Acórdão nº 3674/14.1TBOER.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução20 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

I-Relatório: Fernando ….. veio propor, em 20.8.2014, contra Júlia …., ação declarativa comum pedindo seja reconhecida a resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado entre o A. e a Ré com relação à fração dos autos, sendo esta condenada a restituir ao A. o sinal pago por este, no valor de € 10.000,00, acrescido de juros vencidos e vincendos, à taxa legal, até efetivo cumprimento, e ainda a Ré condenada a pagar-lhe o montante de € 319,80 respeitante às benfeitorias necessárias que o A. realizou na fração prometida vender, tal como o montante de € 500,80 relativo as despesas bancárias que o A. suportou, num total de € 820,60. Alega, para tanto e em síntese, que tendo celebrado com a Ré, em 12.5.2014, contrato promessa mediante o qual a Ré prometeu vender e o A. prometeu comprar a fração autónoma designada pela letra “F”, correspondente ao segundo andar direito do prédio sito na Rua ….., nº …., em Oeiras, após a celebração desse contrato veio a ter conhecimento da existência de uma ação judicial onde se peticiona a declaração de nulidade ou inexistência jurídica do contrato que deu origem à inscrição da propriedade daquela fração a favor da Ré, pelo que, tendo ocorrido a alteração das circunstâncias em que firmou o acordo, resolveu o contrato, recusando, todavia, a Ré devolver-lhe o sinal prestado.

Contestou a Ré, impugnando a factualidade alegada e defendendo, no essencial, que o A. resolveu o contrato sem motivo bastante e sem que a Ré entrasse em incumprimento, pelo que não tem direito a haver o sinal prestado. Pede a improcedência da causa e, em reconvenção, a condenação do A. a devolver-lhe a fechadura da porta da cave de que se apropriou ou o seu valor em dinheiro, mais requerendo a condenação do mesmo por litigância de má fé.

O A. respondeu, requerendo, por seu turno, a condenação da Ré como litigante de má fé.

Em audiência prévia, foi proferido despacho saneador que conferiu a validade formal da instância, procedeu à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova, fixando ainda o valor da causa em € 10.890,60.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, em 31.10.2015, nos seguintes termos: “(...) 1-Julgo verificada a resolução do contrato promessa de compra e venda; 2-Julgo inverificados os fundamentos da resolução, tendo a R, por conseguinte o direito de fazer sua a quantia recebida a título de sinal, no montante de € 10,000,00 (dez mil euros e zero cêntimos) 4.Julgo parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência, condeno ao A: no pagamento à R/reconvinte da quantia de € 20,00, (vinte euros) 5.Julgo improcedente o pedido de condenação de A. e R. em litigância de má fé.

Custas a cargo do A. quanto à ação e pelo A. e R. na proporção do decaimento quanto à reconvenção (art. 527.º o CPC).” Inconformado, recorreu o A., culminando as alegações por si apresentadas com as conclusões que a seguir se transcrevem: “ A)Resulta dos autos (factos dados como provados) que no dia 12.05.2014 o Recorrente celebrou com a Recorrida um contrato-promessa de compra e venda relativo à fracção autónoma designada pela letra “F”, correspondente ao segundo andar direito do prédio sito na Rua ……, n….., em Oeiras, nos termos constantes do respectivo clausulado. Na mesma data o A. entregou à R., a título de sinal e princípio de pagamento, o montante de € 10 000,00 (dez mil euros), mais se obrigando a entregar à R. no dia 01.08.2014, a título de reforço do sinal, o montante de € 10 000,00 (dez mil euros), sendo os restantes € 60 000,00 (sessenta mil euros), liquidados na data da escritura de compra e venda, a realizar até ao dia 31.10.2014.

Resulta igualmente dos autos que em meados do mês de Junho de 2014, o A. teve conhecimento da existência de uma acção judicial onde se peticiona a declaração de nulidade ou inexistência jurídica do contrato de dação que estivera na origem da inscrição da propriedade do imóvel objecto do contrato-promessa a favor da Ré. Tal acção deu entrada em Tribunal no dia 22.05.2014 (sob o n.º de Proc. 1350/14.4TBBRR), tendo sido registada na Conservatória do Registo Predial de Oeiras no dia 12.06.2014.

B)No entendimento do Recorrente, mais se deveria ter provado que “Por se considerar lesado com tal alteração (superveniente e imprevista) de circunstâncias, o A. resolveu o contrato promessa através de carta” (cfr. art.º 14.º da p.i.).

Efectivamente, salvo o devido respeito, não pode o Recorrente concordar com a douta sentença em crise quando o aresto refere não ter sido alegada factualidade demonstrativa de que a acção de anulação fosse, à data da celebração do contrato promessa, (im)previsível, pois essa imprevisibilidade foi não só alegada como (tanto quanto podem ser demonstrados os factos negativos) atestada pelo depoimento da mediadora imobiliária do contrato (19/09/2015, conforme acta, gravado no sistema Habilus Media Studio, com início às 14:05, minuto 9:43). Efectivamente, na esteira do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15.05.2014 (proc. n.º 468/12.2TCFUN.L1-1, Relator EZAGUY MARTINS, in www.dgsi.pt) “a resolução do contrato por alteração anormal das circunstâncias que constituíram a base do negócio, aponta, via de regra, para a imprevisibilidade de tal alteração. Assim, haverá fundamento para a resolução quando as alterações forem de tal monta que no momento da realização do contrato se considerassem completamente impossíveis”.

A ser assim, como na verdade o é, a douta sentença fez errónea (porque insuficiente) apreciação da prova produzida.

C)O tribunal A Quo, pese embora tenha (no entendimento do Recorrido) delimitado correctamente a principal questão em apreciação nos autos – “saber se a propositura de acção e respectivo registo em momento posterior ao da celebração do contrato promessa e que tem por finalidade obter a anulação da dação do imóvel objecto do contrato promessa ao promitente vendedor constituiu e integra alteração superveniente de circunstâncias”, sufragou, no entanto, o entendimento de que a propositura da aludida acção de anulação “(…) não integra, pelo menos à data da resolução, os requisitos de que depende a aplicação do disposto no art.º 437.º do Código Civil”.

Salvo o devido respeito, não pode o Recorrente conformar-se com tal decisão já que a mesma enferma de errónea apreciação da matéria de facto e da prova produzida e, consequentemente, de errónea fundamentação de facto e de direito.

D)Na verdade, entende o Recorrente que, aquando da resolução do contrato promessa de compra e venda, estavam integralmente preenchidos os requisitos previstos no art.º 437.º do Código Civil.

Assim, na esteira do douto Acórdão do S.T.J. de 31/11/1987 (in, BMJ, 371º-408) o direito à resolução pressupõe fundamentalmente: a)Que se tenha produzido uma alteração anormal das circunstâncias que foram basilares para a decisão dos contraentes, de tal modo que a base do negócio tenha desaparecido ou tenha sido substancialmente modificada; b)Que a exigência das obrigações assumidas pela parte lesada afecte gravemente os princípios da boa fé; c)Que tal exigência não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato; d)Que a parte lesada não esteja em mora no momento em que a alteração de circunstâncias se verificou; Ora, dúvidas não subsistem que a interposição da acção de anulação produziu uma alteração anormal de circunstâncias, por atingir uma premissa nuclear do negócio, o qual foi (súbita e imprevistamente) adulterado, pelo que seria atentatório da mais elementar boa fé (e configurando mesmo um abuso do direito) a exigência da obrigação assumida pela parte lesada, tanto mais que tal exigência não está coberta pelos riscos próprios do contrato.

Ademais, pacífico se torna que o Recorrente, quando operou a resolução do contrato, não se encontrava em mora.

E)E nem...

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