que: a)O Réu seja condenado a pagar ao Autor o remanescente do preço da cessão, no montante de 87.860,63 euros, acrescidos de juros à taxa legal, vencidos e vincendos sobre essa quantia, desde a data da notificação avulsa até ao integral e efectivo pagamento; b)O Réu seja condenado a indemnizar o Autor em 10.000,00 euros, a título de danos não patrimoniais; Para tanto, o autor alegou, em suma, que celebrou com terceiro, em 05/03/2003, um contrato promessa de compra e venda, na qualidade de promitente-comprador, relativo ao 4º andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Nova da Trindade, nºs 8 a 8º D, vindo, em 07.02.2004, a celebrar com o R. um contrato de cessão daquela referida posição contratual, dando desta cessão conhecimento ao promitente vendedor que nela consentiu; que no dia 23/02/2004, contra a entrega de €90.000,00, o R. recebeu do A. as chaves da fracção, tendo dela tomado posse, ficando o remanescente do preço, ou seja, € 210.000,00, de ser pago pelo R. na data da outorga da escritura pública de compra e venda, preço este assim repartido: € 119.639,37, referentes à parte da aquisição da fracção a pagar ao promitente vendedor; e € 90.360,63 referentes à parte do preço a pagar pela cessão da posição contratual ao A., deduzindo-se a este montante a quantia de € 2.500,00 entregue como sinal; que o prédio onde estava inserida a fracção estava a ser intervencionado, vindo as obras a sofrer um embargo pela Câmara Municipal, o que atrasou a constituição da propriedade horizontal, a obtenção da licença de habitabilidade e impediu a celebração da prometida escritura no prazo acordado, o que sempre foi do conhecimento do R.; que em 2013, todos os impedimentos que estavam à escritura estavam ultrapassados, vindo o promitente vendedor a interpelar o R. para a sua realização; que depois de vicissitudes várias relativas à marcação de tal escritura, veio esta a realizar-se em 16-10-2013., não vindo o R. a cumprir o pagamento do remanescente em falta do contrato de cessão; que o R. beneficiou com a valorização patrimonial da fracção, que ocupou nela residindo durante cerca de 9 anos, sem nada pagar; que a falta de pagamento pelo R. ao A., que desenvolvia a sua actividade na área imobiliária, deixou-o sem fundo de maneio, vendo-se sem recursos e com a necessidade de recorrer a empréstimos de terceiros, vendo quartada a possibilidade de poder regressar à vida activa e cumprir os seus compromissos, o que muito o abalou física e psiquicamente.

O réu contestou e deduziu reconvenção.

Alegou, em síntese, que o contrato de cessão de 07-02-2004 é nulo, uma vez que as assinaturas não estão reconhecidas presencialmente por notário; que o reconhecimento notarial aposto no contrato de 06-02-2003 é nulo, por, contrariamente ao que dele consta, não foi exibida uma fotocópia autenticada da Repartição de Finanças do 3º Bairro Fiscal com a menção de que o prédio urbano em causa fora inscrito anteriormente em 1951; que essa declaração é nula e contamina todo o contrato; que o referido contrato também não contém o reconhecimento presencial das assinaturas; que ocorreu uma alteração das circunstâncias, na medida em que o preço da cessão foi convencionado em face das condições de mercado existentes em 06.02.2004, tendo ocorrido, nos anos de 2007 e 2009 uma grave crise no sector imobiliário que fez decair em 40% o valor dos imóveis; que nos anos de 2010 a 2012, em razão de uma grave crise financeira com repercussão no sector imobiliário, o valor dos imóveis decaíram mais de 20%; que, à data em que o R. outorgou a escritura, o valor do imobiliário tinha descido mais de 60%, estando as fracções do mesmo prédio a ser vendidas por valor inferior; que no momento em que recebeu as chaves da fracção, em meados de Fevereiro de 2004, a mesma não tinha condições para ser habitada, não tendo o A. realizado as obras a que se comprometera; que solicitou, então, o R. uma peritagem, pela qual pagou €500,00; que realizou obras de reconstrução do telhado pelas quais pagou €11.146,00; com a instalação de gás pagou € 1.500,00; para a realização de projecto para fazer a ligação de luz pagou € 1.000,00; em obras na parede externa pagou € 600,00.

Concluiu pela improcedência da acção e procedência da reconvenção, nos seguintes termos: 1–Sejam julgadas procedentes as excepções de nulidade do contrato de 7 de Fevereiro de 2004 e nulidade de contrato de 6 de Fevereiro de 2003 e improcedente a acção, e por isso absolver o réu da instância, e condenar o autor a pagar as custas do processo, 2–Subsidiariamente, sem conceder e apenas por dever de patrocínio, seja julgada procedente a excepção de modificação do corpo e da alínea c) da cláusula 3ª do contrato de 7 de Fevereiro de 2004 por alteração das circunstâncias em que esse contrato se fundou, para que aí passe a constar respectivamente que "o preço total da cessão é de 220.000,00€" e "o remanescente ou seja 130.000,00€ (cento e trinta mil euros) será pago na data da escritura pública de compra e venda, sendo 119.639,37€ pagos ao vendedor e 10.360,63€ pagos ao ora cedente" e declarar a compensação deste crédito do autor para com o réu no montante de 10.360,63€ com o crédito do réu para com o autor no montante de 14.240,00€ e por isso absolver o réu da instância, e condenar o autor a pagar as custas do processo, 3–Seja julgada improcedente a acção e procedente a reconvenção e por via disso, declarar nulos os contratos de 7 de Fevereiro de 2004 e de 6 de Fevereiro de 2003, absolver o réu do pedido e condenar o autor a pagar ao réu a diferença da compensação do crédito de 14.240,00€ e do crédito de 10.360,63€, no montante de 3.879,37€ e condenar o autor a pagar as custas do processo.

O autor apresentou articulado de resposta, invocando incorrer o R. em abuso de direito na arguição da nulidade dos contratos, a caducidade do direito a arguir a anulabilidade dos contratos e o abuso de direito na invocação da alteração anormal das circunstâncias.

Teve lugar a audiência prévia, na qual se admitiu a reconvenção, se fixou o valor da causa e foi proferido despacho saneador.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, na qual se decidiu: “I)Julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condeno o réu ANTÓNIO MANUEL ... ... a pagar ao autor MANUEL DA SILVA ... ..., a quantia de € 87.860,63 (oitenta e sete mil, oitocentos e sessenta euros e sessenta e três cêntimos), acrescida dos juros de mora, contabilizados à taxa legal de 4% ao ano, vencidos desde 21-10-2013 e, vincendos, até efectivo e integral pagamento, absolvendo o réu do demais contra si peticionado pelo autor; e II)Julgo o pedido reconvencional deduzido pelo réu ANTÓNIO MANUEL ... ..., totalmente improcedente e, em consequência, dele absolvo o autor MANUEL DA SILVA ... ....

Custas - da acção e da reconvenção - por autor e réu, na proporção do respectivo decaimento”.

Inconformada, veio o réu interpor recurso de apelação, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões: 01-Porque não reconhecidas as assinaturas dos contraentes, a cessão da posição contratual firmada entre autor e réu foi formalizada no dia 7 de Fevereiro de 2004 sem a observância dos requisitos legalmente prescritos pelo que é nula por força do disposto no nº 3 do artigo 410°, n.º 1 do artigo 280°, e dos artigos 425° e 286° do código civil, 02-Os Factos Provados 23,24, 33, 38, 43, 46, 47 e 49 devem ser modificados ao abrigo do artigo 662° do código de processo civil para ficarem com as seguintes redacções: Facto Provado 23: "O promitente vendedor, Nuno Oliveira, por carta datada de 19 de Maio de 2013 interpelou o réu, para a sua realização, marcando a escritura pública de compra e venda para as 16:30 horas, do dia 20 de Junho de 2013, a realizar no Cartório Notarial da Notária, Ora Isabel Catarina ..., sito na Avenida Almirante Reis, em Lisboa, facto que o promitente vendedor deu também conhecimento ao autor, entregando-lhe cópia da missiva enviada ao réu e cessionário", Facto Provado 24: "O réu aceitou a data proposta, não tendo levantado qualquer objecção ou impedimento à realização da escritura de compra e venda," Facto Provado 33: "eliminado", Facto Provado 38: "No período de tempo que decorreu entre os adiamentos, de 20 de Junho de 2013 a 16 de Junho de 2013, nunca o réu manifestou qualquer desagrado ou impedimento na realização da escritura ou no pagamento do restante preço da cessão".

Facto Provado 43: .. E-mail que tem a resposta infra do mandatário do réu:" Facto Provado 46: "O réu foi notificado da notificação judicial avulsa apresentada pelo autor no dia 27 de Setembro de 2013 no dia 21 de Outubro de 2013".

Facto Provado 47: "A escritura pública de compra e venda veio efectivamente a ocorrer no dia 16 de Outubro de 2013 tendo sido pago pelo réu ao vendedor 119.639,37€." Facto Provado 49: "eliminado".

03.-A omissão do reconhecimento notarial das assinaturas dos contraentes e a omissão da certificação pela entidade que realiza esse reconhecimento da existência da respectiva licença de utilização em contrato promessa de compra e venda de imóvel ou sua fracção autónoma (nº 3 do artigo 410° do código civil) gera nulidade e não mera anulabilidade (também artigo 294° do código civil), 04.-O bem jurídico que a lei de 1986 pretendeu acautelar é exactamente o que neste processo está em causa, uma vez que a fracção autónoma que o réu comprou a Humberto Nuno ... ... de ... no dia 16 de Outubro de 2013 insere-se num edifício com mais de cem anos, anterior a 1951, que a partir de 2002 sofreu extensas obras de restauração e no interior de todos os seus fogos - que o proprietário pretendia que futuramente fossem fracções autónomas - as quais exigiam, pela sua generalidade e âmbito, a obtenção de licença para a respectiva construção...

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