Acórdão nº 26506/15.9T8SNT-A.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelCRISTINA COELHO
Data da Resolução20 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

RELATÓRIO: S. Cristina S. P.

veio intentar processo especial de revitalização ao abrigo do disposto no art. 17º-A e ss. do CIRE [1].

Decorridas negociações, a requerente remeteu ao processo o plano de recuperação aprovado.

A credora BMW Bank GMBH – Sucursal Portuguesa, que votou contra, veio apresentar oposição à homologação do Plano de Revitalização.

Conclusos os autos foi proferida sentença que não homologou a deliberação dos credores que aprovou o plano de revitalização da devedora, com a seguinte fundamentação: “…No caso, verifica-se que o PR constante de fls. 155 e ss. foi aprovado pela maioria de votos e de créditos exigida na alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-F do CIRE. Não obstante, também se verifica que, ao contrário do que acontece com os demais créditos, que sofrem uma redução de 75%, inexiste qualquer haircut do crédito garantido e do crédito comum titulados pelo credor hipotecário CGD.

Por outro lado ainda, e no que diz respeito aos créditos comuns, no PR estabelece-se que o credor CGD será pago mais cedo do que os demais credores. Tudo isto significa que existe um tratamento privilegiado da CGD, o qual não tem qualquer razão objectiva: no primeiro caso, é verdade que em processo de insolvência o credor hipotecário beneficia do direito real de garantia consubstanciado na hipoteca; porém, nesse processo, esse crédito apenas será pago em função do preço de venda do objecto da garantia real, que representará sempre um valor inferior em face da contraprestação a receber na sequência do cumprimento, em sede de PR, do contratado com o devedor. Assim, há que não homologar o PR, na medida em que se verifica que existe aqui a violação de normas aplicáveis ao seu conteúdo, designadamente do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 194.º do CIRE (n.º 5 do artigo 17.º-F do CIRE). …” Não se conformando com a decisão, dela apelou a requerente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusõesque se reproduzem: A)Não existe no plano de recuperação apresentado pela Recorrente qualquer violação ao princípio da igualdade ínsito no artigo 194º do CIRE.

B)O ponto nº 4, a páginas 14 e 15 do plano de recuperação, expõe e justifica, de forma aprofundada, as diferenciações no pagamento aos seus credores, com razões bem objectivas, que se passam a transcrever: C)A diferenciação no pagamento ao credor “Caixa Geral de Depósitos”, assenta em bases bem justificadas e objectivas, sendo o tratamento diferenciado permitido desde que devidamente justificado.

D)Em primeiro lugar, importa salientar que o crédito da “Caixa Geral de Depósitos” é substancialmente superior aos demais e como tal é um credor fundamental e intransponível para a viabilização do plano de recuperação, motivo pelo qual é expressamente admitido que o voto contra deste credor implica forçosa e necessariamente a insolvência da devedora e assim a impossibilidade praticamente certa dos credores comuns serem ressarcidos.

E)Foi o credor hipotecário que financiou a aquisição da fracção autónoma propriedade da Devedora.

F)Em segundo lugar, o montante do seu voto é fundamental para se obter o desiderato de aprovar o presente plano de recuperação e assim prosseguir e atingir a finalidade última do presente processo – a viabilização económica da Devedora.

G)Em terceiro lugar, os rendimentos auferidos pela devedora, não permitem um plano mais favorável aos credores comuns, pelo que, sem esta configuração, o presente plano de recuperação não é viável nem exequível.

H)Em quarto lugar, a homologação deste plano de recuperação é mais favorável a todos os credores do que a prossecução do processo para liquidação, cenário no qual os credores comuns receberão uma percentagem muito inferior dos seus créditos (ou mesmo nula) face ao proposto no presente plano.

I)A não homologação deste plano acarretará a total destruição económica, emocional e psicológica da devedora e do filho menor.

J)Está em causa a vivência de um agregado familiar, com um filho menor, mormente, a sua casa de família.

K)A conjugar e a acrescentar ao supra exposto, importa ainda salientar que o artigo 65º nº 1 da Constituição da República Portuguesa declara o direito de todos terem uma habitação e o nº 1 do artigo 67º do mesmo Diploma fundamental dispõe que “a família como elemento fundamental da sociedade, tem direito à proteção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros”.

L)Recorre-se ainda a um recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.04.2014 referente ao processo nº 83/13.3TBMCD-B.P1.S1 in “www.dgsi.pt” o qual dispõe que “O novo CIRE privilegia a recuperação da empresa em lugar da liquidação do património do devedor insolvente e da repartição do produto obtido pelos credores” e que “a homologação do plano de insolvência só deve ser rejeitada quando a diferenciação entre os credores é meramente arbitrária, sem qualquer fundamento objectivo e racional, o que não sucede se o tratamento diferenciado dado às instituições bancárias e financeiras está objectivamente fundamentado”.

M)Para uma melhor análise e interpretação das “razões objectivas” previstas no artigo 194º nº 1 do CIRE é necessário enquadrá-lo com o prejuízo efectivo que os credores possam vir a ter com a homologação do plano de recuperação ou seja, se fica ao abrigo do plano numa situação previsivelmente menos favorável daquela que teria na sua ausência, conforme decorre do artigo 216º nº 1 al. a) do CIRE.

N)Invocando o principio constitucional da proporcionalidade, a análise aprofundada da justificação do tratamento diferenciado entre credores terá conjugar o artigo 194º nº 1 do CIRE com o artigo 216º nº 1 al. a) do CIRE, pois parece fundamental que o Meritíssimo Juiz “a quo” tivesse alegado um prejuízo efectivo para os credores com a homologação do plano, o que no caso “sub judice” não sucedeu porque, objectivamente, tal prejuízo não existe.

O)Nesta ponderação de valores, também se terá de ter em atenção os interesses dos credores, pois são os seus interesses que estão em causa nesta lide, realçando-se que, “in casu”, o plano de recuperação teve 89,63% de votos favoráveis.

P)Para o efeito a Recorrente socorre-se do Douto Acórdão desse Venerando Tribunal de Lisboa de 25.03.2014 relativo ao processo nº 3175/13.5TBSXL.L1-1, disponível em www.dgsi.pt, o qual declara que, “na fundamentação do seu julgamento, haverá que ter sempre em conta que a interpretação de uma qualquer norma jurídica, seja ela de natureza substantiva ou adjectiva, tem forçosamente que obedecer aos critérios consubstanciados nos três números do art.º 9º do Código Civil, aos quais acrescem, para a construção do conceito “solução mais acertada”, as exigências inscritas nos artºs 335º (proporcionalidade assente na posição que o valor ético que valida a norma e a torna em verdadeiro Direito ocupa na Hierarquia de Valores que enforma e dá consistência ao tecido social comunitário) e 334º do mesmo Código, destacando-se neste...

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